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De entre as 32 regras binárias totalísticas envolvendo 5 vizinhos, Wolfram (1984) iden- tificou apenas duas como sendo de classe 4: a regra 20 e a regra 52. A evolução no tempo de ambas as regras conduz a estruturas complexas persistentes, localizadas ou que

se propagam. A regra 20 tem sido estudada abundantemente na literatura. Porém desco- brimos que a regra 52 apresenta aspectos bem mais gerais do que a regra 20, que se pode argumentar envolverem maior complexidade do que a regra 20. Basicamente, a regra 52 permite dois estados quiescentes distintos, 0 e 1, enquanto que a regra 20 permite apenas o estado 0. No entanto, apesar que a maioria dos autores atribua à regra 52 um com- portamento complexo (Wolfram 1983, 1984; Boccara 1989; McIntosh 1990), tal ponto de vista é contrariado num trabalho recente (Boffetta et al. 2002).

Dada a complexidade atribuída a autómatos de classe 4 e ao facto de ser possível efectuar um estudo exaustivo sobre o seu comportamento dinâmico, analisa-se aqui em detalhe a regra 52 por ser a menos estudada das regras mais simples de classe 4 e, como referido, ser mais geral que a regra 20.

Para a regra 52, o estado de um dado sítio i no instante t + 1, é determinado pelo seu estado no tempo t bem como pelo estado dos seus sítios vizinhos através da soma

Σ ≡ σi−2(t) + σi−1(t) + σi(t) + σi+1(t) + σi+2(t).

A actualização é feita sincronamente, i.e. simultaneamente em todos sítios, do seguinte modo: σi(t + 1) =    1, if Σ = 2, 4 ou 5 0, caso contrário, (3.1)

ou seja, σi assume o valor 1 apenas quando a soma Σ for igual a 2 ou 4 ou 5.

De acordo com a Eq. (3.1), tem-se que 4 ou mais sítios consecutivos de valor igual a 1, são suficientes para bloquear o fluxo de informação através dos mesmos. Em particular, pode ser adicionado um número arbitrário de sítios de valor igual a 1 que a dinâmica do sistema não será perturbada.

Na Fig. 3.2 estão representadas evoluções temporais típicas da regra 52 partindo de condições iniciais aleatórias. Observa-se que a maior parte da actividade na rede ocorre nas interfaces de transição entre os dois graus de liberdade permitidos (0 ou 1). Estas interfaces podem ser estáticas ou viajantes, e o facto de se considerar condições de fronteira periódicas pode dar origem a colisões entre as interfaces e ao consequente aumento de regiões de actividade sincronizada.

Tal como no caso da regra 20 (ver Fig. 3.1), verifica-se que, após um transiente, apenas os gliders sobrevivem na rede. Uma característica interessante da regra 52 é o facto de estes gliders não surgirem apenas em fundos formados por 0’s (branco), mas também em fundos formados por 1’s (violeta). Ou seja, temos gliders compostos por 1’s sobre fundos formados por sítios de valor 0, bem como gliders compostos por 0’s sobre fundos formados por 1’s. Esta característica, denominada conjugado, traduz a troca simultânea de 0 → 1 e de 1 → 0, tendo-se, em particular, o seguinte:

Teorema I: Para qualquer configuração ξ, a evolução do seu conjugado ξ ≡ C(ξ) produz sempre o conjugado da evolução obtida pela configuração original ξ (ver Fig. 3.4).

1 Sitio 1000 200 0 t 1 Sitio 1000 200 0 t 1 Sitio 200 300 0 t 1 Sitio 200 300 0 t

Figura 3.2: Padrões típicos gerados pela regra 52. Em cima: Assimptoticamente, o sistema tende para extensas regiões de actividade sincronizada, 0 (branco) ou 1 (violeta), interconectadas por interfaces de transição onde ocorre actividade cíclica. Em baixo: As interfaces podem ser estáticas ou viajantes. As condições de fronteira periódicas podem levar a colisões entre as interfaces e dar origem ao aumento de regiões de actividade sincronizada.

Na Fig. 3.3 estão representadas 7 interfaces elementares de transição entre fundos da mesma cor e de cores distintas, acessíveis aos dois graus de liberdade da regra 52. As interfaces de A a D foram identificadas empiricamente, através de uma procura exaustiva nas 230condições iniciais, enquanto que a interface E foi identificada através de relações de

simetria. De notar que, em consequência do Teorema I, para além das interfaces referidas a regra 52 suporta os seus conjugados, obtidos através da troca simultânea de 0 → 1 e de 1 → 0 em todas as células das suas condições iniciais. O conjunto das 7 interfaces elementares e seus conjugados constituem os átomos básicos que, quando devidamente combinados, permitem reproduzir todo o comportamento assimptótico observado na Fig. 3.2.

