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RESULTADOS: ASPECTOS PSICOLÓGICOS E ESTRUTURA DE PERSONALIDADE DE CRIMINOSOS SEXUAIS

4.2 Estudos de caso

4.2.2 Estudo de Caso 2: Rogério, o super-herói carrasco

“[...] acho que esse aqui eu colocaria ele o carrasco do mundo. Ele é feio pra caramba, parece que está com dois chicotes na mão é pra maltratar os outros [...]”

(Prancha IV)

“[...] um super herói passando aqui entre um bocado de monstro, ele sozinho voando aqui [...]” (prancha X).

4.2.2.1 História de vida e criminal

Rogério tem 25 anos, e é o filho do meio de três irmãos homens. Sempre morou com os pais e provém de uma família de classe baixa. Seus pais são evangélicos e, além disso, seu pai é pastor e funcionário público. Dentro de casa, costumava respeitar seus pais e ajudava sua mãe nas tarefas domésticas. Ele diz que sua família é muito unida e que o clima em casa é muito bom, pois todos sempre foram tratados de forma igual. Mesmo após a prisão, o relacionamento familiar continuou bom, principalmente devido ao contato constante com seus familiares.

No período escolar estudou até a sexta série. Descreve-se como bagunceiro e desinteressado pelos estudos, o que o levou a reprovar por quatro vezes a 5a série. Costumava matar aula e uma vez mudou de escola por causa de mau comportamento. Tinha um bom relacionamento com os colegas e quando se empenhava, tirava boas notas.

Rogério passou a ingerir bebida alcoólica e a usar maconha aos 12 anos de idade. O uso do álcool começou após ter ficado embriagado em uma festa, e a maconha, depois de ter flagrado seu irmão mais velho usando, o qual o ofereceu e ele usou. Depois disso, beber e fumar maconha

tornou-se algo rotineiro. Rogério afirma que já experimentou vários tipos de drogas, mas o que usava freqüentemente era a maconha, a qual permaneceu usando até os 21 anos. Trabalha desde os 14 anos sempre fazendo bicos em várias atividades, já trabalhou como letrista, entregador, carroceiro, servente em obra e panfleteiro. Afirma que sempre que trabalhava ajudava em casa.

Também aos 14 anos, juntou-se a alguns colegas e tornou-se o “dono da quadra” de onde morava. Esse fato, segundo ele, fez com que atraísse vários inimigos, pois nessa época começou a envolver-se em brigas, intrigas e a receber juras de morte, então achou melhor arrumar um revolver pra se defender.

Aos 16 anos depois de poucas tentativas frustradas de arranjar um emprego, decidiu ir roubar. Inicialmente cometia pequenos roubos, assaltava pedestres, bares, padarias e por fim passou a roubar carros. Aos pais, ele dizia que os objetos comprados com o dinheiro dos assaltos eram emprestados ou comprados com o dinheiro ganho com pequenos “bicos” que fazia. Ele afirma que seus pais sabiam que ele fumava, mas não que roubava.

Rogério relata que teve vários relacionamentos amorosos, alguns fixos e outros esporádicos. Em um deles, aos 16 anos, teve um filho que hoje tem 8 anos. Ele afirma que na época quis assumir e se casar, mas o pai da menina não quis e se mudou sem deixar contato. Casou-se na penitenciária, e permaneceu casado por um período de 4 anos, segundo ele, o motivo da separação foi por que sua esposa não agüentava mais passar pelos constrangimentos ao ir visitá-lo na cadeia.

Rogério foi detido a primeira vez por lesão corporal, aos 16 anos, em decorrência de uma briga. A segunda vez, com 17 anos, foi preso por assalto e na terceira vez, também aos 17 anos, foi detido por tentativa de homicídio, ao dar nove facadas em um rapaz que tentou agredi-lo. Em nenhuma dessas vezes ficou preso e nem sofreu nenhum tipo de sanção.

