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2 ESTADO E CIDADANIA NA SOCIEDADE CAPITALISTA

2.2 ESTADO-NAÇÃO E OS PAPEIS DO ESTADO CONTEMPORÂNEO

As origens do Estado moderno coincidem com as origens da sociedade burguesa no processo de transformação da sociedade feudal europeia e formação da sociedade capitalista. Nesse processo emerge a propriedade privada dos meios de produção, a divisão social do trabalho, as relações de exploração de produção e o Estado moderno. Nasce, conforme afirma Bobbio (2014, p. 74) “[...] o poder político, o Estado, cuja função é essencialmente a de manter o domínio de uma classe sobre a outra recorrendo inclusive à força, e assim a de impedir que a sociedade dividida em classes se transforme num estado de permanente anarquia”. Nascido no mesmo berço do capitalismo e articulado a ele, o Estado moderno se estabeleceu depois de um tenso e longo processo histórico de formação e transformação social que produziu as nações-Estados com soberania de um povo sobre um determinado território. Essa transformação é fruto de um longo processo dialético de correlação de forças na sociedade humana. Conforme descrito por Maquiavel (2010), esse processo de formação das nações-Estados, foi marcado por guerras de conquista, defesa e reorganização da soberania de territórios, morte e substituição dos mandatários (príncipes), superação dos exércitos particulares dos nobres e formação do exército estatal, atuação da Igreja nestas disputas de domínio, a relação e disputas entre nobres, príncipes, burgueses e súditos (trabalhadores), enfim, um tenso e intenso processo de lutas e transformações sociais que resultaram na definição de um poder capaz de organizar e controlar um povo em um determinado território em condições de reproduzir sua existência.

próxima, que ela tem uma função seletiva e de exclusão das crianças das classes pobres (BAUDELOT & ESTABLET, 1977; BOWLES & GINTIS, 1977; BIHR & PFEFFERKORN, 1995). Na função funcionalista (Durkheim, 1980; PARSONS, 1959), se falará antes, de funções de integração e de especialização da escola, a qual transmite uma cultura comum e saberes especializados que correspondem à organização funcional do mercado de trabalho. Outros autores (PETITAT, 1982; TOURAINE, 1973) acentuarão a dimensão produtiva da escola e sua capacidade de contribuir para a institucionalização de novas relações sociais. Pode-se também insistir na dimensão cultural e cognitiva da escola (YOUNG, 1971; FORQUIN, 1989), entendida como uma organização baseada na transmissão dos conhecimentos e dos modelos culturais”.

Segundo Sell e Silva (2006, p. 119-126), o lento processo de formação dos Estados absolutistas se dá com a separação da Igreja e do Estado, a centralização do exército, da administração financeira e do poder jurídico nas mãos do rei - limitando o poder dos senhores feudais com a unificação dos territórios dos feudos em questão. O poder adquirido pelos reis com a centralização do poder militar e o poder de cunhar moedas acelerou as possibilidades de formação e desenvolvimento da sociedade capitalista. Esse processo ocorreu no bojo da transformação econômica, cultural e política que marca a passagem da Idade Média para a Idade Moderna.

O uso da força militar é um dos elementos fortemente presente nos processos de emergência do Estado-nação. Segundo Trevisol (2007, p. 36-37), a partir do Tratado de Westphália de 1648, que resultou da “Guerra dos Trinta Anos” - dos príncipes soberanos contra a Igreja que detinha autoridade universal, o sistema internacional passou a reconhecer os “estados legalmente iguais”, com soberania sobre territórios e fronteiras definidos. “[...] o Estado começa a tornar-se a única autoridade política legítima a dispor do controle sobre um determinado território e sobre cidadãos que nele habita. Território e soberania mesclam-se [...]”. Surgem os Estados nacionais como entes políticos com “soberania interna e externa”, inclusive para o uso da força militar e de outros meios (jurídicos, políticos, econômicos, culturais etc) na afirmação dessa soberania.

