• Nenhum resultado encontrado

Escola Americana para a Comunidade Alemã

No documento Francisco Luiz Gomes de Carvalho (páginas 92-99)

A sede da Igreja Adventista do Sétimo Dia encontrava-se em Battle Creeck, nos Estados Unidos, mas a Denominação já possuía um programa vigoroso de missões em boa parte do mundo, especialmente na Europa. Os anos finais do Século XIX demonstravam a presença dos adventistas estabelecida na Alemanha, onde a partir da chegada de Louis Richard Conradi (1856-1939), principal coluna do adventismo alemão, a obra da colportagem tornou-se eficiente para os esforços evangelísticos dirigidos em torno das cidades (SCHWARZ; GREENLEAF, 2009, p. 212-213).

À medida que a missão mundial adventista começou a expandir-se intensamente na última década do século XIX, a Alemanha demonstrou-se o país mais receptivo à pregação adventista. Tal êxito esteve vinculado duplamente ao esforço incansável de L. R. Conradi, bem como ao espírito reavivado ―[...] pelas rápidas transformações sociais por que passava a Alemanha, graças ao intenso desenvolvimento industrial‖ (CÔRREA, 2005, p. 88). Por sua vez, Schünemann (2009, p. 154) afirma que:

Embora, Conradi não tenha sido responsável pela inserção da IASD na Alemanha, sua atuação foi fundamental para a rápida expansão da IASD na Alemanha. Sua atuação não se restringiu a Alemanha, mas dirigiu-se para vastas regiões da Europa do Leste, no qual ele procura notadamente diversas comunidades alemãs, várias delas de grupos remanescentes de anabatistas, para o estabelecimento das novas congregações.

Um trio de colportores (E. W. Snyder, C. A. Nowlen e A. B. Stauffer) adventistas começou o trabalho de estabelecer um programa de distribuição de literatura na América do Sul no dia 10 de dezembro de 1891. E como não havia literatura em espanhol e português, optaram pelas colônias, dentre elas a alemã, pois que Stauffer falava o alemão. Este chegou a terras brasileiras em maio de 1893.

A despeito da presença de adventistas no Brasil em 1880, foi somente em maio de 1893 que veio ao país o primeiro colportor adventista, Albert B. Stauffer, que logo começou a colportar entre as colônias alemãs, despertando grande interesse pela mensagem adventista (TIMM, 2005a, p. 14).

Em 1895 chega ao Brasil, enviado pela denominação norte-americana um pastor missionário alemão chamado Huldreich Von Graf, que funda em 1º de julho de 1896, a primeira escola adventista no Brasil – Colégio Internacional de Curitiba – cuja direção foi entregue ao descendente alemão Guilherme Stein Jr., que

[...] embora representando uma denominação norte-americana, não fazia uso da língua inglesa para ministrar suas aulas, mas lançava mão da língua alemã para transmitir os valores de sua originária cultura norte-americana, num país de língua portuguesa que abrigava diversas colônias de estrangeiros, especialmente, no caso de Curitiba, a colônia alemã (CORRÊA, 2005, p. 61, 62).

Ao escolher Guilherme Stein Jr. para liderar as atividades do primeiro empreendimento educacional adventista, Graf demonstrava que havia optado por alguém que além de ser procedente de uma família tradicionalmente cristã luterana (ACOSTA; PEREIRA, 2005) havia recebido importante influência educacional protestante, em seu caso da Escola Alemã de Campinas34. Por isso que, Viera (1995, p. 117) indica que:

A influência da Escola Alemã de Campinas na formação da personalidade de Guilherme Stein J. jamais poderá ser esquecida. Como escola evangélica, guiada pelos mesmos princípios que suas congêneres de São Paulo e Piracicaba, não só lhe proporcionou sólidos conhecimentos fundamentais, como lhe moldou o caráter na fase entre a infância e a adolescência, de conformidade com os ideais evangélicos.

Em visita ao Brasil na época dos primórdios das atividades educacionais adventistas, Thurston (1896, p. 622) relatou que a escola oferecia aulas no sábado, sendo estas dedicadas exclusivamente ao ensino da religião pela instrução bíblica, apesar de haver muitas crianças católicas.