Aos 18 anos, após ter bebido bastante e também fumado maconha encontrou sua namorada em um bar juntamente com uns rapazes que considerava seus inimigos. Segundo seu relato, ao questioná-la sobre o que estava fazendo lá, ela afirmou que desejava vê-lo morto. Neste momento Rogério se descontrolou e bateu em sua namorada até cansar e ela morrer. Logo após o crime Rogério fugiu, mas no dia seguinte arrependeu-se e entregou-se a polícia. Rogério nega o crime de estupro, mas foi condenado por estupro seguido de morte (Art. 213 e 223 CP). Assim, foi condenado a 15 anos de prisão e está preso há 8 anos. Segundo os autos do processo Rogério tentou constranger a vítima a manter relações sexuais com ele, como recebeu resposta negativa,

além de asfixiá-la, aplicou-lhe vários golpes no rosto e na cabeça levando-a a morte. De acordo com o processo, consta nos laudos que a vítima foi estuprada, violentada antes, durante e depois de morta.

Atualmente, Rogério trabalha, na cadeia, costurando bolas de futebol. Além disso, estudou na penitenciária e conseguiu concluir o ensino médio.

4.2.2.2 Análise da entrevista

a) Modo de relações de Objeto

O modo de relação de objeto de Rogério é caracteristicamente genital, pois ele investe sua libido no objeto e estabelece contatos totais. No nível da vinculação, Rogério consegue constituir relações estáveis satisfatórias, o que pode ser observado primeiramente pela sua boa relação com a família de origem. Assim, sobre o clima em casa ele relata:

[...] dentro da minha casa? era bom [...]”

Seus pais são considerados referências positivas, os quais são ressaltados pelas suas qualidades. Aqui, Rogério mostra mais uma vez sua capacidade de reconhecer o outro, fator característico de um tipo de relação objetal total. A impressão inicial é de que consegue estabelecer referências de acolhimento e de vínculo positivo com os pais, termos como amiga (mãe) e de caráter forte (pai) são usados para descrever a mãe e o pai. Sobre os pais ele fala:

“[...] minha mãe é muito minha amiga, ela é amiga, compreensiva, é carinhosa, é preocupada com o bem estar dos filhos, trabalhadora, ela trabalha dentro de casa, dona de casa, não mede esforço para agradar [...]”.

“[...] ele tem um caráter forte, ele é amigo, ele é atencioso e preocupado com o bem estar dos filhos também [...]”.

O investimento libidinal no objeto pode ser percebido pela estabilidade de suas relações amorosas. Rogério afirma que constituiu dois namoros longos. Sobre isso ele diz:

“[...] eu tive dois relacionamentos que foram bem profundos [...]”.

“[...] eu namorei um ano e dois meses, com a outra eu namorei nove meses [...]” .

Além disso, Rogério também já foi casado por quatro anos, o que confirma sua capacidade e desejo de manter vínculos íntimos e estáveis:

“[...] Olha eu me casei com ela dentro do sistema, já a conhecia na rua, já tinha uma certa afinidade, mas foi logo quando eu fui preso que nós começamos a nos corresponder e depois de um certo tempo, por iniciativa dela ela quis me visitar e começamos a namorar, noivamos e depois de um certo tempo a gente casou [...]”.

O fim de seus relacionamentos ocorreu por forças adversas a sua vontade, o que demonstra o investimento no outro. Esse aspecto fica claro ao justificar o fim do seu namoro e do seu casamento.

“[...] a mãe dela tinha dito que se fosse pra nós ficar juntos é pra eu arrumar minhas malas e sair de casa. E eu disse então a gente para por aqui [...] eu disse que a gente ficava amigos [...]”.

“[...] ela se cansou dessa revista e quando foi um dia ela chegou lá e disse que não tinha mais condições físicas e psicológicas pra me visitar. Eu disse que tudo bem [...]”.

O investimento no objeto, explicitado pelo apego afetivo a suas parceiras amorosas fica claro pelo sofrimento causado pelo fim dos relacionamentos:

“[...] estava apaixonado, gostava dela. Acabou por que a mãe dela não queria. Pra mim não foi bom não, eu fiquei bastante triste [...]”.

“[...] Acho que uns dois meses, eu sei que eu fiquei bem abalado, mas tudo na vida passa [...]”.

