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ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO DA POBREZA

4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.5 ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO DA POBREZA

Em decorrência das implicações negativas das privações de consumo, os consumidores pobres desempenham estratégias de enfrentamento para sua pobreza relativa. Conforme Hill e Stephens (1997), essas estratégias podem ser emocionais ou comportamentais. E são empregadas com a finalidade de sobrevivência (HILL, 2002a). Nessa pesquisa as estratégias de enfrentamento da pobreza se mostram como resultados empíricos da pesquisa, essa dimensão surgiu no decorrer da pesquisa.

4.5.1 Emocional

Esse método de enfrentamento da pobreza é de natureza psicológica. Aqui os consumidores tentam alterar seu estado emocional, reorientando suas mentes em circunstâncias materiais mais agradáveis ou fantasias de melhores oportunidades de consumo no futuro (HILL, 2002a). Essa situação reflete a mesma encontrada na entrevista da Criança 16, em que ela conta em vários momentos que realizou a compra de itens que não possuir como foi afirmado pela sua responsável (16). Com isso, é possível compreender que a criança descreve momentos que ela idealiza e que gostaria de viver, mas que não são verdadeiros. No decorrer da entrevista a mesma criança (16) mostra que as coisas que ela conta estão apenas em seu pensamento, confirmando o que foi exposto por Hill (2002a). Outras crianças corroboram esse comportamento de enfrentamento emocional.

Eu fico pensando que eu vou trabalhar, vou fazer faculdade, vou ganhar meu dinheiro

e vou poder comprar essas coisas, eu penso que eu vou trabalhar numa lanchonete e vou estudar para veterinária (C06).

Quando eu vou dormir eu fico pensando que se eu tivesse muitos brinquedos eu ia

deles [...]quando eles combinam de ir para a casa de alguém jogar eles não me chamam porque eu não tenho os jogos, eles iam me chamar para tirar foto com eles de quando a gente tivesse jogando para botar no facebook [...] tem noite que eu até sonho (risos)

eu fico na minha cabeça pensando como era eu comprando essas coisas com minha avó (C08).

Eu fico pensando e digo a ela (Responsável 13) que um dia eu vou me formar e vou comprar uma casa pra gente morar e que vou poder comprar tudo o que a gente

precisa (C13).

Eu fico sonhando na minha cabeça como seria se eu tivesse tudo o que eu penso,

eu sonho que eu moro em uma casa grande com piscina e que eu tenho muitas roupas e um celular grande (risos) essas coisas ficam só no meu pensamento, mas um dia

eu vou ter (C16).

Eu fico pensando que seria legal ter as coisas que eu vejo nas lojas, as roupas que

eu queria ter, mas eu só fico olhando eu não peço não porque eles não podem comprar ai eu não posso ficar pedindo, eu já sei que nem sempre eles (pais) podem comprar [...] eu fico pensando eu comprando várias coisas, brinquedos, eu podendo

comprar tudo que eu queria (C23).

[...] ele (Criança 01) as vezes fala assim: ‘quando eu crescer eu vou estudar vou trabalhar vou comprar uma casa pra mainha’, outra pra mim fala que vai ser

policial depois que vai ser médico. Ele fala mais isso que vai trabalhar e que vai ajudar eu e a irmã dele (R01).

A estratégia de enfrentamento emocional também foi identificada quando algumas crianças contam o que pensam em relação ao seu futuro, elas idealizam que futuramente vão desempenhar esforços que as conduzirá a uma situação financeira desejável, como começar a trabalhar e concluir os estudos. Porém, durante a infância a criança é dependente de outras pessoas, elas são pobres porque nasceram em famílias pobres, então nessa fase da vida a criança não podem alterar suas condições financeiras e as condições de sua família (GUNN; DUNCAN, 1997).

4.5.2 Comportamental

Segundo Hill e Stephens (1997), a estratégia de enfretamento comportamental está associada às atividades legais e ilegais desempenhadas com a finalidade de adquirir o que se deseja.