As matriculas cresceram rapidamente, o número subiu de oito no dia da abertura da escola para cerca de cem alunos em fevereiro de 1897 (THURSTON, 1897a, p. 219), o que justificou as sucessivas mudanças de endereço para prédios maiores. No início de 1900, o Colégio estava endereçado em uma moderna construção que oferecia amplas acomodações e atendia uma clientela dividida em três classes contando com cerca de cento e trinta alunos,

34

Para informações mais detalhadas acerca desta instituição consultar: BENCOSTTA, Marcus L. A. Educação escolar norte-americana no Brasil do século XIX: trajetórias históricas de um colégio protestante em São Paulo (1869-1892). In: BENCOSTTA, Marcus L. A, et all. Memórias da educação; Campinas (1850-1960). Campinas: Unicamp, 1999; BENCOSTTA, Marcus L. A. Ide por todo mundo: a província de São Paulo como campo de missão presbiteriana (1869-1892). Campinas: Unicamp/CMU, 1996.

além de contar com corpo docente ampliado, na época composto por Paul Kramer e esposa e Waldemar Ehlers, recém-chegado de Hamburgo, Alemanha.

Fonte: The Advent review and sabbath herald, 13 March, 1900

Nessa época, a instituição recebeu destaque numa edição de um jornal local impresso em alemão, Der Beobachter, que tendo feito um relato positivo acerca da infraestrutura, da disciplina, do currículo, do desempenho escolar, enfatizou o sistema fonético usado pelos professores para ensinar a ler (KRAMER, 1900, p. 171, 172).

Identificando que vários elementos políticos e sócio-culturais contribuíram para a impulsão no número de matriculas no Colégio Internacional, bem como para o sucesso da instituição, Mesquida (2005, p. 48) destaca ―[...] o uso de métodos pedagógicos inovadores em relação àqueles empregados por outras instituições de ensino que funcionava em Curitiba‖.

Assim, no empreendimento educacional adventista em Curitiba havia uma demanda por professores que falassem alemão para que viessem para o Brasil afim de que a incipiente obra educacional pudesse avançar (STAUFFER, 1898, p. 14). A indicação da falta de professores em Minas Gerais, Espirito Santo e Rio Grande do Sul, bem como a opção pelas comunidades alemãs apontavam a direção seguida e a estratégia escolhida pelos primeiros líderes denominacionais na implantação do adventismo em terras brasileiras.

Guiherme Stein Jr. que havia conduzido a escola de Curitiba durante o primeiro ano de existência foi para Gaspar Alto, localizado no município de Brusque em Setembro de 1897 a fim de trabalhar como professor em uma escola aberta junto a igreja ali localizada.

Após um ano de intensas atividades no ―Collegio Internacional‖, Guilherme Stein Jr. foi chamado pelo então líder da IASD no Brasil, H. Graf, para ser o diretor daquela que se tornaria a primeira escola oficial adventista neste território. Sendo assim, em 15 de outubro de 1897, foi fundada a ―A Escola Missionária‖ [Colégio Superior] em Gaspar Alto perto de Brusque, SC, instituição subsidiada pela IASD (STENCEL, 2006, p. 86).

Com o chamado de Guilherme Stein Jr. para trabalhar como editor da revista O Arauto

da Verdade no Rio de Janeiro, John Lipke (1875-1943) assumiu a direção do Colégio Superior de Gaspar Alto a partir de 1899. Azevedo (2004a, p. 52) oferece-nos uma descrição geral da escola indicando que:

O terreno em Gaspar Alto tinha 2,5 hectares. Na parte da manhã funcionava na escola o nível primário e à tarde o nível secundário para a formação de missionários. O idioma utilizado era o alemão. A instituição, que estava sob a direção de John Lipke, dispunha de um dormitório com capacidade para 40 alunos internos, num edifício de 7m x 12m, com dois pisos, sótão e refeitório. Realizavam-se também ali as atividades agrícolas. Os alunos trabalhavam 26 horas por semana, pagavam US$ 2,50 por mês e recebiam em troca cama, comida e ensino. O edifício escolar estava dividido em dois ambientes: um para a igreja e outro para o ensino.