Rogério demonstra insegurança em relação aos futuros relacionamentos amorosos. Tal sentimento se expressa pelo medo da perda do objeto e/ou pela sua rejeição, o que demonstra o desejo de investir libidinalmente no outro.

“[...] hoje eu tenho medo de firmar um relacionamento com qualquer mulher, medo de quando ela venha, ou quando eu contar pra ela, porque eu não quero e jamais vou esconder isso dela e não quero que ela descubra por segundo ou por terceiros [...]”.

“[...] Então eu tenho medo de me envolver dotora, medo dela tomar parte da história, ela tenha medo de mim e não queiram ai ficar comigo [...]”.

Em relação às vítimas, nos casos de agressão, Rogério apresenta uma relação peculiar. A vítima geralmente é considerada como uma figura ameaçadora, a qual deve ser destruída. Assim, seu impulso agressivo é dirigido ao outro, motivado por uma necessidade de auto-preservação. Sobre as agressões ele relata:

“[...] no meio do caminho eu encontrei um jovem que ele havia me ameaçado de morte ele disse que onde me pegasse ele iria quebrar minhas pernas. Aí pegamos ele seguramos ele e eu dei nove facadas nele [...]”

“[...] eu encontrei com ela sentada na mesa com quatro jovens que havia me ameaçado de morte [...] ai foi quando ela falou eu quero lhe ver é morto ai eu não vi mais nada [...]”.

“[...] Aí eu bati nela até cansar e quando já não tinha mais força [...]”.

A dimensão do “matar ou morrer” parece ter marcado as suas relações, constituindo até um “lema” que norteava sua vida. Como pode ser observado em sua fala:

“[...] pra fora de casa, doutora, já era a lei do mais forte. É como diz um [...] existe um provérbiozinho que o povo comenta muito: ‘quem tem a boca maior, come o outro’[...]”.

b) Incidência do narcisismo

O apelo narcísico de Rogério a sua auto-imagem, está de acordo com aspectos que observa concretamente, sem caracterizar um movimento onipotente e de supervalorização da imagem de si. Isso demonstra a presença de aspectos saudáveis do narcisismo, quando diz, ancorado em experiências da sua realidade de vida, ele afirma:

“[...] Eu até tenho muita facilidade em aprender [...]”.

[...] Eu penso que Cleber é um bom rapaz, trabalhador [...]”.

“[...] Eles diziam que eu era um bom aluno. Inteligente, um rapaz novo, cheio de vida [...]”.

“[...] Cleber é um bom rapaz, trabalhador [...]”.

“[...] eu sempre fui uma pessoa bem esperta, ativa, conversadeira [...]”.

Por outro lado, há uma busca de reasseguramento narcísico, ao falar quase que como se estivesse defendendo o seu Eu:

“[...] eu não me acho uma pessoa doida não doutora, me acho uma pessoa bem sã, bem centrada [...]”.

c) Dinâmica Psíquica

O funcionamento da personalidade de Rogério demonstra certa dificuldade no controle dos impulsos. Os atos não são cometidos após planejamento e antecipação. O impulso é que comanda a ação, pois não planejava os crimes e agia por impulso. Sobre isso comenta que:

“[...] era por impulso [...]”.

“[...] eu estava conversando com um e com outro e depois eu dizia que precisava ganhar um dinheiro e saia a procura de algo, mas não tinha nem uma meta [...]”.

A dificuldade de controle racional dos impulsos fica mais evidente, quando Rogério descarrega de forma impulsiva toda a sua ira no outro, perdendo totalmente a empatia, e agindo como se estivesse em uma horda primitiva. Movido pela raiva e pelo ressentimento, age sem pensar e cegamente. O tom de ameaça utilizado pela namorada, foi o estopim para que cometesse o crime, ao final da sua fala diz não ter visto mais nada:

“[...] eu encontro ela bêbada com quatro jovens que haviam me ameaçado de morte e conversando os ânimos se alteraram e foi quando ela disse eu quero te ver morto, olhando nos meus olhos, ai eu não vi mais nada [...]”.

