3.3 ANÁLISE DOS DADOS
3.3.1 Especificação do Modelo Econométrico
Com o intuito de investigar se as poison pills exercem influência no nível de gerenciamento de resultados das companhias listadas na B3, foi estimado o seguinte modelo com uma disposição de dados em painel desbalanceado, o que tornou possível a análise do comportamento de uma maior quantidade de empresas em determinado período de tempo:
AD$,&= β)+ β+Poisonpill$,&+ β3PoisonpillCP$,&+ 6 β5
789 Controles$,&+ ε$,& (1)
Em que:
AD$,& = accruals discricionários da empresa i no período t;
Poisonpill$,& = dummy para presença da cláusula estatutária poison pill na empresa i no
período t;
PoisonpillCP$,& = interação entre a variável Poisonpill e a dummy para presença da cláusula acessória “pétrea” na empresa i no período t;
Como 6 β7
789 Controles$,&, tem-se:
MTB$,& = razão entre o valor de mercado (enterprise value) e o valor contábil da empresa i no período t;
Alav$,& = grau de alavancagem da empresa i no período t; Rent$,& = rentabilidade da empresa i no período t;
Tamanho$,& = tamanho da empresa i no período t;
ΣAno$,& = dummy de ano para dados da empresa i no período t; ε$,& = termo de erro da regressão.
Para estimar os accruals discricionários, obtidos por meio da diferença entre os
accruals totais e accruals não discricionários, conforme evidenciado na Equação 5, foi
sentido, visando mensurar os accruals não discricionários de acordo com esse modelo, tem-se a Equação 2: AND$,&= α+ I+ J,KLM + α3 ∆OPQR$SJ,K T ∆UVW&OPQJ,K IJ,KLM + α9 XYVZJ,K IJ,KLM (2) Em que:
AND$,& = accruals não discricionários da empresa i no período t; A$,&T+ = ativo total da empresa i no período t-1;
∆RecLiq$,& = variação da receita líquida da empresa i no final do período t-1 para o final do ano t;
∆ContRec$,& = variação das duplicatas a receber (clientes) da empresa i no final do período t-1 para o final do ano t;
Imob$,& = saldo final do ativo imobilizado da empresa i no período t α+, α3, α9 = coeficientes estimados na Equação 2.
Visto que o modelo Jones Modificado utiliza os parâmetros (α+, α3, α9) estimados
pelo modelo de Jones (1991), esses coeficientes são estimados, segundo Dechow, Sloan e Sweeney (1995), da seguinte forma:
AT$,& = α+ I+ J,KLM + α3 ∆OPQR$SJ,K IJ,KLM + α9 XYVZJ,K IJ,KLM + ε$ (3) Em que:
AT$,& = total dos accruals da empresa i no período t; A$,&T+ = ativo total da empresa i no período t-1;
∆RecLiq$,& = variação da receita líquida da empresa i no final do período t-1 para o final do ano t;
Imob$,& = saldo final do ativo imobilizado da empresa i no período t; ε$ = termo de erro.
Consistente com estudos anteriores (HEALY, 1985; JONES, 1991; DECHOW; SLOAN; SWEENEY, 1995), o total dos accruals utilizados na estimação da Equação (3) foram calculados por meio das contas patrimoniais da seguinte forma:
AT$,& = ∆IUJ,KT ∆`$abJ,K T ∆cUJ,KT ∆dYbe$WfWUcJ,K T`Pab`PbgPQJ,K
IJ,KLM (4)
Em que:
AT$,& = total dos accruals da empresa i no período t;
∆AC& = variação do ativo circulante da empresa i no final do período t-1 para o final do ano t; ∆Disp& = variação das disponibilidades da empresa i no final do período t-1 para o final do
ano t;
∆PC& = variação do passivo corrente (circulante) da empresa i no final do período t-1 para o
final do ano t;
∆EmpFinanCP = variação dos empréstimos e financiamentos de curto prazo da empresa i no final do período t-1 para o final do ano t;
DespDeprec& = montante de despesas com depreciação da empresa i durante o período t. A$,&T+ = ativo total da empresa i no período t-1.
Por fim, os accruals discricionários da empresa i no período t foram calculados conforme Equação 5 (DECHOW; SLOAN ; SWEENEY, 1995).
AD$,&= AT$,& - AND$,& (5)
Em que:
AD$,& = accruals discricionários da empresa i no período t; AT$,& = total dos accruals da empresa i no período t (Equação 4);
AND$,&= accruals não discricionários da empresa i no período t (Equação 2).