Em um artigo escrito à Review and Herald, Spies (1903) relata entusiasticamente o início da obra adventista na região, destacando o comprometimento da membresia local em prover os meios necessários para o estabelecimento da primeira escola de treinamento do Brasil. Segundo ele,

[...] obreiros educados no próprio campo teriam vantagens sobre aqueles que vinham de fora [...] alguns, talvez jamais se adaptariam totalmente as condições (clima, hábitos e costumes) a ponto de serem uma benção para o povo do Brasil (SPIES, 1903, p. 12).

A seguir são apresentadas duas fotos da escola de treinamento de Brusque, uma do prédio escolar (esq.) e outra do dormitório.

Em seu artigo, The Message in Brazil publicado na primeira edição de janeiro de 1903 da Review and Herald, Westphal (1903) caracteriza brevemente o Brasil, fazendo alguns apontamentos acerca do início da obra adventista com destaque para as comunidades alemãs. Além disso, indicava o fato que a membresia estava

[...] planejando uma pequena escola industrial em uma base autossustentável no estado do Rio Grande do Sul para a formação dos obreiros. Uma escola em Santa Catharina já tem realizado um bom trabalho. Os resultados são vistos principalmente no número de escolas de igreja estabelecida na conferência, a coisa mais necessária em um país onde alguns poucos têm quaisquer vantagens educacionais que seja (WESTPHAL, 1903, p. 11).

Antes do final de 1903, visto que o número de adventistas estava aumentado no Rio Grande do Sul e como eram constantes as reclamações referentes à localização descentralizada e o difícil acesso à escola em Brusque, a liderança denominacional transferiu a instituição para Taquari, cidade localizada nas proximidades de Porto Alegre.

Em 19 de Agosto de 1903 com um número razoável (cerca de 12) de estudantes foi aberto o colégio, tendo com propósito definido o treinamento de obreiros para levar o evangelho aos habitantes do Brasil. Em um artigo intitulado Our Industrial School in

Taquary, Brazil, Lipke (1907) além fazer uma relação das atividades manuais e agrárias realizadas pelos estudantes em quatro horas diárias, destaca a instrução recebida por meio do currículo ofertado. Diz ele que:

Esta instituição oferece dois anos de curso de Alemão e Português. A Bíblia toma o primeiro lugar nos estudos. Instrução também é dada no estudo da natureza, fisiologia, gramática, geografia, aritmética, escrita, canto, música, corte e costura, agricultura e trabalho manual (LIPKE, 1907, p. 29)

Segundo o Annual Statistical Report (1906) da Conferência Geral da IASD publicado nos Estados Unidos, até o ano acima referido o Brasil se apresentava em seu desenvolvimento referente ao número de igreja, membros, escolas e alunos matriculados os seguintes dados:

Uniões da IASD Igrejas Membros Escolas Alunos

União Sul 19 894 9 153 RS 6 444 1 15 SC 12 427 8 138 SP 1 23 0 0 União Norte 5 176 1 25 BRASIL 24 1.070 10 178

Assim, em apenas dez anos de inserção em terras brasileiras a obra adventista já contava com várias escolas paroquiais, como também uma instituição voltada para a formação de obreiros locais para que avanços fossem alcançados na causa adventista. De acordo com Azevedo (2004b, p. 33) ―os pioneiros tinham a visão de que a escola era, em essência, uma forma dinâmica e sólida de expandir a Igreja Adventista na América do Sul‖.

Ainda que no Brasil e América do Sul a situação educacional adventista ainda estivesse em seus primórdios, as instituições por aqui estabelecidas seguiam o paradigma denominacional norte-americano, a despeito de algumas adaptações. Nesta perspectiva de análise, Greenleaf (2010, p. 104) destaca que:

A medida que se desarrollaba en Norteamérica, la educación adventista como movimento llegó a ser un paradigma para los adventistas en el resto del mundo. Ninguna instituición educativa determinada llegó a ser el único modelo, pero como los norteamericanos constituían la mayoria de los obreiros denomincionales y llevaban sus ideas sobre educación, organización y metodologia doquiera iban, era inevitable que las fueran aplicando al estabelecer nuevas instituiciones educativas en el mundo. Por supuesto, com frecuencia se debieron realizar adaptaciones, pero siempre fue visible la influencia del modelo norteamericano.