[...] teve só uma toalhinha minha que sumiu [...] no ano passado quando minhas colegas ficam de castigo elas sempre escondiam as coisas das outras crianças, [...] só que nessa brincadeira tinha gente que ficava sem brinquedo porque os brinquedos

sumiam (C04).

[...] na escola já teve, a menina saiu aí outra menina chegou e abriu a bolsa dela e pegou o brinquedo dela, aí quando a menina chegou começaram a brigar porque a dona do brinquedo viu que ela pegou e ela foi dizer a professora e ela mandou

devolver, mas a menina que pegou disse que queria a boneca porque ela não tinha [...] ela queria a boneca e ficou chorando [...] (C05).

[...] eu estava assim de costas e minha bolsa tem um bolso de lápis aí teve um menino

que pegou meu lápis sem me pedir [...] acho que ele pegou porque ele não tinha um lápis daquele e queria [...] (C09).

[...] um menino que pegou o lanche de uma amiga minha, mas ele sempre pega lanche das pessoas, acho que ele pega porque ele não leva lanche (C23).

A partir das falas apresentadas, as crianças entrevistadas não confirmaram que já tinham praticado o furto, o que elas contam é que amigos próximos, geralmente da escola e que estão na mesma situação econômica praticam essas atividades. Outras afirmaram que foram vítimas da situação.

Outro aspecto apontado pelos entrevistados como forma de enfretamento da pobreza foi indicado pelos responsáveis 01 e 15.

[...] no aniversário dele (Criança 1) ele queria uma festa e eu não tinha condição de fazer ai eu fui tentar arrumar dinheiro para tentar fazer a festa dele, ai eu empenhei

com um agiota o meu cartão do bolsa família e fiz a festinha passei vários meses

sem meu cartão porque além do dinheiro que eu peguei ainda tinha os juros, mas fiz a festa e chamei os amigos dele (R01).

[...] para comprar a bicicleta que te falei fiz muito esforço, fiz um empréstimo pra comprar essa bicicleta pra ele (Criança 15) porque era um sonho, por meus filhos eu faço tudo, tô passando por aperto pra pagar, ainda tô pagando, mas vai dá certo (R15).

Jaiswal e Gupta (2015) explicam que consumidores pobres em decorrência de suas habilidades intelectuais limitadas muitas vezes são explorados por agiotas, como foi caso da Responsável 01 que conseguiu empréstimo de forma ilegal, entregando o cartão do bolsa família como forma de garantia pelo pagamento da dívida, para que pudesse realizar a festa de aniversário para seu filho (Criança 01).

Quanto à Responsável 15, diante das condições financeiras precárias, realizou um empréstimo para que pudesse comprar a bicicleta da Criança 15. Ela explicou que o empréstimo foi necessário porque não tinha crédito na loja para comprar a bicicleta parcelada e que no banco o empréstimo foi conseguido sem dificuldades. Essa colocação da Responsável 15 vem ao encontro do que foi demostrado por Jaiswal e Gupta (2015) que consumidores pobres têm facilmente condições de crédito no mercado, porém a juros altos. Essa situação pode ser agravada por incapacidade de saldar empréstimos e, consequentemente, endividamento.

Após os resultados empíricos da pesquisa, com o surgimento de uma nova dimensão, estratégia de enfrentamento da pobreza e suas categorias: emocional e comportamental elaboramos o modelo empírico da pesquisa.

FIGURA 14 - Modelo empírico da pesquisa.

FONTE: Elaboração própria (2016).

Essa dimensão que surgiu na fase empírica da pesquisa, já era abordada por Hill e Stephens (1997), os autores explicam que as estratégias de enfrentamento da pobreza podem ser de duas formas: (1) emocional em que pessoas tentam direcionar seu estado emocional, reorientando suas mentes em circunstâncias materiais mais agradáveis ou fantasias de melhores oportunidades de consumo no futuro; e (2) comportamental como se desempenhar atividades legais e ilegais com o propósito de adquirir renda ou produtos desejados (HILL; STEPHENS, 1997, HILL, 2002a). Assim, essa pesquisa confirma o modelo dos autores Hill e Stephens (1997) abordado na revisão da literatura.

PO

BRE

Z

A REL

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VA