“[...] eu bati nela até cansar e quando já não tinha mais força [...]”.

“[...] sai com esse jovem e no meio do caminho eu encontrei um jovem que ele havia me ameaçado de morte ele disse que onde me pegasse ele iria quebrar minhas pernas. Ai pegamos ele seguramos ele e eu dei nove facadas nele aí larguei ele lá [...]”

As manifestações agressivas no comportamento de Rogério estão presentes desde a infância. Mesmo nessa época, já existia uma agressividade direcionada a destruir o outro que se pretende embaraçar os seus objetivos. Sobre isso ele comenta:

“ [...] eu peguei um pedaço assim de piche, aquele piche de asfalto, não agüentava nem levantar a pedra, tão moleque que eu era, taquei ela assim [...] Eu acertei a pedra na cabeça dele [...]”.

Desde a infância, Rogério apresenta também comportamentos sádicos, no sentido de se satisfazer com a depreciação do outro. Esse aspecto pode se identificado pela presença de um gozo vivido ao expor um colega de classe a uma situação vexatória:

“ [...] um jovenzinho, ele era até meu amigo [...] eu tava na 4ª série. E ele colocou cinco chicletes na boca e ficou mastigando aqueles chicletes e ele fez uma bola assim, mas uma bola bem grande de chiclete e me chamou pra mim olhar. Quando eu olhei, por instinto eu assoprei. Aí o chiclete grudou na cara dele, ficou parecendo uma máscara [...]”.

Apesar de considerar-se uma pessoa tranqüila, afirma que não aceita desaforos e costuma agir com agressividade, denotando a falta de controle e a impulsão de agir. Não tenta esconder nem manipular ao falar do seu comportamento agressivo e impulsivo, a descrição é crua, denotando falhas na capacidade de simbolizar a agressividade, facilmente colocando-se em oposição. Aqui, sua agressividade se manifesta de forma impulsiva, desmedida e direcionada a destruição do outro que se interpor em seu caminho. Como podemos identificar na sua fala:

“[...] eu era um cara bem tranqüilo, amigo, mas coisas que eu nunca aceitei era desaforo de ninguém [...]”.

“[...] Olha dotora eu reagia com toda brabeza que eu podia expressar diante dos desaforos [...]”.

Os aspectos impulsivos e agressivos do comportamento de Rogério são sustentados pela sua pouca tolerância a frustração. Tal aspecto pode ser identificado, quando o mesmo justifica o seu ingresso no mundo do crime pelo fato de ninguém ter-lhe dado uma oportunidade de emprego. Sobre isso ele fala:

“[...] eu procurei por dois dias ninguém quis me dar uma oportunidade eu desisti. Ai eu fui roubar. Com arma, 157, ai fui roubar doutora, fui tentar a sorte, desde os 16 anos [...]”.

A pouca tolerância a frustração fica evidente também, quando Rogério afirma que não aceita desaforos de ninguém.

“[...] Dotora dentro da minha situação lá atrás eu era um cara bem tranqüilo, amigo, mas coisas que eu nunca aceitei era desaforo de ninguém [...] ”.

Seu funcionamento psíquico, regido pelo princípio do prazer, existe desde sua infância. Desde essa época Rogério burla as regras e comete atos anti-sociais, demonstrando a dificuldade de incorporação do Superego. Primeiramente, por meio de comportamentos indisciplinados na escola, pois como ele mesmo afirma, bagunçava, não assistia às aulas e não tinha interesse pelos estudos. Sobre isso ele fala:

“[...] Bagunça demais. Nesse tempo eu tava muito bagunceiro, desinteressado no colégio [...]”.

“[...] Não prestar atenção na aula, de vez em quando dar uma escapulida, ficar rodando dentro do colégio mesmo, ali, pra não tá assistindo aula [...]”.