Apesar dos esforços denominacionais em manter estas instituições na região sul, o que aconteceu foi que elas fecharam as portas. O Colégio Internacional em Curitiba e a escola de treinamento em Brusque não tiveram vida longa. Em 1904, após oito anos de existência foram encerradas as atividades do estabelecimento em Curitiba. A escola de treinamento de Brusque funcionou até 1903, sendo depois transferida para Taquari, mas também fechou as portas, em 1910.

A respeito do fechamento do Colégio Internacional de Curitiba em 1904 pode-se perguntar sobre os motivos que influenciaram o seu encerramento, haja vista ter suplantado de 1896 a 1904 (ano que cerrou temporariamente as portas) as demais instituições que atuavam junto à comunidade alemã. Segundo Gross (1996) mesmo possuindo excelentes professores, material didático de qualidade e estando em uma boa localização, tudo isso não foi suficiente para conter a evasão de alunos.

Questionando-se a respeito do fechamento abrupto de tal instituição, Mesquida (2005) indica que o problema não esteve no uso da língua alemã, mas sim na aculturação promovida pelos missionários adventistas, posto que pelo uso da língua

[...] não contribuíam para alicerçar os fundamentos da cultura alemã, mas difundiam os valores, as ideias e os princípios do "way of life" norte-americano, [...] a língua

alemã era utilizado como veículo de princípios e valores de outra cultura e não da cultura teuta, fato que não agradou aos emigrantes de língua alemã que matriculavam seus filhos e filhas na escola mantida pela Igreja Adventista de origem missionária norte-americana (MESQUIDA, 2005, p. 51).

Em seu artigo Reorganization in Brazil, Spicer (1906) que havia participado de reuniões com lideres eclesiásticos em Taquari em 1906, indicou aquela que devia ser a tônica do trabalho denominacional nos anos seguintes, ao afirmar que ―[...] o assunto chave da reunião foi a comunicação da verdade às pessoas de fala portuguesa [...] trabalhar nos estados mais populosos, em que pouco tem sido feito até agora‖ (SPICER, 1906, p.5).

Na foto abaixo há a identificação da escola de Taquari, como também há referência à oficina tipográfica que funcionava em suas dependências, por ocasião da reunião de reorganização denominacional do território em 1906.

Fonte: The Advent review and sabbath herald, 21 June, 1906

Os primeiros indícios de um movimento em direção a execução do planejado na reunião de reorganização de 1906 se evidenciaram a partir do ano seguinte, quando a gráfica adventista (Sociedade de Tratados do Brasil, hoje Casa Publicadora Brasileira) foi deslocada do sul, em Taquari, para o sudeste, nas imediações de São Paulo. Em seguida,

[...] em fevereiro de 1910 a Conferência do Rio Grande do Sul recomendou a transferência do educandário de Taquari para um ponto mais central do país. A instituição fechou e a administração vendeu a propriedade em 1911 por onze contos de réis. Esta quantia foi remetida à Conferência da União Brasileira, [com sede em São Paulo], para formar o grande fundo de educação (RABELLO, 1990, p. 41).

O que se pode entrever a partir de então, é uma igreja que decide investir maciçamente no estado de São Paulo a ponto de fazer deste a base para o seu desenvolvimento no Brasil. Foi em terras paulistas que foi fundado o Colégio Adventista Brasileiro (CAB), instituição que recebeu o Seminário denominacional, como também cursos de formação superior.

O direcionamento da pregação da IASD a partir de 1906, para os estados ―do norte‖, ―entre os brasileiros‖, ―nas grandes cidades‖ do Rio de Janeiro e São Paulo, impulsionou membros e líderes denominacionais a implantarem uma frente pioneira baseada nas imediações de São Paulo, no município de Santo Amaro, mais especificamente nas colinas do Capão Redondo, a partir de 1915, transformando essa região num espaço com marcante importância para o adventismo no estado, no país e no mundo (HOSOKAWA, 2001, p. 64).

Importa a partir daqui, voltar a atenção para o desenvolvimento denominacional adventista com base em São Paulo com foco privilegiado para o CAB, de modo a relevar o contexto social e econômico que favoreceu sua inserção. Traçar a sua história institucional com referência à historia denominacional oportunizará visualizar suas práticas educacionais, atestando dessa forma o papel destas no espectro maior do plano evangelizador adventista.

No documento Francisco Luiz Gomes de Carvalho (páginas 92-99)