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Evolução Histórica da Educação Especial

2. Perspetiva histórica da Intervenção Precoce

2.2. Intervenção Precoce em Portugal

2.2.1. Evolução Histórica da Educação Especial

De acordo com o estudo acerca do Sistema de Educação Especial, publicado pelo Secretariado Nacional de Reabilitação [SNR], em Portugal existem três fases de atendimento a crianças e jovens com deficiência (SNR, 1984).

Baseando-se nos estudos de Caldwell (1973) os autores Meisels & Shonkoff, (2000) referem que a primeira fase corresponde ao “período dos esquecidos e escondidos”, a qual prolonga a tradição asilar e segregadora do século XIX. Neste período, que se situa no início do século XX, mais concretamente a partir da segunda metade do século XIX até á data da fundação do Instituto António Aurélio da Costa Ferreira (Veiga, 1999), as famílias, sentindo-se discriminadas, mantinham as crianças com deficiência longe da vista do público pois eram vistas como um ser estranho (Conselho Nacional de Educação [CNE], 1999). Surgem, desta forma, as “instituições especiais, asilos, em que são colocadas muitas crianças rotuladas e segregadas em função da sua deficiência” (Correia e Cabral, 1997a, p. 13) o que revela que as medidas de apoio eram essencialmente de carácter assistencial e/ou médico (Bairrão, Felgueiras, Fontes, Pereira e Vilhena, 1998; CNE, 1999; Serrano, 2007; Veiga, 1999). De acordo com o estudo do SNR referido anteriormente (SNR, 1984) e com Veiga (1999) a primeira fase do atendimento a crianças com deficiência em Portugal começou em 1823 sendo que as primeiras crianças a serem atendidas eram portadoras de deficiências sensoriais as quais estavam em asilos na sua maioria de iniciativa privada. Contudo, Bairrão, Barbosa, Borges, Cruz e Macedo-Pinto (1989, citados por Tagethof, 2007) referem que a primeira forma de atendimento às crianças com menos de seis anos, teve início em 1834, com a institucionalização de crianças economicamente desfavorecidas.

O estudo acerca do Sistema de Educação Especial, publicado pelo Secretariado Nacional de Reabilitação (SNR, 1984) refere que a segunda fase, a fase do despiste e da segregação, surge nos anos 50 e 60, mais especificamente em 1946 (Veiga, 1999), e que esta se caracteriza por ser um período em que a preocupação se centrava na classificação e diagnóstico e não na educação (CNE, 1999). Daí que os autores a caraterizam como uma fase de forte intervenção de natureza pública, liderada pelo Ministério dos Assuntos Sociais, em que o Ministério da Educação não assume qualquer papel de destaque. Este período distingue-se, de acordo com os autores, pela fundação de “centros de educação especial e centros de observação e também pela realização dos primeiros programas de educação especializada de professores, fora do âmbito do Ministério da Educação” (CNE, 1999, p. 16) sendo uma fase com um cariz médico-terapêutico (Veiga, 1999). Surge desta forma “um sistema educativo paralelo ao sistema educativo regular e com uma marca estigmatizante, decorrendo em espaços segregados e com uma designação significativa: as classes especiais” (CNE, 1999, p. 4). Como exemplo Costa (1981), Correia e Cabral (1997b), Pimentel (2005)e Veiga (1999) referem a importância da fundação, em 1915, do Instituto Médico-Pedagógico ou Instituto Médico Pedagógico António Aurélio da Costa Ferreira

(assim denominado a partir da década de 40 em homenagem ao seu fundador), o qual foi pioneiro na avaliação e educação das crianças com diversas deficiências, nomeadamente deficiência mental, bem como na investigação e formação de professores de ensino especial. Também Costa e Rodrigues (1999, citados por Pimentel, 2005) referem que até à segunda metade do século XX, foram criadas, por iniciativa de médicos, pais e professores, as escolas especiais para um conjunto de deficiências nomeadamente Síndrome de Down, Paralisia Cerebral e Deficiência Visual. Santos (2007) acrescenta que estes centros foram criados pela Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral, constituída, em 1960, por um grupo de pais de crianças portadoras de Paralisia Cerebral e problemáticas semelhantes, sendo apoiados por alguns técnicos e tendo-se constituído numa resposta de atendimento precoce à sua população-alvo, embora a taxa de cobertura fosse muito restrita, já que estava condicionada pela localização dos três únicos centros do país em Lisboa, Porto e Coimbra.

