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3.2 Pressões sobre sistemas lênticos

3.2.2 Eventos chuvosos

As consequências dos episódios de precipitação costumam ser peculiares para cada ambiente aquático, e irão depender de fatores como as características dos eventos de precipitação, a hidrodinâmica do reservatório, as comunidades existentes e o estado trófico, a hidrologia da bacia hidrográfica e seu uso e ocupação do solo (REICHWALDT e GHADOUANI, 2012).

Jennings et al. (2012) monitoraram em alta frequência sete lagos distintos, delineando duas classes principais de efeitos advindos de episódios meteorológicos. A primeira contempla consequências rápidas e menos duradouras, como o efeito das tempestades na estrutura térmica do corpo d’água. Já a segunda engloba efeitos de maior duração, como alterações nas concentrações de matéria orgânica dissolvida colorida e na transparência da coluna d’água.

No estudo de Jennings et al. (2012), foi constatado que as consequências mais duradouras foram decorrentes de episódios meteorológicos com período de retorno maior. De fato,

episódios de precipitação intensos podem perturbar estrutura da coluna d’água e ocasionar a desestratificação térmica, a qual pode ser sentida forma imediata (WILHELM e ADRIAN, 2008) ou em alguns dias após os eventos (XING et al., 2014).

Eventos de precipitação intensos podem ocasionar a redução da biomassa fitoplanctônica e consequentemente da produção primária do ambiente. Efeitos físicos, como o arrastamento do plâncton pela corrente (“flushing”) e a mistura parcial ou completa da massa d’água, podem levar a uma grande redução da biomassa em um curto período de tempo (JACOBSEN e SIMONSEN, 1993; NOGES et al., 2011).

A composição das comunidades também pode ser afetada por eventos de precipitação. Jacobsen e Simonsen (1993) perceberam que as primeiras chuvas intensas encerraram uma floração de cianobactérias em um lago raso eutrófico (Lago Godstrub – Dinamarca), levando a uma grande redução da biomassa, entretanto a diversidade de espécies não foi afetada. Após dois meses, outro período de chuvas intensas ocasionou o fim da dominância das cianobactérias e um forte aumento na diversidade do fitoplâncton.

Os corpos hídricos podem receber uma grande carga de nutrientes após episódios chuvosos (BUDAI e CLEMENT, 2007; SONG et al., 2015), ocasionando o crescimento do fitoplâncton em momentos posteriores, quando existe maior estabilidade na coluna d’água. De forma análoga, um forte crescimento também pode ser percebido em momentos de estabilidade após a desestratificação térmica, devido à incorporação na superfície dos nutrientes anteriormente presentes no fundo da coluna d’água (BLOTTIERE et al., 2015).

Com a ocorrência de episódios intensos, a carga de nutrientes exportado da bacia hidrográfica tende a ser maior, porém são observadas maiores quantidades de materiais particulados em relação aos componentes solúveis (BUDAI e CLEMENT, 2007; SONG et al., 2015). As frações particuladas não estão prontamente disponíveis para o crescimento do fitoplâncton, já que o mesmo somente os absorverá na forma solúvel (STRASKRABA e TUNDISI, 2013).

Em experimentos realizados em bacias hidrográficas piloto na margem de um lago urbano (Lago Bolton, Hungria), Budai e Clement (2007) encontraram uma forte relação linear (r = 0,79, p <0,05) entre a intensidade dos eventos de precipitação e a concentração de sólidos em suspensão (SS). Os eventos chuvosos de maiores vazões de pico (um terço do total), foram responsáveis por mais de 3/4 de toda a carga anual de SS e TP e metade da carga de PO43-.

Dependendo de características da bacia hidrográfica, as precipitações podem carrear grande quantidade de compostos solúveis para o meio aquático, como a matéria orgânica dissolvida colorida. Nestes casos, as alterações na transparência da água e nos níveis de nutrientes podem refletir em respostas biológicas mais persistentes, sendo notadas mudanças na estrutura das comunidades bacterianas e fitoplanctônicas, assim como no metabolismo do sistema por curtos ou médios períodos (BRIGHENTI, 2012; JENNINGS et al., 2012).

