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1. Introdução

2.4 Ergonomia, emoção, CR e Design

A Ergonomia é indispensável ao desenvolvimento de TAs capazes de melhorar a interação do homem com o mundo a sua volta, mesmo frente as barreiras físicas ou sociais. Costa e Moreira da Silva (2010) afirmam que “questões ergonômicas como psicossociologia, psicofisiologia, antropometria e biomecânica, devem ser levadas em consideração quando se desenvolve um projeto de CR”. Conforme estes autores estas questões devem ser abordadas de forma sustentável e integrada, tendo sempre a clara intenção de proporcionar uma qualidade de vida à PcD. E isso pode ser realizado pela intervenção nos sistemas mecânicos que compõem a CR ou buscando um outro olhar para a pessoa que usa uma CR.

Todas as questões citadas acima e que se relacionam a Ergonomia levam a reflexão de que é preciso conhecer as sensações, impressões e emoções da PcD em relação a TA para então modifica-la, afinal

Embora os usuários com deficiência possam ter capacidades sensoriais ou motoras diminuídas, capacidade cognitiva limitada ou dificuldades emocionais, suas necessidades são, em geral, semelhantes às da população apta. Assim, para além das necessidades relacionadas com as suas próprias deficiências, os utilizadores com deficiência têm necessidades em termos de aspirações, singularidade, valores e status que devem refletir-se nos produtos que utilizam. As insatisfações na utilização do produto ocorrerão se os produtos não satisfizerem plenamente as suas necessidades. Isto aplica-se a ambos os tipos de produtos: os produtos para uso geral de toda a população e aqueles destinados a satisfazer as necessidades das PcDs em particular (SOARES, 1998).

Em uma pesquisa sobre as necessidades da PcD usuária com CR Soares (1998) argumentou que a ergonomia não tem sido efetivamente utilizada nos métodos de projeto e que não conhecem técnicas modernas que incorporem o estabelecimento e satisfação das necessidades dos usuários no processo de Design.

Certamente o afastamento de critérios centrados no usuário do projeto de CR é um dos fatores que levam ao desapontamento da PcD em relação a este objeto. Luborsky (1993) assegurar que muitos usuários e seus familiares expressam descontentamento em relação aos dispositivos e ao significado cultural atribuído a usuários de TA.

Sendo importante destacar que o descontentamento dos usuários se dá com relação a CR e não em relação a deficiência em si. E tal significado cultural que é parte do processo de estigma gera na PcD que utiliza CR emoções que podem ser negativas, afinal, tem se observado uma forte relação entre as respostas culturais e as emocionais na escolha de um objeto (COSTA e MOREIRA DA SILVA, 2012).

Mokdad et al. (2017), baseado no modelo desenvolvido por Desmet et al. (2002), demonstram que as respostas emocionais dos usuários de CR são o resultado das interações de três componentes: avaliação, preocupação e produto. Os autores explicam que os indivíduos avaliam primeiro a utilidade da CR e posteriormente lhe atribuem um valor dependendo se eles satisfazem suas necessidades emocionais ou não. E dessa forma, esses produtos seriam classificados como emocionalmente positivos ou negativos.

Urgen (2006) evidencia o papel das emoções como elemento importante para o sucesso de qualquer produto, e destaca que modificar as respostas emocionais de um produto como a CR deve envolver um esforço coletivo com o qual todos os cidadãos devem estar envolvidos e reforça que “até que todos aqueles que estão interessados nos deficientes façam o esforço necessário, essa luta nunca será um sucesso”.

Desmet e Dijkhuis (2003) promoveram estudo que tinha como objetivo o levantamento de requisitos e posteriormente o desenvolvimento de uma CR para crianças e pontuaram a importância de um design que leve em conta aspectos emocionais relativos ao produto, objetivando modificar o impacto emocional desagradável destes objetos. Para os autores, o impacto emocional normalmente não é considerado no design de produtos como CR.

Neste estudo Desmet e Dijkhuis (2003) discutiram os elementos formais de diferentes modelos de CRs e a relação destes com as emoções suscitadas. Encontraram-se diferenças entre diferentes grupos de usuários (crianças versus pais), discorreram sobre a diferença entre entender como os produtos evocam emoções, e sobre a real possibilidade de manipulação do impacto emocional de um projeto.

