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OS ESPAÇOS PÚBLICOS FORTES NO CENTRO DE ARACAJU

A. Estação Rodoviária

Nas décadas anteriores, a ferrovia havia desempenhado um papel fundamental na vida das regiões e cidades pelas quais ela atravessava. A estação ferroviária era a porta de entrada e ponto de encontro, onde se reuniam as gentes que chegavam e saiam da cidade. Com a opção do governo brasileiro em priorizar o transporte rodoviário, oferecendo incentivos à indústria automobilística em detrimento do sistema ferroviário no transporte de passageiros e cargas no país, a rede de estradas se expande sensivelmente e os eixos rodoviários passam a assumir um papel cada vez mais estruturante da malha urbana das cidades.

As condições geográficas73 de Aracaju limitaram as possibilidades de acesso terrestre à cidade. Seja através da ferrovia (1914), como posteriormente através das rodovias, os eixos de entrada na cidade sempre se localizam no oeste da cidade, o que propiciou a ocupação desta área por bairros que cresceram muito rapidamente – em especial o Siqueira Campos, inclusive como pólo comercial. A modernização das rodovias BR-101 e BR-235 nos anos 50 e 60 acelera o processo de decadência da ferrovia, mas a estrutura da cidade pouco mudou, pois em ambos os casos a porta de entrada era basicamente a mesma: o lado oeste.

Construída pelo governador Luiz Garcia (1959-1962), o terminal rodoviário foi a primeira edificação deste tipo na cidade, destinada a atender aos passageiros e ônibus de um serviço rodoviário em expansão, ligando Aracaju às cidades do interior e ao restante do país74. Sua construção fez parte do processo de modernização da cidade e só foi possível após o desmonte do Morro do Bomfim (cuja areia foi utilizada para aterrar outras áreas da cidade) a partir de 1955, o que permitiu a criação de novas ruas e quadras urbanas, expandindo o centro da cidade. Segundo Barreto (2006b), o desmonte do Morro do Bomfim representou a maior intervenção de engenharia no centro e criou várias alternativas para a sua urbanização.

Com o nome do governador, a Estação Rodoviária (ver também as figuras 24 e 25) é uma edificação de linhas modernistas, dentro do espírito de época, implantada de forma isolada no centro de um quarteirão, criando desta maneira um amplo espaço aberto em seu entorno, a Praça João XXIII – parte deste espaço era, no entanto, utilizado como área de manobra e estacionamento de ônibus75.

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O município de Aracaju está localizado entre as bacias do rio Sergipe no norte e leste, e do rio Vaza -Barris ao sul, restando apenas o lado oeste como possibilidade de ligação terrestre a outras regiões. Apenas em 2006 foi inaugurada uma ponte sobre o Rio Sergipe, criando uma ligação direta para o litoral norte.

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Até então havia apenas um precário ponto de embarque e desembarque de ônibus na Rua da Frente (Av. Rio Branco).

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Com a construção em 1979 de um novo Terminal Rodoviário na periferia, ela vai se tornar a Rodoviária Velha abrigando apenas as linhas de ônibus intermunicipais de cidades mais próximas.

131 Em seu entorno imediato não demoram a surgir novas edificações e atividades com relações intrínsecas com uma estação rodoviária, como hotéis e pensões, além de um diversificado comércio varejista e atacadista com preços mais baixos, voltado principalmente para a população do interior em visita à capital.

É por este motivo que a rede de supermercados Paes Mendonça (hoje Bompreço) implanta, ao lado da Rodoviária, sua primeira “moderna” grande loja em Sergipe, constituindo-se num marco referencial para os habitantes da capital e do interior. Se ainda hoje, com a forte polarização da capital em relação ao Estado, muitos habitantes das demais cidades frequentemente viajam a Aracaju para se utilizar de seu comércio e fazer compras mais especificas, pode-se imaginar o que significava naqueles anos 60 esta primeira grande loja do Paes Mendonça. Juntas, a Rodoviária e o supermercado, materializam a praticidade da vida urbana moderna e vão atuar de modo convergente, em reciprocidade mútua, na configuração deste novo espaço urbano do centro da cidade. Interessante notar que a primeira loja do Supermercado Paes Mendonça estava localizada na Rua da Frente, próxima ao mercado municipal, e sua transferência para a vizinhança da Rodoviária traduz claramente a mudança de foco da “nova” cidade, dando as costas definitivamente para a antiga Rua da Aurora e para as margens do rio.

Completando o conjunto urbano, um outro vizinho importante é o edifício-sede do antigo INPS (Instituto Nacional de Previdência Social), hoje INSS. Inaugurado em 1971, trata-se de um novo arranha-céu na cidade (verticalidade que acompanha o Ed. Estado de Sergipe e o Hotel Palace) que se torna um marco arquitetônico na paisagem urbana da região da Rodoviária. Como no caso do supermercado, a localização deste órgão público tem muito a ver com a proximidade da Rodoviária, pois a população do interior só podia resolver questões relativas à Previdência Social em Aracaju e desembarcava dos ônibus a poucos metros de distância.

132 Figura 23: Região do entorno dos mercados municipais e da Rodoviária Velha – situação atual.

(1) Rodoviária Velha

(2) Terminal Urbano de Integração (construído em 1987) (3) Supermercado Bompreço

(4) Edifício do INSS

(5) Ed. Estado de Sergipe (“Maria Feliciana”) (6) Hotel Pálace

(7) Rua João Pessoa (calçadão) (8) Mercados Municipais (9) Rua Santa Rosa

Fonte: Google Earth, 2004, imagem reformada pelo autor.

Importante salientar aqui as relações espaciais de proximidade entre diferentes atividades urbanas, em que cada uma potencializa as demais, cujo resultado é uma configuração urbanística extremamente rica e dinâmica – algo que vai se perder com a descentralização funcional do centro nas décadas seguintes, como veremos adiante. Partindo destes dois casos (supermercado e órgão público), observamos como a Estação Rodoviária vai caracterizar em boa parte o uso do solo em seu entorno, polarizando e impregnando certa “personificação” da área em termos sociais e funcionais. Este novo espaço pode ser entendido também como uma expansão dos mercados municipais ao longo das ruas Santa Rosa e Apulcro Mota, consolidando uma mancha urbana ao norte do centro com predominância de um comércio mais “popular”, voltado a populações de renda mais baixa.

133 Figura 24: Estação Rodoviária (em primeiro plano) nos anos 60/70.

Ao fundo, o edificio-sede do então INPS. Fonte: http://www.infonet.com.br/cidade/antigas.asp. Acesso em 01/10/2009.

Figura 25: Vista aérea parcial de Aracaju nos anos 70.

À direita: o edifício do INPS (1), a Rodoviária (2) e o supermercado Paes Mendonça (3). Em segundo plano, o Edifício Estado de Sergipe (4), o mais alto da cidade. À esquerda, o Mercado Municipal (5). Fonte:

http://www.infonet.com.br/cidade/antigas.asp.Acesso em 01/10/2009.

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