Extensas regiões de comportamento sincronizado surgem de colisões entre gliders e, tal como ilustrado na Fig. 3.4, os gliders surgem das diferentes possibilidades de combinar as interfaces elementares. Por exemplo, a estrutura mais à esquerda no painel superior da Fig. 3.4 pode ser visto, quer como um glider isolado que se propaga num fundo branco, quer como uma dupla transição entre regiões sincronas, de branco → violeta → branco, compostas pelas interfaces A e seu conjugado A, representadas na Fig. 3.3. O núcleo interno do glider 1, que consiste em quatro células adjacentes de valor igual a 1, é o menor

A

B

C

D

E

T

G

F

1

Figura 3.3: As sete interfaces elementares necessárias para produzir a complexidade assimptótica gerada pela regra 52. As interfaces de A a E fazem a transição entre fundos de cores distintas, enquanto que F e G fazem a transição entre fundos da mesma cor. Em ambos os casos, temos interfaces estáticas ou viajantes. O glider viajante T1 não é elementar, mas sim a justaposição de B e B, o conjugado de B;

viaja à “velocidade da luz” no sistema, ou seja, uma célula por passo de tempo. O glider G viaja a 1/9 célula por passo de tempo. Aqui e em todas as figuras, o tempo evolui no sentido descendente.

4

F

2

1

C(4)

C(F)

C(2)

C(1)

4’

2’

1’

Figura 3.4: Gliders obtidos por combinações entre as interfaces elementares. Em cima: Os motivos mais simples que sobrevivem num fundo branco (sítios de valor 0). Ao centro: Conjugados dos gliders do painel superior, dados por estruturas brancas que sobrevivem num fundo violeta (sítios de valor 1). Em baixo: Gliders observados no painel superior, mas com um aumento do núcleo interno de 1’s.

possível, mas o seu tamanho pode, no entanto, ser aumentado indefinidamente, tal como exemplificado pelo glider 1′. De modo análogo, o glider 2 da Fig. 3.4 resulta da dupla

transição entre regiões sincronas, compostas pela interface elementar C e seu conjugado, e o seu núcleo pode também ser estendido indefinidamente, tal como exemplificado pelo glider 2′. O glider 4 pode ser composto aumentando o núcleo de 1’s do glider 1 dentro do

qual se coloca o conjugado F de F . Deste modo, pode produzir-se todo o comportamento assimptótico computado pela regra 52.

A Fig. 3.5 ilustra gliders típicos obtidos por justaposição entre interfaces iguais ou distintas. Assim, por exemplo, com as interfaces C e C podem gerar-se três gliders, denominados S3, S3′, S3′′ na Fig. 3.5. Enquanto que S3 é simétrico relativamente ao seu

eixo central, S′

3 e S3′′ apresentam uma simetria mais elaborada que envolve uma reflexão

espacial e um deslocamento de um passo de tempo, que pode ser reconhecido pela coloração mais escura na figura.

Verifica-se, assim, que os gliders observados na regra 52, consistem em simples al- ternâncias de regiões sincronizadas de 0’s e de 1’s, conectadas entre si por um pequeno

S

S

1 2

S’’

S’

S

3 3 3

S’’

S’

S

4 4 4

Figura 3.5: Em cima: Gliders estáticos híbridos, formados pela justaposição entre interfaces distintas. Os quatro sítios pretos que separam as interfaces podem ser aumentados indefinidamente, tal como se mostra na Fig. 3.4. Ao centro: Gliders estáticos formados pelos três possíveis desfazamentos temporais entre interfaces iguais de período 3. De notar que S3 apresenta uma simetria relativamente ao seu eixo

central, enquanto que S′

3 e S3′′ apresentam uma simetria que envolve uma reflexão adicionada a um

deslocamento de um passo de tempo (indicada pela coloração adicional). Em baixo: Gliders híbridos formados pelos três possíveis desfazamentos temporais entre interfaces distintas de período 3.

número de interfaces onde ocorre actividade periódica. Verifica-se, também, que combina- ções adequadas destas interfaces dão origem a gliders. Para registro, mencionamos ainda que verificámos que a regra 52 pode ser utilizada para preencher completamente uma rede comensurável com períodos espaciais, analogamente como reportado recentemente para a regra 20 (Gallas e Herrmann 2005).

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