Veiga (1999) destaca que, na sequência destes movimentos de natureza associativa, surgem nomeadamente: em 1960, a Associação Portuguesa de Paralisia Cerebral; em, 1964, os Serviços de Educação de Deficientes destinados a deficientes mentais criado pelo Instituto de Assistência a Menores; em 1965, o primeiro Centro da Associação Portuguesa e Amigos das crianças Mongoloides mais recentemente designada de Associação Portuguesa de Pais e Amigos do Cidadão Deficiente Mental (APPCDM); em 1968, os Serviços de Educação de Deficientes destinado a deficientes visuais e auditivos criado pelo Instituto de Assistência a Menores; e ainda em 1968, surge, por iniciativa da APPCDM, a primeira creche de inclusão e das primeiras na Europa denominada “A Lebre e a Tartaruga”.

A terceira fase de atendimento, a fase de “identificação e ajuda”, inicia-se nos primórdios dos anos 70 (Bairrão et al, 1998) a qual se carateriza pelo aumento das responsabilidades do Ministério da Educação (SNR, 1984). Destacamos a criação em 1972, das Divisões do Ensino Especial do Básico e do Secundário (DEEB/DEES) (Correia e Cabral, 1997b; Serrano, 2007; SNR, 1984; Veiga, 1999); a criação no ano seguinte do Departamento de Educação Especial o qual se propunha a dar início a um programa de atendimento a crianças com deficiência a nível nacional numa perspetiva de integração (Pimentel, 2005). Também em 1975/76 o Ministério da Educação cria as Equipas de Educação Especial (EEE’S) cujos objetivos gerais eram propiciar a integração social, familiar e escolar das crianças com deficiências motoras e sensoriais, permitindo assim que essas crianças permanecessem nas escolas regulares (Bairrão et al., 1998; Correia e Cabral, 1997b; Pimentel, 2005; Serrano, 2007). São também criadas as Unidades de Orientação Educativa (UOE) e os Serviços de Apoio às Dificuldades de Aprendizagem (SADA), no âmbito do Ministério da Educação, “numa perspetiva de orientação educativa junto dos professores e não do apoio direto aos alunos com dificuldades de aprendizagem” (Pimentel, 2005, p. 218). Simultaneamente, surgem, de acordo com Veiga (1999), na mesma década,

cooperativas e associações de pais que fundam escolas de ensino especial para crianças com deficiências profundas.

Em Portugal a Educação Especial foi fortemente influenciada pela publicação de vários documentos normativos estrangeiros nomeadamente a Public Law (PL 94- 142) publicada, nos Estados Unidos da América, em 1975 a qual promovia direitos iguais para todos os cidadãos no que se refere à educação (Alves, 2009; Bairrão et al, 1998; CNE, 1999; Correia e Cabral, 1997b; Mesquita, 2002; Pimentel, 2005; Serrano, 2007). Os autores não só valorizam a influência da legislação americana como também reiteram a enorme influência de um outro documento normativo, o Warnock Report, publicado em 1978, no Reino Unido, o qual introduz o conceito de Necessidades Educativas Especiais. Neste sentido o apoio a estas crianças está previsto em vários documentos normativos nomeadamente a Lei de Bases do Sistema Educativo (Lei nº 46/86), o Decreto-Lei 35/90 de 25 de janeiro (Cruz et al., 2003) e o Decreto-Lei 319/91 de 23 de agosto, o qual veio preencher a lacuna legislativa sentida no nosso país no âmbito da educação especial (Correia e Cabral, 1997b; Cruz et al., 2003; Serrano, 2007). Posteriormente foi publicado um outro documento normativo, o Decreto-Lei nº 3/2008 que vigorou até agosto de 2018, data da publicação do Decreto Lei nº 54/2018, recentemente em vigor e que veio dar início a uma nova fase: a fase de inclusão.