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As teorias da Base de Exportação, consubstanciadas notadamente nos trabalhos de North (1977) e Pred (1966), enfatizam as implicações da especialização em determinadas atividades produtivas para o desenvolvimento regional e para a configuração dos sistemas urbanos. O argumento básico é de que as rendas geradas pela exportação da produção de tais indústrias implicam efeitos cumulativos, definindo o padrão de crescimento da economia local. Nestes termos, o desenvolvimento da região em questão estará condicionado pelo sucesso das atividades exportadoras, isto é, da Base Exportadora.

A inclusão de um mecanismo multiplicador – análogo àquele desenvolvido por Keynes – na análise dos problemas regionais pode ser encontrada no livro clássico de Pred (1966). O modelo analítico desenvolvido pelo autor busca explicar a relação existente entre o crescimento urbano e as mudanças verificadas na estrutura das atividades urbanas, isto é, a relação entre o crescimento das cidades e o surgimento de novas funções por estas fornecidas. Embora Pred (op. cit) tenha enfatizado o papel do multiplicador no contexto de investimentos em novas plantas industriais, o mesmo foi amplamente aplicado à análise do impacto das rendas de exportação sobre a economia local. Esta é a linha seguida por Fujita,

Krugman e Venables (1999), os quais fizeram do multiplicador da base um dos elementos chave da Nova Geografia Econômica.

O multiplicador da base é similar ao multiplicador keynesiano clássico e na sua versão mais simples pode ser representado por:

; 1 1 X a Y − = (3.2)

em que Y é o nível de renda regional e X é a renda gerada pelo setor exportador, cuja fração

a é gasta localmente em produtos não da base.

A proposição básica de Pred é de que o multiplicador aumenta com o tamanho da economia regional, isto é, à medida que a economia local cresce torna-se lucrativo produzir uma maior variedade de produtos e serviços localmente. Nos termos da equação acima, o a cresce quando a economia regional se expande, resultando num multiplicador maior, promovendo o crescimento de Y e originando um processo circular virtuoso.

A despeito do uso que a Nova Geografia Econômica faz do multiplicador da base, bem como das suas implicações teóricas e das críticas que possa ensejar, pretende-se identificar aqui alguns resultados dos comportamentos especulativos verificados ao longo dos ciclos econômicos e que podem ser analisados a partir do multiplicador da base. Primeiramente é preciso destacar que a análise do caso da periferia extrema tem pouco a acrescentar, visto que, como destacado anteriormente, o terreno mais fértil para a emergência de comportamentos especulativos se verifica nas regiões intermediárias. A discussão deve então se centrar no caso da região intermediária.

Até o momento destacou-se o fato de que nas fases de ascensão no centro algumas regiões não centrais são diretamente impactadas pelos transbordamentos de demanda. Observou-se também que tais impactos, traduzidos pelo aumento das exportações para o centro, implicam uma valorização dos ativos localizados na periferia, o que por sua vez atrai o interesse de agentes objetivando ganhos de capital. A compra e venda de ativos periféricos, de acordo com expectativas formadas ao longo das flutuações cíclicas, constituem então o aspecto da especulação enfatizado até o momento – a especulação imobiliária constitui-se num exemplo apropriado. Não obstante, de igual importância é o fato de que a especulação também se verifica com vistas à apropriação de parte da renda que decorre da expansão das

exportações para o centro nas fases de ascensão. Neste caso, a compra de ativos locais por não residentes, ou investimentos diretos realizados por estes nas fases de retomada, além de objetivar ganhos de capital, visa à obtenção de lucros decorrentes do aumento da renda local. É possível afirmar que tais comportamentos se verificam essencialmente em setores onde a presença de sunk costs é pouco significativa – como exemplo, pode-se citar a instalação de filiais de grandes empresas varejistas na periferia nas fases de ascensão, as quais podem, sem maiores custos, encerrar suas atividades quando julgarem conveniente; isto é, quando da mudança do estado de expectativas, em função de uma generalização da crença quanto a uma iminente inflexão do ciclo de negócios no centro ou mesmo depois que esta ocorre.

O setor bancário, por sua vez, participa do processo ao fornecer o financiamento necessário. Movido por uma redução na sua preferência pela liquidez, característica das fases de expansão, o grau de alavancagem é aumentado e uma maior facilidade na obtenção de crédito é aproveitada tanto por unidades empresariais quanto por famílias (crédito ao consumidor) que, no contexto específico da região em questão, se caracterizam por elevada propensão a consumir. Aqui se verifica a interdependência entre demanda e oferta de crédito, sintetizada pelo interesse comum entre bancos e investidores privados na apropriação de parte da renda das exportações na periferia: investidores necessitam de crédito prontamente disponível para que se concretizem suas expectativas de lucro; bancos, por sua vez, dependem desta demanda para compartilhar de tais ganhos.

O efeito sobre o multiplicador da base torna-se então evidente. Os vazamentos de recursos para o centro, já destacados por Dow (1993d), como resultado de uma elevada propensão a importar, serão aumentados por uma maior presença de investimentos de não residentes na economia local nas fases de expansão, a qual reduz a parcela da renda das exportações que é gasta localmente. Considerando-se o Balanço de Pagamentos regional tal redução decorre de um aumento na remessa de lucros, registrado com sinal negativo na sub-conta renda de capitais. Cabe notar que cada nova unidade monetária que entra na região a partir de atividades da base exportadora só tem o poder de impactar positivamente outras atividades enquanto permanecer e for reutilizada na economia da própria região. A remessa de lucros por parte de firmas e de bancos atuando na periferia e sediados no centro reduz esta

permanência. Tudo mais permanecendo constante, a magnitude do multiplicador depende da capacidade de retenção na região da renda obtida com as exportações.17

Nos termos da equação (3.2) o aumento da especulação pressiona o valor de a para baixo. De modo geral, pelo menos no curto prazo, poderá se observar um aumento das exportações associado a uma redução do multiplicador. Generalizando, o comportamento do parâmetro a é anticíclico. Como resultado, comportamentos especulativos por parte de bancos e firmas poderão limitar os ganhos decorrentes das exportações na periferia, isto é, implicar um aumento da renda regional menor do que se poderia esperar na ausência destes. No longo prazo, tais comportamentos tendem a contribuir para a perpetuação da condição de periferia.

3.6 Balanço de Pagamentos regional: ajustamento diferenciado no gradiente