Na infância, Rogério também apresentava comportamentos de insubordinação a figuras de autoridade, sempre no sentido de desqualificar o seu real poder e fazer prevalecer a sua vontade. Esse comportamento fica evidente quando Rogério desafia o diretor de uma das escolas em que estudou. Sobre isso ele comenta:

“[...] eu discuti com um jovem dentro da sala, e o professor de lá o apoio, que era no caso o diretor, ele me pegou discutindo com esse jovem, ele me colocou pra escrever o quadro inteiro, encher no quadro dizendo que eu perdoava meu colega. Eu falei que não ia escrever. Falei: ‘não escrevo!’. Ele: ‘cê escreve!. ‘não escrevo!’. Ele pegou no meu braço, apertou meu braço. E eu: ‘não, o senhor me solta, dá licença’[...]”.

Aos doze anos, Rogério iniciou o uso de álcool e drogas:

“[...] com 12 anos eu tive um porre de vinho [...].”.

“[...] dali em diante, doutora, eu comecei a provar de tudo um pouquinho. Aí comecei a fumar um baseadinho, um cigarrinho de maconha, aprendi o vício do cigarro [...]”.

Na adolescência, Rogério começou a cometer crimes, como furtos e assaltos, fato que corrobora a sua postura de banalização da lei, como algo que pode ser burlado.

“[...] Com arma, 157, ai fui roubar doutora, fui tentar a sorte, desde os 16 anos [...] ”. “[...] umas duas três vezes por semana, era o 157 o assalto a mão armada [...] ”.

No sentido de enganar e manipular os pais, Rogério mentia procurando justificar a presença dos objetos provenientes de roubo:

“[...] eu dizia fui ali trabalhei, fiz umas duas três placas ali, sempre com pequenas mentiras, sempre uma mentira e outra ia encobrindo a realidade nua e crua [...]”.

Depois de algum tempo, a Lei representada pela figura do pai ficou enfraquecida, pois Rogério não escondia o fato de ser usuário de drogas.

“[...] chegou um certo tempo que ele sabia que eu usava droga, pois eu já não escondia, ele nunca apoiou isso, nunca apoiou que eu fumasse cigarro, que eu bebesse, que eu usasse a droga [...]”.

Já a Lei representada pela figura da autoridade policial, também não impunha medo a Rogério. Tendo em vista ser adolescente, a lei configurava algo que não inflingia punição, por isso, não precisava ser temida. Deste modo, Rogério reincindiu várias vezes.

“[...] lá eu fiquei detido como autor da lesão. Eu tinha 16 anos [...] meu pai foi lá e conversou com o delegado e saí na hora [...]”.

“[...] Eu tinha 17 já, fizemos um [...] apareceu três policial armado [...] fomos pra delegacia e chegou lá deram uma geral na gente e a gente levou uns tapas, porque isso é de praxi acontecer e ligaram pro meu pai e ele foi lá me buscar [...]”.

“[...] Eu tinha 17 sai com esse jovem e no meio do caminho eu encontrei um jovem que ele havia me ameaçado de morte ele disse que onde me pegasse ele iria quebrar minhas pernas. Ai pegamos ele seguramos ele e eu dei nove facada nele aí larguei ele lá e tava subindo pra rodoviária e no meio do caminho a policia me abordou me pegou com a faca e levou pra delegacia e lá o delegado já me conhecia, conhecia meu pai, porque ele era irmão evangélico também ai me segurou lá e ligou pro meu pai e meu pai foi lá novamente e meu pai disse enquanto eu poder lhe ajudar eu vou lhe ajudar, mas vai chegar o dia que você vai responder por você [...]”.

A atuação do Superego de Rogério pode ser percebida, pelo sentimento de arrependimento que o assolou logo após o cometimento do crime.

“[...] Eu senti arrependimento, desde o primeiro instante eu tive ciência do que eu fiz [...]”.

Tal arrependimento se concretiza no momento em que Rogério entrega-se a polícia e pelo seu não arrependimento de ter se entregado.

“[...] Eu disse agora não tem mais o que ser feito não, vou pagar e me entregar enquanto eu tou novo ai voltei [...] me apresentei e cheguei lá expliquei tudo, dei meu depoimento [...] e dali em diante eu fiquei preso [...]”.

“[...] não me arrependo de ter me entregado [...]”.

