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Estratégias e métodos de recolha de informação

CAPITULO II METODOLOGIA DO ESTUDO EMPÍRICO

1. TRAJETÓRIA METODOLÓGICA

1.3. Estratégias e métodos de recolha de informação

“A grandeza de um ser humano não está no quanto ele sabe, mas no quanto ele tem consciência que não sabe”

(Cury, Augusto, 2007)

A recolha de informação necessária para realizar esta pesquisa foi feita em dois momentos. Começamos por fazer a análise da estrutura curricular do curso com base no plano de estudos do curso de licenciatura em enfermagem da referida escola e em documentos disponíveis online, no sítio da instituição. Seguiu-se a recolha de informação junto da população alvo, através da técnica de entrevista semiestrururada com o objetivo de obter os testemunhos dos participantes.

A entrevista semidiretiva, ou semiestruturada é uma técnica muito utilizada no campo das Ciências Sociais e Humanas (Bardin, 2004 e Ghiglione & Matalon, 2001) e que facilita o acesso à opinião de cada participante sobre o assunto em estudo, permitindo ao investigador posteriormente, mediante o leque de informações obtidas, elaborar uma visão panorâmica da problemática da pesquisa. Se por um lado, com a técnica da entrevista se pretende informação sobre a realidade, por outro, procura-se conhecer algo sobre os quadros conceptuais dos elementos constituintes desses processos. A entrevista tem como vantagem poder explorar e esclarecer as posições dos intervenientes ao longo do desenrolar do discurso, algo que não é possível com o uso de questionários. A possibilidade de se poder estar frente a frente com a pessoa, proporciona maior envolvimento do interlocutor. No entanto este frente a frente com o investigador pode acarretar algumas desvantagens, como inibição e não permitir que o entrevistado estruture o seu pensamento em torno do objeto perspetivado.

A técnica da entrevista semiestruturada na opinião de Afonso (2005) situa-se num formato intermédio entre a entrevista estruturada e a não estruturada. Sendo estas geralmente conduzidas a partir de um guia orientador. O guião foi construído a partir das questões da pesquisa e eixos de análise do projeto de investigação. A sua estrutura tem um carater matricial organizada por objetivos, questões, itens ou tópicos. A cada questão podem corresponder vários itens ou tópicos que foram utilizados na gestão do discurso do entrevistado. “As perguntas fechadas devem ser utilizadas apenas quando for necessário clarificar detalhes do discurso do entrevistado” (Afonso, 2005, p. 99). Idêntica opinião é partilhada por Turato (2010) ao referir que o entrevistador introduz o

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tópico e depois guia a discussão para perguntar coisas específicas, em que partes da entrevista assumem características mais estruturadas, se o entrevistador pretende obter detalhes, exemplos ou contextos, e partes menos estruturadas, quando o entrevistado explica uma ideia, um evento ou a sua experiência.

Optou-se pela realização de entrevistas semidiretivas, por ser a técnica mais adequada para “aprofundar um determinado domínio, ou verificar a evolução de um domínio já conhecido” (Ghiglione & Matalon, 2001, p. 89). A entrevista semidirigida, tem como objetivos, entre outros, o de “organizar, de estruturar o pensamento” e que “ as questões abordadas com o respondente permitam uma exploração aprofundada de certos temas” (Gauthier, 2003, p. 285).

As entrevistas podem ser classificadas de diferentes formas, Hébert, Goyette e Boutin (2005) sugerem duas grandes categorias: as orientadas para a resposta e as orientadas para a informação. Utilizamos a última que de acordo com os autores “(…) visa circunscrever a perceção e o ponto de vista de uma pessoa ou de um grupo de pessoas numa dada situação. Aqui, o processo pode ser mais ou menos estruturado mas, neste caso é o entrevistado que impõe o grau de estruturação” (p. 162). Este instrumento possibilita ao entrevistado a liberdade para expor as suas perceções, sem estar limitado a responder de acordo com perguntas estruturadas, mas por meio de um roteiro pré- estabelecido. “Esta técnica tem a capacidade de facilitar o afloramento de dados corrigidos de afetividade e emoção” (Barros & Lehfeld, 2003, p. 82).

