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Os eventos climáticos abruptos geralmente se referem a mudanças climáticas marcadas por alterações na temperatura ou em outros padrões. Embora os mecanismos responsáveis pela ocorrência dos eventos climáticos abruptos não estejam completamente elucidados, esses eventos causaram fortes modificações na paleocirculação do Atlântico durante a última deglaciação (DANSGAARD; WHITE; JOHNSEN, 1989; VIDAL, 1997; ARZ; PÄTZOLD; WEFER, 1999; CHIESSI et al., 2008).

Os Heinrich events (HE) são episódios marcados pelo lançamento de detritos de gelo no Atlântico Norte, que ocorrem de forma irregular a cada 10.000 anos e são tipicamente seguidos pelos eventos Dansgaard/Oescheger (D/O) (HEINRICH, 1988; BOND et al., 1992; HEMMING, 2004). Os D/O são caracterizados por alternâncias entre períodos quentes e frios que acontecem a cada 1.500 anos aproximadamente, embora seu ritmo seja variável (BOND et al., 1992). Segundo Bond et al. (1993) e Broecker (1994), HE estão associados a mudanças climáticas abruptas, e apresentam-se correlacionados a desaceleração ou desligamento da AMOC e redução da formação da NADW (VIDAL et al., 1997) (Fig. 3).

O Bølling-Allerød (BA) é uma transição rápida de temperatura para as condições de maior aquecimento no deglacial, ocorridas após o H1, há aproximadamente 14.600 e 12.800 anos cal. A. P., segundo Rasmussen et al. (2006). No entanto, os eventos quentes abruptos no hemisfério norte, como o BA, também podem impactar o clima do nordeste do Brasil e criar um grande déficit na precipitação decorrente do deslocamento da ITCZ para Norte, assim como observado no oeste da Bahia (WANG et al., 2007) e no Rio Grande do Norte (CRUZ et al., 2009). O YD é um evento milenar que consiste na retomada das condições glaciais durante o deglacial, entre 11.500 e 13.000 anos cal A.P. (DANSGAARD; WHITE; JOHNSEN, 1989; PETEET, 1995). Embora este período seja característico do Atlântico

Norte, tem sido identificado impactos referentes ao YD em registros ao redor do mundo (BROECKER, 2003).

Figura 3 - Evolução da temperatura da superfície do mar no Atlântico Norte. Simulação da temperatura do Atlântico Norte na região da Margem Ibérica. O aquecimento do Bølling-Allerød pode ser decomposto em contribuições que geraram o restabelecimento da AMOC e a resposta climática para o aumento da concentração dos gases estufa e diminuição das camadas de gelo.

Fonte: TIMMERMANN; MENVIEL, 2009.

De acordo com a hipótese “Bipolar Seesaw”, como a AMOC representa o elo entre as mudanças climáticas entre os dois hemisférios, o resfriamento no Hemisfério Norte está associado ao aquecimento no Hemisfério Sul (BROECKER et al., 1985). Essas alterações no Atlântico Norte se refletem em alterações no cinturão tropical, que culminam em mudanças na vegetação em diversos locais, incluindo o nordeste do Brasil (BEHLING et al., 2000; LEDRU et al., 2006; DUPONT et al., 2010).

Estudos recentes afirmam que a ocorrência do H1 está associada às oscilações climáticas nos dois pólos, em vez de ser um processo exclusivo do Hemisfério Norte. Yang, Rial e Reischmann (2014) demonstraram que os pulsos de energia estão intimamente relacionados ao H1, assim como o máximo gradiente de temperatura norte-sul. Entretanto, ainda não está claro se o gradiente de temperatura entre os pólos seria a causa ou o efeito do enfraquecimento ou desligamento da AMOC após a entrada de grande quantidade de água doce no Atlântico Norte. Rühlemann et al. (2004) relatou em seu trabalho o aquecimento do Atlântico Tropical durante a redução da AMOC.

