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A figura 30 traz uma charge publicada no livro Novas Palavras (2013).

A charge ilustra a questão do desmatamento a partir de um grupo de pessoas em trajes formais dando uma entrevista coletiva para um grupo de repórteres, no centro de um cenário desértico. Esta charge se encontra na seção de Atividades do capítulo sobre Figuras de Linguagem, Volume 1, do livro Novas Palavras (2013). Ela é o texto 1 e aparece ao lado do texto 2, apresentado abaixo:

[...] O empresário moderno não demite mais, faz um downsizing, ou redimensionamento para baixo da sua empresa. O empregado pode dizer em casa que não perdeu o emprego, foi downsizeado, e ainda impressionar os vizinhos, [...] VERÍSSIMO, Luis Fernando. A versão dos afogados: novas comédias da vida pública: 347 crônicas datadas. Porto Alegre: L&PM, 1994, p. 77.

Apresentados esses dois gêneros textuais, o livro propõe as seguintes questões: Tanto a charge quanto o texto utilizam, como recurso expressivo, a mesma figura de linguagem.

a) De que figura se trata?

b) Explique, na charge e no texto, como se constrói o efeito de sentido criado por essa figura.

Figura 30 - Entrevista Coletiva

Fonte: Livro Novas Palavras, volume 1, 2013, p. 211. ANGELI. Folha de S. Paulo, São Paulo, 22/05/2005.

Diante da importância da rápida apreensão do conteúdo da imagem pelas PcDV, para que elas possam acompanhar texto e imagem, acredito que a composição (metafunção composicional), deveria ser a primeira função a ser abordada na descrição dos elementos/participantes da imagem, pois ela direciona o “olhar” do observador para o local onde se encontra a informação nuclear do gênero imagético. Assim, para que as PcDV tenham o mesmo ponto de partida que os videntes no processo de construção da imagem mental, após a identificação do gênero imagético, a proposta de leitura seria do centro para baixo, tendo como foco central a bancada de autoridades e repórteres, pois são eles que dão sentido aos outros elementos da imagem, ou seja, o conteúdo da entrevista que as autoridades dão aos repórteres é apresentado na frase (parte inferior da imagem) e dialoga com a paisagem na qual a bancada está representada.

Dada a localização da informação nuclear, a audiodescrição deveria apresentar o ângulo em que a imagem é vista, para que as PcDV sejam orientadas pelo mesmo ponto de vista dos videntes e assumam o papel pensado para os observadores da imagem. A forma como a imagem foi capturada, num ângulo vertical de cima para baixo (metafunção interacional), convida o observador a refletir sobre o desmatamento causado pela não execução de medidas preventivas citadas no discurso dos entrevistados.

Para que as PcDV pudessem compor a imagem mental, após a orientação do “olhar” do observador para a imagem, a audiodescrição deveria lhes oferecer as mesmas informações que os videntes absorvem imediatamente ao ver os participantes representados na imagem. Essas informações devem contemplar o posicionamento desses participantes (onde), a maneira como eles estão vestidos e o que estão fazendo (faz o quê). Em seguida, a audiodescrição deveria apresentar às PcDV o conteúdo da frase que aparece na parte inferior da imagem. Assim, a leitura seria do centro para baixo, partindo da informação nuclear para a informação real, “o que é”, as promessas.

Com o objetivo de mapear a composição desta imagem e ilustrar o ponto vista na qual ela foi capturada, a figura 31 mostra todos os elementos que compõem a charge, assim como a ordem em que, segundo as orientações da GDV, as informações deveriam ser apreendidas.

Na imagem acima, o texto imagético é a informação nuclear, o ponto de partida, representado pela imagem dos entrevistados e dos repórteres, e o texto verbal é a informação real, representada pela fala dos entrevistados. A charge parece fazer um contraste entre o que se propõe e o que se efetiva na preservação do meio ambiente. A ordem de apresentação dessas informações na audiodescrição, segundo a GDV, deveria ser da informação nuclear para a informação real, pois a compreensão do texto verbal depende da apreensão do texto imagético, que ao ocupar a posição central da imagem, detém os elementos que o rodeiam.