Para nortear a recolha de informação, elaboramos algumas proposições ou questões orientadoras da pesquisa, e que constituíram o guião das entrevistas semiestruturadas dirigidas aos três grupos de participantes e que se encontram no Apêndice I. Este guião foi organizado em torno de cinco grupos de questões. A primeira parte destinava-se à caracterização das variáveis sociodemográficas dos entrevistados. As variáveis, sexo, idade, estado civil, nacionalidade e experiência de cuidar em fim de vida são comuns aos três grupos de participantes. Aos profissionais foram avaliadas: as habilitações; a escola onde obtiveram o diploma de enfermeiro; o tempo de serviço como enfermeiro, como docente, ou como tutor de estudantes; o local de trabalho, departamento da escola no caso dos docentes, o serviço, ou instituição de saúde, no caso dos enfermeiros. A segunda parte avaliava a perceção da morte pelo participante e a representação que têm do fenómeno. A terceira parte caraterizava a preparação para o cuidar em fim de vida e as dificuldades sentidas no processo de aprendizagem. A quarta debruçava-se sobre a

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sua contribuição no processo formativo, como docente ou tutor das práticas. Os estudantes não foram questionados sobre este aspeto, sendo solicitado comentários ou sugestões para melhorar o processo formativo. A quinta parte perspetiva as competências que consideram necessárias desenvolver quer para cuidar do moribundo, quer da família. No final, para além dos agradecimentos, reiterava-se o pedido sobre a autorização de prosseguir com o material recolhido e de validar a entrevista depois de transcrita.

As entrevistas destinam-se a obter “a compreensão geral das perspetivas sobre o tópico” (Bogdan & Biklen, 1994, p. 136). Pretende-se estar atento às ideias dos participantes de modo a descrever opiniões, dificuldades e sugestões que nos possibilite fazer uma interpretação e análise da problemática investigada.

Para validar a compreensão das questões, a sua lógica e sequência foram feitas três entrevistas prévias, uma em cada grupo de participantes. Foi possível melhorar a estrutura de algumas questões e sempre que necessário clarifica-las com o entrevistado. Foi, por vezes, necessário clarificar se a aprendizagem dos profissionais em relação à morte ocorreu de forma acidental (efeito perlocucionário) ou fez parte de uma formação em enfermagem. Contudo não foi possível estimar um tempo de demora média, visto que a duração dependia do envolvimento e das experiências do participante, seguindo o entrevistador o princípio da não interrupção.

As entrevistas foram todas realizadas pela pesquisadora que seguiu as recomendações de Afonso (2005, p. 99) “Durante a entrevista é necessário saber ouvir, não interromper a linha de pensamento do entrevistado, aceitando as pausas, e, em geral, aceitar tudo o que é dito numa atitude de neutralidade atenta e empática”.

Nos procedimentos de recolha, tratamento e análise da informação tivemos em conta, entre outros, os seguintes procedimentos éticos, que passamos a descrever.

Foi apresentado e aprovado o projeto ao Conselho Cientifico do Instituto de Educação da Universidade de Lisboa. Na data do pedido ainda não havia comissão ética na referida escola de enfermagem, pelo que foi solicitada autorização prévia para realizar as entrevistas ao Conselho Técnico Cientifico, que autorizou, conforme Apêndice II. Estas só se realizaram após prévio contacto com os destinatários, em que foram informados dos objetivos e âmbito da pesquisa. Caso aceitassem participar foi marcada a data, hora e local da entrevista. Decorrem nas instalações da referida Escola, no 2º

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semestre do ano letivo 2010-11 em gabinetes, ou salas de reuniões, sendo previamente informadas a telefonista e a rececionista que durante aquele período deveriam evitar passar chamadas telefónicas, e evitar o uso da referida sala por terceiros de modo a não perturbar o ambiente. Como salienta Turato (2010) as entrevistas devem ser planeadas de acordo com a conveniência e horário do entrevistado, bem como em locais onde não haja imprevistos, com entradas súbitas de terceiros, ou chamadas telefónicas constantes. O uso de um recinto reservado para a entrevista cria um setting ideal para manter a privacidade da relação, sendo este um cuidado essencial para manter uma conversa isenta de interferências.

