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3 CAMPO EMPÍRICO

3.2 Contextualizando o campo empírico

3.2.2 Estrutura e funcionamento do Iterra, IEJC e Ipe Campo

Como foi dito anteriormente, o Iterra, o IEJC e o Ipe-Campo compartilham de um mesmo espaço físico em Veranópolis (RS) e comungam do mesmo regime de funcionamento. Portanto, para simplificar a apresentação das mesmas, a partir deste ponto será citada a estrutura física e o funcionamento do Iterra, pois explicando a estrutura e funcionamento desta instituição, que se estende, para efeitos de caracterização desse campo empírico, às demais.

O prédio do antigo Seminário com o qual o Iterra possui o contrato de comodato possui 04 pavimentos, totalizando uma área de 4.438,30m2. No térreo ficam localizados: recepção, escritórios, lavanderia, rádio comunitária, ciranda infantil, panifício, almoxarifado e a agroindústria Terras & Frutos. No primeiro andar estão: secretaria, biblioteca, sala de professores, cozinha, refeitório e salas do setor pedagógico. Já no segundo andar serão encontrados: salão de atos e alojamento de educadores, outros trabalhadores e estudantes. No terceiro e último andar estão as três salas de aula, a parte principal de alojamento de estudantes, sala de vídeo, laboratórios (física, química, didática e informática) e salas de estudo e/ou outras atividades.

Figura 6 – Vista parcial do Iterra: entrada principal

Fonte: Pesquisa de campo (2015).

O Iterra, mantenedor da primeira escola de âmbito nacional do MST, desde sua origem vem sendo referência da Pedagogia do Movimento, como define Caldart (2012).

Dentre os princípios pedagógicos da educação no MST, destaca-se a centralidade do trabalho como princípio educativo, na qual a categoria trabalho é entendida como uma relação do ser humano com a natureza, transformando-a e sendo, nesse processo, transformado.

Na perspectiva da superação das relações sociais capitalistas e no seio de suas contradições, Marx apud Frigotto (2012) sinaliza três conceitos relativos à formação: trabalho como princípio educativo, formação humana omnilateral e educação politécnica (FRIGOTTO, 2012).

O TRABALHO COMO PRINCÍPIO EDUCATIVO, ligado ao processo de socialização e de construção do caráter e da personalidade do homem

novo, que internaliza, desde a infância, a sua condição de ser da natureza e

que, portanto, implica produzir, com os outros seres humanos, seus meios de vida e não viver da expropriação do trabalho de seus semelhantes; a

formação humana omnilateral (ver EDUCAÇÃO OMNILATERAL), ligada ao

desenvolvimento de todas as dimensões e faculdades humanas, em contraposição à visão unidimensional de educar e formar para os valores e conhecimentos úteis ao mercado capitalista; e, finalmente, o de EDUCAÇÃO POLITÉCNICA ou tecnológica, ligada ao desenvolvimento das

bases de conhecimentos que se vinculam ao processo de produção e reprodução da vida humana pelo trabalho, na perspectiva de abreviar o tempo gasto para responder às necessidades [...] e de ampliar o tempo livre (tempo de escolha, de fruição, de lúdico e de atividade humana criativa), no qual a omnilateralidade pode efetivamente se desenvolver (FRIGOTTO, 2012, p. 274 - 275, grifos do autor).

É a partir desta referência teórica, em diálogo com outras áreas do conhecimento, que o Iterra tem se inspirado na sua forma escolar. Esta possui em sua “engenharia” alguns traços de sua configuração, elencados por Caldart et al. (2013): cursos organizados em alternância entre Tempo Escola e Tempo Comunidade; estudantes vinculados a movimentos sociais; tempos educativos; estrutura de gestão em que todos decidem; trabalho organizado para todos; organização de estudo para além do ensino e avaliação de diferentes dimensões (CALDART et al., 2013).

