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Ergodicidade ´ unica

No documento Revis˜ ao de Teoria da Medida (páginas 84-89)

Dizemos que uma transforma¸c˜ao cont´ınua T : X → X de um espa¸co m´etrico compacto X ´eunicamente erg´odica seMT(X) consistir de um ´unico elemento.

Essa ´unica medida de probabilidade invariante ´e erg´odica, pois ´e ponto extremal de MT(X).

A ergodicidade ´unica est´a relacionada com o conceito topol´ogico de minimalidade, que passamos a descrever. Apenas restringiremos um pouco nossa hip´otese, pedindo que T seja um homeomorfismo.

Um homeomorfismoT :X →X´eminimalse para todox∈X a ´orbita{Tnx;n∈Z} dex, denotada por O(x), ´e densa em X.

Umconjunto minimaldeT ´e um conjunto fechado E comT E =E eT|E minimal.

Do Lema de Zorn segue que todo homeomorfismo tem um conjunto minimal.

O pr´oximo Teorema d´a maneiras alternativas de se formular a minimalidade.

Teorema 4.16. Se T :X → X ´e um homeomorfismo de um espa¸co m´etrico compacto, ent˜ao s˜ao equivalentes:

1. T ´e minimal.

2. E ⊂X fechado, T E =E implica E =∅ ou E =X.

3. Se U ´e aberto n˜ao-vazio ent˜ao S

n=−∞TnU =X.

Demonstra¸c˜ao.

(1) implica (2): Suponha que T ´e minimal e que E ´e um conjunto fechado, n˜ao-vazio satisfazendo T E=E. Sex∈E ent˜aoO(x)⊂E, ao mesmo tempo em que O(x) ´e densa em X. Logo E ´e denso em X, mas por ser fechado, E =X.

(2) implica (3): Seja U aberto de X n˜ao-vazio. Ent˜ao S

n=−∞TnU ´e aberto e E = X \S

n=−∞TnU ´e fechado, estritamente contido em X e T E = E, logo pela hip´otese E =∅.

(3) implica (1): Seja x∈X. Mostraremos que para todo y∈X e >0 existe n ∈Z tal que Tnx∈B(y). Pela hip´otese,

[

n=−∞

TnB(y) =X

ent˜ao em particular existe n tal que x∈T−nB(y), isto ´e, Tnx∈B(y).

Obs. Evidentemente seX ´e infinito e minimal ent˜ao n˜ao pode conter pontos peri´odicos.

Obs. Se T : X → X ´e um homeomorfismo com pelo menos uma ´orbita densa (em particular se ´e minimal) ef ∈C0(X) ent˜aof ◦T =f implica que f ´e constante.

Teorema 4.17. Seja T homeomorfismo de um espa¸co m´etrico compacto X. Suponha que T seja unicamente erg´odico e µ seja sua ´unica probabilidade invariante. Ent˜ao T ´e minimal se e somente se µ(U)>0 para todo aberto n˜ao-vazio U.

Demonstra¸c˜ao. Se T ´e minimal ent˜ao para todo aberto n˜ao-vazio U vale S

n=−∞TnU = X, logo U n˜ao pode ter medida nula.

Por outro lado, suponha que µ(U)> 0 para qualquer aberto n˜ao-vazio U. Se T n˜ao fosse minimal, existiria U tal que

E =X\

[

n=−∞

TnU

´

e n˜ao-vazio, fechado e T E = E. Ter´ıamos ent˜ao T|E como transforma¸c˜ao cont´ınua de um espa¸co compacto, de onde garantimos a existˆencia de uma medida ˜µ de (E,B(E)) invariante por T|E. Podemos ent˜ao definir ˆµ de (X,B(X)) por ˆµ(B) = ˜µ(B∩E), ∀B ∈ B(X). Mas ˆµtem a propriedade de ser invariante por T e ˆµ(X\E) = 0, logo ˆµ(U) = 0.

Ent˜ao ˆµn˜ao pode ser a medidaµ, de onde chegar´ıamos `a contradi¸c˜ao com a ergodicidade

´

unica deT, por termos achado uma segunda medida de probabilidade de Borel invariante.

Um homeomorfismo do c´ırculo que tenha um ponto fixo e tal que toda ´orbita convirja a esse ponto fixo, no passado e no futuro, n˜ao ´e minimal, e no entanto sua ´unica medida

´

e a medida de Dirac com suporte no ponto fixo.

Proposi¸c˜ao 4.18. Uma rota¸c˜ao irracional do c´ırculo ´e minimal e unicamente erg´odica.