Handiani, Paul e Dupont (2012) constataram a partir de modelos climáticos, que o transporte da NADW pelo equador em direção ao Atlântico Sul foi reduzido em 40% durante o LGM. As simulações mostraram que o enfraquecimento da AMOC associado às mudanças climáticas no Atlântico Norte são consistentes com as mudanças na vegetação reconstituídas na região tropical durante o H1.

O acúmulo de calor no Oceano Austral quando o transporte sul-norte foi reduzido, contribuiu para o aquecimento subsuperficial do Atlântico Norte por meio do aquecimento das águas superficiais nas baixas latitudes. Dessa forma, foi proposto que o HE e a redução da AMOC evoluíram juntos, de forma que o aquecimento subsuperficial proveniente do sul e da redução da convecção no Atlântico Norte propiciaram o início do processo de derretimento das geleiras, o qual apresenta uma retroalimentação positiva (CLARK; REES; JOINT, 2007). Isso teria culminado no lançamento de gelo massivo que caracteriza este evento. A entrada de água doce teria sido responsável por colapsar a NADW, resultando no desligamento da AMOC seguido do aumento do gradiente de temperatura entre os pólos (BOND et al., 2001; CLARK; REES; JOINT, 2007).

De acordo com alguns modelos, quando a AMOC enfraquece muito, apresentando-se abaixo de certo limite, a NBC também enfraquece ou até mesmo tem sua direção invertida (CHANG et al., 2008; WEN et al., 2011). Esse comportamento poderia acarretar o transporte de sedimentos provenientes do Amazonas para o sul, ao longo da costa nordeste, durante os eventos no Atlântico Norte, como H1; no entanto, ainda não há dados suficiente que confirmem esse acontecimento (NACE et al., 2014). Durante os períodos glaciais, a redução do nível do mar possibilita a erosão da plataforma continental interna, sendo que os rios, como o Amazonas, recortam a plataforma continental e desembocam diretamente no talude. Dessa forma, além do aumento da precipitação, possivelmente o intemperismo físico se intensificou, aumentando a carga de partículas em suspensão na foz e o fluxo na região do Leque do Amazonas, direcionando-o para o Canyon do Amazonas (MILLIMAN; SUMMERHAYES; BARRETO, 1975; DAMUTH, 1977; NACE et al., 2014).

A ITCZ é formada pela confluência dos ventos alísios provenientes do hemisfério norte e sul e a sua posição e intensidade são responsáveis pelos diferentes regimes de precipitação sobre a Amazônia e nordeste do Brasil (MOLION, 1987; MELO et al., 2002). A posição da ITCZ flutua ao longo do ano de um lado ao outro da Linha do Equador, se posicionando mais ao norte ou a sul e desencadeando diferentes regimes de chuvas no estado do Ceará e em toda a região nordeste. Segundo Alapati e Raman (1989), a ITCZ sobre os continentes aparentemente acompanha as mudanças sazonais do sol, enquanto nos oceanos

está associada às mudanças no gradiente de SST no Atlântico Tropical, de modo que o seu deslocamento se dá em direção ao hemisfério com maior SST (NOBRE; SHUKLA, 1996).

Durante os períodos chuvosos foi observado por Xavier et al. (2000) o aprofundamento da descida da ITCZ para latitudes mais ao sul, sendo o contrário também verdadeiro. No H1, o posicionamento da ITCZ mais ao sul, resultou em um clima mais úmido no leste da África e Norte da América do Sul (MENVIEL et al., 2008).

A redução da AMOC, durante os eventos Heinrich é considerada um fator importante para a migração mais a sul da ITCZ (HESSLER et al., 2010), em virtude da intensificação dos ventos alísios de nordeste, resultando em maiores taxas de precipitação e condições mais úmidas no nordeste do Brasil (MARTIN et al., 1997; ARZ; PÄTZOLD; WEFER, 1998; JAESCHKE et al., 2007).

4 MATERIAIS E MÉTODOS

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