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Exato, só depois é que a gente sente queimá, arde, ( ) (Inf 26, Amostra 00 (C), Ginásio, p 07)

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

F: Exato, só depois é que a gente sente queimá, arde, ( ) (Inf 26, Amostra 00 (C), Ginásio, p 07)

Pessoa gramatical dos sujeitos das cláusulas matriz e completiva

Esse fator lingüístico atua principalmente no processo de gramaticalização. Alguns usos gramaticalizados de construções lingüísticas se restringem a uma pessoa gramatical. A título de ilustração, na língua inglesa, os verbos cognitivos think e guess se gramaticalizaram e passaram a ser utilizados como parentéticos epistêmicos em um contexto: respectivamente, no de primeira e segunda pessoas do singular (como já foi mencionado no capítulo 2 desta tese, a partir dos resultados do trabalho de Thompson e Mulac, 1991 apud Hopper e Traugott, 1993). Evidencia-se esse mesmo uso com algumas formas verbais do português: por exemplo, achar e parecer são interpretados como parentéticos epistêmicos, apenas quando ocorrem na primeira e na terceira pessoa do singular, respectivamente (cf. Galvão, 1999; Cezario, 2001; Gonçalves, 2003).

Neste trabalho, no que tange à categoria pessoa gramatical dos sujeitos das cláusulas vinculadas, foram formuladas as seguintes perguntas: (a) alguma das acepções arroladas para os seis verbos aqui examinados está relacionada a um dado contexto de ocorrência? (b) no caso afirmativo, isso constitui um indício de gramaticalização do uso do verbo que apresenta uma restrição de pessoa gramatical? Com o intuito de responder a essas duas perguntas, os sujeitos das sentenças matriz e completivas foram codificados em função das seis pessoas gramaticais da língua portuguesa18.

Em síntese, a partir das propriedades lingüísticas supracitadas (com exceção da última), estou assumindo que cláusulas matriz e encaixada que se encontram mais integradas semântica e sintaticamente apresentam as seguintes características estruturais:

a. forma não-finita da encaixada; b. sujeito da completiva não explícito; c. sujeitos correferenciais ;

d. sujeito da encaixada realizado como uma anáfora zero; e. sujeito inanimado na completiva;

f. partilha de tempos e modos verbais;

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g. na matriz, sujeito agentivo que controla o sujeito da encaixada e, inversamente, na encaixada, sujeito menos agentivo que exibe, nos termos de Givón (1990), menor controle, liberdade de escolha e independência de ação;

h. na matriz, um único operador de negação cujo valor se estende até a encaixada ou nos casos de negação dupla (uma, na matriz, outra, na encaixada), operadores de negação que não se mostram com valores excludentes;

i. ausência de conectivos (essa característica está associada à realização da encaixada em suas formas não-finita ou nominalizada);

j. ausência de material fônico entre as cláusulas matriz e completiva.

Além dos parâmetros formais e semântico-pragmáticos mencionados anteriormente, foi controlado, nesta pesquisa, o fator lingüístico acepções dos verbos aqui examinados. Passo a tratar desse fator.

Acepções dos verbos

Em construções encaixadas com oração completiva, um mesmo verbo da matriz (por exemplo, deixar) pode ser empregado com diferentes significados, os quais podem estar associados a variadas codificações estruturais das completivas desse verbo. Como já foi dito, a hipótese a ser perseguida em relação a esse fator é a de que há diferenças de graus de integração sintática e gramaticalização entre as acepções de cada verbo analisado. Assim, parte-se do pressuposto de que determinados sentidos de verbos estão mais integrados e, por conseguinte, mais gramaticalizados do que outros.

3.2.2 A categoria extralingüística grau de escolaridade

Dentre os fatores extralingüísticos que podem ser correlacionados ao fenômeno de variação lingüística, foi selecionada, nesta pesquisa, apenas a categoria escolaridade. Resultados de estudos variacionistas têm apontado o efeito dessa categoria sobre o uso de formas variantes de fatos lingüísticos do português do Brasil. A título de exemplo, considere-se o fenômeno de concordância nominal (cf. Scherre, 1996, 1998).

Neste trabalho, embora não estivesse operando com uma regra variável, controlei a categoria escolaridade, baseada nas seguintes hipóteses: (a) confrontando-se os níveis de concretude/abstratização dos sentidos de um item lingüístico, a de que usos de um dado verbo que instanciam valores mais abstratos ocorreriam acentuadamente com falantes com nível de escolaridade mais avançado; (b) a de que usos mais gramaticalizados dos verbos aqui analisados, pelo fato de serem mais abstratos e expressarem estratégias comunicativas mais complexas (cf. Martelotta e Rêgo, 1996), também predominariam nos graus mais altos de escolaridade. Essa variável apresenta os seguintes fatores: (a) nível primário, (b) nível ginasial e (c) nível colegial. A justificativa pela escolha desses três fatores se deve ao fato de os falantes das amostras 80 e 00 (C) já se encontrarem estratificados em função deles.

3.3 Procedimentos adotados para a apresentação do exemplário

Os exemplos selecionados para ilustrarem os dados das amostras foram reproduzidos de acordo com os seguintes critérios:

(a) No caso dos dados sincrônicos, que se referem à modalidade falada da língua portuguesa, a identificação de cada exemplo foi feita imediatamente após a sua citação, indicando-se o informante que produziu o trecho em destaque, a amostra utilizada, o grau de escolaridade do informante e o número da página do inquérito onde se encontra a parte citada; já nos dados diacrônicos, os exemplos foram identificados do seguinte modo: utilizou-se uma abreviatura do documento analisado, seguida dos números do fólio ou capítulo e das linhas em que estava o trecho destacado.

(b) Em cada capítulo, a numeração dos exemplos partiu sempre do número 1; no capítulo de análise dos dados, essa numeração se reinicia a cada seção.

(c) Na reprodução dos exemplos, priorizou-se a fala do informante, porém, em alguns casos, transcreveu-se a fala do documentador para facilitar a compreensão do trecho destacado; em

alguns momentos, também houve a necessidade de se transcreverem, mais extensamente, alguns exemplos com o propósito de que não se perdesse o contexto discursivo em que se inseriam.

(d) Na transcrição dos exemplos, para indicar que alguma palavra ou frase da entrevista foi omitida, utilizaram-se reticências entre parênteses.

CAPÍTULO 4