No momento que antecedeu a entrevista foi explicado o objetivo do estudo, esclarecidas eventuais dúvidas, obtido o consentimento informado por escrito e a autorização para a gravação (Apêndice II). Foi assegurado o direito à recusa em qualquer das fases da prossecução da recolha de material. Houve situações em que alguns entrevistados informaram que não gostariam que um conteúdo, ou frase, figurasse na entrevista, por, na sua opinião, terem sido acutilantes, ou pouco refletidos, pelo que na sua presença foi removido esse excerto da gravação. Os conteúdos transcritos foram reencaminhados aos participantes para reapreciarem o material fornecido.

Foi garantido o anonimato e a confidencialidade dos resultados obtidos. “As referências aos dados da investigação em reuniões científicas, em aulas ou em publicações, não podem, em caso algum, colocar em causa a confidencialidade dos resultados” (Almeida & Freire 2003, p. 218). Devendo esta condição ser devidamente acautelada, como salientam os autores, nas situações em que o investigador pode ter alguma ascendência sobre os próprios sujeitos. “(…) Podemos ilustrar esta situação quando o investigador profissional recorre aos trabalhadores da sua empresa, aos estudantes da sua universidade, ou aos sujeitos internados na sua clínica” (2003, p. 217).

Tivemos em conta as considerações de Turato (2010) ao salientar que é melhor não entrevistar os nossos clientes, porém se tal não pode ser evitado, deve ser-lhe dada a permissão para dizer o que realmente pensam, e não devem ser corrigids se disserem coisas que os entrevistadores consideram erradas. O autor recorda que alguns informantes são mais prolixos que outros, sendo vital que os entrevistadores, nesta situação, mantenham um certo controlo sobre o rumo da entrevista.

Para manter o anonimato dos conteúdos expressos por cada participante, mencionaremos o referido conteúdo em itálico, acrescido dos códigos E1, E2, E3, En

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para os estudantes; D1, D2, D3, Dn, para as entrevistas dos docentes; o código T1; T2, T3, Tn, para os profissionais de enfermagem, que neste contexto do estudo, são tutores do ensino clinico. Deste modo pretende-se assinalar a quem pertence o registo, sem permitir identificar qualquer dos entrevistados. Quando a opinião é comum a todos, referimos os participantes; se é idêntica nos docentes e tutores, relatamos os profissionais, para distinguir dos estudantes, que ainda o não são.

As entrevistas foram gravadas em sistema áudio MP3, como recomenda Turato (2010, p. 340) “o que deixa o entrevistador livre para prestar toda a atenção à pessoa do entrevistado”. O uso deste dispositivo permitiu registar fielmente todas as palavras, frases, entoações de voz, todo o conteúdo e forma de falar do entrevistado. Gravar facilita a posterior transcrição das entrevistas de modo a poderem ser ouvidas, lidas, analisadas e submetidas a análise de conteúdo. Estas tiveram durações variáveis que oscilaram entre os 30 minutos e os 90 minutos, sendo em média, as dos estudantes mais curtas e as dos docentes as mais longas.

Refletindo sobre o papel do investigador, nesta etapa, este deve ter adquirido competências de conversação, mas também deve ser um ouvinte atento e sensível capaz de estabelecer com os participantes uma relação de confiança e compreensão ao mesmo tempo que consegue demonstrar respeito pelas perspetivas e conceções destes (Bogdan & Biklen, 1994).

