• Nenhum resultado encontrado

I.2. CONSUMO E TURISMO

I.2.1. Evolução do consumo em turismo

À medida que a indústria do turismo cresce, o interesse e a compreensão do consumo dos produtos turísticos tem aumentado, tornando-se crucial para o sucesso das empresas turísticas, dos destinos turísticos e das próprias comunidades locais (Crouch et al., 2004).

Muitos aspectos do comportamento do consumidor têm sido negligenciados. Um deles é o lado social do consumo, i.e dos efeitos das forças presentes nas sociedades, nos processos intra-individuais, o comportamento interpessoal e as relações entre as colectividades sociais (Bagozzi, 2000).

O turismo é um fenómeno de consumo cujo desenvolvimento está directamente relacionado com as alterações frequentes das preferências dos turistas (Salazar, 2004). Essas mudanças ocorreram mediante a evolução das sociedades e dos respectivos modelos turísticos preconizados (Sharpley, 1994). O turismo pode ser entendido como um tipo de ritual que reflecte os valores da sociedade (Graburn, 1989; McCabe, 2002). Nos anos 50, o modo de vida dominante das sociedades ocidentais valorizava a propriedade e a acumulação de bens. Os valores do ter - posse, propriedade, fortuna e consumo - superavam os valores do ser. Vivia-se sob o lema comprar, gastar e possuir (Rojas, 1994). No entanto, nesta década, o turismo ocupava um lugar inferior na lista de prioridades da maioria das pessoas, sendo desejável mas não essencial. A procura teve de ser criada despertando nos consumidores a necessidade para a compra deste produto exótico (Foster, 1985).

No princípio da década de 60 o modo de vida da sociedade americana torna-se o modelo social de referência para os restantes países desenvolvidos, favorecendo a extensão do consumo. As alterações mais significativas nos padrões do consumo em turismo ocorreram a partir desse período (Perkins & Thorns, 2001). Nesta década o

turismo passou a ter um maior significado e a procura aumentou substancialmente (Foster, 1985). Para os turistas foi a época da construção da imagem das férias baseada no modelo dos 3 S’s – sol, mar e areia (sun, sea, sand). O ócio passou a ser uma necessidade dos indivíduos devido ao aumento dos rendimentos, à generalização do princípio das férias pagas, à mobilidade e ao crescimento das cidades (Batouxas, 2001).

Nos anos 70 a realização pessoal constituiu-se como o elemento motor da procura turística. O modelo de férias baseava-se na descoberta de países longínquos, no contacto com a Natureza, diferentes povos e culturas. Para os países do Terceiro Mundo ou para as economias das áreas mais empobrecidas, o turismo era visto como um factor de modernização (Gil & Curiel, 2008).

No fim dos anos 70 e princípio dos anos 80 desenvolveu-se um tipo de sociedade na qual se combinavam valores diferentes e, por vezes, contraditórios. A recessão económica mundial do princípio dos anos 80 forçou uma vez mais as pessoas a conceber as férias como algo profundamente essencial sobretudo com as altas taxas de inflação e desemprego que dominavam na época (Foster, 1985).

Os destinos longínquos passaram então a estar mais acessíveis com a diminuição do preço das viagens, surgindo as primeiras companhias aéreas de baixo custo, de que é exemplo a Virgin. No final desta década, o comportamento dos consumidores em turismo baseava-se na necessidade de regresso ao durável, às coisas simples e económicas. Os indivíduos passaram a valorizar quer o seu equilíbrio físico e psicológico através da realização de actividades físicas e desportivas (Arroteia, 1994), quer a problemática ambiental resultante dos impactos negativos, cada vez mais visíveis, da industrialização e da massificação turística dos anos 60. É o período do

small is beautiful (Joaquim, 1997), onde as questões de sustentabilidade começam a

ser discutidas por instituições locais e internacionais, como a União Europeia (Gil & Curil, 2008).

Na década de 90 o turismo tornou-se um dos primeiros sectores da economia mundial. Na actualidade, verifica-se uma alteração nos comportamentos de consumo em turismo. Contrariamente ao verificado na década de 50, os valores do ser - liberdade, participação e desenvolvimento pessoal - tornam-se prioritários no viver da sociedade

actual. O objectivo da qualidade de vida sobrepõe-se ao do nível de vida (Krippendorf, 1989). O turismo é hoje um componente essencial dos estilos de vida das populações bem como um traço essencial das representações sobre a qualidade de vida (Ferreira, 1995). A abundância, ter tudo a nível material, dá lugar à qualidade do que se tem inclusive ao nível espiritual que se consegue alcançar (Rojas, 1994). As férias passam a constituir uma procura de realização de vida, de felicidade, de paraíso e por isso a fazerem parte da qualidade de vida (Opaschowski, 2001).

