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A espectroscopia de ressonância paramagnética de elétrons não é uma técnica comumente utilizada no laboratório de pesquisas da área de Inorgânica, do Instituto de Química da UFRN e, por isso, faz-se necessário desenvolver uma breve introdução sobre EPR, de maneira a esclarecer os principais conceitos e fundamentações a respeito desta técnica.

O EPR é uma técnica utilizada para caracterização de moléculas que possuam elétrons desemparelhados, como por exemplo, os complexos que contém elementos dos blocos d e f, ou espécies contendo radicais livres. Para compostos de coordenação, por exemplo, é possível comprovar a presença do metal na amostra analisada, desde que ele seja paramagnético. Este procedimento decorre da especialidade da técnica em gerar um sinal com intensidade proporcional à quantidade de spins desemparelhados.

Nessa técnica, um campo magnético externo é aplicado sobre a amostra, e se nela existirem elétrons desemparelhados, ocorrem interações, gerando-se novos estados energéticos, cuja quantidade depende dos momentos angulares de spin na amostra. Como as diferenças enrgéticas entre esses estados são da ordem de grandeza das microondas, ao se aplicar radiações dessa faixa do espectro sobre a amostra podem ocorrer transições eletrônicas entre esses estados, como é mostrado na Figura 21.

Figura 21 – Comportamento dos spins na ausência de campo magnético (esquerda) e na presença de campo

magnético (direita)

Fonte: Autora (2014).

O dipolo magnético do spin do elétron é gerado devido à rotação do elétron sobre o seu próprio eixo, Figura 22. A direção deste dipolo é paralela ao eixo de rotação.

Figura 22 – Rotação de uma partícula eletrizada em torno do seu próprio eixo e o dipolo magnético gerado

devido a esta rotação

Fonte: Santos (2006, p.20).

Os compostos analisados devem possuir elétrons desemparelhados para que a resultante do spin produza um dipolo magnético não nulo, uma vez que, quando os elétrons estão emparelhados, eles rotacionam em sentidos opostos e o dipolo magnético resultante é nulo.

Antes de aplicar um campo magnético, os dipolos magnéticos possuem direções aleatórias, no entanto, ao aplicar um campo magnético sobre a amostra, os dipolos magnéticos adquirem uma direção preferencial, os quais se alinham à direção do campo magnético, como ilustrado na Figura 23.

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Figura 23 – Direção dos dipolos magnéticos: direções aleatórias (esquerda) direções alinhadas devido à ação do

campo magnético (direita).

Fonte: Santos (2006, p.21).

A aplicação desta técnica se fundamenta na análise do espectro de absorção da radiação de microondas gerada pelos momentos de dipolo magnético do spin do elétron. Os espectros experimentais são obtidos medindo-se a intensidade da radiação em função do campo magnético. Com a finalidade de melhor analisar os resultados obtidos, os perfis dos espectros de EPR apresentados correspondem à primeira derivada dos seus espectros de absorção característicos.

No espectro de EPR, um dos prinicpais parâmetros considerados é o fator-g. Os valores de g relacionam-se aos momentos angulares orbitais e de spin dos elétrons, sendo iguais a 2,0023 no elétron livre, e por isso, os momentos angulares eletrônicos pode gerar informações sobre as estruturas eletrônicas (MABBS, 1993). O fator-g é característico para cada tipo de composto,e os seus valores podem ser obtidos com o uso da equação:

g = h . ν / β . H Com h = constante de Planck

ν = frequência

β = magnéton de Bohr H = campo magnético.

Pela sua correlação com os momentos angulares eletrônicos, o fator-g é dependente da orientação da amostra em relação a um referencial, que normalmente é a coordenada z. Assim, os valores de gz são chamados de gǁ, enquanto que gx e gy são denominados de g﬩.

Além da ação de um campo magnético externo sobre o elétron (ou os elétrons) desemparelhado(s), há ainda três tipos de interações que podem ocorrer no EPR, como ilustrado na Figura 24.

Figura 24 – Tipos de interações magnéticas que podem ocorrer no EPR

Fonte: Adaptado de Duin (p.13).

A interação comumente observada nos espectros de EPR de compostos de coordenação ocorre entre o elétron desemparelhado e o núcleo magnético, chamada de interação nuclear hiperfina. Já a interação superhiperfina ocorre entre o elétron desemparelhado e os núcleos vizinhos, a qual é normalmente observada na região perpendicular do espectro. A terceira interação é denominada spin-spin, e ocorre entre dois elétrons desemparelhados de diferentes átomos presentes em um mesmo composto.

