• Nenhum resultado encontrado

Entrevista com a representante do Tarifa Zero Goiânia, a historiadora Aline do Carmo Ela tem 24 anos e membro do grupo atuante na capital

do estado de Goiás.

1. Eu percebi que vocês prezam pela horizontalidade, assim não há hierarquia. Como, então, eu poderia nomeá-la? Como membro do Tarifa Zero Goiânia?

Aline: Sim, não há hierarquia. Pode me nomear sim como membro do Tarifa Zero Goiânia. Além da horizontalidade, prezamos também pela rotatividade de funções, hoje eu darei entrevista, a próxima vez que solicitarem entrevistas pode ser qualquer um outro que se disponha ou que seja decidido coletivamente entre nós. Não há funções específicas para nenhum membro, e todos participam das tarefas que temos.

2. O Tarifa Zero Goiânia se define como um “espaço de compartilhamento de informações e de discussão sobre mobilidade urbana e transporte coletivo na região metropolitana de Goiânia”. Sob este conceito, como vocês acreditam contribuir para a melhoria da mobilidade urbana?

Aline: Nós acreditamos contribuir para a melhoria da mobilidade urbana uma vez que discutimos sobre o funcionamento desta lógica em nossa cidade, levantando os problemas e construímos debates com a população que se movimenta pela cidade, a fim de, por exemplo, perceber quais são os interesses dos empresários do transporte, e quais são as demandas da população que utiliza o transporte coletivo, a partir disso, buscamos debater como é possível interferir e mudar uma lógica que visa o lucro e não o direito irrestrito a cidade, ou seja, pensamos uma mobilidade urbana que não esteja condicionada a interesses capitalistas. Acreditamos que, através da Tarifa Zero, a locomoção pela cidade pode melhorar e se tornar mais justa para os habitantes que vivem nela. Lutamos pelo direito a cidade, pois, como costumamos dizer: a cidade só existe para quem pode se locomover por ela.

3. Vocês estão presentes em blog, no Facebook, no Twitter, no Youtube e no RSS. Em que esta presença na internet contribui para o desenvolvimento da proposta do Tarifa Zero Goiânia? Qual a diferença de uso de cada uma destas ferramentas?

136

Aline: A internet para nós é vista como uma ferramenta que nos auxilia na divulgação de informações e dos debates que envolvem a discussão sobre Tarifa Zero, mas não é vista com um espaço de organização e construção da luta. No Blog, costumamos principalmente publicar textos de análises que fazemos sobre o transporte e sobre as lutas em Goiânia. Sempre que publicamos textos no blog, compartilhamos no facebook. No facebook buscamos também divulgar informações, imagens, vídeos, compartilhar notícias sobre o transporte da cidade e sobre outras lutas, além de eventos que realizamos, etc.

4. Como vocês conciliam a contribuição de vocês no âmbito da internet e fora dela? Qual a diferença de cada uma delas?

Aline: Na internet, todos os membros do TZ auxiliam no manuseio. Porém, nossa contribuição se dá principalmente em outros espaços, como debates em espaços públicos ou em escolas, buscando por diálogos com a população fora da internet, pois, apesar desta ser uma ferramenta que auxilia na divulgação da luta, não pensamos que ela cumpra o papel de debate e luta que almejamos. A diferença é que a internet nos fornece uma ferramente de divulgação, enquanto os outros espaços são os espaços em que efetivamente buscamos construir nossa luta.

5. Como vocês organizam suas manifestações? Ela foi planejada ou foi espontânea? Por que vocês optaram por este caminho (planejamento ou espontâneo)? Como a internet esteve presente antes, durante e depois desta manifestação?

Aline: Primeiro, é importante frisar que as manifestações em Goiânia foram realizadas pela Frente de Lutas pelo Transporte, antes denominada de Frente de Lutas contra o aumento, o Tarifa Zero Goiânia foi um dos grupos que compôs a Frente. Logo, não eram só nossas essas manifestações. Mas, respondendo a pergunta, todas as manifestações foram planejadas fora da internet, principalmente porque entendemos que uma manifestação tem que ser bem construída e que temos que saber porque estamos manifestando, neste sentido, tudo era planejado e debatido. Definíamos o trajeto da manifestação somente após termos definido o objetivo, que era debatido por todos. Por exemplo, na primeira manifestação deste ano, em que paramos o centro por 4 horas, havíamos definido que entregaríamos uma carta para um

137

representante da CMTC com as nossas pautas de reinvindicações, que foram debatidas. Todos os atos que fizemos tínhamos claro o que queríamos. Além do mais, nosso meio de divulgação era principalmente panfletagens, em escolas, terminais e pontos de ônibus. Somente após definir como seria o caráter da manifestação é que criávamos um evento no facebook. A internet ajuda, neste sentido, para divulgar o evento, mas o processo de construção se dá principalmente fora dela. Até porque, a internet, apesar de um meio eficaz de divulgação, é também hoje um meio de repressão que muito nos preocupa.