A consciência de Rogério acerca do ato cometido verifica-se pelo reconhecimento do seu comportamento como um erro que deve ser reparado. Neste momento, Rogério reconhece a existência de uma lei punitiva, a qual ele deve se submeter. Além disso, o cometimento do crime gerou uma “dívida” que precisa ser paga em nome de uma paz psíquica.

“[...] errei me entreguei, tou até hoje pagando pelo que eu fiz, errei feio, mas se não houvesse arrependimento da minha parte eu acho que eu não, eu não teria me entregado, eu que me apresentei, confessei, então eu quero ter paz [...]”.

“[...] se eu pudesse eu repararia cada erro meu [...]”.

A noção da sua responsabilidade sobre os delitos cometidos indica a preservação do seu contato com a realidade.

“[...] é responsabilidade minha dotora. Eu não posso culpar ninguém não dotora, tudo é responsabilidade minha [...]”.

No seu contato com a realidade é possível identificar o uso do mecanismo da racionalização. Neste caso, numa tentativa de manter intacta a imagem idealizada do eu, no sentido de ser um bom aluno que ia as aulas todos os dias, ele minimiza o aspecto negativo de ir a escola, mas não assistir as aulas.

“[...] Não, minha freqüência era boa! Boa! Eu ia todos os dias. Aí eu ia todos os dias. Quando eu não tava com interesse de assistir a aula, eu ia assistir a primeira aula, aí na segunda aula, quando ia trocar de professor, era o tempo que eu saía [...]”.

Apesar de utilizar o mecanismo da racionalização, a defesa mais evidente em Rogério é a clivagem do Ego. Rogério sustentava dois comportamentos opostos no seu contato com a realidade. Em casa, ele afirma que se submetia as regras e ajudava sua mãe nas tarefas domésticas, em contraponto, na rua, como ele mesmo afirma, era agressivo com aqueles que se colocavam como obstáculo em seu caminho.

“[...] eu acredito que era como se eu tivesse uma dupla personalidade. Dentro da minha casa, dentro do colégio eu era uma pessoa. Mas do portão da minha casa pra fora, do portão do colégio pra fora eu era uma outra pessoa [...]”.

“[...] Dentro de casa, doutora, eu sempre fui um filho obediente [...] dentro de casa sempre ajudei minha mãe, lavar roupa, fazer comida, limpar casa [...]”.

“[...] Pra fora de casa, doutora, já era a lei do mais forte [...] da rua pra fora eu já não precisava de dispensar respeito a ninguém que não me desse respeito [...]”.

4.2.2.4 Análise do Método de Rorschach

a) Psicograma

Quadro 2: Resultado da cotação do protocolo do caso Rogério

Localização Determinante Conteúdo

G= (11) GDbl=(4) G%= 39,47% D= (12) DDbl=(2) D%= 36,84% Dd=(6)= Do=(1) Dd%=18,42% F% = (15) = 39,47% F+% = 86,66% F+=13 F-=2 FClob=1 K= 3 Kan=8 Kp= 1 FE=6 EF=1 CF=1 FC=2 A% = 57,89% A= 20 Ad= 2 H% = 18,42% H=3 Hd=2 (H)= 2 Obj=3 Masc=1 Arq= 1 (Arq)=1 Pl=1 Nat=1 R= 38 K:Kan=3:8 Hd+Anat+sexo+sangue= 5,26% T.T= 19,86 mim K:ΣC= 3: 2 % últ. pranchas=31,57% T/R= 31,35 seg G:K= 15:3 Ban= 6 T.m.r.= 17,4 seg Σ C= 2 IR= 5 T.m.r.a= 16 seg FC:CF+C= 2: 1 ΣE : Σ C= 4 : 2

b) Relação com a realidade e capacidade de adaptação

Rogério encontra-se inserido na realidade (IR=5; Ban=6), onde seu pensamento adapta-se de forma estereotipada (A= 57,89%). Sua lógica de pensamento é predominantemente genérica (G%=39,47%), com pouca capacidade de diferenciação (D=36,84%). Apesar de sua adaptabilidade superficial, apresenta uma postura oposicionista diante do mundo (GDbl=4;