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2.2 Os Sistemas Imunológicos Artificiais (SIAs)

2.2.1 Espaço de Formas

Observando o comportamento da resposta imunológica adaptativa, tanto de acordo com o prin- cípio da Seleção Clonal (Secão 2.1.1) quanto com a teoria da Rede Imunológica (Seção 2.1.2), é possível notar que um dos aspectos mais importantes é a questão da afinidade, seja ela entre um

anticorpo e um antígeno ou entre dois anticorpos3. Sendo assim, para que fosse possível descrever

quantitativamente as interações de moléculas do SIN, Perelson & Oster (1979) introduziram o con- ceito de espaço de formas, que foi desenvolvido a partir de estudos teóricos sobre os mecanismos de seleção clonal.

3Geralmente, na literatura de SIAs, não há uma distinção explícita entre uma célula do sistema imunológico e os seus

respectivos anticorpos, o que faz com que os termos “célula” e “anticorpo” acabem sendo empregados como sinônimos, referindo-se genericamente ao componente do SIN adotado no modelo em questão.

A afinidade entre um anticorpo e um antígeno ou entre dois anticorpos envolve vários processos físico-químicos, tais como interações covalentes entre as moléculas, pontes de hidrogênio e ligações de van der Waals. Sendo assim, para que tais ligações possam ser estabelecidas e o reconhecimento ocorra, é necessário que ambas as moléculas possuam estruturas complementares por longos trechos de sua superfície, como representado pictoricamente na Figura 2.3, a qual considera apenas aspectos geométricos. Dessa forma, é possível definir a afinidade entre um anticorpo e um antígeno ou entre dois anticorpos como sendo o grau de complementariedade que as duas moléculas apresentam entre si. Caso um anticorpo e um antígeno (ou dois anticorpos) não sejam perfeitamente complementares entre si, como é o caso da Figura 2.3, a ligação entre eles mesmo assim poderá ocorrer, embora com menor afinidade.

Fig. 2.3: Complementariedade geométrica parcial das formas de anticorpos e antígenos. Quanto melhor for esta complementariedade, maior será a afinidade. Esta figura apresenta uma visão pictórica de interações físico-químicas de compostos moleculares.

Tanto a forma e a distribuição de cargas elétricas, quanto a existência de grupos químicos em posições complementares na superfície dos antígenos e anticorpos são essenciais para a determinação de suas interações, e podem ser consideradas como propriedades destas moléculas. A este conjunto de atributos, dá-se então o nome de forma generalizada. Já do ponto de vista computacional, supondo- se que a forma generalizada de um anticorpo ou antígeno possa ser descrita por um conjunto de L atributos, o espaço L-dimensional dentro do qual esta forma generalizada corresponde a um ponto específico é denominado espaço de formas.

A definição de tais atributos para os modelos de anticorpos e antígenos se dá basicamente no domínio da aplicação a que se destina o sistema imunológico artificial e independentemente da inspi- ração biológica, de forma que a equivalência biológica entre estes parâmetros e os atributos da forma generalizada não é relevante.

Matematicamente, a forma generalizada de qualquer molécula m em um espaço de formas S pode

ser representada como um vetor de atributos de tamanho L, dado por m = [m1, m2 . . . , mL]. Tal

o que definirá o espaço de formas a ser adotado da seguinte maneira:

• Espaço de Formas Real: onde os vetores de atributos são vetores de números reais; • Espaço de Formas Inteiro: onde os vetores de atributos são vetores de números inteiros; • Espaço de Formas de Hamming: onde os vetores de atributos são compostos por elementos

pertencentes a um alfabeto finito de tamanho k;

• Espaço de Formas Simbólico: onde os vetores de atributos são geralmente compostos por elementos simbólicos, tais como um nome, uma cor, etc; e

• Espaço de Formas Híbrido: onde os vetores de atributos agregam elementos pertencentes a mais de um dos tipos acima.

Além disso, outro aspecto crucial que está associado à definição do tipo de vetor de atributos de um sistema imunológico artificial é a definição de quais métricas serão usadas para medir as intera- ções de indivíduos (anticorpos e/ou antígenos), ou seja, quais métricas serão empregadas para avaliar o grau de afinidade entre os componentes do SIA. Sendo assim, se considerarmos que as formas generalizadas de um anticorpo e de um antígeno (ou de outro anticorpo) são de mesmo tamanho (o que no caso biológico não ocorre necessariamente), sob a perspectiva de reconhecimento de padrões a medida de afinidade entre estes dois indivíduos é avaliada a partir de alguma métrica de distância, definida no espaço de formas a que pertencem os correspondentes vetores de atributos.

Tal medida de afinidade realiza um mapeamento da interação de anticorpos com antígenos em um número real não negativo que corresponde à afinidade ou ao grau de similaridade entre tais componentes. Sendo assim, como a afinidade é então proporcional ao grau de similaridade entre os vetores de atributos, geralmente o conceito de complementariedade entre moléculas não é adotado em SIAs, embora seja possível definir uma relação direta entre ambos.

O termo afinidade é geralmente adotado em SIAs para quantificar o grau de reconhecimento entre um anticorpo e um antígeno, mas também é possível interpretar tal afinidade como um termo geral que indica a qualidade de um elemento do sistema imunológico em relação ao ambiente em que está inserido (de Castro & Timmis, 2002b). Esta abordagem alternativa do conceito de afinidade é empre- gada principalmente em SIAs voltados para otimização, onde não existe uma representação explícita de antígenos, e os anticorpos do modelo de sistema imunológico adotado correspondem a soluções candidatas para o problema em questão. Nestas aplicações, a afinidade dos anticorpos corresponde à sua qualidade frente ao problema, e pode ser avaliada diretamente pela função-objetivo a ser oti- mizada. Estabelecendo um paralelo com os algoritmos evolutivos (AEs), esta forma de avaliação de

afinidade entre anticorpos e antígenos é equivalente à utilização de funções de fitness em AEs, tanto que, em muitos trabalhos de SIAs para otimização, os dois termos são utilizados como sinônimos.

Neste trabalho, como será visto nos próximos capítulos, as duas interpretações de afinidade es- tarão presentes. Como serão tratados problemas de otimização, os anticorpos dos modelos imuno- lógicos utilizados corresponderão a soluções candidatas para os problemas, e terão suas afinidades com os antígenos avaliadas através de métricas do tipo fitness. Por outro lado, serão adotados aqui modelos imunológicos também baseados na teoria da Rede Imunológica (Jerne, 1974), o que requer a adoção de uma métrica de afinidade entre anticorpos. Sendo assim, para atender adequadamente esta segunda exigência, será adotada aqui também uma métrica de afinidade que indica o grau de reconhecimento entre dois indivíduos da população.