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III CAPITULO

3. RETÁBULOS

3.1 EVOLUÇÃO TECNOLÓGICA DOS RETÁBULOS

É compreensível que os acontecimentos históricos, sociais e religiosos tenham influenciado nas transformações ocorridas nos sistemas construtivos de retábulos ao longo dos séculos e introduzido inovações nestes sistemas. De simples painéis contendo pintura e representando uma sequência narrativa do período medieval à elaborada talha dourada e policromada, a estrutura se modificou para poder suportar a carga proveniente da incorporação de novos

elementos, a exemplo das colunas, e produzindo, desta forma,

sistemas mais complexos (Ilustração 6). ainda, a incorporação da tribuna do trono, que segundo Faria (2003), consiste em um elemento fundamental ao retábulo (Ilustração 7).

Trama: conjunto de linhas principais ou eixos que estruturam um edifício ou uma composição decorativa. O mesmo que malha e retícula.

Capitel: parte superior de colunas e e geralmente apresenta característica marcante das ordens (as principais ordens são a Jónica, Coríntia, Toscana, Compósita). Originalmente as colunas tinham como função construtiva aumentar a superfície de apoio dos elementos que sustentava, permitindo que fossem mais curtas, posteriormente, com a utilização de outros elementos estruturais seu uso restringiu-se à função decorativa.

Elementos constituintes da parte anterior do da Igreja Nossa Senhora das Necessidades. Coroamento Segundo corpo Corpo central Primeiro corpo 3- 4- 5- 6- 7- Escudo Entablamento Coluna Capitel Peanha 8- Tribuna do trono 9- Trono 10- Nicho 11- do altar 12- Banqueta 13- Porta

Ilustração 6 - Localização de elementos do retábulo. Foto da autora.

Níveis de pisos existentes na parte dos fundos do retábulo-mor da Igreja Nossa Senhora das Necessidades. O elemento divisor é o assoalho da tribuna do trono:

Superior, composto por tribuna e fundos desta, cujo acesso se dá através de uma escada em madeira.

2 Inferior.

Ilustração 7 - Fundos do retábulo. Desenho: Rafael

Segundo e (1999), pode-se considerar que a origem destes bens esteja relacionada à arte gótica, com seus vitrais e fachadas. Mas, tem-se como antecedente os altares do período românico, com a existência de pintura à no frontal da mesa do altar. Dessa forma, foram incorporados à parte superior e posterior dos altares os trípticos, que são formados por três painéis justapostos constituídos de tema único e contendo pinturas (Ilustração 8). Com o Renascimento e a adoção das ideias gregas, o tridimensional

ganhou corpo e houve mudanças na concepção dos retábulos. Alguns

elementos construtivos, a exemplo de colunas, já não cumprem tão somente função estrutural, e sim ornamental como elementos de expressão artística (Ilustração 9).

Ilustração 8 - Painel lateral do da virgem Rogier Van der Weyden. Acesso em 26 nov 2005.

Ilustração 9 - do Convento da

Cartuxa. Évora. Portugal. Foto da autora, 1997.

Foi no período barroco que a execução dos retábulos adquiriu envergadura, ou seja, o caráter funcional abriu caminho para novas formas plásticas com suas complicadas estruturas

Têmpera: o termo têmpera significa temperar os pigmentos aos veículos, sendo este um meio aquoso. Esta antiga técnica pictórica normalmente utilizava como aglutinante o ovo ou cola proteica.

constituindo-se em bens integrados à arquitetura, abarcando o próprio espaço

por meio de seus painéis pintados e entalhados e de seus nichos. O crescente domínio das técnicas e dos materiais proporcionou a obtenção de maior profundidade ao retábulo, possibilitando a concepção de efeito cenográfico ao ambiente e transformando os retábulos, no sentido do templo, por muitas vezes.

Como resultado do aprendizado conquistado ao longo dos séculos, obras duradouras e com qualidade foram obtidas com respaldo na habilidade e no conhecimento do artesão quanto ao uso do material e da técnica, o que normalmente era repassado pelos mestres e embasado nos tratados de Uzielli (1998), referindo-se a estes manuais antigos sobre técnicas artísticas, menciona que uma das mais detalhadas informações sobre técnicas de arte data do

século XV. Escrita por Ceninno Cennini, em seu livro // libro tece

recomendações quanto aos cuidados necessários ao uso da madeira e ao preparo das camadas aplicadas sobre o suporte.

Pressupõe-se que as técnicas utilizadas na criação de esculturas em madeira assemelham-se às empregadas nos retábulos. Medeiros (1999), referindo-se às esculturas executadas no período Barroco e Rococó, entre os séculos XVIII e início do XIX, em Minas Gerais, menciona que estas são consideradas obras de grande beleza plástica e de qualidade técnica. Isto de certa forma comprova o conhecimento e domínio pelos artistas deste período das técnicas tradicionais de policromia em Minas Gerais (SOUZA, 1996; MEDEIROS, 1999). Da mesma forma, Schaefer (2000) considera o refinamento das técnicas utilizadas na execução dos retábulos da Igreja Nossa Senhora do Rosário do Embu, seguindo os procedimentos descritos em tratados clássicos de pintura.

Conforme Souza (1996), Medeiros (1999) e Schaefer (2000), têm-se conhecimento de que os diversos materiais a serem empregados na execução dos retábulos normalmente seguem uma ordem na aplicação da policromia. Schaefer (2000, p. por exemplo, citando o tratado de Francisco Pacheco diz que "a primeira fase da policromia era a da talha, dos nós da madeira e das partes resinosas com o aparelhamento e em seguida, com o gesso e cola". Para

Dentre estes tratados destaca-se o do monge beneditino Theophilus (Livro I, início do séc. XII); de Cennino Cennini libro século XV); de Francisco Pacheco (Arte de pintura, século XVII) e de Philippe Nunes (Arte da pintura, simetria e perspectiva, 1615).

facilitar a compreensão a Ilustração 10 representa esquematicamente o corte a saber: a) suporte; b) camada de encolagem; c) base de preparação; d) bolo arménio; e) policromia e/ou douramento; f) camada protetora. A aplicação da camada de bolo arménio ocorre quando se pretende aplicar a folha de ouro. Observa-se que intervenções realizadas ao longo dos anos podem provocar a alteração da estratigrafia das camadas, com o acréscimo de repinturas ou da retirada de camadas provenientes da concepção original.

a

Ilustração 10 - Representação esquemática de corte estratigráfico considerando o suporte "a" como camada.

Quanto às sambladuras, Schaefer (2000), comenta que os painéis medievais eram pregados, encaixados e colados, sendo que os tratados da época mencionam o uso de encaixes e colas, mas não especificam os tipos de encaixes usados. Segundo a referida autora os tratados de Theophilus e Cennino Cennini comentam o uso da cola de queijo para fixar a madeira. Serck- Dewaide (1998), ao citar os retábulos de Bruxelas executados no século XV, menciona que os elementos eram sistematicamente cortados em quadros e esculpidos em blocos, sendo que as sambladuras eram em cauda de andorinha e os elementos eram fixados com cola animal.