Embora existam formas de avaliar e abordar emoção no desenvolvimento de produtos, quando se observa o mercado ainda se nota o caráter obsoleto da maioria dos produtos disponíveis para PcD. Isso ocorre devida a falta de atenção às necessidades não só funcionais, mas, principalmente, psicológicas do usuário. Ao que Bonsiepe e Yamada (1982) afirmam que “uma prótese ou uma CR não deveriam ter o aspecto estigmatizante” e isso certamente contribuiria na aceitação e possivelmente no processo de reabilitação e inclusão da PcD.

Conforme Basso (2012) o estigma ocorre, pois, o design voltado para PcD e idosos

[...] tende a focar em necessidades especiais ao invés de pensar na melhoria de condições de vida, e assim, permaneceu preso em mercados estreitos, onde o volume de negócios e rentabilidade é demasiado baixo para justificar o investimento adequado no design, dando origem a uma infinidade de adaptações e equipamentos estigmatizantes e de má qualidade.

Mallin et al. (2015) aponta para o lado oposto e mostra que o Design e a Emoção relacionados ao projeto de TA colocam o usuário no centro do processo, e consequentemente, tem-se a criação de inovações que presem a funcionalidade, além dos desejos e necessidades da PcD. Estes autores afirmam que “ fazer uso de um produto, não é uma questão de manipulação, mas a necessidade de criar experiências que afetem positivamente o usuário”. Trata-se do que Mallin et al. (2015) chamaram de ‘sujeito emocional’ e que

[...] é uma das várias dimensões da Experiência de produto refere-se a [...] todo o conteúdo afetivo que é suscitado para a interação entre usuário e produto, Incluindo o grau em que os sentidos são recompensados (experiência estética), o significado atribuído ao produto (significado experiência) e os sentimentos e emoções despertados (experiência emocional).

Mallin et al (2015) também discutem a importância do prazer no contexto das emoções relacionadas a produtos e que deve ser considerado para permitir transformar as TAs em “objetos desejados que afetam a qualidade de vida daqueles que os usam positivamente”. E acrescentam que, além de colocar o usuário no centro do processo de desenvolvimento de uma TA, “é necessário assumir o risco de fazer ajustes e trazer inovação para estes projetos”.

Neste sentido, destaca-se a constatação de Vaes (2014), que nota que quando um usuário recebe uma CR esteticamente diferente (cores fortes, estampas, entre outros) tende a relacioná-la com um evento positivo. Isto pode gerar outros significados que podem ser transmitidos à sociedade. São mudanças que embora pareçam simples estão relacionadas aos elementos que compreendem a linguagem dos objetos, ou seja, refere-se ao que a CR comunica sobre ela, sobre quem a utiliza e que se diferencia das demais CR e demais elementos presentes em seu entorno (figura 20).

Figura 20 – Modelo semântico da CR

Assim, refletir a CR e aquilo que ela comunica – Modelo Semântico – coloca o objeto como portador do estigma e capaz de suscitar emoções positivas ou negativas, e em consequência, auxiliar ou prejudicar a interface PcD-CR. E ao ver essa interface como ponto inicial, destaca-se o papel do design tem um papel importante, pois busca conhecer as necessidades da PcD e, utilizando teorias e métodos, pode promover inovações capazes de modificar a forma como esta e outras TAs são socialmente vistas.

Tal reflexão vai de encontro com modelo de avaliação de TA proposto por Hersh (2008), baseado no que chamou de ‘unidade de análise’, composta pela pessoa, o contexto, as atividades e a TA. Este modelo tem o objetivo de organizar as informações sobre o usuário para fornecer ao projetista informações estruturadas para a realização do projeto de TA.

Costa e Moreira da Silva (2010) chamam atenção que em comparação com objetos com função próxima, mas que não estão no escopo da TA, como o carrinho de bebê, a CR ainda tem muito a evoluir. Afinal, como os autores destacam, esta TA pode ser considerada uma “extensão do próprio corpo da PcD”, e devem por isso promover a inclusão.

Tendo em vista o número de estudos que reforçam o estigma associado a CR e que tem consequências como a dificuldade de aceitação e o abandono desses produtos, fatores fortemente relacionados a emoção, se faz necessário a união design e indústria. Afinal, em objetos dessa natureza é preciso buscar meios de garantir o bem-estar dos usuários, pois o uso não é opcional.

Conclui-se, então, que o design tem muito a oferecer para transformação prática, estética e simbólica de TAs como a CR, e que conhecer os fatores da interface PcD-CR que de fato estão relacionados a emoção pode ser um passo importante neste contexto.

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