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Na Introdução desta tese, apresento o objetivo, hipótese, justificativas, universo de pesquisa e fundamentação teórica. Tento demonstrar a importância de se perceber como os remanescentes de quilombos da Colônia do Paiol, ao contrário do que se pensa, não são um grupo isolado, mas esteve sempre em movimento, para dentro e para fora, mantendo contato com Juiz de Fora e povoados vizinhos desde sua fundação, devido à necessidade de auto- manutenção. Esse constante contato com os de fora possibilita a seus membros uma troca de experiência que enriquece o grupo, fazendo com que eles adquiram certas estratégias para se defenderem diante das dificuldades.

No Capitulo I, que tem como título “Um olhar para a escravidão”, faço uma abordagem histórica sobre o tráfico negreiro, indicando a posição de alguns estudiosos com relação à quantidade de negros que entraram no Brasil durante o período da escravidão. As cifras aí apresentadas nos indicam que o Brasil foi o país das Américas que mais recebeu negros africanos como escravos. Analiso historicamente as origens étnicas dos negros que vieram para o Brasil, e que contribuíram na construção da cultura brasileira. Tomo Minas Gerais, Estado onde estão meus sujeitos de pesquisa, como paradigma da escravidão no Brasil. Este Estado recebeu um grande número de negros, de origens diversas, que enriqueceram, com seus trabalhos e costumes, os povoados e vilas que surgiram em Minas Gerais, na época do ouro. A descoberta do ouro provocou um grande deslocamento de negros para estas terras para, num primeiro momento trabalharem na mineração do ouro e, depois, do diamante. Era grande também o número de escravos que trabalhavam nas famílias, no comércio e em outras atividades. Somente no final do século XVIII, com a queda da mineração, é que este forte contingente de escravos vai ser transferido para as fazendas e grandes plantações, especialmente para o café, na Zona da Mata mineira.

No Capítulo II, cujo titulo é “Em busca da liberdade”, faço uma análise das condições em que se davam as alforrias em Minas Gerais e a sua importância para o escravo. Ser forro era o sonho de todos aqueles que se curvavam sob o jugo da escravidão. O escravo procurava negociar com seu senhor maneiras diversas para alcançar a liberdade. Havia aqueles que

ficavam livres por serem filhos dos senhores com suas escravas e aqueles que recebiam a liberdade já na pia batismal. Porém, o mais comum era o escravo acumular seu pecúlio para comprar, ele mesmo, sua alforria. Um segundo caminho para se buscar essa liberdade eram as fugas. Elas eram inerentes ao sistema da escravidão. Onde havia a escravidão as fugas faziam parte do cotidiano desse sistema. Tento mostrar em que condições o escravo fugia, para onde fugia. E se havia fuga, havia também mecanismos, desenvolvidos pela sociedade repressora, para captura do escravo evadido. Tento explicar esses tipos de mecanismos, as torturas a que os escravos eram submetidos quando capturados. Geralmente, o escravo fugia para conquistar um novo espaço onde ele pudesse se sentir livre, mesmo se fosse por alguns dias, semanas, meses, anos e em alguns casos, quando a fuga dava certo, para sempre. Os quilombos eram o saldo das fugas. Por essa razão, faço também uma análise das condições em que se dava a formação de quilombos no Brasil. São apresentados a etimologia da palavra quilombo, os tipos de quilombos que se formaram nas diferentes regiões do país, suas peculiaridades, os meios de sobrevivência e mecanismos de defesa, nessa sociedade em que eram vigiados por todos os lados.

Trabalho também a organização dos quilombolas e seu convívio social com os livres. Os quilombos na terra do ouro eram diferentes de outros quilombos no Brasil. Eram urbanos, na sua maioria. Os quilombolas viviam da cata do ouro ou diamante, do comércio clandestino, da lavoura e de assaltos às casas de senhores e a viajantes. Neste contexto, o papel da mulher negra,

escrava ou forra, foi fundamental para a manutenção dos quilombos. Destaco aqui as chamadas negras de tabuleiros. Faziam um comércio intinerante. Levavam informações de um quilombo para o outro, faziam contato dos comerciantes (compradores clandestinos de ouro ou diamantes) com quilombolas, comunicavam aos quilombolas sobre um possível ataque ao seu quilombo. Eram bem informadas, solidárias, mas ao mesmo tempo odiadas e perseguidas pelo sistema, devido à sua influência naquela sociedade. As autoridades da época consumiam suas energias para controlar a proliferação desses “enclaves negros” dentro da capitania. Foram muitas as medidas tomadas contra os quilombos em Minas Gerais. Os documentos, pesquisados por mim, no Arquivo Público Mineiro, comprovam essa afirmação. As queixas contra os quilombos eram muitas. Daí a necessidade de se programar políticas públicas no combate a eles, especialmente com o emprego dos capitães do mato e dos ataques por parte de tropas do governo. Nesse contexto, os meios de comunicacão da época exerciam um tipo de controle social na fuga do escravo e na denúncia da existência de quilombos em algum lugar da província. No caso da Zona da Mata Mineira, especialmente na região de Juiz de Fora, esse mecanismo de controle da fuga de escravos era feito pelo Jornal “ O Pharol”.

No terceiro e último capítulo, “O passeio dos quilombolas e a formação do quilombo urbano”, trabalho os depoimentos dos moradores da Colônia do Paiol, Bias Forte e Juiz de Fora. Cruzo os dados etnográficos da fala de meus narradores. Através de suas narrativas, tento analisar como e em que

condições se dá a sua migração para Juiz de Fora e a recriação de sua identidade cultural nesse novo espaço urbano. Para esses remanescentes de quilombos, sair do espaço tradicional provoca mudanças na sua vida e na vida da comunidade deixada para trás. Através do esforço de lembrar, meus informantes comparam a vida passada com a vida de hoje. Constatam que muitas coisas mudaram para melhor, em termos de aquisição de bens, porém, sentem que a vida já não é mais a mesma. Os jovens são diferentes e não respeitam mais a tradição dos antepassados. Tento trabalhar aí o conflito entre as gerações, que na realidade não é um fato negativo para a comunidade. Pelo contrário, o choque entre o antigo e o novo mostra a dinamicidade cultural em que imbricam-se elementos do passado e da vida moderna.

Para a elaboração desse trabalho foram pesquisadas diversas fontes. Dentre o material impresso, foram pesquisados livros, artigos de periódicos, resumos de congressos e arquivos históricos públicos, como os de Barbacena, Juiz de Fora e Belo Horizonte. Foram pesquisados também documentos eletrônicos, pela Internet. Uma outra fonte de dados importantíssima para a elaboração dos trabalhos é a resultante de entrevistas realizadas com remanescentes dos quilombos e com indivíduos não-negros, habitantes de Bias Fortes.

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