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Elaboração: Paulo Roberto Cunha

Problema ingressa na ESTABELECIMENTO DA AGENDA E

FORMULAÇÃO DO PROBLEMA

 Uma questão social ainda não considerada como problema;  Percepção da questão e sua definição como um problema  Processo de filtragem para o problema ingressar na agenda

AGENDA DE GOVERNAMENTAL

CALDO DE PROPOSTAS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

 Propostas podem ser criadas independentemente da associação com

problemas identificados

CRIAÇÃO DE ALTERNATIVAS

 Criação de alternativas ou associação de uma alternativa existente ao problema percebido  Negociações políticas nas arenas do Executivo e Legislativo

 Influência, apoio, contrariações por parte de atores diversos nas arenas de poder  Coleta de informações, análises

 Decisões parciais AGENDA DECISIONAL DECISÃO IMPLEMENTAÇÃO DA POLÍTICA PÚBLICA Programas de implementação Organização do aparelho administrativo EXECUÇÃO

 Põe em prática a política pública

FUTURO DA POLÍTICA

Reflexões sobre o futuro da política pública e do programa de implementação que podem levar a uma nova agenda

JUDICIALIZAÇÃO  de parte ou de toda política pública Condições AVALIAÇÃO  Acompanhamento da execução da política pública

Com base no Diagrama 3, considera-se que uma questão, por algumas razões, chama a atenção de governantes, ingressa na agenda de governamental e passa a ser um problema de política pública. Uma proposta de solução pode ser oferecida a partir de um conjunto de ideias pré-concebidas, criadas independentemente de um problema (KINGDON, 1995), ou então podem sugir propostas novas. Em momento político propício, decide-se associar o problema às alternativas criadas e a política pública é materializada em norma jurídica74. Em seguida, a implementação envolve o “planejamento e organização do aparelho administrativo e dos recursos humanos, financeiros, materiais e tecnológicos necessários” (SARAVIA, 2006, p. 34). Na execução, a política pública é colocada em prática, submetendo-se, depois, à avaliações permanentes ou periódicas75 que podem gerar decisões sobre seu futuro (extinção, prosseguimento, aperfeiçoamentos, mudanças e até o estabelecimento de uma nova agenda).

Ressalta-se que o comportamento dos atores nesse processo não é roteirizado. Não há, pois, uma organização onde “cada ator social conhece e desempenha o papel esperado” (KINGDON, 1995, p. 3), como também é preciso ser “cético” à ideia de que “alguns atores têm a responsabilidade de tomarem as decisões, enquanto outros cuidam de pôr em prática as políticas”, afinal os implementadores também tomam decisões (HILL, 2006, p. 62).

As setas com linhas contíguas do Diagrama 3 indicam um caminho seqüencial e esperado, lembrando que, no mundo real, essa dinâmica costuma ser emaranhada, de forma que as fases podem ocorrer de forma não subsequente. Ademais, a produção de uma política pública pode ser abortada a qualquer tempo, por isso as atividades de uma fase podem ou não resultar em produtos (RIPLEY, 1995, p. 157) ou até retornar à estágios precedentes.

As setas tracejadas, por sua vez, correspondem à (s) atividade (s) que eventualmente podem interferir no trajeto previsto pelo modelo, como na fase da judicialização, onde algum autor constitucionalmente legitimado pode questionar no Poder Judiciário determinado aspecto material ou processual da política pública, como ocorreu com a PRFA76.

O Poder Judiciário não faz política pública, no máximo ele é ator secundário77 que, quando provocado, é obrigado a se pronunciar, emitindo uma das seguintes decisões: (i) reputar como legal ou constitucional o aspecto material ou processual-legislativo questionado;

74 Nessa fase de “formulação”, as alternativas são selecionadas e vem a “declaração que explicita a decisão adotada, definindo seus objetivos e seu marco jurídico, administrativo e financeiro (SARAVIA, 2006, p. 33). 75 Segundo Saravia (2006, p. 35), a avaliação consiste na análise dos efeitos da política pública, especialmente no tocante “às realizações obtidas e às consequências previstas e não previstas”.

76 Em 2009, a PRFA foi objeto de ação direta de inconstitucionalidade junto ao STF, decidida somente em 2017. 77 Ao mesmo que em que é um ator, o Poder Judiciário pode ser uma arena, onde outros atores conflituosos realizam disputas para que o julgamento da política pública possa atender ao seu interesse.