Segundo Weber (2011, p. 73), o desenvolvimento do Estado moderno se dá em paralelo ao desenvolvimento da empresa capitalista. O príncipe expropria “[...] os poderes ‘privados’ independentes que, a par do seu, detêm força administrativa, isto é, todos os proprietários de meios de gestão, de recursos financeiros, de instrumentos militares e de quaisquer espécies de bens suscetíveis de utilização para fins de caráter político” e os reúne “em mão única” sob seu comando. Em paralelo, a empresa capitalista aos poucos domina os produtores independentes e os priva dos meios de produção. De ambos os processos surge o capitalismo e a ampliação da divisão social do trabalho e das relações de exploração na produção. Giddens (2009, p. 232), reafirma que “as origens do Estado moderno são também as origens da esfera da sociedade civil [...]” e destaca a importância dos “ambientes criados” – as cidades capitalistas nesse processo.24

24 Segundo Giddens (2009, p. 231-232), “[...] as nações-Estados são os novos recipientes de poder que

substituem as cidades. A transformação da relação cidade-campo mediante o surgimento de ‘ambientes criados’ – exemplificados pelo (mas não limitados ao) ‘meio ambiente construído’ do urbanismo moderno – é parte integrante da formação da nação-Estado. O caráter transmutado do espaço e do tempo é essencial para a formação política do Estado e para a ‘economia’ diferenciada. Esse processo de transmutação separa a contradição estrutural da existencial, e a primeira adquire agora primazia sobre a segunda. Em poucas

Segundo Sell e Silva, (2006, p. 126), depois de experimentado o Estado absolutista, outro longo caminho a humanidade percorreu até construir o Estado democrático de direito, a partir das revoluções burguesas (liberais): a inglesa – a gloriosa (1688-1689), a americana - da independência (1776) e a francesa (1789). Para Marx e Engels (1998, p. 42), a burguesia desempenhou um papel revolucionário na História: “onde quer que tenha conquistado poder, a burguesia destruiu as relações feudais, patriarcais e idílicas. [...] para só deixar subsistir, de homem para homem, o laço do frio interesse, as duras exigências do ‘pagamento a vista’”. Observam que cada etapa econômica vencida pela burguesia foi acompanhada de um correspondente processo político, alcançando a apropriação do Estado de tal forma que “o executivo no Estado moderno não é senão um comitê para gerir os negócios comuns de toda a classe burguesa”.25

Segundo Trevisol (2007, p. 37-38), “o nacional-estatal ganha contornos mais claros em meados do século XVIII, quando Estado e nação se mesclam. As revoluções Francesa e Americana põe fim ao Estado absolutista e a soberania monárquica e criam o Estado republicano e a soberania popular”. Nesse processo, “a nação se transforma na fonte de soberania do Estado; de pré-política, transforma-se numa característica constitutiva da identidade política dos sujeitos da comunidade democrática”. A constituição da soberania é o elemento essencial desse processo. Para Bobbio, Matteucci e Pasquino (2010, p.1.179), “[...] o conceito político jurídico de Soberania indica o poder de mando de última instância, numa sociedade política e, consequentemente, a diferença entre esta e as demais associações humanas em cuja organização não se encontra este poder supremo, exclusivo e não derivado”. Segundo Sell & Silva (2006, p.125), “a ideia de soberania implica a ideia de que o Estado (sistema político) deve comandar o sistema social (sociedade), ainda que a noção de que o Estado seja um instrumento dos indivíduos (liberalismo) organizados coletivamente (democracia) [...]”. Esses autores, resgatando Thomas Marshall, consideram que a conquista dos direitos civis (propriedade privada, livre iniciativa) significou a formação do ‘Estado de direito’; com a conquista dos direitos políticos (direito de votar e de ser votado, de participar de partidos políticos) surge o “Estado democrático”, juntando-se os dois, estruturou-se o

palavras, isso significa que a organização social humana deixa de ter qualquer simetria com a natureza; esta torna-se um meio para a expansão da produção”.

25 Para Marx e Engels (1998, p.41-42), “classe oprimida pelo despotismo feudal, associação armada e autônoma na comuna, aqui república urbana independente, ali terceiro estado tributário da monarquia; depois, durante o período manufatureiro, contrapeso da nobreza na monarquia feudal ou absoluta, base principal das grandes monarquias, a burguesia, com o estabelecimento da grande indústria e do mercado mundial, conquistou finalmente, a soberania política exclusiva do Estado representativo moderno”.

‘Estado democrático de direito’. Para Habermas (1995, p. 92), “o Estado constitucional é concebido como uma ordem política livremente estabelecida pela vontade do povo, de modo que os destinatários das normas legais podem, ao mesmo tempo, reconhecerem-se como os autores da lei”.