A escolha desse modelo para a estimação dos accruals se deve ao fato de que, diferentemente dos modelos propostos por Healy (1985), DeAngelo (1986) e Jones (1991), o modelo Jones Modificado controla a possibilidade de o reconhecimento de vendas a prazo estar sujeito ao gerenciamento de resultados, o que possibilita um aumento na eficácia do modelo (DECHOW; SLOAN; SWEENEY, 1995).
Além disso, Dechow, Sloan e Sweeney (1995) descrevem que ele apresenta um maior poder preditivo na detecção de gerenciamento de resultados que o modelo de Jones (1991), como também apresenta maior robustez em comparação com os modelos de Healy (1985),
DeAngelo (1986) e Jones (1991), tendo em vista a minimização dos erros do tipo II (quando a hipótese nula é falsa, mas não é rejeitada).
De forma complementar, leva-se em consideração que o modelo proposto por Dechow, Sloan e Sweeney (1995) é um dos mais utilizados pelos estudos empíricos (PAULO, 2007; MOURA et al., 2016), sendo comumente usado para investigar a influência das poison
pills no nível de gerenciamento de resultados (JIRAPORN, 2005; ZHAO; CHEN, 2008a;
HUANG; WANG; ZHOU, 2013; GE; KIM, 2014).
Por fim, considera-se que, apesar das vantagens e desvantagens desse modelo já terem sido discutidas por Fields, Lys e Vincent (2001); Kothari, Leone e Wasley (2005); Lo (2008); DeFond (2010); Dechow, Ge e Schrand (2010); Dechow et al. (2012); dentre outros, nenhuma abordagem alternativa oferece uma solução superior, conforme descrevem Consoni, Colauto e Lima (2017).
Considerando, então, que o presente estudo objetiva investigar se as poison pills exercem influência no nível de gerenciamento de resultados, tem-se a dummy Poisonpill como variável independente (explicativa) no modelo econométrico (1), em que é atribuído 1 para a companhia i que adotar essa cláusula estatutária no período t, e 0 caso contrário.
De forma complementar, tendo em vista a possibilidade de interação entre variáveis
dummy em modelos de regressão (GUJARATI; PORTER, 2011; WOOLDRIDGE, 2015),
considera-se interessante verificar o efeito das poison pills que possuem cláusulas acessórias “pétreas” (jklmknolpp$,&∗ rj$,&) no nível de gerenciamento de resultados das companhias listadas na B3.
Isso pode ocorrer sob a perspectiva de que as cláusulas “pétreas” fornecem incentivos para o entrincheiramento gerencial, pois praticamente impedem a remoção das poison pills, fazendo com que gestores ineficientes, ou que possam estar envolvidos em atividades de expropriação, sintam-se seguros em suas atuais posições. Assim, considerando que a inclusão dessas cláusulas, que fornecem incentivos para o entrincheiramento gerencial, pode influenciar positivamente no nível de gerenciamento de resultados, foi inserida a interação entre as variáveis Poisonpill e CP.
Ressalta-se que também foi considerada a correlação entre as referidas variáveis para justificar a realização da interação. Desse modo, por meio da correlação de Phi, uma vez que ambas as variáveis são dicotômicas, foi verificado que existe uma correlação moderada (0,4158) entre as variáveis Poisonpill e CP.
Por fim, em consonância com os estudos que já investigaram a influência das poison
apresentam significativa influência nos accruals discricionários, proxy para gerenciamento de resultados, conforme evidenciado no Quadro 2.
Quadro 2 - Resumo das variáveis utilizadas no modelo econométrico
Variável Forma de Mensuração Estudos Anteriores Sinal
Esperado
AD Estimação com base no modelo Jones Modificado
Jiraporn (2005); Zhao e Chen (2008a); Zhao e Chen (2009); Huang, Wang e Zhou (2013); Ge e Kim (2014).
Dependente
Poisonpill
1 para companhias que possuem poison pill em seu estatuto social, 0 caso contrário
Jiraporn (2005); Zhao e Chen (2008a); Zhao e Chen (2008b); Zhao et al. (2012); Ge e Kim (2014); Small, Kwag e Li (2015).