Assim, em termos de descrição da composição da imagem, acredito que a ordem ideal para a AD, segundo a GDV, seria descrever os representantes da informação nuclear - os entrevistados e os repórteres, e por último a informação real, representada pelo texto verbal.

No que diz respeito à representação (metafunção representacional), a charge representa um processo narrativo, no qual os entrevistados são os atores, a direção de seus olhares é o vetor e os repórteres são as metas. (Vê Figura 31).

Do ponto de vista da metafunção Interacional, a perspectiva deveria ser a segunda informação apresentada na AD desta charge, devido à forma como a imagem foi capturada. O contato que os participantes – atores (entrevistados) e metas (repórteres) - estabelecem com quem contempla a charge (o observador) é de oferta, pois eles não se direcionam ao observador.

Figura 31 - Mapeamento de Entrevista Coletiva segundo a GDV

No quadro sinótico 7, é possível observar os elementos que compõe a imagem, a partir das metafunções composicional, interacional e representacional.

Quadro 7: Análise da charge Entrevista Coletiva, segundo a GDV.

METAFUNÇÃO

Composicional

Valor da Informação Centralizado

(onde)

Centro: No centro e um cenário desértico. Real: Frase In*teracional Contato (faz o quê/como) Distância Social Perspectiva (de onde)

Oferta: 5 pessoas dão entrevista coletiva para um

grupo de repórteres.

Impessoal: Descrição dos entrevistados e dos

repórteres.

Subjetiva (câmera alta): A imagem mostra, de cima

para baixo. Representacional Processo Narrativo Ação (o quê/quem) (faz o quê/como)

Ator: 5 pessoas sentadas atrás de uma mesa Vetor: A direção de seus olhares

Meta: Grupo de nove repórteres e fotógrafos

Fonte: Elaborado pela autora

Para fornecer informações necessárias à PcDV para responder às questões que envolvem a imagem Entrevista Coletiva, propostas pelo livro, uma AD segundo a GDV deveria iniciar pelos entrevistados e repórteres (metafunção composicional), seguida do ângulo de captura dessa imagem (metafunção interacional), depois deveria apresentar a descrição de seus atores com a ação que eles executam em relação às suas metas (metafunção representacional), e finalizaria com a informação real representada pela frase dos entrevistados (metafunção composicional).

Assim, para construir um texto narrativo da audiodescrição de forma a facilitar a construção da imagem mental desta charge pela PcDV, as informações seriam apresentadas conforme as metafunções composicional, interacional, representacional e novamente composicional, nesta ordem.

4.3.1. Análise da AD do Mecdaisy a partir da GDV

Agora veremos, como a AD do Mecdaisy poderia ser analisada a partir das considerações da subseção anterior. Antes, vejamos a AD atribuída à charge:

Charge com um quadro. Num cenário desértico, uma bancada de autoridades está sentada diante de repórteres e fotógrafos. Uma frase aparece embaixo da cena, representando o discurso das autoridades: “Senhores, a ideia é criarmos um conselho que coloque em prática medidas efetivas contra o desmatamento!”.

A audiodescrição acima não fornece à PcDV uma noção precisa sobre a posição em que as autoridades e os repórteres estão representados na imagem. Além disso,

ela não apresenta a informação sobre o ângulo de captura da imagem, cuja importância foi explicada anteriormente.

No tocante à descrição dos participantes representados na imagem (os atores), ao defini-los como “uma bancada de autoridades”, ao invés de descrever suas características, a AD do Mecdaisy diminui significativamente a autonomia da PcDV na sua capacidade de inferência sobre o que está sendo descrito. O que se repete com a afirmação de que a frase que aparece na parte inferior da imagem “representa o discurso das autoridades”, que retira da PcDV a possibilidade de chegar às suas próprias conclusões sobre a autoria da frase.

Sabendo-se que a interpretação é subjetiva, ao elaborar um texto de AD o audiodescritor deve evitar fazer afirmações a partir do seu ponto de vista, pois ao fazê- lo ele imprime o modo como o texto da AD deve ser lido pela PcDV.

Em seu Relato livre, a PcDV-2 relatou ausência de informações sobre os personagens da imagem (Vê Apêndice F):

Eu achei que falta informação, na minha mente eu formei uma imagem [...] de um desenho com uma mesa, uma grande mesa, e com as pessoas atrás sentadas só que eu não faço ideia de quem são e como são essas pessoas. São brancas, negras, altas, baixas, homens, mulheres, se vestem com alguma roupa específica? [...] eu acho que faltou informação para gente formar uma ideia mais clara daquela situação que tá acontecendo.