Estado-nação ou Estado nacional, que representa a unidade de povo, território e soberania, é o resultado desse longo processo histórico. É uma construção humana dialética que propiciou a condição de firmar a soberania de um povo-nação em um determinado território. Segundo Habermas (1995, p. 87-89), “[...] a sociedade mundial de hoje é politicamente composta de Estados-nação. Este fato não é de modo algum trivial. Tal tipo de histórico de Estado surgiu originalmente com as revoluções francesa e americana, difundindo- se depois por todo o mundo”, como revela o próprio nome - ‘Nações Unidas’. Seu sucesso decorre das “vantagens trazidas pelo Estado moderno” na “modernização social acelerada”. A difusão do Estado-nação se intensificou no século XIX, com a unificação da Itália e da Alemanha, a organização de outros Estados europeus no pós-guerra napolenônicas e a independência das colônias americanas; no século XX, com a descolonização da África no pós-guerra mundial.

Bobbio (2014, p. 95), aponta a questão do poder como essencial para a instituição do Estado.

Do ponto de vista de uma definição formal e instrumental, condição necessária e suficiente para que exista um Estado é que sobre um determinado território se tenha formado um poder em condição de tomar decisões e emanar os comandos correspondentes, vinculatórios para todos aqueles que vivem naquele território e efetivamente cumpridos pela grande maioria dos destinatários na maior parte dos casos em que a obediência é requisitada.

Para Weber (2011, p. 66-69, grifos do autor), o poder decorre do “monopólio do uso legítimo da violência física” que pertence ao Estado: “[...] devemos conceber o Estado contemporâneo como uma comunidade humana que, dentro dos limites de determinado território – a noção de território corresponde a um dos elementos essenciais do Estado – reivindica o monopólio do uso legítimo da violência física”. E acrescenta que “tal como todos os agrupamentos políticos que historicamente o precederam, o Estado consiste em uma relação de dominação do homem sobre o homem, fundada no instrumento da violência legítima (isto é, da violência considerada como legítima)”. Para esse autor, o que legitima a dominação e a obediência é a legitimidade da autoridade: “o Estado só pode existir, portanto, sob condição de que os homens dominados se submetam à autoridade continuamente

reivindicada pelos dominadores”. E coloca duas questões que precisam ser analisadas nessa dominação: “[...] em que condições se submetem eles e por quê? Em que justificações internas e em que meios externos se apoia essa dominação?”. Weber responde, que “existem em princípio [...] três razões internas que justificam a dominação, existindo, consequentemente, três fundamentos da legitimidade”, sendo eles: o poder ‘tradicional’, o poder ‘carismático’ e o poder da razão da ‘legalidade’” ou racional-legal.

Bobbio (2014, P. 93, grifos do autor), com base na teoria de Nikas Luhmann, afirma que “[..] a legitimidade é o efeito não da referência a valores mas da aplicação de certos procedimentos (Legitimität durch Verfahren), instituídos para produzir decisões vinculatórias, tais como as eleições políticas, o procedimento legislativo e o procedimento judiciário”. Essa legitimidade se fundamenta no fato dos sujeitos “dominados” participarem e fazerem parte do procedimento legal e dessa participação comprometer-se com a obediência à autoridade que emerge do seu resultado. Bobbio (2014, p. 91), pondera que “o debate sobre os critérios de legitimidade não tem apenas um valor doutrinal: ao problema da legitimidade está estritamente ligado o problema da obrigação política, à base do princípio de que a obediência é devida apenas ao comando do poder legítimo”.

Weber (2011, p. 70-71), observa que a dominação política, depende, de forma decisiva, “dos meios” para a efetivação da dominação: “[...] a dominação organizada necessita, por um lado, de um estado-maior administrativo e, por outro lado, necessita dos meios materiais de gestão”. Esse estado-maior administrativo, que é um representante externo, não funda a obediência ao detentor do poder político na legitimidade da dominação política, mas “[...] em duas espécies de motivo que se relacionam a interesses pessoais: retribuição material e prestígio social”. E é nesses interesses pessoais, de manutenção dessas vantagens, que o estado-maior administrativo firma solidariedade com os detentores do poder. Para Weber (2011, p. 71-74), ao passo que a empresa capitalista privou o trabalhador dos meios de produção no capitalismo, o Estado moderno, conseguiu ‘privar’ os trabalhadores do Estado dos meios de gestão (o trabalhador do estado-maior administrativo passa a ser um assalariado do Estado).