+/-
PoisonpillCP
Variável de interação entre as
dummies poison pill e CP,
sendo 1 para companhias que possuem poison pill e CP em seu estatuto social, 0 caso
contrário
- +
MTB Valor de mercado
Valor contábil
Zhao e Chen (2008a); Zhao e Chen (2008b); Zhao e Chen (2009); Hwang e Lee (2012); Ge e Kim (2014). +/- Alav Exigível Total Ativo Total Bona-Sánchez; Pérez-Alemán e Santana-Martín (2011); Hwang e Lee (2012); Small, Kwag e Li (2015); Portulhak et al. (2017).
+/-
Rent Lucro Operacional
Ativo total
Zhao e Chen (2008a); Hwang e Lee (2012); González e García-Meca (2014); Small, Kwag e Li (2015); Sincerre et al. (2016).
+
Tamanho Logaritmo natural do Ativo
Total
Jiraporn (2005); Zhao e Chen (2008a); Zhao e Chen (2009); Hwang e Lee (2012); Chen e Zhang (2014); González e García-Meca (2014); Ge e Kim (2014); Silva e Fonseca (2015).
+
Ano Dummies de tempo
Zhao e Chen (2008a); Zhao e Chen (2009); Bona-Sánchez, Pérez-Alemán e Santana- Martín (2011); Hwang e Lee (2012); Huang, Wang e Zhou (2013); Ge e Kim (2014).
+/-
Levando em consideração que companhias em crescimento tendem a apresentar maiores níveis de accruals discricionários (BURGSTAHLER; HAIL; LEUZ, 2006; OTHMAN; ZEGHAL, 2006), a variável market-to-book (MTB) foi incluída no modelo para controlar a oportunidade de crescimento das companhias.
O MTB pode se relacionar positivamente com o nível de gerenciamento de resultados na medida em que é considerado incentivo ou parâmetro para que os executivos gerenciem os resultados das firmas (ALMEIDA; LOPES; CORRAR, 2011; DECHOW et al., 2011). Entretanto, na perspectiva que as empresas em crescimento podem ser menos propensas a gerenciar seus resultados, visto que essas ações comprometem a vantagem competitiva da companhia no longo prazo, também se considera a possibilidade do MTB influenciar negativamente o nível de gerenciamento de resultados (GE; KIM, 2014).
Em relação à Alavancagem, pode-se considerar que companhias que apresentam maiores níveis de alavancagem podem estar expostas a níveis crescentes de monitoramento institucional, diminuindo, assim, a probabilidade de a companhia gerenciar seus resultados (BECKER et al., 1998). No entanto, em uma diferente perspectiva, se pode esperar que empresas com um alto grau de alavancagem financeira sejam mais propensas a apresentarem maiores níveis de gerenciamento de resultados, devido à possibilidade de potenciais perdas, como a quebra de cláusulas contratuais de títulos de dívida (debt-covenant violation), conforme descrevem Chen e Zhang (2014).
A rentabilidade também foi inserida como variável de controle, considerando que os gestores são motivados a gerenciar os resultados com a intenção de torná-los mais atraentes (KOTHARI; LEONE; WASLEY, 2005; MACHUGA; TEITEL, 2007). Segundo Munhoz (2015), isso ocorre devido à importância de se apresentar uma rentabilidade favorável aos
stakeholders, seja para manter sua reputação, seja para manter a da companhia.
O logaritmo natural do ativo total, proxy para tamanho da companhia, foi inserido na perspectiva de que grandes companhias tendem a apresentar sistemas de controle mais sofisticados, bem como estão sujeitas a um maior monitoramento por investidores e analistas. Assim, considera-se menos provável que os gestores de grandes empresas se envolvam em atividades de gerenciamento de resultados, quando comparados aos gestores de companhias menores (GONZÁLEZ; GARCÍA-MECA, 2014).
Ressalta-se que a opção de logaritimizar o ativo total se deu com base na sugestão de Fávero e Belfiore (2017), os quais descrevem que o porte empresarial é uma variável já tradicionalmente conhecida como sendo o logaritmo natural dos ativos nas pesquisas de
finanças e contabilidade, uma vez que essa transformação possibilita a harmonização de escala, tendo em vista a diminuição da amplitude e da discrepância dos dados.
Por fim, em consonância com estudos anteriores e com os resultados do teste de especificação do modelo econométrico, também foram inseridas as dummies de Ano para controlar o efeito do tempo no modelo de efeitos fixos.
4 ANÁLISE DE RESULTADOS
Nessa seção, apresentam-se os resultados da análise estatística, sendo primeiramente apresentada a análise descritiva para, posteriormente, evidenciar os resultados da estimação do modelo de regressão em dados em painel com efeitos fixos.