(ii) apontar alguma desconformidade, gerando um comando de alteração parcial ou total na política pública ou no seu processo legislativo; ou (iii) intervir drasticamente, determinando o retorno do processo a uma etapa anterior ou abortando-o em definitivo.

1.2.3 – As perspectivas teóricas do campo da análise de políticas públicas

O estudo realizado nesta tese se enquadra no campo de conhecimento chamado de análise de políticas públicas (policy analysis)78 que, segundo Souza (2006, p. 23), procura conciliar conhecimento científico com a produção empírica dos governos.

Em geral, esse campo foca: (i) nos resultados produzidos por uma política específica (planos, programas e projetos), aquilo que Winkler (2009, p. 130) chama de “fosso” entre “a intenção do legislador os resultados da política”; e (ii) os processos decisórios de formulação de políticas públicas, que é a preocupação deste trabalho no tocante à PRFA.

Essa área de estudo possui teorias, modelos e métodos próprios que incidem sobre a coleta e a interpretação de dados e são importantes para o estabelecimento de relações entre as variáveis e os mecanismos causais associados (BARNES e WELLER, 2011, p. 28).

No tocantes as teorias79, ou “macroteorias”, nas palavras de Capella (2018 [informações verbais]80), quatro são as principais abordagens da ciência política que procuram elucidar a relação entre o Estado e a sociedade e, via de consequência, as políticas públicas e a capacidade de influência dos atores: (i) o marxismo, que considera a burguesia o principal ator na definição das políticas públicas que, consequentemente, garantem os processos de acumulação de capital; (ii) o elitismo, onde as elites influenciam decisivamente a construção das políticas; (iii) o pluralismo, que analisa as políticas públicas como resultado da competição entre atores e grupos; e (iv) o institucionalismo, que valoriza a importância das

78 A expressão policy analysis, introduzida por Harold Laswell, em 1936, é um campo de conhecimento que parte da perspectiva de que, em democracias estáveis, aquilo que o governo faz ou deixa de fazer pode ser analisado e formulado cientificamente (SOUZA, 2006, p. 22-23).

79Teoria é o conjunto de categorias organizadas e fundamentadas em hipóteses, formando um conjunto sistêmico ecom dimensão analítica mais ampla e mais abstrata do que um modelo teórico.

80 CAPELLA, Ana Cláudia. Palestra apresentada em 19 de abril de 2018, no III Encontro Nacional de Políticas Públicas, realizada na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH/USP).

regras institucionais para a formulação e implementação de políticas públicas81 (MARQUES, 1997; SOUZA, 2006).

As teorias, por sua vez, são simplificadas em modelos, que possuem um nível de estudo mais específico e mais instrumental. Segundo Dye (2009, p. 99), os modelos são “uma representação simplificada” de algum fenômeno do mundo real, podendo ser uma “maquete de edifício” ou um fluxograma mostrando como um projeto se transforma em lei.

Os subtópicos a seguir esclarecem a abordagem teórica utilizada nesta tese para entender o processo de construção da PRFA.

1.2.4 – O referencial teórico: o modelo dos múltiplos fluxos

Os modelos teóricos de análise de políticas públicas focalizam em pontos distintos e características essenciais da “vida política”, ordenam e simplificam a compreensão da realidade, orientam a pesquisa e a investigação, propõem explicações e procuram prever consequências, sugerindo “algumas causas e consequências gerais” (DYE, 2009, p. 100-101, 126). Os modelos possuem nível intermediário de análise e são chamados de “mesoteorias” por Capella (2018) (informações verbais)82.

Como o objetivo geral desta tese é analisar os processos de construção e de tomada de decisão alusivos à PRFA no governo Lula, os principais atores, seus interesses, seus conflitos e suas ideias, é preciso entender, primordialmente, a formação da agenda, isto é, identificar os problemas que ingressaram na agenda de governo, para depois compreender como eles geraram as soluções adotadas pela política pública. Para tanto, este trabalho elege como referencial teórico o modelo dos Múltiplos Fluxos (Multiple Streams Model), desenvolvido pelo cientista político estadunidense John W. Kingdon (1995), reconhecido pela sua capacidade de explicar como as agendas de políticas públicas são formadas e alteradas (CAPELLA 2007, p. 87) e como são concebidas as alternativas para soluções dos problemas.

81 Essas teorias explicativas foram construídas historicamente, uma se opondo a outra. Existem discordâncias sobre a capacidade teórica de algumas dessas abordagens, como, por exemplo, Marques (1997, p. 68), ao ponderar que o neoinstitucionalismo é uma “teoria de médio” alcance, ao passo que a perspectiva marxista seria uma “teoria geral da sociedade, da economia e da política”.

