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Com o des envol vi mento da a rqui tetura moderna em escala internacional, essas idéias

foram retomadas, acrescentando-se outros ingredientes justificadores da estreita colaboração entre pintores e arquitetos, ao se erigir um mural. Dentre os marcos significativos e reforçadores das proposições corbusianas, acrescenta-se o encontro, em 1943, entre Fernand Léger, o arquiteto e também muralista Jose Sert, e o historiador Sigfried Giedion. Reúnem-se em Nova York, para elaborar um texto, sob o título “Uma nova monumentalidade”. Pela impossibilidade em publicar na íntegra os artigos, Giedion cede, em 1944, sua parte numa coletânea organizada por Paul Zukker – New Architecture and City Planning - que teve ampla ressonância. (LOURENCO, 1995, p. 264)

Assim, o debate internacional acerca da síntese das artes seria fomentado pela confluência entre arquitetos e artistas. Percebemos, contudo, que essa colaboração tão almejada em defesa ao espírito de

equipe, no qual artistas e arquitetos promoveriam juntos e em caráter de igualdade a construção da “obra”, não se efetivou como idealizado. As discrepâncias enquanto linguagens comprovam a tese. Acreditava-se que em arquiteturas modernas se configurariam obras de arte igualmente modernas, demonstrando uma perfeita integração.

Ainda assim, como Morais (1988) percebeu, em várias expressões murais, veem-se artistas como Portinari, Burle Marx, Anísio Medeiros, Djanira e, posteriormente, Athos Bulcão, trabalhando, mesmo que cumprindo uma função decorativa ou convidativa, dentro de uma vertente moderna, seja de caráter expressionista como Portinari, seja construtivista como Athos. O autor entende como um biomorfismo,

identificável não apenas na obra de Portinari como também na arquitetura de Niemeyer, nos jardins, nos painéis e na pintura de Burle Marx, nos painéis de Paulo Werneck ou Lygia Clark, definiria quase um estilo- o modernismo (...) (MORAIS, 1988, p. 56)

O que o autor quer dizer se refere a um tema formal que

fundindo sonho e construção, o irracional e o racional, o surrealismo tardio e a abstração situada entre a geometria e o informal, perpassa com maior ou menor freqüência a pintura de artistas como Léger, Klee, Arp, Max Ernst, Picasso, Matisse, Braque (...) (MORAIS, 1988, p. 57)

Ou seja, um estilo que, mesmo rompendo com o pragmatismo do ângulo reto, não se perdeu, ainda nas palavras de Frederico Morais, na gratuidade do informalismo, debatendo com o repertório imagético modernista internacional.

Figura 77 | Painel Athos Bulcão Data: 1955; Local: Rio de Janeiro.

No entanto, não podemos ignorar outra vertente criativa na década de 1950, orientada pela tradição, que retomando o azulejo e/ou a pastilha de vidro para compor obras de caráter densamente figurativo

admiradas pelo seu caráter ornamental, imprimiu ao trabalho do artista- artesão um virtuosismo até então desconhecido pela sociedade industrial, como atentou Lehmkuhl (2011). Pelo elemento construtivo, pastilhas ou azulejos, como revestimentos, funcionaram como expressão de personalidades e individualidades dos artistas. Como visto, São Paulo na década em questão representou, conforme Lourenço (1995), o ápice da muralística, com obras também implantadas em cidades interioranas. Uberlândia nessa perspectiva se insere no contexto analisado, pela atuação de Geraldo Queiroz e João Jorge Coury, comportando não apenas a biografia ou trajetória do artista e do arquiteto, mas também parte da história da arte.

Lehmkuhl (2009) recorre ao historiador Roger Chartier para o qual a história cultural não é mais definida pela unidade de sua abordagem, mas pela recusa dos historiadores em reduzir os fenômenos a uma só das dimensões, seja a social, a econômica, a política ou a cultural. Ainda conforme a autora, Chatier faz uso de categorias definidas por Pierre Bourdieu, apoiando-se na noção de campo artístico, no conhecimento e no domínio de seu passado e seu desenvolvimento para a história do campo.

(...) as representações no mundo social são determinadas pelos grupos que a forjam – e são

denominadas como “lutas de representação”. Para ambos autores a história do campo constitui critério fundamental, tanto para a definição estilística quanto para imposição da distinção cultural e social. Assim, o domínio prático e teórico da história do campo, tanto para produtores quanto para consumidores, constitui elemento decisivo nas lutas de distinção/representação. (LEHMKUHL, 2009, p. 8)

Assim, o objeto aqui analisado é retomado em sua feitura sendo a sua leitura, como já justificado, amparada além de sua materialidade, de sua técnica, sua linguagem, de modo a compreendê-la como fato artístico. O interesse estético de Geraldo Queiroz, visto em sua obra de cavalete, demonstrou-se pouco sensível às posturas vanguardistas, ao contrário, interessava-lhe o sentido de construção dos valores plásticos da tradição, como em outros artistas do período. Sergio Milliet (1941), em crítica publicada no VI Salão dos Artistas Plásticos118 – V, defende o artista Paulo Rossi Osir do rótulo de acadêmico:

A tendência para reagir contra o academismo tem levado pintores e os críticos a um excesso de severidade no julgamento das obras mais acabadas e uma confusão entre clássico e acadêmico eu seria desejável que fosse desfeita. É preciso não esquecer que o academismo não é desprezível porque se apega ao assunto nem porque permanece mais ou menos

118

O VI Salão do Sindicato dos Artistas Plásticos ocorreu na Galeria Prestes Maia em São Paulo no ano de 1941.

dentro do campo atual da fotografia, mas sim porque abusa de um formulário ao alcance dos menos talentosos porque estabelece um padrão assassino da personalidade marcante (...).” (MILLIET, 1941, apud RIBEIRO, 2006, p. 61)

Milliet reconheceu em Osir princípios artísticos discutíveis, porém honestos, nem acadêmico, nem moderno, na visão do crítico um pintor que se recusou às facilidades de um falso modernismo, considerando-o moderno não pela liberdade do fazer, mas pela ousadia da composição. No seu excessivo apego ao real, motivo de discordância por parte da crítica, Ribeiro (2006) apontou para o fato de a concepção estética do artista encontrar “ressonâncias na arte produzida por uma geração de artistas que provinham de experiências de formação artesanal e profissional, ligadas à tradição artística de raízes realistas” (RIBEIRO, 2006, p. 62), assim como Geraldo Queiroz.

Os painéis em mosaico do artista Geraldo Queiroz que compõem fachadas, alpendres, varandas de casas de classe média alta, dentre outros, detêm um colorido e de uma iconografia que indicam, como advertiu Morais (1990), determinado repertório, que apesar de ter uma funcionalidade imagética, indicam também uma percepção estética e principalmente um determinado status econômico e social, diferindo do

“ideal” moderno debatido internacionalmente como se percebe nas obras dos artistas citados anteriormente, envolvendo-se numa outra dimensão. Em levantamento documental, estimamos que Geraldo Queiroz realizou cerca de 15 painéis entre os anos de 1955/58119, período que atuou como mosaicista principalmente em Uberlândia, Tupacigura e Campina Verde. Dentre alguns painéis elencados120 nesta pesquisa podemos destacar: