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2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.3 ESTUDOS DE PEACOCK E WISEMAN

Em 1953, Peacock e Wiseman iniciaram um estudo destinado a preencher uma lacuna estatística sobre as despesas públicas no Reino Unido nos sessenta anos anteriores. Publicado em 1961, The growth of

public expenditure in the United Kingdom, apresenta dados sobre o

crescimento das despesas públicas no Reino Unido no período 1890- 1950 e explica esses resultados por meio de fatos histórico sociais.

Inicialmente, os autores registram que as significativas mudanças econômicas e sociais observadas nesse período (energia elétrica, o automóvel, o avião, o telefone e rádio, o navio de combustão e as fibras celulósicas) ocasionaram o surgimento de novas indústrias e regiões industriais.

Como reflexo destas mudanças, os autores apontam que no período 1890-1955 o PIB do Reino Unido cresceu o equivalente a 11 vezes: foi de £ 1.472 em 1890 para £ 16.784 milhões em 1955 (PEACOCK; WISEMAN, 1961). No mesmo período, a população cresceu cerca de 50% (de 37,5 milhões para quase 51 milhões de

pessoas) e havia ocorrido uma mudança considerável em sua

distribuição etária. Adicionalmente, o PIB per capita havia crescido entre 1 e 4 vezes.

Esse cenário fez com que uma proporção crescente da população trabalhadora na Grã-Bretanha utilizasse serviços públicos no início dos anos 60 (PEACOCK; WISEMAN, 1961).

Os resultados dessa pesquisa demonstraram que o crescimento das despesas não foi linear. Peacock e Wiseman (1961) perceberam que o volume das despesas alterou-se por meio de picos periódicos, ou seja, a curva desses gastos governamentais apontou para uma série estacionária separada por picos que coincidem com os períodos de guerra ou preparação para a guerra (1900, 1918, 1943 e 1952).

Para esses autores, grandes distúrbios sociais criam um efeito deslocamento que acaba modificando os níveis das receitas e despesas. Após a perturbação, emergem novas ideias sobre níveis fiscais toleráveis

e um novo patamar de despesas pode ser alcançado, com as despesas públicas mantendo-se, novamente, praticamente constantes em proporção ao PIB (PEACOCK; WISEMAN, 1961).

Os autores argumentam, também, que as guerras produzem um sentimento de comunidade, dirigindo a atenção para as deficiências não apenas na educação, mas também nos serviços de saúde e habitação, e incentivando que as necessárias expansões do setor público sejam sentidas por toda a comunidade. Rezende (2001) aponta que, além das guerras mundiais, períodos de grande depressão econômica ou processos hiperinflacionários têm sido mencionados como fatores capazes de deflagrar esse efeito “deslocamento”.

No entanto, Peacock e Wiseman (1961) entendem que não se pode afirmar que esses distúrbios sociais produzem, inevitavelmente, alterações permanentes ou duradouras que promovam aumentos gerais nas despesas governamentais, nem que outras influências diretas (tais como as relativas à densidade demográfica) possam ser desconsideradas. 2.4 TEORIA DAS NECESSIDADES PÚBLICAS

Musgrave (1976), autor da teoria das necessidades públicas, argumenta que uma teoria normativa ou ótima do setor público teria como finalidade (e contribuição) principal a determinação de um plano orçamentário ótimo, isto é, cujos resultados para os cidadãos e economia seriam considerados ótimos.

Em termos teóricos, esse plano poderia ser elaborado a partir da identificação da reação de cidadãos e do mercado frente às variadas possibilidades de política tributária e de despesas públicas, sem perder de vista que o uso (clássico) desses instrumentos fiscais visa: (i) viabilizar ajustamentos na alocação de recursos; (ii) promover ajustamentos na distribuição de renda e riqueza, e (iii) garantir a estabilização econômica (MUSGRAVE, 1976).

Em termos práticos, contudo, não existe uma regra uniforme ou um conjunto (simples) de princípios universais que possam normatizar o comportamento das finanças públicas. Pelo contrário, o que se observa é uma gama de funções governamentais distintas, embora inter- relacionadas, que também requerem soluções distintas.

Portanto, para Musgrave (1976) a política orçamentária resulta desses três planos interdependentes (alocação, distribuição e estabilização), cada qual envolvendo diferentes objetivos e princípios de ação, e a otimização dos seus resultados (outcomes) dependerá da eficiência do planejamento realizado em cada um desses três níveis.

No tocante à alocação de recursos, foco deste estudo, cabe destacar que o chamado mecanismo de preço de mercado (ou forças de mercado) assegura uma alocação ótima, situações em que há um mecanismo de ajuste automático da economia. Esse ajuste funciona da seguinte maneira: a escassez eleva os preços e o aumento de preços induz o fim da escassez. Assim, e equilíbrio atingido em alguns setores da economia faz com que os governos não tenham que se preocupar quanto à alocação de recursos para essas áreas, supridas pelo setor privado.

No entanto, há situações em que o mercado não se ajusta sozinho, em virtude das chamadas “falhas de mercado”. Quando estas falhas (externalidades, informação assimétrica, por exemplo) são observadas, o governo pode (deve) intervir buscando promover um nível mais elevado de bem estar social.

Nesse processo (de alocação) é fundamental a compreensão do conceito de necessidades públicas. Segundo Musgrave (1976), necessidade pública é toda necessidade que possui interesse geral e é satisfeita pelo processo do serviço público, diretamente pelo Estado, ou por delegação a pessoas sob a supervisão do Estado. Musgrave (1976) classificou essas necessidades como sociais ou meritórias.

As necessidades sociais são aquelas que devem ser satisfeitas por intermédio de serviços que precisam ser consumidos por todos em quantidades iguais (ordem e segurança pública, por exemplo), assim, a pessoa que não deseja pagar por um determinado serviço não pode ser excluída dos benefícios que dele resultam.

Assim, para as necessidades sociais não é esperada a contribuição voluntária do consumidor, fazendo-se necessária para o seu custeio a intervenção governamental através da cobrança compulsória de tributos. Por sua vez, as necessidades meritórias são aquelas parcialmente atendidas pela iniciativa privada, uma vez que parte da população é excluída por não possuir condições econômico financeiras para satisfazê-las. Devido a sua importância, elas se tornam necessidades públicas e devem ser providas pelo Estado. Exemplos: merendas escolares, subsídios para casas de baixo custo (populares) e educação ou saúde “gratuitas”, ou melhor dizendo, sem dispêndios diretos associados.

Para Musgrave (1976), a regra básica para a alocação é priorizar recursos em resposta à procura efetiva dos cidadãos (consumidores), determinada pelas preferências individuais e pelo estado de distribuição prevalecente. Entretanto, outros fatores também afetam as políticas

fiscais desenvolvidas pelos governos, tais como as questões político institucionais que serão vistas a seguir.