6. Alguns teóricos da comunicação chamam os manifestantes que lutam por uma causa somente pela internet, de ativistas de sofá. Como vocês entendem este aumento de membros talvez não tão ativistas?

Aline: Nós nunca chegamos a debater este assunto. Os militantes que conhecemos e que fazem parte do TZ o são porque participam de reuniões, pegam tarefas, e constroem um debate conjunto. Mas claro, nos atos apareciam pessoas que ficavam sabendo da manifestação pelo evento criado no Facebook, e iam e contribuíam de maneira positiva.

7. Ainda sobre os membros das atuais manifestações, há pessoas que não utilizam o transporte público, ou não participam ativamente de alguns grupos, mas estão presentes nas manifestações públicas. Vocês acreditam que a internet contribuiu para a manifestação destes militantes solidários?

Aline: Provavelmente sim, nós tínhamos em nossa manifestação grande quantidade de pessoas não ligadas a grupos, que usavam ou não o transporte público. A internet provavelmente contribuiu para divulgar e chamar estas pessoas, no entanto, também há outros fatores, as panfletagens, os debates públicos e o diálogo com a população provavelmente são práticas que chamam, talvez mais, estes militantes solidários.

8. Quais tipos de mensagens publicadas na internet, e quais conteúdos veiculados vocês acreditam causar maior impacto na sociedade?

Aline: Acho que o que causa mais impacto atualmente, em relação especificamente ao tema de movimentos sociais e que é circulado na internet, são os conteúdos que mostram as práticas repressivas da polícia.

138

9. Como você acredita que seria o Tarifa Zero Goiânia, caso não existisse a internet?

Aline: Seria diferente, claro, mas a internet não é essencial para nós. Ela é um meio importante de divulgação, mas não é um meio importante de debate, se comparado a outros espaços. Se não tivéssemos, penso que poderíamos utilizar outros meios para acessar as pessoas. Como nossas atividades são em outros espaços, na rua, nas escolas, nas praças públicas, nos terminais, etc, penso que poderíamos criar novos meios de divulgar também os textos e as informações, com efeito semelhante.

10. Como vocês estabelecem um diálogo entre os membros efetivos do Tarifa Zero Goiânia com as demais pessoas da sociedade?

Aline: Procuramos sempre debater com as demais pessoas da sociedade. Em escolas, aulas públicas, debates, etc. Faremos um sarau sem catracas no dia 26 de Outubro, em uma praça pública, também com o intuito de dialogarmos

com a população. Quando vamos a escolas, por exemplo,

iniciamos um debate que não parta somente das discussões acumuladas dos membros efetivos, mas principalmente do que as pessoas pensam do transporte coletivo, a partir daí tentamos dar nossa contribuição instigando-os a pensar de maneira mais aprofundada sobre os problemas que envolvem o tema, sobre as possíveis mudanças e sobre a proposta de Tarifa Zero.

11. Como vocês avaliam as manifestações da sociedade brasileira, em junho, durante o período da Copa das Confederações?

Aline: Foi um momento bastante peculiar na história do país, e bastante positivo. A luta pelo transporte foi uma luta que unificou demandas do país inteiro, e partiu de

movimentos que estavam se organizando, cada qual

a seu modo, mas não só pela internet. Isto é bastante interessante. De repente, a luta contra o aumento da tarifa, que já vinha acontecendo em Porto Alegre, Goiânia, Aracaju e Natal, tomou proporções que não imaginávamos quando chegou a SP.

Em relação aos movimentos pelo transporte, surgiram em várias outras cidades discussões sobre Tarifa Zero, mobilidade urbana, direito a cidade, etc. Isso, por si só, já representa um grande avanço no debate e na luta. Porém, é preciso lembrar que não precisamos só de um número significativo

139

de pessoas nas ruas, mas também um número significativo de pessoas debatendo, participando ativamente das discussões que envolvem o transporte e as outras questões passíveis de serem discutidas e questionadas pela população.