4.3.2. Proposta da AD com base na GDV

Considerando análise de Entrevista Coletiva, proponho a seguinte AD para a charge em questão:

Charge. No centro de um cenário desértico, a imagem mostra, de cima para baixo, 5 pessoas sentadas atrás de uma mesa, em trajes formais, dando uma entrevista coletiva para um grupo de nove repórteres e fotógrafos posicionados na frente da mesa. Na parte inferior da imagem a frase: “Senhores, a ideia é criarmos um conselho que coloque em prática medidas efetivas contra o desmatamento! ”.

A audiodescrição tem início com a identificação do gênero ao qual pertence a imagem para que os alunos se ambientem e acessem conhecimentos específicos sobre este tipo de imagem. Em seguida, as PcDV terão acesso aos elementos/participantes da imagem na sequência proposta pelos procedimentos de análise descritos acima, para que tenha acesso às informações necessárias à

apropriação da imagem e assim ter meios de lograr êxito nas questões propostas pelo livro.

Os elementos/participantes da imagem são descritos na sequência orientada pela composição da imagem, com suas respectivas localizações (onde), e pela orientação do ponto de vista da imagem (de onde). Temos, então, a bancada de autoridades e repórteres e a frase, que nesta ordem representam as informações Central e Real, respectivamente. A bancada de autoridades e repórteres localiza-se no centro de um cenário desértico e é vista de cima para baixo; e a frase localiza-se na parte inferior da imagem.

Em seguida, os elementos/participantes são descritos de forma a contemplar as informações das unidades de análise das metafunções interacional e representacional. A ausência de contato visual entre os participantes representados e o observador (unidade de contato), bem como a distância imposta entre esses sujeitos (unidade distância social), além de ficarem subentendidas na informação inicial sobre o ângulo de visão da imagem (unidade de perspectiva), concretizam-se também na descrição da ação dos participantes (metafunção representacional). Ao informar que 5 pessoas (quem), dão uma entrevista coletiva (faz o quê), para um grupo de repórteres, a AD configura o contato como oferta, pois as pessoas não estão olhando para o observador da imagem; assim como ao descrever detalhes das autoridades e dos repórteres, a AD configura a unidade distância social como impessoal, pois tais informações só são possíveis porque eles são mostrados de corpo inteiro, numa distância de impessoalidade.

As informações referentes às representações desses participantes (metafunção representacional) na imagem, serão apresentadas na audiodescrição pela ação de dar uma entrevista, que define a relação dos entrevistados com os repórteres.

Em seu Relato livre, a PcDV-2 considerou a AD da MAIE mais completa, pois apresenta mais detalhes sobre os personagens e sobre a imagem, como pode ser observado em sua fala abaixo:

Essa informação já foi mais completa, já fala a posição da imagem, de cima pra baixo, já fala a roupa, [...] informou que estão em trajes formais, quantas pessoas estão atrás dessa mesa, porque na minha imagem, quando falou uma bancada, eu já imaginei umas dez, [RISOS], [...] então a informação ficou mais completa, eu achei que essa ficou mais detalhada, mais fácil de visualizar, não depende tanto da nossa imaginação, que a gente tem mais informação para montar essa imagem, e quando a gente depende menos da imaginação a

imagem fica mais clara e… como que eu vou dizer, consequentemente mais real.

Em seu Relato Guiado (Vê Apêndice F), a PcDV-2 preferiu a AD da MAIE, de acordo com as seguintes avaliações: apresenta mais clareza; as informações se apresentam de forma mais lógica para a construção da imagem; facilitou a construção da imagem mental; e causou maior envolvimento com a imagem, pois exigiu menos esforço na sua formulação:

A outra me deu mais detalhes, então não precisei recorrer tanto à memória de outras descrições para formular aquela imagem, já disse a quantidade de pessoas, como tava a posição da imagem, quem tava na frente quem tava atrás, [...] então ela me ajudou a me envolver mais com a imagem do que com o meu pensamento de montar essa imagem. (Ver Apêndice F)