Demonstra¸c˜ao. Que toda ´orbita ´e densa sob uma rota¸c˜ao irracional ´e um exerc´ıcio, logo a primeira conclus˜ao ´e imediata. Sejaµmedida invariante pela rota¸c˜aoRα. Iremos provar que µ´e invariante por qualquer rota¸c˜ao Rβ, o que implicar´a que µ´e a ´unica medida de Haar, que no caso do c´ırculo ´e a medida de Lebesgue.

Para isso bastar´a mostrar que R

f dµ=R

f◦Rβdµ, para toda f ∈C0(S1).

Seja >0 arbitr´ario. Comof ´e cont´ınua e S1 ´e compacto, ent˜ao existeδ >0 tal que d(x, y)< δ implica|f(x)−f(y)|< . Tome {nj} tal que αnj →β quando j → ∞ e seja j0 tal que j ≥j0 impliqued(αnj, β)< δ.

Para esses nj’s, d(Rnαj(x), Rβ(x)) =d(αnj, β)< δ. Ent˜ao

Z

f◦Rnαjdµ− Z

f◦Rβ

< . Como R

f◦Rnαdµ=R

f dµ, segue Z

f dµ− Z

f ◦Rβ

< . Sendo arbitr´ario, vale a igualdade.

A Proposi¸c˜ao acima pode ser demonstrada para grupos m´etricos compactos: uma transla¸c˜ao densa ´e unicamente erg´odica.

Sobre homeomorfismos do c´ırculo sem pontos peri´odicos temos o seguinte Teorema.

Teorema 4.19. Se T ´e um homeomorfismo do c´ırculo sem pontos peri´odicos ent˜ao ´e unicamente erg´odico. Al´em disso, existe uma transforma¸c˜ao φ : S1 → S1 cont´ınua, so-brejetora e localmente mon´otona e uma rota¸c˜ao irracional Rα tais queφT =Rαφ (isto ´e, T ´e semi-conjugado a uma rota¸c˜ao irracional). SeT ´e minimal ent˜aoφ´e homeomorfismo (neste caso, T ´e conjugado a uma rota¸c˜ao irracional).

Demonstra¸c˜ao. O primeiro fato a observar ´e que se T n˜ao tem pontos peri´odicos ent˜ao n˜ao pode existir µ ∈ MT(X) e z ∈ S1 tais que µ({z}) > 0 (diz-se que µ “n˜ao tem

´

atomos”).

Dada µ∈ MT(X) (certamente existe pelo menos uma), definiremos φ=φµ por φ(z) = exp{2πiµ([1, z])

(a medida dos intervalos ´e contada no sentido anti-hor´ario). A fun¸c˜ao φ ´e (localmente) mon´otona, ´e cont´ınua porque µ n˜ao tem ´atomos e ´e sobrejetiva porque µ ´e medida de probabilidade. ´E evidente tamb´em que a pr´e-imagem de qualquer ponto por φ ou

´

e um ponto ou ´e um intervalo fechado (e se sempre for um ponto ent˜ao φ ser´a um homeomorfismo).

Antes de verificar a semi-conjuga¸c˜ao, vale observar que, se z1, z2, z3 s˜ao pontos quais-quer de S1, em qualquer ordem, ent˜ao

µ([z1, z2]) +µ([z2, z3]) =µ([z1, z3]) mod 1 , portanto

φT(z) = exp{2πi[µ([1, T(1)]) +µ([T(1), T z])]} .

Logo, por µser invariante, φT(z) =Rαφ(z), se α for definido por α=µ([1, T(1)]).

Queremos mostrar queαtem que ser irracional. ´E f´acil mostrar queRnαφ(z) =φTn(z).

Se α fosse racional, haveria n ≥ 1 tal que Rnαφ(z) = φ(z) para todo z ∈S1, isto ´e, para todoz valeria φ(Tnz) =φ(z). Da´ı sairia que

µ([1, Tnz]) =µ([1, z]), ∀z . Como µ([1, z]) +µ([z, Tnz]) =µ([1, Tnz]) mod 1, ent˜ao

µ([z, Tnz]) = 0 mod 1.

Lembremos que T n˜ao tem pontos peri´odicos, logo z 6= Tnz, para todo z. Mais ainda, a fun¸c˜ao z 7→ d(z, Tnz) ´e cont´ınua, portanto existe δ > 0 tal que d(z, Tnz) > δ. Isso implicaria que todo z ´e extremo de um intervalo de tamanho pelo menos δ com medida zero (o intervalo evolui de z no sentido anti-hor´ario). Isso obrigaria a que a medida de S1 fosse nula, o que seria uma contradi¸c˜ao.