A partir do modelo da lata do lixo (garbage can), de Cohen, March e Olsen (1972), Kingdon começou a traçar o seu modelo de análise de tomada de decisão (CALDAS, 2007, p. 38), que foi originalmente elaborado a partir de estudos sobre as políticas públicas de saúde e de transporte do governo dos Estados Unidos, levando em conta as instituições, a política e o desenho do federalismo estadunidense83.

Assim, o modelo dos Múltiplos Fluxos não prevê alguns aspectos institucionais e políticos que são típicos do caso brasileiro, como a medida provisória - por meio do qual o presidente da República pode alterar repentinamente o status quo, lançando ou alterando uma política pública antes de passar pelo crivo do Congresso Nacional – e a formação de coalizões governamentais que, no Brasil, combina presidencialismo, representação proporcional de lista aberta e sistema parlamentar altamente fragmentado.

Por isso, optou-se pela combinação do modelo dos Múltiplos Fluxos com algumas características institucionais do presidencialismo de coalizão brasileiro, estudado por Abranches (1998/2003), Limongi (2006), Figueiredo e Limongi (1999) e outros.

Cada capítulo desta tese analisa uma fase da PRFA, orientado por pontos específicos do modelo de Kingdon. Por isso, o preâmbulo de cada etapa deste trabalho é destinado a explicar o respectivo enfoque teórico, a fim de aproximá-lo da análise empírica e estabelecer um diálogo mais rico entre a teoria e o estudo de caso.

Além disso, de forma subsidiária e complementar, esta tese considera ainda o modelo do incrementalismo, de Charles Lindblom (1959/2009; 1979/2009), segundo o qual “as variáveis políticas transformam as decisões que são tomadas na área de políticas públicas num processo contínuo e permanente – sem começo e sem fim”; dessa forma, a ação governamental “nunca parte do zero, mas sim de decisões que já foram tomadas no passado”, avançando a partir de decisões “marginais”, de maneira incremental, “sem provocar rupturas nem grandes modificações” (RODRIGUES, 2010, p. 39-40).

Acrescente-se que, na segunda edição do seu livro84, Kingdon (1995) acrescentou um capítulo com reflexões teóricas adicionais, dentre as quais destaca “a importância das instituições” e como o seu modelo se enquadra na perspectiva teórica do neoinstitucionalismo, salientando que o governo “não é simplesmente empurrado e puxado por forças sociais ou econômicas”, “não é produto da estrutura de classe”, mas tem autonomia e, nesse contexto, as

83 O modelo tem sido testado no Brasil, como em Cunha (2013), na análise da mudança do Código Florestal, em Caldas (2007), no estudo de formação de agendas dos consórcios municipais, em Ferreira (2010) e Antelo (2018a), com relação do Plano BR-163 sustentável, e em Capella (2007).

instituições são importantes na definição de agendas de políticas públicas por constituírem importantes constrangimentos à sua elaboração, tornando alguns resultados possíveis e outros improváveis.

Tendo em vista que os objetivos desse trabalho passam pela análise dos espaços institucionais que os principais atores relacionados à PRFA se apropriaram, bem como o peso de determinadas instituições no processo de construção e de tomada de decisão da política pública, esta tese se apropria de elementos da abordagem do neoinstitucionalismo como pano de fundo teórico.

1.2.5 – O pano de fundo teórico: o neoinstitucionalismo

As elites no poder possuem relevância analítica, especialmente na questão fundiária brasileira, onde uma oligarquia agrária, dotada de supremacia política e econômica, tem influenciado decisivamente as ações públicas ao longo da nossa história. Além disso, a classe dos capitalistas e as pressões de grupos de interesse são essenciais para compreender a produção de políticas públicas que afetam o meio rural, tal como demonstrado em Cunha (2013, 2016) em relação a participação do agronegócio na derrubada do Código Florestal.

Apesar desses aspectos serem levados em conta na presente tese, considera-se principalmente as relações entre os atores políticos e as instituições estatais, porque as estratégias dos atores são constrangidas por instituições. Em outras palavras, a política é emoldurada por instituições, porque os atores olham para elas e constroem ou desfazem alianças, propõem leis, enfim, decidem o que fazer.

