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6. DISCUSSÃO GERAL

6.4 Excipientes farmacêuticos: um problema ainda “desconhecido”

Conforme demonstrado no presente trabalho, os neonatos foram expostos a uma grande variedade de excipientes farmacêuticos com potencial nocivo por diversas formulações, alertando para a possibilidade de interações entre os excipientes, efeitos aditivos decorrentes do acúmulo, entre outros efeitos ainda pouco elucidados. Apesar desse problema ter sido levantado por outros autores, principalmente na década de 1980 em decorrência dos eventos adversos relacionados ao álcool benzílico, propilenoglicol e polissorbato 80, poucas medidas têm sido tomadas no que concerne a incentivos à pesquisa e ao desenvolvimento de medicamentos isentos de tais substâncias ou que contenham excipientes seguros (CENTERS FOR DISEASE, 1982; LORCH et al., 1985; MACDONALD et al., 1987). O tema somente tem sido suscitado após o apelo de alguns pesquisadores sobre a necessidade de enxergar os excipientes farmacêuticos como substâncias exógenas que necessitam de estudos de segurança, e não apenas como substâncias inertes especialmente no que concerne à população pediátrica (PIFFERI; RESTANI, 2003; NAHATA, 2009; FABIANO et al., 2011).

A presente pesquisa alerta sobre a exposição “desconhecida” de neonatos a excipientes nocivos e potencialmente nocivos habitualmente utilizados na prática clínica em UTIN’s no Brasil, informando quais as formulações de maior uso apresentam urgência em intervenções e pesquisas relacionadas ao desenvolvimento de medicamentos isentos de excipientes nocivos ou substitutos terapêuticos.

No Brasil, não há legislação específica que incentive ou promova a regulamentação da utilização de excipientes farmacêuticos na população pediátrica em geral. Em 2009, a ANVISA exigiu que as bulas trouxessem alertas para as possíveis contraindicações a excipientes farmacêuticos constantes no produto (BRASIL, 2009). Algumas medidas da Agência são específicas para alguns excipientes específicos (alumínio, amarelo de tartrazina, benzoato de sódio, cânfora, corante, etanol, glicose/ dissacarídeos, glúten e sulfito), exigindo- se que o fabricante explicite os efeitos adversos ou alertas decorrentes da sua utilização (BRASIL, 2010). Apesar de não apresentar todos os excipientes nocivos aos neonatos, essa resolução apresenta um passo importante ao exigir que fabricantes informem os riscos

específicos de alguns excipientes quando utilizados em recém-nascidos, a exemplo de formulações contendo alumínio e álcool benzílico. No ano de 2012, a ANVISA realizou consulta pública a fim de definir as Boas Práticas de Fabricação de Excipientes Farmacêuticos e, apesar de ainda não ter sido divulgada, percebe-se que há uma tendência em observar os excipientes como parte fundamental no processo de qualidade do medicamento (BRASIL, 2012).

A despeito das formulações de uso adulto, nosso estudo evidenciou que algumas formulações de uso pediátrico, principalmente as soluções orais, apresentaram um grande número de excipientes farmacêuticos nocivos e potencialmente nocivos. No que concerne às questões de segurança, a escolha de excipientes farmacêuticos que compõem uma formulação utiliza de estudos de segurança realizados em humanos adultos ou animais, não considerando as especificidades e heterogeneidade da população pediátrica, a exemplo da presença de polissorbato 80 em domperidona solução oral, como detectado em nosso estudo. Conforme discutido no primeiro artigo da tese, não há consenso sobre a dosagem de excipientes nas formulações e o surgimento de reações adversas a curto e longo prazos. Em estudo publicado por de Cock et al., (2013) sobre a farmacocinética de propilenoglicol, ainda não há dose segura que possa ser recomendada aos neonatos, além de não ter sido notada nenhuma reação adversa a curto prazo. Muito embora, os efeitos aditivos e a possibilidade de acúmulo desses excipientes devem ser considerados, dadas as especificidades relacionadas ao neonato e decorrentes de procedimentos da UTIN que, a depender da criticidade do neonato, podem receber até 20 medicamentos por dia ou por meio de vacinas, a exemplo de vacinas tais como a anti-hepatite B (Engerix-B® contendo polissorbato 20) recomendada pelo programa brasileiro de imunizações para utilização nas primeiras 12 horas de vida (BRASIL, 2003).

Algumas medidas deveriam ser adotadas em relação aos excipientes, e uma delas seria o laboratório informar dados quantitativos dos excipientes reconhecidamente nocivos a fim de prevenir que eventos adversos fatais ocorram. Cabe aos órgãos reguladores de medicamentos exigir que tais medidas sejam implementadas. Interessantemente, a ANVISA na Resolução RDC nº 60/2010 publicou normas solicitando que os fabricantes informassem os dados quantitativos relativos aos excipientes etanol e glicose/dissacarídeos (BRASIL, 2010). No entanto, essa medida ainda é tímida frente ao problema aqui discutido.

O desenvolvimento de formulações prontas-para-uso isentas de excipientes nocivos ou potencialmente nocivos poderia ser outra solução para esse problema. No contexto dessa

apresentavam formulações isentas de excipientes nocivos disponíveis no mercado brasileiro, a exemplo de heparina solução injetável de uso subcutâneo sem a presença de álcool benzílico.

Autores sugerem que possivelmente a produção de formulações sem excipientes seria economicamente inviável, não tendo atratividade comercial para o mercado não permitindo aos clínicos escolher o tratamento mais adequado e seguro (VAN RIET-NALES et al., 2011; LASS et al., 2012). Algumas indústrias cosméticas têm começado a se preocupar com o tema e têm disponibilizado produtos isentos de excipientes nocivos, a exemplo de produtos sem parabenos (CARVALHO, 2014). Pergunta-se se o momento não seria o mais adequado para a indústria farmacêutica buscar outras soluções para esse problema.

A condição demonstrada em nossos resultados é confirmada por autores do Reino Unido, Estônia e EUA, demonstrando a necessidade de se promover e incentivar pesquisas relacionadas aos excipientes (SHEHAB et al., 2009; WHITTAKER et al., 2009; LASS et al., 2012). Algumas dessas iniciativas têm ocorrido de forma conjunta entre países da União Europeia e EUA, associações de pesquisadores e indústria farmacêutica, a exemplo do Safety and Toxicity of Excipients for Pediatrics (STEP) database e European Study of Neonatal Excipient Exposure (ESNEE) (SALUNKE et al., 2013; TURNER, M. A.; DUNCAN; SHAH; METSVAHT et al., 2013).

6.5 Informações sobre uso de medicamentos em neonatos: o papel dos órgãos