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ENQUADRAMENTO DO ESTUDO

ESTUDO EMPÍRICO: VALORES E CRENÇAS NA RELAÇÃO ENTRE ENFERMEIROS E IDOSOS

1. OBJECTIVOS E METODOLOGIA

1.1. ENQUADRAMENTO DO ESTUDO

Sendo a enfermagem uma profissão consciente dos seus valores, deve colocar questões que mereçam ser pesquisadas (OMS, 1985). Constituindo o próprio homem, nos cuidados de enfermagem, o cerne da pesquisa (Colliére, 1986), a relação enfermeiro/ idoso: valores e crenças, emerge como um tema pertinente.

Os cuidados de enfermagem estão envoltos por concepções, crenças e valores, que existem quer em quem tem necessidade de procurar esses cuidados (por exemplo, os idosos), quer em quem os presta (enfermeiros). Os idosos são aqueles que mais recorrem aos cuidados de enfermagem, sendo os valores e crenças sobre os enfermeiros que determinam as atitudes e comportamentos dos cuidados que lhe são prestados. Por outro lado, devido ao número reduzido de estudos, torna-se importante investigar esta problemática. As implicações deste estudo serão relevantes ao nível da formação em enfermagem, pois permitirão perceber como os valores estão a influenciar o desempenho profissional, melhorando a prestação de cuidados, tanto por quem os presta (enfermeiros), como quem os recebe (idosos).

1.2. OBJECTIVOS

A investigação parte de uma situação problemática, “qualquer questão não resolvida e que é objectivo de discussão, em qualquer domínio do conhecimento” (Gil, 1989: 137). Atendendo a que os valores e crenças são aspectos que influenciam qualquer interacção, também estão presentes entre enfermeiros e idosos. E, a questão não é se os valores dos enfermeiros e idosos se irão confrontar, mas como tal ocorrerá (Aponte, 1985). Este tema é, ainda, mais importante, pois quer idosos, quer enfermeiros entram num processo de cuidados com valores e crenças sobre como a relação deve ser. Depois este conjunto de valores é filtrado de várias formas, pelos indivíduos envolvidos e pela sua interacção.

Assim, o objectivo global deste estudo exploratório é compreender os valores e crenças que enfermeiros e idosos têm em relação à sua interacção e como poderão estar a influenciar essa interacção de forma positiva e/ou negativa.

Mais especificamente, este estudo pretende atingir os seguintes objectivos:

a) Identificar crenças e valores que os idosos e os enfermeiros têm sobre a sua relação. b) Compreender como esses valores podem estar a organizar a interacção em termos positivos/negativos.

c) Identificar qual será o sistema de crenças e valores que podem estar a organizar a interacção entre idosos e enfermeiros.

Espera-se que os resultados permitam:

a) Reavaliar crenças e valores para a promoção de melhores cuidados de saúde aos idosos.

b) Contribuir para que os serviços de saúde, principalmente na enfermagem, prestem cuidados humanizados, centrados na qualidade de vida do idoso, mantendo os objectivos tradicionais de prevenção, promoção e manutenção da saúde.

c) Contribuir para a formação dos enfermeiros, para poder situar, analiticamente, as suas acções e reacções, tanto no percurso apropriativo de formação, como nas estratégias individuais e colectivas.

d) Promover a satisfação, por parte dos profissionais de saúde, em relação aos cuidados prestados.

e) Promover a satisfação dos utentes, principalmente idosos.

2. METODOLOGIA

2.1. INSTRUMENTO

A técnica dos incidentes críticos constitui um meio fecundo de conhecimento e de valores, representações e opiniões dos observadores duma dada actividade (Estrela & Estrela, 1958), pois ao permitir recolher dados sobre determinado ângulo, sobre o comportamento mediante os relatos dos incidentes descritos pelos entrevistados, dá-nos

Para Flanagan, autor da técnica dos incidentes críticos, incidente é definido como toda a actividade humana observável, suficientemente completa, para que através dela se possam fazer induções ou previsões sobre o indivíduo que realiza a acção. Para ser crítico, um incidente deve dar-se numa situação tal que o fim ou intenção da acção apareçam suficientemente claros ao observador e que as consequências da acção sejam evidentes (Flanagan, 1954, citado por Estrela & Estrela, 1978). A técnica dos incidentes críticos ocupa-se de incidentes, que podem definir-se como um episódio observável e integral da conduta humana. A palavra “crítica” denota que o incidente deve ter impacto discernível nos resultados ou prognóstico; pode ter tido uma contribuição positiva ou negativa para o ganho de alguma actividade de interesse (Polit, 1985).