Geralmente, os episódios de precipitação são fundamentais para o aporte de nutrientes aos corpos hídricos (TUNDISI et al., 1995), entretanto existem ambientes que os recebem continuamente a partir de fontes pontuais, como cargas de efluentes domésticos em ambientes urbanizados (VIVIANO et al., 2015; SILVA et al., 2016a). Nestes casos, podem existir relações inversas entre a precipitação e a concentração de nutrientes afluentes, como por exemplo o nitrato (DUAN et al., 2014).

As precipitações também podem contribuir para o fornecimento autóctone de nutrientes para a superfície, sendo percebido por Wilhelm e Adrian (2008) em um lago eutrófico (Muggelsee – Alemanha) o aumento das concentrações de fósforo em decorrência das desestratificações térmicas ocasionadas pelos eventos. Neste ambiente, Sondergaard et al. (2003) delineou que mesmo as precipitações menores contribuíam para a liberação do fósforo pelos sedimentos, pois aumentavamo gradiente de concentração existente nas águas intersticiais.

WU et al. (2013) realizaram testes de correlação, regressões múltiplas e análises de componentes principais (ACP), percebendo que a qualidade da água de reservatórios urbanos de Pequim respondeu diferentemente às variações atmosféricas, de acordo com o seu estado trófico. Em ambientes eutróficos, as mudanças na qualidade da água foram relacionadas às variações meteorológicas, existindo relações positivas entre a ocorrência de precipitações e concentrações de TP e Chl-a.

Em ambientes eutróficos de regiões tropicais as mudanças sazonais relacionadas à precipitação têm sido observadas juntamente com alterações na biomassa e na estrutura das comunidades do fitoplâncton. Em geral, é durante o período seco que ocorrem os maiores problemas relacionados à qualidade da água e processos de eutrofização (FIGUEIREDO e GIANI, 2001; BOUVY et al., 2003; BRASIL et al., 2016).

No período seco, a redução do nível d’água em decorrência da menor vazão afluente e do aumento das taxas de evaporação em alguns ecossistemas acarreta no aumento da salinidade e

concentração de nutrientes no meio (JEPPENSEN et al., 2015). A estabilidade da coluna d’água contribui para a dominância de cianobactérias com capacidade de flutuação, pois conseguem obter melhores condições de luz na superfície e de nutrientes nas regiões abaixo na zona de mistura (PAERL et al., 2011).

Juntamente com os episódios de precipitação, as condições atmosféricas desempenham um papel fundamental para ocasionar alterações em ambientes lênticos. Para estas, os principais atores costumam ser a mudança nas temperaturas do ar, precipitações e velocidades dos ventos, ou uma combinação entre os mesmos (JENNINGS et al., 2012; XING et al., 2014).

São observadas relações distintas entre a ocorrência de ventos e a biomassa do fitoplâncton, podendo ocorrer o aumento dessa última com a disponibilização de nutrientes (WU et al., 2013), e em razão da turbidez gerada inibir o crescimento de macrófitas, evitando a competição (SCHEFFER, 1998). Em contraste, também pode ser percebida relação oposta, na qual a presença do vento é acompanhada pela redução da biomassa de cianobactérias em locais dominados por grupos coloniais (SORANNO, 1997).

Tundisi et al. (1995) afirmam que a precipitação no verão e o vento durante o inverno foram fatores fundamentais para explicar a biomassa e a composição da comunidade fitoplanctônica em um reservatório tropical raso (Represa do Lobo, SP). A precipitação promoveu a entrada de nutrientes, em especial o nitrogênio, sendo que a turbulência produzida pelo vento levou à sua reincorporação na massa d’água. Assim, a ciclagem de nutrientes ocorreu com a precipitação, que impulsionou a produção nova no período chuvoso, e ao vento, que estimulou a produção regenerada no período seco.

Padisák (1988) observou em um lago raso de clima temperado (Lago Balaton – Hungria) que duas tempestades com ventos de velocidade de 12 m.s-1 promoveram o desenvolvimento de duas comunidades fitoplanctônicas características, uma pré e outra pós-turbulência. A ação dos ventos levou à ressuspensão dos sedimentos e o crescimento sincrônico de bactérias, acelerando a disponibilização de nutrientes para a coluna d’água, sendo notado após 7 dias a sucessão de espécies do fitoplâncton de reprodução rápida para as de reprodução lenta.