Para Lenin (2010, p. 50) “a burocracia e o exército permanentes são ‘parasitas’ da sociedade burguesa, parasitas engendrados pelos antagonismos internos que esfacelam essa sociedade, parasitas que tapam os poros da vida”. Para Althusser (1985, p. 63-107), o Estado deve ser tratado de “aparelho de Estado”, constituído do “aparelho repressivo do Estado” (exércitos, tribunais, polícias, prisões, etc) que “‘funciona através da violência’ – ao menos em situações limites” e dos “aparelhos ideológicos do Estado” (religião, escola, família,

sistema jurídico, sistema político, sindicatos, imprensa, artes, esportes, etc) entendidas como “instituições distintas e especializadas” que reproduzem a ideologia dominante. Segundo esse autor, na tradição marxista, o “Estado é uma ‘máquina’ de repressão que permite às classes dominantes [...] assegurar a sua dominação sobre a classe operária, para submetê-los ao processo de extorsão da mais valia (quer dizer, à exploração capitalista)”. O Estado só tem sentido em função do poder de Estado – em torno da manutenção da sua posse por uma classe ou por aliança de classes ou frações de classe.

Embora algumas pertinências nas elaborações de Althusser e Weber, concordamos com Poulantzas (1980, p. 130, grifos do autor), que o Estado capitalista não deve ser concebido nem como “coisa-instrumento” da concepção instrumentalista de Althusser, nem como “sujeito” da concepção Weberiana que acredita na autonomia do Estado como “instância racionalizante da sociedade civil”. O Estado capitalista deve ser visto, “[...] como aliás é o caso do ‘capital’, como uma relação, mais exatamente como a condensação material

de uma relação de forças entre classes e frações de classe, tal como ele expressa, de maneira sempre específica, no seio do Estado”. No esforço de contribuir com a teoria marxista de

Estado, Poulantzas (1980, p. 10 - 43), estabelece uma dura crítica para as duas concepções marxistas que não colocam o Estado no campo das relações de produção e da luta de classes. Critica a concepção instrumental que vê o Estado como um aparelho especial com “ossatura material própria” – um instrumento de “dominação política” a serviço da “ditadura da classe dominante”, que reduz “aparelho de Estado a poder de Estado”. Também critica a outra visão que vê uma “dupla natureza do Estado”, uma divisão entre o primeiro Estado, que seria um aparelho técnico-social ligado a estrutura econômica com certa separação das classes e de suas lutas, e um segundo Estado-poder - um superestado, que agregaria em si o primeiro para uma “utilização de classe do Estado”. Afirma que o Estado não age só de forma negativa, pelos aparelhos ideológicos e repressivos, é mais que isso, age também de forma positiva – “cria, transforma, realiza”, procura construir consenso. “[...] trabalhando para a hegemonia de classe, age no campo de equilíbrio instável do compromisso entre as classes dominantes e dominadas” (POULANTZAS, 1980, p. 29-30, grifo do autor).

Segundo Offe e Ronge (1984, p. 123, grifos do autor), “o Estado nem está a serviço nem é ‘instrumento’ de uma classe contra outra. Sua estrutura e atividade consistem na imposição e na garantia duradoura de regras que institucionalizam as relações de classe específicas de uma sociedade capitalista”. Para esses autores, “O Estado não defende os interesses particulares de uma classe, mas sim os interesses comuns de todos os membros de uma sociedade capitalista de classes”. Elaboram o conceito de Estado capitalista, referindo-

se a ele como uma “[...] forma institucional do poder público em sua relação com a produção material”, caracterizada por quatro determinações funcionais: a) a privatização da produção – diretamente na propriedade privada ou indiretamente na empresa estatal; b) a dependência dos impostos – que dependem da acumulação privada; c) a acumulação como ponto de referência – sem condições de fazer a acumulação capitalista pelo Estado, os detentores do poder de Estado tendem a garantir as condições que favoreçam a acumulação privada; d) a legitimação democrática: “[...] está sujeito a uma dupla determinação política: segundo sua forma institucional, este poder é determinado pelas regras do governo democrático-representativo; segundo o seu conteúdo, é determinado pelo desenvolvimento e pelos requisitos do processo de acumulação” (OFFE; RONGE, 1984, p. 123-125, grifos do autor).