O campo magnético efetivo que age sobre o elétron, é constituído da soma entre o campo magnético externo e o campo magnético gerado pelo núcleo. Uma vez que o campo magnético gerado pelo núcleo pode adquirir 2I + 1 valores possíveis, haverá 2I + 1 campos magnéticos diferentes agindo sobre os elétrons desemparelhados, gerando 2I + 1 linhas de igual intensidade no espectro, conhecidas como linhas de desdobramento hiperfino. A separação entre as linhas é chamada de constante de desdobramento hiperfino, representada pela letra a, correspondente à intensidade da interação entre o elétron e o núcleo.

Os valores do fator-g podem ou não coincidir com os valores do fator-A e, estas relações podem gerar diferentes comportamentos ao espectro de EPR. Tais comportamentos estão totalmente associados à simetria que o complexo apresenta. Na Figura 25 estão representados os possíveis perfis que os espectros de EPR podem assumir, de acordo com os valores do fator- g apresentados.

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Figura 25 – Perfis de espectros de EPR idealizados para diferentes simetrias

Fonte: Adaptado de Mabbs (1993, p. 314).

Conforme apresentado na figura acima, os espectros podem apresentar perfis denominados de isotrópico, axial e rômbico. O espectro de EPR apresenta um perfil isotrópico quando não são observadas hiperfinas e os valores do fator-g são iguais, ou seja, quando o espectro é totalmente simétrico, com gxx = gyy = gzz (todos os eixos da molécula são iguais). O espectro é caracterizado como rômbico quando todos os eixos da molécula são assimétricos. Neste sistema não há nenhum tipo de isotropia, ou seja, gxx≠ gyy ≠ gzz. Já o perfil axial pode ocorrer de duas formas, a primeira apresentando hiperfinas do lado esquerdo do espectro, com fator-g paralelo maior do que o fator-g perpendicular, indicando que os eixos x e y são equivalentes e o eixo z é maior que os demais, e outro perfil com hiperfinas apresentadas do lado direito do espectro, com o fator-g paralelo menor do que o fator-g perpendicular, indicando um composto que apresente o eixo z menos alongado do que os demais. Desta forma, tais perfis determinam as possíveis simetrias que o complexo em análise pode apresentar.

Como os complexos de cobre mononucleares ou polinucleares apresentam configuração eletrônica d9, ou seja, possuem elétrons desemparelhados, a técnica de EPR surge como uma ferramenta útil na caracterização destes compostos.

Os diversos compostos de coordenação com cobre (II) possuem diferentes geometrias, tais como quadrado planar, pirâmide de base quadrada ou octaédrico com distorção tetragonal. Apesar disso, apresentam espectros de EPR com perfis semelhantes, tendo vários sinais

eletrônicos paralelos característicos de simetria axial, com gǁ > g﬩. Na Figura 26, por exemplo, são apresentados espectros de EPR de complexos de cobre com perfil axial, indicando simetrias em que o eixo z seja mais alongado do que os eixos x e y, conforme observado em suas estruturas representadas ao lado. Ainda nesta figura, pode-se observar um perfil idealizado para compostos de cobre (II) (a), enfatizando as características espectrais que são próprias deste metal, dentro destas condições estruturais apresentadas.

Figura 26 – Espectros de EPR dos compostos 1-4 em DMSO, a 43K (a) simulação do espectro de EPR

Fonte: Adaptado de Beckford (2012, p.226).

Além dos espectros axiais apresentados, os complexos de cobre também podem apresentar outro tipo de simetria axial, neste caso, com fator-g perpendicular maior do que o fator-g paralelo. Como exemplo, tem-se o complexo [Cu(bipy)2Cl]ClO4, que possui geometria bipirâmide trigonal e apresenta um espectro axial, com g﬩ > gǁ, como pode ser observado na Figura 27.

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Figura 27 – Espectro de EPR experimental (- - - ) e simulado (-.-.-.-)

Fonte: Valko (1990, p. 810).

No entanto, este comportamento espectral pode ser modificado, de acordo com as características estruturais que o complexo de cobre apresenta. O complexo hexacoordenado [Cu(pabh)2], por exemplo, possui geometria tetragonal, proveniente do efeito Jahn-Teller, e apresenta um perfil rômbico de EPR, conforme apresentado na Figura 28.

Figura 28 – Espectro de EPR do complexo [Cu(pabh)2] em pó à 298K

Fonte: Adaptado de Pal (2002, p.422).

Complexos que possuem geometria tetraédrica ou octaédrica perfeita, com todos os ligantes iguais na esfera de coordenação e apresentando os mesmos comprimentos de ligações, possuem um perfil isotrópico. No entanto, complexos de cobre dificilmente terão estas características e, por isso, na prática este perfil é raramente observado (HATHAWAY, et al., 1969). Desta forma, na Figura 29 é apresentado um espectro de EPR com perfil isotrópico, referente ao complexo [Ni(NH3)6]2+, apenas à título comparativo.

Figura 29 – Espectro de EPR do complexo [Ni(NH3)6]2+ em solução de amônia a 77K

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