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2. ACESSIBILIDADE AO AUDIOVISUAL: OS SURDOS, A TRADUÇÃO E AMBIENTES DE ACESSO

2.1 O PÚBLICO SURDO

2.1.4 Escrita das Línguas de Sinais

As línguas de sinais não tem tradição de registro escrito, porém destaca-se a necessidade do uso de um sistema de escrita iconográfico, que preserve a característica viso espacial das línguas de sinais (CORREIA; LIMA; LIMA, 2010).

De modo a preservar as características visual e espacial das LS no registro escrito, a escrita de sinais adota “um sistema de representação gráfica das línguas de sinais que permite através de símbolos visuais representar as configurações das mãos, seus movimentos, as expressões faciais e os deslocamentos corporais” (STUMPF, 2000, sem paginação).

A Escrita da Língua de Sinais ocupa um ‘lugar’ de marcador cultural, de tradução cultural surdo, pois retrata a diferença e experiência de ser surdo no sentido mesmo de disseminador de uma cultura, que se alicerça em conceitos como a diferença e de experiência visual (ZAPPE, 2010, p.63).

Um sistema de notação escrita de sinais não representa seus significados diretamente, mas descreve apenas seus aspectos físicos (KENNAWAY, 2004). Existindo diferentes sistemas de escrita para a as línguas de sinais, por exemplo, o Stokoe, o HamNoSys e o SignWriting (MCCARTY, 2004). O sistema de escrita Stokoe foi o primeiro sistema para escrita de sinais, tendo um objetivo mais cientifico do que prático em relação a sua utilização pelos surdos. O HamNoSys, assim como o Stokoe, foi projetado com objetivos mais científicos. Já o SignWriting visa a comunicação baseada nos sinais. Estas três formas de registro das línguas de sinais, aplicados à American Sign Language (ASL) estão apresentados na figura 7 abaixo.

Figura 7: Três notações para o registro escrito das línguas de sinais. Fonte: Maurer, Stubenrauch e Camhy (2003, p. 334).

Além destes sistemas de escrita, o sistema de escrita Elis, apresentado por Barros (2008), consiste em um sistema de escrita linear, assim como o Stokoe e HamNoSys. Barros (2008) descreve sua aprendizagem por um grupo de surdos, os quais propõem a produção de dicionários e materiais didáticos utilizando este sistema de escrita. As figuras 8 e 9 apresentam respectivamente um texto em Libras escrito com o Elis e sua tradução para o português.

Figura 8: Texto no sistema de escrita Elis. Fonte: Barros ( 2008, p.137).

Figura 9: Tradução livre para o português do texto em LS. Fonte: Barros (2008, p.139).

Em relação ao sistema de escrita HamNoSys, ilustrado na figura 10, Kennaway (2004) afirma que este sistema apresenta problemas referentes a omissão de informações, dificuldade de representação quanto a direção do dedo estendido, ambiguidade da fonética gestual e escopo.

Figura 10: exemplos de configurações de mão e sua notação correspondente em HamNoSys

Fonte: Hanke (2009, p.6)

A escrita de sinais SignWriting consiste em representações gráficas da língua de sinais (SUTTON, 1990). Exemplos de escrita de sinais em SignWriting e seus sinais correspondentes podem ser vistos na figura 11.

Figura 11: exemplo de correspondência entre sinais e escrita de sinais. Fonte: Silva (2009, p.66)

Deve se notar que a escrita de sinais ocorre do ponto de vista do sinalizante. A figura 12 apresenta um exemplo específico de correspondência entre configuração de mão, vista sob essa perspectiva, e um caractere em escrita de sinais.

Figura 12: Correspondência entre configuração de mão e seu símbolo em escrita de sinais.

Fonte: Sutton e Frost (2011)

Exemplos de expressões faciais descritas com escrita de sinais são apresentados na figura 13, apresenta a correspondência entre símbolos referentes à bochechas.

Figura 13: correspondência de símbolos com expressões faciais referentes às bochechas.

Fonte: Parkhurst e Parkhurst (2010, p.143)

Na escrita de sinais SignWriting (SW) um sinal da linguagem, correspondente a um significado que é transcrito em um conjunto de

símbolos posicionados em um canvas 2D chamado SignBox (SUTTON, 2008).