Foi durante a II Guerra Mundial que esta técnica foi pela primeira vez utilizada, para a preparação dos pilotos americanos. A sua aplicação é difundida no mundo do trabalho, após a guerra, dando resposta a algumas preocupações da psicologia do trabalho, entre as quais como melhorar as condições de trabalho e aumentar a produtividade (Estrela & Estrela, 1994). Os campos de acção desta técnica são variados, sendo os principais a psicologia de trabalho, a psicoterapia e aconselhamento e a investigação sobre o ensino e a formação (Estrela & Estrela, 1994).

Também tem sido utilizada em diversos estudos de investigação em enfermagem, com diversos objectivos: ajudar à tomada de decisões; esclarecer a conduta dos enfermeiros na prestação de cuidados; tornar mais eficaz a aplicação das técnicas assistenciais; elaborar métodos de ensino que visam a mudança de comportamento dos utentes (Polit, 1985). Clark e Lenburg (1980) utilizaram a técnica dos incidentes críticos para investigar o comportamento baseado em informação cognitivista de um grupo de enfermeiras (citado por Polit, 1991).

A técnica dos incidentes críticos tem inspiração behaviorista, implicando alguns pressupostos: um comportamento é susceptível de ser observado, isolado e classificado; um comportamento possui um certo grau de consistência que o torna inteligível (é função de factores da situação e individuais; o número de respostas possíveis a uma determinada situação é teoricamente limitado).

Destes pressupostos decorrem limitações para a técnica dos incidentes críticos, nomeadamente, ficarão fora do seu alcance todos os processos que não se traduzam em comportamentos observáveis (Estrela & Estrela, 1994). Apesar de algumas limitações, esta

técnica tem dado provas de fiabilidade na descrição dos conteúdos em que tem sido utilizada, tendo-se tornado um instrumento poderoso na investigação descritiva e exploratória, devido ao seu potencial de descoberta (Estrela & Estrela, 1994). Assim, algumas das vantagens da técnica são: flexibilidade e tendência para proporcionar informação útil e compenetrada quanto ao tema em estudo; permite obter dados de forma relativamente eficiente, inclusive com entrevistas pessoais; um indivíduo pode relatar três ou quatro incidentes críticos em relação a uma conduta relevante (Polit, 1985).

Considerando as finalidades deste estudo, optamos por este tipo de metodologia, porque parece a mais adequada, quer às características de um trabalho exploratório, quer à temática em estudo, tendo ainda a vantagem de possibilitar a articulação entre as diversas variáveis.

A natureza do problema de investigação determina o instrumento de recolha de dados a utilizar. Segundo Fortin (1999: 240) “antes de empreender uma recolha de dados, o

investigador deve perguntar-se se a informação que quer recolher com ajuda de instrumento de medida em particular, é exactamente a que tem necessidade para responder aos objectivos da sua investigação”. Segundo o mesmo autor “na escolha de um instrumento de medida são de considerar determinados factores como sejam os objectivos de estudo, o nível de conhecimentos que o investigador possui sobre as variáveis, a possibilidade de obter medidas apropriadas às definições conceptuais, a fidelidade e a validade dos instrumentos de medida, assim como a eventual concepção pelo investigador dos seus próprios instrumentos de medida” (Fortin, 1999: 235).

Examinando a técnica dos incidentes críticos, esta permite visualizar as perspectivas pessoais de experiências significativas, podendo ajudar a ver uma diversidade de significados pessoais e dinâmicos e reflectir o contexto interpessoal no qual eles são expressados, revelando alguns dos valores assegurados pelo narrador. Mas, mais relevante, é a propriedade metafórica da técnica de incidentes críticos, evidenciando aspectos menos acessíveis da experiência.

Mais especificamente, a técnica de incidentes críticos é um jogo de procedimentos de recolha e análise de relatos de incidentes que envolvem “certos factos importantes

relativos ao comportamento em uma dada situação” (Flanagan, 1954: 335). Os incidentes

resultados. Um incidente crítico pode ser uma trivialidade, evento quotidiano ou interacção (Tripp, 1993).