Quando se vivencia o Iterra, seja quanto tempo for, uma característica que fica marcada é a organização do tempo e tarefas na escola. Ao soar a sirene, todos sabem o que fazer, para onde ir. A consciência dos estudantes de saber o seu papel nessa engrenagem é perceptível, ao se observar o cotidiano escolar. Para isso, a primeira tarefa, quando da chegada dos estudantes, é apresentar todos os espaços e regras e convidá-los a se organizarem em Núcleos de Base, similares aos núcleos formados pelas famílias assentadas nos assentamentos “nucleados”.18

Em cada núcleo escolhe-se um coordenador e uma coordenadora para contribuir na gestão das atividades do grupo. Com base em Caldart et al. (2013), serão apresentadas algumas dessas atividades, denominadas Tempos Educativos, dentre as quais estão: Tempo Formatura, Trabalho e Aula (tempos diários); Tempo Núcleo de Base, Notícias, Educação Física, Leitura, Oficina e Cultura (alternados ao longo da semana).

a) Tempo Formatura – momento após café da manhã para conferência dos estudantes, relatos do dia anterior, informes do dia, realização de mística19 e hino (pode ser o Hino Nacional Brasileiro, o hino da

18

“A criação dos Núcleos de Base no acampamento/assentamento também chamada de nucleação consiste em organizar as famílias, de acordo com sua proximidade, parentesco ou outros aspectos que as próprias famílias julgarem importantes, e que cada grupo seja composto de aproximadamente 10 famílias” (MELO, p.62, 2007).

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“A mística é algo que mobiliza as pessoas em torno de algo, que busca manter uma ‘chama viva’ nos integrantes do MST. Materializa-se na realização de rituais que relembre grandes lutadores, fatos históricos, embates, obstáculos a vencer e mostre a esperança de mudança na sociedade. A mística objetiva [...] busca unir os assentados nas ações, ideias e sentimentos” (MENEZES NETO,

Internacional ou o hino do MST);

b) Tempo Trabalho – através da organização da divisão social do trabalho entre estudantes, professores e outros trabalhadores, considerando as habilidades e a vontade de aprender coisas novas, toda a estrutura da escola é gerida nessa teia de solidariedade diária;

c) Tempo Aula – momento diário de estudo dos componentes curriculares, conforme cronograma de aulas;

d) Tempo Núcleo de Base – reuniões por núcleo para contribuições na gestão da escola, como também para estudo de temas de formação política previstos no projeto metodológico. Ocorre três vezes por semana; e) Tempo Notícias – ocorre duas vezes por semana para acompanhamento

de noticiários por diversos meios (impresso, televisionado, etc.) e debate acerca das informações obtidas;

f) Tempo Educação Física – tempo destinado a atividades físicas, que ocorre uma ou duas vezes por semana;

g) Tempo Leitura – tem por objetivo constituir disciplina e gosto pela leitura. Pode ser realizada individualmente ou por grupos, a depender do planejamento para esta atividade;

h) Tempo Oficina – tempo destinado a habilidades específicas em cada Posto de Trabalho da escola. São oficinas de capacitação;

i) Tempo Cultura – acontece uma vez por semana, geralmente aos sábados à noite. Tem como objetivos a integração, reflexão e cultivo das mais variadas expressões culturais. Neste tempo também se realiza a chamada Jornada Socialista, para sensibilização e reflexão acerca de algum fato histórico ou tema da contemporaneidade.

2003, p.66).

Figura 7 – Resultado de oficina de arte com sementes (TAC - turma 14)

Fonte: Pesquisa de campo (2015).

Detalhe do

quadro

Figura 8 – Tempo Cultura no Iterra

Fonte: Pesquisa de campo (2015).

Menezes Neto (2003), nas considerações finais acerca de sua pesquisa sobre o TAC, afirma que o ensino médio no Brasil não prepara as classes populares nem para o vestibular nem para o mercado de trabalho, mas a proposta do TAC vincula a formação teórica crítica ao trabalho produtivo, além de enfatizar a cultura e as artes.

Todas essas atividades, dentre outras, visto que as mesmas podem ser alteradas, suprimidas, acrescidas, de acordo com a demanda escolar, são realizadas por todas as turmas, professores e demais trabalhadores. Dessa forma, fica ressaltado que os egressos do curso TAC passaram, de uma maneira ou outra, por essa experiência dos tempos educativos.