A escrita de sinais SignWriting pode ocorrer de três modos (WÖHRMANN, 2003):

• escrita com o corpo inteiro, que “utiliza a figura completa do corpo, uma forma mais fácil de ser entendida pelos iniciantes”;

• a escrita de sinais padrão, que “utiliza a figura com símbolos tornando o sinal uma unidade visual. É a forma considerada padrão no uso da escrita da língua de sinais”;

• e a escrita simplificada, que “é uma forma simplificada da escrita padrão que exclui alguns símbolos de maneira a facilitar a redação escrita a mão”.

Existem dois tipos de sequênciamento em relação aos sinais no SignWriting: a sequência de soletragem do sinal, e a sequência de símbolos do sinal (SUTTON, 2008).

A sequência de soletragem do sinal define a ordem de leitura dos símbolos dentro de um sinal, dividindo ele em sílabas que estabelecem qual grupo de símbolos aparecem primeiro, por segundo, e assim sucessivamente. Um sinal escrito não é lido diretamente da direita para a esquerda, mas sim de acordo com a sequência de soletragem ou pronuncia, de modo que a pronuncia de sinais tem aspectos sequênciais e simultâneos.

Na escrita de sinais SignWriting,

Os símbolos são unidades visuais relacionadas ao centro do sinal, onde o leitor busca o formato de mão que inicia o sinal e segue os símbolos de movimento para a segunda posição da mão. Este processo, apesar de não ser linear, cria a sequência de soletragem dos sinais (SUTTON, 2008, p.3).

Especificamente, cada sinal é composto por 4 sílabas, de tal modo que os símbolos que ocorrem em cada sílaba correspondem a movimentos realizados ao mesmo tempo. As quatro sílabas consistem em:

1. Posição inicial da mão dominante 2. Posição inicial da mão não dominante Sílaba 2: Movimento

1. Primeiro movimento da mão dominante 2. Primeiro movimento da mão não dominante 3. Segundo movimento da mão dominante 4. Segundo movimento da mão não dominante 5. Dinâmica da mão dominante;

6. Dinâmica da mão não dominante Sílaba 3: Mãos

1. Posição final da mão dominante 2. Posição final da mão não dominante Sílaba 4: Ordenamento detalhado 1. Localização da mão dominante 2. Localização da mão não dominante 3. Cabeça

4. Face 5. Pescoço 6. Ombro 7. Torso

8. Braços & Pernas

A primeira sílaba corresponde à configuração das mãos, a segunda sílaba corresponde ao movimento realizado, a terceira sílaba indica a posição/configuração final das mãos e a quarta sílaba indica localização, expressões faciais, aspetos da cabeça e do corpo. A sequência padrão é mão dominante, mão não dominante (sílaba um e três); primeiro movimento dominante, primeiro movimento não dominante, segundo movimento dominante, segundo movimento não dominante, dinâmica dominante, dinâmica não dominante; localização da mão dominante, localização da mão não dominante, cabeça, rosto, pescoço, ombro, torso, braços e pernas (SUTTON, 2008a).

A figura 14 exemplifica a aplicação da ordem de soletragem do sinal.

Figura 14: Exemplo de ordem de leitura/soletragem de um sinal. Os símbolos à direita estão ordenados pela ordem de leitura.

Fonte: Moemedi, Connan (2010, p.2)

Durante a escrita pode ocorrer um deslocamento de elementos da quarta sílaba, como detalhamento da face e pontos de articulação, que ganham prioridade em relação à configuração de mãos (WANDERLEY, 2011). Este deslocamento reflete a relevância dos movimentos faciais na compreensão dos sinais.

Já a sequência de símbolos do sinal refere-se à ordenação de um sinal em um dicionário ou glossário de escrita de sinais. Esta sequência permite ao usuário encontrar os sinais nesse dicionário, baseando-se na configuração de mão ou outros detalhes (SUTTON, 2008). As categorias de símbolos do SignWriting podem ser vistas no quadro a seguir.

Quadro 2: categorias de símbolos do SignWriting Fonte: Denardi (2006, p. 29).

O SignWriting é um sistema de escrita fonética de grande valia para os aprendizes de línguas de sinais, entretanto o detalhamento de todos os fonemas no registro escrito pode limitar seu uso cotidiano, pois torna a escrita volumosa e complexa em função da quantidade e variedade de elementos gráficos (CORREIA; LIMA; LIMA, 2010).

Espera-se que o uso dos sistemas de escrita de sinais na legendagem possibilite a prática por parte do público surdo de sua língua na modalidade escrita.

A próxima sessão apresenta os ambientes em que o audiovisual pode ser acessado pelos públicos surdos.