À medida que os consumidores se tornaram mais sofisticados, experientes e simultaneamente menos ricos, verificaram-se mudanças nos padrões de comportamento e as decisões passaram a basear-se em critérios mais cuidadosos e exigentes (Foster, 1985). Os novos turistas querem ser diferentes e destacar-se das multidões pela afirmação da sua individualidade (Poon, 1993). São cada vez mais independentes, experientes, flexíveis com preferências voláteis e desejo por um turismo alternativo (Ioannides & Debbage, 1997).

A tendência a ter direito a férias mais longas no final do século XX ajudou a estimular o notável desenvolvimento da preferência do consumidor em tirar várias férias ao longo do ano, mudando a atitude tradicional das férias anuais (Middleton & Clarke 2001). Este facto estimulou o crescimento da oferta de produtos de férias adicionais em curtos períodos de tempo. Por outro lado, o conceito do novo consumidor passou a requerer a oferta de novos produtos e destinos no âmbito dos novos modelos turísticos complementares ou alternativos aos de sol e praia, como as montanhas (Fourneau, 1998; Middleton & Clarke 2001; Aguiló, Alegre & Sard, 2005).

O turista do séc. XXI procura novas e excitantes formas de turismo num desafio ao produto massificado (Wearing, 2002). Assiste-se, por isso, a uma cada vez maior preferência e procura de destinos remotos e naturais (Poon, 1993; Urry, 1995), com tendência para as férias activas através da procura de novos produtos e destinos turísticos que proporcionem experiências fortes e intensas (Bétran, 1995; Stamboulis & Skayannis, 2003; Cohen, 2004). Os consumidores guiam-se hoje em dia por novas prioridades e preocupações, procurando novas experiências e actividades durante as suas viagens. Querem viver ambientes, atmosferas e comprar emoções e não produtos

(Hirschman & Holbrook, 1982; Opaschowski, 2001; Trauer, 2006) o que traduz uma alteração nos comportamentos dos indivíduos em turismo.

O paradigma do novo turismo descreve o velho turista como inexperiente, standard, massificado na procura de climas quentes e soalheiros através de um pacote rígido de férias (Aguiló et al., 2005). Como resposta, as novas práticas turísticas emergem como um conjunto de actividades recreativas espontâneas e imprevisíveis (Poon, 1993), baseadas na necessidade da libertação de adrenalina e do stress acumulado no dia-a- dia (Juan-Alonso, 1999). Os desportos de aventura e de contacto com a Natureza ganham quota de mercado em turismo. Os destinos turísticos que proporcionem experiências únicas de aventura, aprendizagem e relacionamento humano são considerados os mais atractivos de que são exemplo os destinos de montanha (McCool, 2002).

Quadro I.3 – QuadroResumo da Evolução do Consumo em Turismo.

Características do Consumo Turístico

Anos 50

O nível de vida como prioridade, medido pelos valores do ter: posse, propriedade, fortuna e consumo.

Turismo como um produto de consumo desejável mas não essencial. Consumo turístico limitado a determinados grupos sociais.

Anos 60

A actividade turística assumida como uma necessidade.

Aumento substancial da procura turística: Massificação do turismo. Consumo turístico baseado no modelo turístico 3 S’s – sun, sand, sea. Procura de destinos turísticos de sol e mar.

Anos 70

Modelo turístico baseado na descoberta de países longínquos e regiões remotas. Consumo turístico baseado na descoberta do diferente: procura de contacto com diferentes culturas e formas de vida.

Anos 80

Consciência dos efeitos negativos da massificação do turismo.

Comportamento dos consumidores em turismo baseado na necessidade do regresso ao durável e às coisas simples e de reencontro com a Natureza.

Procura turística baseada no princípio do small is beautiful. Emergência do modelo turístico 3 L’s – land, lore, leisure.

Características do Consumo Turístico

Anos 90

Valorização do ser: liberdade, participação e expansão pessoal.

Turismo com um traço essencial das representações da qualidade de vida.

Consumo turístico como uma procura de revalorização da vida, felicidade e paraíso. Motivação para a auto-realização e procura de experiências autênticas.

Séc.XXI Turismo como um modo de vida.

Preferência por destinos turísticos remotos como as montanhas. Tendência para férias activas.

Consumo turístico baseado em emoções. Motivação para o processo de aprendizagem.

Emergência dos modelos turísticos 3 E’s - excitment, education, experience e 4 L’s - landscape, leisure, learning, limit (Franch, Martini, Buffa & Parisi, 2008).

Procura de formas alternativas de turismo: Edu-turismo, Ecoturismo, Turismo de Voluntariado, Turismo de Montanha.

Fonte: Elaboração própria.