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Capítulo III – Sistema Educativo em Timor-Leste no período de 1976-99

3.5. Evolução do Sistema Educativo

A integração de Timor-Leste na Indonésia implicou que a nova província se adaptasse ao país ao qual iria pertencer. Uma dessas adaptações passava pela aprendizagem da língua oficial dominante na Indonésia, o bahasa javanês. A língua oficial da Indonésia é o bahasa, embora existam em todo o seu território mais de 250 línguas e dialectos. Em Timor-Leste existem 14 dialectos predominando a língua tétum. Com a integração foi introduzido o bahasa nas escolas de Timor-Leste. Um dos objectivos desta medida era o de facilitar aos timorenses facilidades de deslocação no resto do país. A respeito dos timorenses,

“o domínio que adquiriam sobre a língua indonésia permitia-lhes o acesso a um mundo que transpunha as fronteiras de Timor e da Indonésia, muito à semelhança da situação que os holandeses criaram aos intelectuais indonésios, ao permitiram o acesso a um mundo para além das Índias Orientais Holandesas durante o período do «despertar» nacional (...)”176.

Esta medida de favorecimento da deslocação de timorenses pela Indonésia (que teve início em finais de Dezembro de 1988 e que não abrangeu toda a província de Timor-Leste), obedecia uma vez mais ao objectivo estratégico de apressar a integração.

O bahasa tornou-se na língua administrativa do território, sendo exigida a sua utilização em todos os assuntos tratados com a administração indonésia. Nos primeiros anos, tornou-se necessário o envio de um grande número de professores de outras partes da Indonésia, de todos os níveis de ensino, para assegurar a aprendizagem da nova língua. Contudo, foi progressivamente crescendo o número de professores primários timorenses: “Em 1998/99, dos 6672 professores primários 78% eram timorenses”177.

Para além da implantação do bahasa, Jakarta iniciou um programa de alargamento do acesso da população timorense a todos os níveis de ensino: “o número de inscritos nas escolas secundárias aumentou 50 vezes (para mais de 50000) e a taxa de analfabetismo diminuiu de forma significativa (de 90%, em 1972, para 52%, em 1990)

176

COX, Steve; CAREY, Peter – Ob. Cit., p.47.

177

”178. Estes resultados justificam-se porque o ensino era obrigatório, não obstante existir uma fracção de crianças em idade escolar que não eram matriculadas: “A baixa taxa de matrículas, a par das elevadas taxas de abandono, significa que em 1995 (…), no grupo etário 15-19, menos de metade dos jovens, rapazes ou raparigas, tenha completado a instrução primária. Como resultado actualmente mais de metade da população é analfabeta (49% de homens e 64% de mulheres) ”179.

Mesmo estes esforços não foram suficientes para superar as carências estruturais de Timor-Leste no domínio da educação: “o rácio entre professores e alunos do ensino secundário era o pior de todo o país e o número de habitantes sem saber ler e escrever era ainda, em 1990, cerca de quatro vezes superior à média nacional indonésia”180.

Apesar do número de escolas, de todos os níveis de ensino, terem aumentado significativamente, a esmagadora maioria dos jovens timorenses não ingressava no ensino secundário e no ensino superior. Mais, o ingresso nestes dois níveis de ensino não garantia a obtenção de emprego no futuro. Em finais da década de oitenta começaram a surgir dificuldades na absorção, pela economia local, dos timorenses com formação técnico-profissional e académica. Problemas semelhantes tinham surgido ao longo da década de oitenta, que atingiram em geral, os timorenses, independentemente das suas qualificações. Nessa década, as autoridades indonésias implementaram a política «desenvolvimentista» (pembangunan) em Timor-Leste que criou novas oportunidades locais de emprego (sobretudo ao nível da construção de infra-estruturas: vias de comunicação, edifícios, etc), que beneficiaram sobretudo os transmigrantes, isto é, civis indonésios deslocados das outras ilhas do país. Durante a década de noventa, a admissão de timorenses na administração pública e no sector privado foi difícil. No sector privado, o comércio a retalho era monopolizado por civis indonésios e as grandes empresas eram dominadas pelos militares indonésios que preferiam recrutar pessoas da sua confiança.

Neste sentido, o sistema de ensino instituído pelos indonésios não representava uma perspectiva de futuro e, por essa razão, entre outras, os timorenses preferiam não frequentar a escola. A percentagem de alunos timorenses matriculados nas escolas primárias e nas escolas secundárias foi diminuindo progressivamente até ao final dos anos noventa: “no último ano da administração indonésia, a taxa de matrícula líquida só 178 Idem: p.46. 179 Idem: p.15. 180 Idem: p.46.

atingiu os 36%, no nível mais baixo do ensino secundário, e de 20%, no nível mais alto do mesmo”181. O sistema de ensino indonésio tinha aspectos pouco meritórios: “A corrupção generalizada permitia a venda descarada de certificados e de diplomas falsos em todos os graus de ensino”182.

O sistema de ensino funcionou como um instrumento de promoção da integração que, no caso de falhar, seria complementado por outros instrumentos, nomeadamente o militar. Outro instrumento promotor da integração foi a política da transmigração (transmigrasi) que teve repercussões no sector educativo. Em Timor-Leste, a maioria dos professores eram indonésios, cujo abandono do território, após o referendo de 1999, produziu uma crise de recursos humanos, sobretudo ao nível do ensino secundário. O prosseguimento dos estudos, pelo menos durante a primeira década da ocupação, era mais favorável para os alunos indonésios: “Na passagem do ensino primário para o secundário, foi dada prioridade aos filhos dos militares e funcionários indonésios estabelecidos em Timor-Leste”183.

O sistema educativo implantado pelos indonésios notabilizou-se sobretudo pelo número de escolas construídas. Este facto foi reconhecido por várias organizações internacionais, incluindo a ONU. Em 2000, a ONU estabeleceu a comparação quantitativa entre as escolas existentes em 1978 e as escolas existentes em 1999. Essa comparação, permite constatar a enorme discrepância entre o número de escolas construídas pelos indonésios e o número de escolas construídas pelos portugueses.

181

Resumo do Relatório do Desenvolvimento Humano em Timor-Leste -2004. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, Díli, p.6. www.geocities.com (acedido em 26-04-07)

182

MATTOSO, José – A Dignidade. Kónis Santana e a Resistência Timorense. Mem Martins: Círculo de Leitores, 2005, p.140.

183

Timor-Leste: 20 anos de ocupação; 20 anos de resistência. Lisboa: A Paz é possível em Timor- Leste, s/d, p.30.

Tabela n.º 2 – Legados da Educação Colonial

Fonte184:

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Capítulo IV – O Período Pós-Independência