O início da entrevista fez-se através de uma reapresentação mútua do entrevistador e do entrevistado, de forma mais detalhada e afetiva com a intenção de estabelecer o raport, seguida da explicação detalhada dos objetivos da mesma. O raport pode ser definido como “um sentimento consciente de acordo, simpatia, confiança e responsabilidade mutua entre uma pessoa e outra” (Campbell, 1996, p. 607).

Sendo entrevistas semiestruturadas estas foram realizadas não com uma sequência rígida, exatamente como consta no guião, mas com alguma flexibilidade de modo a respeitar a forma como cada entrevistado elaborava o seu discurso em torno do tema proposto. Depois de introduzir cada bloco temático e formulada a primeira questão os participantes expressavam livremente as suas opiniões, limitando a intervenção do entrevistador ao estritamente necessário, ou para solicitar que clarificassem a ideia, ou conduzir o discurso para retomarem ao tema.

Os participantes puderam falar de acordo com a livre associação de ideias, o que consiste em “exprimir indiscriminadamente os pensamentos que ocorrem ao espirito, a

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partir de um elemento dado, ou de uma questão posta pelo entrevistador” (Turato, 2010, p. 315). Esta flexibilidade permitiu que se verificassem duas situações que não foram esperadas, mas que constituíram um desafio para a pesquisadora. A primeira foi a situação do ‘transcurso diferente’ que consiste na prossecução da entrevista por uma ordem diferente da que estava planeada pelo entrevistador, enquanto mentor do guião, podendo o participante falar, por sua iniciativa sobre um tópico antes que este lhe seja perguntado. Outra situação foi o aparecimento de um ‘tópico novo’ em que “questões não previstas inicialmente no guião, podem ser verbalizadas pelo informante e ser de grande valor para serem trabalhadas no conjunto do estudo” (Turato, 2010, p. 315). O uso da metodologia qualitativa permite entender o modo como os participantes descrevem e interpretam os fenómenos. A descrição narrativa do entrevistado possibilita a compreensão das representações, dificuldades, atitudes, significados e preferências dos sujeitos sobre determinados acontecimentos, sendo este material constituindo maioritariamente de entrevistas ou outros documentos pessoais (Bogdan & Biklen, 1994).

Sabemos que os estudos qualitativos não pretendem obter a objetividade, o que não significa que o investigador possa negligenciar o rigor dos processos de análise e das conclusões a formular. Na tentativa de obter uma compreensão mais profunda do fenómeno em estudo, Seale (1999), sugere que se tenha em conta a opinião dos participantes, ou seja, se procure validar a informação obtida de modo a aumentar a credibilidade da investigação, sem no entanto a garantir. Este procedimento pode permitir obter dados adicionais de suporte a determinados aspetos, mas tem de ser usado com precaução, salienta o autor. Aos que aceitaram a sugestão foi devolvida a entrevista transcrita, por email, e pedido que a validassem, tendo alguns alterado a estrutura das frases, melhorado a redação e as expressões linguísticas de modo a aprimorar o discurso, inicialmente oral, para a estética da linguagem escrita, sem contudo adulterar ou suprimir a informação anterior resultante da oralidade.

Ao devolver a transcrição da entrevista para o participante conferir, acrescentar, ou subtrair mensagens, há o risco, como salienta Turato (2010, p. 390) de “o entrevistado afastar-se mais de ser sujeito, tornando-se mais pessoa, ou persona, aquele que se esconde por de traz das mascaras”. Isto é, pode utilizar mecanismos de defesa egoicos. Em síntese no procedimento de recolha de informação através de entrevistas seguimos as etapas recomendadas por Turato (2010) que orienta neste sentido: conhecer o ambiente e o contexto dos participantes, fazer entrevistas preliminares e rearranjo das

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questões a colocar no guião, selecionar e convidar os participantes, marcar as entrevistas, reservar e marcar um espaço para a entrevista, estabelecer o rapport no início da entrevista, explicar o termo de consentimento, recolher os elementos de identificação pessoal, colocar paulatinamente as questões do guião da entrevista, auto observar o decurso da entrevista e mostrar disponibilidade do entrevistador pós entrevista.

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