Antes de mostrar a ergodicidade ´unica de T, observemos que se φ ´e semi-conjuga¸c˜ao entre T e Rα e µ ∈ MT(X) (sem que necessariamente φ tenha sido constru´ıda a partir deµ como acima) ent˜aoµ◦φ−1 ´e medida invariante por Rα, logo µ◦φ−1 ´e a medida de Lebesgue, que chamaremos de λ, porque a rota¸c˜ao irracional ´e unicamente erg´odica.

Para mostrar queT ´e unicamente erg´odica, considereµ1, µ2 ∈ MT(X),µ= 1212) eφ =φµ. Pela observa¸c˜ao acima, as medidasµ1◦φ−12◦φ−1 eµ◦φ−1 s˜ao todas iguais

`

a medida de Lebesgue, logo

µ1−1φ([a, b])) =µ2−1φ([a, b])) =µ(φ−1φ([a, b])) para todo intervalo [a, b]. Pela constru¸c˜ao de φ, temos tamb´em

µ(φ−1φ([a, b])4[a, b]) = 0 ,

logo µi−1φ([a, b])4[a, b]) = 0,i= 1,2, pois µ´e a m´edia de µ1 e µ2. Ent˜ao µ1([a, b]) =µ2([a, b]) =µ([a, b]),

implicando queµ12 =µe da´ı que T ´e unicamente erg´odica.

Se T for minimal ent˜ao do Teorema 4.17 segue que µ([a, b]) > 0 se a 6= b. Portanto n˜ao pode haver pontos cuja pr´e-imagem por φ seja um intervalo.

Finalmente, o Teorema abaixo descreve o que acontece com as m´edias de Birkhoff no caso unicamente erg´odico.

Teorema 4.20. Seja X espa¸co m´etrico compacto eT :X →X transforma¸c˜ao cont´ınua.

Ent˜ao s˜ao equivalentes:

1. T ´e unicamente erg´odica.

2. Existe µ∈ MT(X) tal que para toda f ∈C0(X) e qualquer x∈X

n→∞lim 1 n

n−1

X

i=0

f(Tix) = Z

f dµ .

3. Para toda f ∈C0(X), n1 Pn−1

i=0 f(Tix) converge pontualmente a uma constante.

4. Para toda f ∈C0(X), n1 Pn−1

i=0 f(Tix) converge uniformemente a uma constante.

Demonstra¸c˜ao. Que (4) implica (3) ´e trivial. Para mostrar que (3) implica (2), basta ver que ξ:C0(X)→Rdado por

ξ(f) = lim

n→∞

1 n

n−1

X

i=0

f(Tix)

(para qualquer x) ´e um funcional linear positivo. Pelo Teorema da Representa¸c˜ao de Riesz, existe ´unica probabilidade µ tal que R

f dµ = ξ(f), ∀f ∈ C0(X). A medida µ ´e invariante pois ξ(f ◦ T) = ξ(f). Para mostrar que (2) implica (1), supomos a existˆencia de ν ∈ MT(X). A m´edia de Birkhoff converge ν-q.t.p. a uma fun¸c˜ao ˆf tal que R

f dν =R f dνˆ . Mas do fato que as m´edias convergem pontualmente para a fun¸c˜ao constante igual aR

f dµsegue queR f dνˆ =R

f dµ. Comoνeµintegram fun¸c˜oes cont´ınuas da mesma forma ent˜ao s˜ao idˆenticas (Teorema 1.23).

Para mostrar que (1) implica (4), observamos primeiro que a constante para a qual a m´edia de Birkhoff converge tem que serR

f dµ, ondeµ´e a ´unica probabilidade invariante

de T. Suponhamos que (4) n˜ao valha. Ent˜ao existem g ∈ C0(X) e > 0 tais que para todon0 ≥1 existe n≥n0 exn tais que

1 n

n−1

X

i=0

g(Tixn)− Z

gdµ

≥ .

Ou seja, existe subseq¨uˆencia {nj}j e para cadaj um ponto xnj tais que

1 nj

nj−1

X

i=0

g(Tixnj)− Z

gdµ

≥ . Tome as medidas µnj dadas por

µnj = 1 nj

nj

X

i=0

δTixnj .

Para elas, temos

Z

gdµnj − Z

gdµ

≥ .

Por causa da compacidade de M(X), existe subseq¨uˆencia de {nj}j (suporemos que ´e a mesma, para facilitar a nota¸c˜ao) tal que µnj →µ, e por causa da desigualdade acima, µ 6= µ. A contradi¸c˜ao vem do fato de que µ ´e uma medida invariante (veja a prova de que MT(X) ´e n˜ao-vazio).

No documento Revis˜ ao de Teoria da Medida (páginas 84-89)

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