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Capítulo II O Sistema Educativo colonial português

2.9. O fim da era colonial: dois programas educativos em competição: o programa

2.9.1. O programa da Fretilin

Poucas semanas após o 25 de Abril de 1974, o novo regime instalado em Lisboa autorizou a formação de partidos políticos em Timor-Leste, cabendo a estes tomar uma decisão sobre o futuro do território. Uma delegação militar portuguesa esteve presente na província em Junho de 1974 e informou que o povo timorense teria de optar por uma das três seguintes situações futuras: a independência, a independência como um Estado federado com Portugal ou a integração na Indonésia. Em Outubro do mesmo ano Portugal reatou relações diplomáticas com a Indonésia.

Em Timor-Leste formaram-se três principais formações partidárias, a FRETILIN, a União Democrática Timorense (doravante UDT) e a Associação Popular Democrática de Timor (doravante APODETI), cada uma das quais com uma visão

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CASTRO, Gonçalo Pimenta de – Timor: Subsídios para a sua História. Lisboa: Agência Geral das Colónias, Divisão Geral de Publicações e Biblioteca, 1944, p.203.

diferente sobre o futuro do território. Em Junho de 1975, a FRETILIN e a UDT coligaram-se mas por pouco tempo. A 29 de Julho de 1975, a FRETILIN venceu com maioria absoluta as eleições para as assembleias locais. Este partido provocou preocupações na Indonésia: “A Indonésia (…), mostrou-se preocupada com a possibilidade (…), da FRETILIN, conotada com a FRELIMO de Moçambique e outros partidos marxistas mundiais, se apoderar do poder em Dili, instalando em Timor um regime marxista”136.

No período compreendido entre Abril de 1974 e Dezembro de 1975, em Timor- Leste não se constituiu nem funcionou plenamente um novo sistema educativo devido à instabilidade política local, sobretudo em 1975. Não obstante, foram exercidas significativas funções educativas. Uma dessas funções foi desempenhada pelos militares portugueses ainda que a título de consciencialização política. Tratava-se da divulgação do Programa do Movimento das Forças Armadas.

Em finais de 1975, a Fretilin publicou um manual político que continha a ideologia deste partido sobre a política educativa. Eis duas citações desse manual que exprimem as ideias essenciais sobre educação: “Um ensino ao serviço do povo conduz à libertação do povo. Um ensino que possa levar o povo a participar activamente no traçado da vida da Nação ao contrário do ensino colonial”137. Constava também no programa do manual político a alfabetização total da população: “A Fretilin quer o povo esclarecido e que todos saibam ler e escrever porque a libertação tem que ser completa (…). A Fretilin vai iniciar, desde já, uma campanha de alfabetização num ensino verdadeiramente libertador dos 500 anos de obscurantismo (…)138.

A Fretilin iniciou a sua campanha de alfabetização de adultos utilizando o método do pedagogo brasileiro Paulo Freire. Os dirigentes deste partido acreditavam, tal como Paulo Freire, que os alunos deveriam primeiro aprender a ler e a escrever na língua materna, condição para aprender a fazer o mesmo nas outras línguas. Com esse objectivo é ensinado o tétum e mesmo criado um manual escrito nessa língua, para uso dos professores, intitulado Rai Timur Rai Ita Niang (Timor é o Nosso País): “O manual, Rai Timur Rai Ita Niang, focava palavras do dia-a-dia e dividia estas palavras em sílabas, colocando-as seguidamente em diferentes contextos com palavras associadas. A essência do manual consistia na descrição do quotidiano rural, fornecida pelos próprios

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ROCHA, Nuno – Ob. Cit., p.87.

137

CHRYSTELLO, J. Chrys – Timor-Leste: 1973-1975. O Dossier Secreto. Matosinhos: Contemporânea Editora, 1999, p 77.

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timorenses”139. A campanha de alfabetização teve início em Julho de 1975: “Formaram- se pequenas equipas para levar a todo o país uma campanha de sensibilização para a alfabetização, para as questões sanitárias e para as questões políticas”140. Nestas equipas, formadas pela FRETILIN e denominadas «brigadas revolucionárias», participavam professores, enfermeiras, membros do Comité Central da FRETILIN e estudantes do ensino secundário. A FRETILIN pretendia ensinar os timorenses a ler e a escrever o tétum em apenas três meses. Para conseguir esse feito organizou o primeiro sindicato de Timor-Leste composto por estudantes e professores.

A erradicação do analfabetismo constituiu um dos objectivos do programa político da FRETILIN publicado em Novembro de 1974. Com efeito, Timor-Leste possuía uma das mais baixas taxas de alfabetização do mundo: “Aquando da partida dos portugueses, em 1975, a taxa de alfabetização rondava apenas 5%”141.

Não obstante o projecto educativo significar uma ruptura com o passado colonial, a língua portuguesa não foi esquecida: “A Fretilin adopta o Português como língua oficial (…). Adoptaremos um língua estrangeira, por facilidade e por já ser falada, escolhemos o Português”142. O programa educativo da FRETILIN apoiou-se também na formação de pequenas cooperativas rurais, onde eram ensinadas técnicas modernas de produção agrícola, e em centros médicos onde se ensinavam práticas de primeiros socorros e de higiene. Apesar do programa educativo da FRETILIN ter sido breve, este partido apresentou resultados sobre as suas actividades educativas: “…Durante um ano, mais de 200 escolas foram criadas pela FRETILIN num esforço enérgico de eliminar a alta taxa de analfabetismo – mais de 96% do nosso Povo não sabe ler nem escrever”143.

139

TAYLOR, John – A Fretilin e o Movimento Nacionalista em Timor-Leste. In Encontros de Divulgação e Debate em Ciências Sociais. Vila Nova de Gaia: Sociedade de Estudos e Intervenção Patrimonial, s/d, p.116.

140

ALEIXO, Estanislau – Construir uma Sociedade Justa (I). In Depois das Lágrimas. A reconstrução de Timor-Leste. (coord) Jill Jollife. Lisboa: Intercooperação e Desenvolvimento, 2000, p.53.

141

Relatório do Desenvolvimento Humano de Timor-Leste 2002. Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, Díli, p.50.

142

CHRYSTELLO, J. Chrys – Ob. Cit., p 77.

143

Timor-Leste: Uma Luta Heróica. Documentos da Fretilin e do Governo da República Democrática de Timor-Leste, s/d, p.45.