Nesse sentido, Kingdon (1995, p. 229, tradução nossa) pondera:

O governo não é simplesmente o produto da estrutura de classe, por exemplo, ou o empregado da opinião pública ou grupos de pressão. Nesse contexto, instituições, constituições, procedimentos, estruturas governamentais e funcionários governamentais afetam tanto os sistemas políticos, sociais e econômicos quanto o contrário (tradução nossa).

Em linhas gerais, instituições são “corporificações de regras” (LABRA 1999, p. 141), uma coleção relativamente duradoura de regras, práticas e procedimentos organizados, que desempenham um papel parcialmente autônomo na vida política e prescrevem o comportamento apropriado para atores, capacitando-os e restringindo-os de maneira diferente,

em situações específicas (MARCH e OLSEN, 2006), de modo que os atores sociais são comparados aos jogadores em partidas esportivas, enquanto as instituições seriam “a delimitação do campo e as regras do jogo” (MARQUES, 1997, p. 76).

As instituições podem ser regras formas ou informais (NORTH, 1991, p. 97; SOUZA, 2006, p. 39). As instituições formais são as leis, as constituições, as estruturas de Estado, os direitos de propriedade, etc, enquanto que as instituições informais são os códigos de linguagem e de conduta, a cultura, os símbolos, as sanções, os tabus, os costumes, as tradições, as convenções em geral (NORTH, 1991, p. 97; MARQUES, 1997, p. 76; IMMERGUT, 2006).

Existem críticas a essa amplitude conceitual, de forma que alguns autores consideram como instituições apenas as normas com algum aspecto legal, deixando de fora aquelas cujos incentivos e desincentivos são sociais e cognitivos (MARQUES, 1997, p. 76). Dessa maneira, esta tese prioriza as instituições formais na análise empreendida.

Qual é o papel desempenhado pelas instituições?

As instituições, como constrangimentos estabelecidos pelo homem, estruturam as interações políticas, econômicas e sociais (NORTH, 1991, p. 97), “moldam o comportamento dos atores” (SOUZA, 2006, p. 39-40), influenciando suas estratégias, suas interpretações e suas metas, ao mesmo tempo que “são resultado de estratégias políticas deliberadas, do conflito político e de escolhas” (LABRA 1999, p. 141 e 144).

Como explica Immergut (2006, p. 160 e 177), as instituições “induzem comportamentos específicos” e “agem como filtros que favorecem de forma seletiva, determinadas interpretações dos objetivos que buscam os atores políticos ou da melhor forma de alcançar esses fins”. E, lembrando do filósofo e teórico político Jean-Jacques Rousseau, a mesma autora assim se refere às decisões políticas:

Da mesma forma que as preferências do homem são produtos de ambientes sociais e institucionais específicos, também as decisões políticas surgem de um conjunto específico de procedimentos institucionais, que poderão moldar ou distorcer essas decisões. Dependendo de como as vontades individuais são reunidas em decisões coletivas, os resultados finais poderão refletir o bem comum ou serem distorcidos.

Assim, o neoinstitucionalismo85 é uma perspectiva teórica utilizada na ciência política,

que parte da premissa central de que as propensões, as decisões políticas e os fenômenos governamentais não resultam da agregação de comportamentos e preferências individuais, mas são produtos de regras e procedimentos institucionais, que as distorcem de diversas maneiras, daí porque só no contexto das instituições é possível compreender os fenômenos políticos (IMMERGUT, 2006, p. 156-160).

As preocupações analíticas dos estudos que adotam esta perspectiva enfocam no processo pelo qual as instituições surgem ou se modificam e as relações entre as instituições e os comportamentos dos indivíduos, para entender como as primeiras exercem influência sobre as situações políticas (HALL e TAYLOR, 2003, p. 194).

O neoinstitucionalismo não é uma corrente de pensamento unificada, possuindo três escolas ou métodos de análises (HALL e TAYLOR, 2003, p. 193):

(i) Histórico: foca nos acontecimentos históricos, que explicam o funcionamento das instituições que, por sua vez, moldam interesses, representações, demandas políticas, políticas públicas e as decisões dos atores (IMMERGUT, 2006, p. 172);

(ii) Escolha racional: enfatiza as escolhas feitas pelo ator individual, suas estratégias e sua racionalidade que o orienta na maior parte das ações políticas (CALDAS, 2007, p. 27-29), considerando que as escolhas políticas não representam necessariamente “a soma de preferências honestas”, mas um resultado das regras do jogo (das instituições) e dos esforços dos participantes relevantes em tirar vantagens dessas regras (IMMERGUT, 2006, p. 166)86;

(ii) Sociológico: foca nos limites cognitivos da racionalidade, nas categorias culturais, de forma que as decisões políticas ou qualquer outra decisão devem ser entendidas como “o resultado de procedimentos cognitivos e organizacionais”, onde “categorias culturais, como os conceitos de papéis e hierarquia”, podem constranger o comportamento dos atores (IMMERGUT, 2006, p. 170-171).

