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O que entra na conta da emissão de GEEs

Desde 1984, como um dos principais produtores de biocombustíveis, o Brasil vem desenvolvendo metodologias para quantificar as emissões de GEEs na cadeia produtiva do açúcar e do etanol. A partir de 2006, aumentou a preocupação em definir metodologias mediante aos interesses dos países desenvolvidos em usar etanol e biodiesel. A partir de então, detalhou-se o que é analisado nas emissões de GEEs em etanol. Primeiro, são contabilizadas as emissões nos fluxos de carbono associados com a absorção do carbono atmosférico por fotossíntese; a liberação na queima da palha da cana na colheita; a liberação gradual por oxidação de resíduos não queimados no campo; a liberação de gás carbônico na fermentação da sacarose e combustão do bagaço nas usinas; e a liberação do gás carbônico pelos motores dos automóveis. Essas emissões são consideradas neutras na emissão total, pois os volumes de carbono emitido e sequestrado são semelhantes.

Outros dados que entram no balanço de emissões se relacionam aos fluxos de carbono associados com o uso de combustíveis e a produção dos insumos usados na agricultura e na indústria, na fabricação de equipamentos, prédios e em sua manutenção. Aqui entra o gás carbônico emitido pelo uso de combustíveis fósseis na agricultura, como o diesel consumido pelos veículos que transportam a cana para as

usinas, por exemplo. E também o gás emitido pelos produtores de insumos agrícolas, como herbicidas, pesticidas, mudas etc. Nesse quesito, disse Macedo43, há um aumento da quantidade de gás carbônico na atmosfera.

Um terceiro item que entra na conta de emissão dos GEEs são os gases não associados ao uso de combustíveis fósseis, principalmente metano e óxido nitroso. A emissão desses gases é medida no processo de queima da cana, na liberação com o uso de fertilizantes, na combustão dos bagaços nas caldeiras e do etanol nos motores. Também são fluxos que ampliam o volume de GEEs na atmosfera.

Um quarto grupo trata das emissões que seriam evitadas ou emissões de mitigação. É uma conta que diz quanto haveria de carbono a mais na atmosfera se, ao invés do etanol, fosse utilizado um combustível fóssil. Aqui entram as emissões de GEEs evitadas pela substituição de gasolina por etanol, de óleo combustível por bagaço para geração de energia nas usinas, e com a co-geração de energia. Emissões por conta da mudança do uso do solo são consideradas à parte.

Na atual metodologia adotada, descarta-se a contabilização dos “efeitos indiretos” da produção dos biocombustíveis e destaca-se a importância na contabilização do balanço final das emissões dos GEEs resultantes do efeito indireto da mudança do uso do solo. Nas metodologias hoje existentes, incluem-se apenas o uso direto, ou seja, a substituição de uma cultura por outra - por exemplo, laranja por cana de açúcar. Faz-se a conta para ver se essa substituição aumentou ou diminuiu a emissão de GEEs. Quando se leva em conta as emissões de carbono que ocorrem quando agricultores de todo o mundo convertem florestas e pastagens em novas áreas cultivadas para repor os grãos (ou a área plantada) desviados para a produção dos biocombustíveis, estima-se que as emissões resultantes dessa mudança do uso do solo, ao invés de produzir uma redução de 20% nas emissões, dobram as emissões de gases em 30 anos e aumenta as emissões durante 167 anos. Esses resultados trazem preocupações sobre a obrigação de adicionar percentuais de biocombustíveis em gasolina e enfatizam o valor do uso de resíduos.

43 Isaías Macedo, do Núcleo Interdisciplinar de Planejamento Energético (Nipe) da Unicamp, coordenador do painel "A evolução do etanol: do programa de álcool do Brasil à quebra de lignocelulose".

Com isso as metodologias adotadas envolvem dados de forma mais abrangentes, devido ao aumento da complexidade do sistema produtivo do etanol. Muitas usinas estão produzindo co-produtos, como ácido cítrico, lisina, leveduras especiais; há o uso do bagaço e da palha para produção de energia que pode ser co-gerada e vendida ao mercado, substituindo as formas convencionais de produção de energia elétrica; há a produção de plásticos e solventes, o uso conjugado de etanol e biodiesel na parte agrícola e industrial, em rotação de cultura de soja. Esses elementos não têm sido considerados nas metodologias.

Outro ponto da metodologia que não é discutida em âmbito internacional refere- se ao cálculo de remoção futura de floresta por conta do deslocamento de culturas promovido pela expansão do uso de biocombustíveis. Ou seja, quando o cultivo dos biocombustíveis é feito em regiões degradadas, o balanço é positivo. No entanto, quando esse plantio é feito em regiões de florestas, tal ação elevaria as emissões percentuais de carbono. Isso porque, a monocultura de cana ameaça mais o Cerrado brasileiro que a Floresta Amazônica. Na safra de 2007, as lavouras de cana de açúcar ocupavam 5,8 milhões de hectares no cerrado, contra 16.033 hectares da Amazônia, segundo o levantamento do IBGE que será utilizado no estudo. Nos Estados que compõem a Amazônia brasileira, há três usinas de processamento de cana de açúcar instaladas e, em contrapartida, somente em Goiás, Minas Gerais e Mato Grosso do Sul são 58 usinas. O Cerrado brasileiro apresenta condições ideais de plantio de cana de açúcar se comparado a Amazônia (PNUD, 2008). Tal bioma apresenta melhores condições climáticas, irrigação e topografia. Por um lado, há uma forte pressão internacional de preservação da Amazônia, por outro lado, há vários planos de combate ao desmatamento da floresta. Portanto, ainda é necessário, frente à política de preservação da Amazônia, a criação de financiamento para o desenvolvimento agrícola, mas que sejam acompanhados de políticas de preservação dos demais biomas brasileiros. Segundo pesquisas divulgadas recentemente, a monocultura da cana traz significativas perdas na biodiversidade brasileira. Seu plantio mexe no meio bioquímico do cerrado, principalmente na acidez do solo, que é muito alto nessa região. O bioma do cerrado é o segundo em perdas de mata nativa no Brasil depois da

Mata Atlântica, segundo o Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (IBAMA) (PNUD, 2008).