O fato da funcionalização da soberania exige que o aparelho estatal assuma funções

de classe sob o pretexto da neutralidade de classe e invoque o álibi do universal

para o exercício do seu poder particular. [...] Daí resulta, como problema estrutural do Estado capitalista, que ele precisa simultaneamente praticar e tornar invisível o

seu caráter de classe” (OFFE E RONGE, 1984, p. 163, grifos do autor).

Para Poulantzas (1980, p. 188-189, grifo do autor), a reprodução da força de trabalho como estratégia política é o fio condutor das funções econômicas do Estado. “A reprodução da força de trabalho é uma estratégia política, pois trata-se sempre de uma reprodução da

divisão social do trabalho; os elementos político-ideológicos estão sempre constitutivamente

presentes nele”.

É preciso ter sempre isso em mente: toda uma série de medidas econômicas do Estado, muito particularmente as que se referem à reprodução ampliada da força de trabalho, lhe foram impostas pela luta das classes dominadas em torno do que se pode designar sob a noção, social e historicamente determinada, de ‘necessidades’ populares: da segurança social à política relativa ao desemprego e ao conjunto de domínios assinalados do consumo coletivo (POULANTZAS, 1980, p.188, grifo do autor).

Segundo Giddens (2009, p. 227-232), embora Estado e sociedade civil (mercado e coletividades), sejam interdependentes, o Estado capitalista é a “contradição estrutural” da sociedade capitalista. Essa contradição é constituída por uma “contradição primária”, que decorre do fato do Estado-nação diferenciar uma esfera pública da esfera privada da sociedade civil e por uma “contradição secundária”, que decorre do fato que a esfera pública do Estado-nação é de caráter nacional e a esfera privada da sociedade civil ser internacional – global. Essa contradição implica o espaço do público e do privado na relação público- privado na sociedade capitalista - na relação Estado-mercado e na relação Estado-

coletividades da sociedade civil. É a partir desse conceito de “contradição estrutural primária” que faremos a análise dos papeis do Estado capitalista contemporâneo. Em relação a contradição secundária, a relação é muito variável dependendo da combinação da política interna e externa do Estado-nação e da conjuntura internacional, fato que exige que o governante, ao governar o Estado-nação, não esqueça que o seu país não é uma ilha e que além da contradição primária, a contradição secundária também precisa ser observada e administrada. Entre outras questões importantes, a política monetária, a relação da moeda nacional com o padrão monetário internacional, especialmente o câmbio com a demais moedas nacionais e o fluxos econômicos são de alta relevância.

A partir do que já foi exposto acima, a partir de elementos das práticas políticas das experiências históricas, passamos a analisar como opera a contradição estrutural primária (Estado-coletividades da sociedade civil; Estado-mercado) nos diferentes modelos de Estado capitalista na sociedade capitalista contemporânea,

O Estado absolutista representa a história e as características do Estado moderno que embasou a formatação do Estado-nação e do Estado nacional contemporâneo. Praticamente se constituía em um Estado policial (exército e polícia) e fiscal - o suficiente para sua manutenção, que teve como contribuição histórica a formação do território e consolidação da soberania interna e externa, a formação do aparelho administrativo e a sustentação dos privilégios da nobreza em sua volta. No Estado absolutista, a contradição estrutural é total na relação Estado-coletividades da sociedade civil. O Estado absorve a totalidade da esfera política e inibe a organização e a ação das coletividades da sociedade civil. A contradição estrutural é baixa na relação Estado-mercado. A propriedade privada dos meios de produção, a livre iniciativa e as relações de produção de exploração são preservadas, com a presença dos negócios do soberano em paralelo aos do mercado, com baixa proteção ao trabalhador, baixa carga tributária e baixa oferta de políticas sociais. No Estado absolutista se inicia o processo de separação das finanças do soberano e da comunidade (do Estado) que se consolida no Estado liberal.

Junto com a emergência da burguesia no contexto das revoluções burguesas emergiu o Estado liberal que suplantou o Estado absolutista. A burguesia com o poder político e o poder de Estado passou a fortalecer o que lhe é mais sagrado – a propriedade privada, a livre

iniciativa, a divisão social do trabalho, as relações de produção de exploração e a livre acumulação do capital26.

O Estado liberal, teorizado por Locke no liberalismo político, tem em Smith (2007, p.17-26) a teorização do liberalismo econômico, que introduziu importantes conceitos como o de que “a riqueza das nações” é fruto do trabalho (da produção), superando o conceito

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