Para os objetivos desta tese, leva-se em consideração que as fronteiras dessas escolas nem sempre são claras (SOUZA, 2003, p. 18) e que cada uma delas “parece revelar aspectos

85 O neoinstitucionalismo se contrapõe ao movimento behaviorista (1950-1960), que enfatizava o comportamento político dos atores como “dado básico” de análise; a abordagem institucional está concentrada em mostrar que “preferências e decisões são produtos de instituições”, que as distorcem de diversas maneiras; o problema é que o institucionalismo não se preocupa em revelar as verdadeiras preferências dos indivíduos, depurada, entretanto, pela tradição behaviorista que assume que “as pessoas revelam suas preferências por meio de seus comportamentos”, proposição rejeitada pelos institucionalistas (IMMERGUT, 2006, p. 162).

86 Immergut (2006, p. 166) exemplifica sua explicação com o voto, que “expressa não as preferências verdadeiras dos eleitores, mas uma amalgama indefinida de votos honestos e estratégicos”.

importantes do comportamento humano e do impacto que as instituições podem ter sobre ele”, daí importância de intercâmbios entre essas vertentes87 (HALL e TAYLOR, 2003, p. 219).

Portanto, este trabalho emprega o chamado “núcleo teórico comum” dos três ramos do neoinstitucionalismo, adotando concepções teóricas dessas clivagens que enfatizam a relevância dos atores e das instituições como instrumento analítico da realidade empírica, dentre os quais se destaca as seguintes premissas: (i) as preferências e os interesses expressos em ações não são necessariamente as verdadeiras preferências dos atores88; (ii) o somatório de preferências individuais não explica inteiramente as decisões coletivas89; (iii) “configurações institucionais podem privilegiar conjuntos específicos de interesses”90; (iv) instituições não determinam o comportamento político dos atores, mas disponibilizam circunstâncias em que decisores analisam seus interesses e definem suas preferências (IMMERGUT, 2006, p. 159- 160, 178); (v) as instituições “tornam o curso de certas políticas mais fáceis do que outras”, redefinindo as alternativas políticas e mudando a posição dos atores (SOUZA, 2006, p. 39).

Essa abordagem neoinstitucionalista91, agregada ao modelo de Kingdon, enriquece a

análise na medida em que se considera as instituições pertinentes, como as regras formais e informais que regem a relação entre os Poderes Executivo e Legislativo, e suas influências nos processos de construção e de tomada de decisão alusivas à PRFA.

1.2.6 – As abordagens teóricas e observações empíricas testando as hipóteses de pesquisa

De que maneira as abordagens teóricas escolhidas e as observações empíricas testam as hipóteses de pesquisa formuladas?

87 Essa sugestão de Hall e Taylor (2003, p. 219) vem acompanhada com a advertência de que os representantes extremos de cada uma escolas neoinstitucionalistas adotam posições bem diferentes sobre questões fundamentais, mas os autores ressaltam que cada uma delas supre “uma explicação parcial das forças ativas numa situação dada”, admitindo que “o comportamento de um ator pode ser influenciado ao mesmo tempo pelas estratégias prováveis de outros atores e pela referência a um conjunto familiar de modelos morais e cognitivos, cada fator estando ligado configuração das instituições existentes”.

88 Os institucionalistas distinguem as preferências expressas no comportamento político das preferências reais do indivíduo (IMMERGUT, 2006, p. 157).

89 Estudos comportamentais admitem que as preferências individuais podem ser agregadas, entretanto institucionalistas concordam que decisões políticas não podem ser analisadas na agregação de preferências individuais (IMMERGUT, 2006, p. 157-158).

90 Essas são as três premissas básicas do novo institucionalismo (IMMERGUT, 2006, p. 159).

91 O neoinstitucionalismo tem ampla aceitação pela ciência política brasileira (CALDAS, 2007, p. 26) e impactos importantes na literatura nacional (MARQUES, 2013, p. 39).

Em larga medida, descobrir o porquê e como o Estado brasileiro adotou uma política pública, passa pela análise da formação de uma agenda, dos interesses preponderantes, do jogo de forças político-institucional dos atores e de como as instituições moldam ou distorcem

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