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Em 2014, o Chile substituiu sua antiga lei de falências pela nova lei de reorganização e liquidação de empresas e pessoas físicas. Os principais pontos da reforma são a instauração de tribunal especializado em questões de falência, o fomento do acesso a novos empréstimos e a inclusão de processos para pessoas físicas – a legislação anterior era focada em empresas e tornava o processo para pessoa física difícil e caro.

Como mostra a Figura 17, a reforma levou ao aumento da taxa de recuperação de crédito, diminuiu o tempo de insolvência e melhorou o indicador de força da estrutura de insolvência – que leva em conta quem pode dar início ao processo de insolvência, a gestão de ativos do devedor, os procedimentos de reorganização e o nível de participação dos credores no processo.

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Taxa de recuperação (centavos de dólar)

Força da estrutura de insolvência (0–16)

Anos para resolução de insolvência

29 10 3 2014 2014 2014

Taxa de recuperação (centavos de dólar)

Força da estrutura de insolvência (0–16)

30 10 3 2015 2015 2015 57 2015 13 2015 31 12 3 2016 2016 2016 58 2016 13 2016 34 12 3 2017 2017 2017 61 2017 14 2017 41 12 2 2018 2018 2018 63 2018 14 2018

Figura 17: Medidas de resolução de insolvência no Chile

Figura 18: Medidas de resolução de insolvência na Polônia Fonte: Relatório Doing Business – Banco Mundial

O mercado imobiliário brasileiro teve surtos relevantes de desenvolvimento. Desde a criação do Sistema Financeiro Habitacional (SFH) em 1964, o estabele- cimento do Sistema Financeiro Imobiliário em 1997 e a Lei que cria a alienação fiduciária do bem imóvel, observamos momentos em que há expansão desse mercado, com reflexos positivos de bem estar. O SFH foi criado com o objetivo de implementar o financiamento imobiliário, que antes era baseado em iniciativas de políticas públicas, o que fazia com que dependesse de dotações orçamentárias. Para isso, direcionou novos recursos para investimento em habitação: via Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) e via obrigatoriedade de direcionamento dos depósitos em poupança. Ele também definiu regras rígidas para as operações, com limites de financiamento e das taxas de juros cobradas. O sistema apresentou resultados relevantes, com financiamento de 33,8% dos domicílios urbanos particulares ocupados entre 1967 e 1986.

Na década de 1980, passou a se mostrar menos efetivo, e esse percentual passou a 14,7% entre 1987 e 2000.

Isso motivou a criação do SFI, com o objetivo de estabelecer um mercado secundário de crédito imobiliário – companhias securitizadoras compram créditos imobiliários junto às instituições primárias e os transformam em valores mobiliários, negociados por investidores – para viabilizar mais liquidez de recursos para o mercado primário. O sistema também ampliou as alternativas de garantias, como a alienação fiduciária. Além disso, ele permite operações mais flexíveis, pois não estabelece limite de financiamento e das taxas de juros. Apesar de criado em 1997, o sistema só se consolidou em 2004, quando foi promulgada a lei 10.931, que dispõe sobre o patrimônio de afetação de incorporações imobiliárias – segrega do patrimônio da incorporadora os recursos captados para financiar uma obra –, Letra de Crédito Imobiliário, Cédula de Crédito Imobiliário e Cédula de Crédito Bancário.29

O MERCADO IMOBILIÁRIO

Figura 19: Evolução dos distratos por incorporadora Cancelamento (% dos recebíveis)

Fonte: BTG Report – jan/2017

2013 2014 2015 2016

Tenda Grafisa

Tecnisa Eztec Cyrella Even MRV 58 23 28 29 44 57 90 36 12 7 8 13 14 11 12 13 15 17 18 19 22 23 25 27 28

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Figura 20: Funcionamento do financiamento imobiliário e impactos do distrato

Como funciona o financiamento imobiliário Problemas gerados pelo distrato

Clientes adquirem imóvel na planta Construtora faz planejamento do fluxo de caixa Construtora tem problemas de fluxo de caixa Bancos fornecem crédito para os consumidores

Bancos diminuem crédito para construtoras, pelo aumento do risco Clientes pedem distrato e recuperam investimento

Retorno dos pagamentos realizados pelos clientes

Não consegue honrar obrigações com juros

Diminuição de crédito para construtoras Pagamento da entrada e obrigações com financiamento Obrigações com juros Crédito para empreendimento

Em 2009, com a criação do programa Minha Casa Minha Vida30 – um programa habitacional criado pelo governo federal para reduzir o déficit habitacional brasileiro e agir como política anticíclica no contexto da crise internacional31 – houve um novo impulso ao crédito imobiliário direcionado para uma parcela da população. Ao contrário das medidas anteriores, esse programa não veio acompanhado de nenhuma mudança estrutural do sistema, foi apenas uma transferência de recursos para esse setor. O programa teve o seu ápice em 2013, ano em que um terço das novas moradias do país foram construídas ou financiadas pelo programa32. Com o agravamento da crise fiscal da economia brasileira, e a revisão de alguns subsídios concedidos pelo governo federal, o programa perdeu força nos anos seguintes.

Apesar dos avanços e crescimento do mercado imobiliário, ainda há uma ampla agenda de avanços institucionais que permitirão a retomada desse mercado e a aproximação dos nossos números das participações do crédito imobiliário no PIB que é observada nos nossos pares.

Os distratos, por exemplo, são uma frente em que precisamos avançar do ponto de vista de regulamentação. A legislação atual e a jurisprudência criam um cenário em que o adquirente pode realizar o distrato, incorrendo perda minoritária em relação ao valor do contrato. Impulsionada pela crise econômica, a taxa de distratos aumentou para diversas incorporadoras. (Figura 19)

O elevado volume de distratos requer expressivos aportes para quitar os valores devidos, elevando o risco do setor e potencialmente afetando o andamento do empreendimento e os adquirentes adimplentes. Além disso, muitos empreendimentos foram financiados a taxas de juros mais baixas, uma vez que a venda prévia de apartamentos reduzia o risco de inadimplência. Porém, a disseminação dos distratos mostra que essa expectativa estava errada. Isso resulta em maiores perdas esperadas nas operações de crédito, consequentemente um maior custo de risco levando à redução dos novos empréstimos. (Figura 20)

Figura 21: Penalidade para distrato por adquirentes em diferentes países1*

Nota: 1*. Percentuais não incluem taxas a brokers Fonte: BTG Report

País Entrada (%) Pagamento mínimo para retirar as chaves (%) Penalidade para comprador Outras penalidades Venda forçada

Brasil 10–30 30 0–50% de depósitos Nenhuma

Não

Austrália 5–10 10–20

100% de depósitos

Pode ser processado e obrigado a compensar despesas do vendedor

Canadá 10 25–35

Sim

Reino Unido 5–10 20–25 Pode ser processado e obrigado

a compensar despesas do vendedor e queda de preço

Portugal 15–30 30–85

México 5–30 30-50

Pode ser processado e forçado a comprar o imóvel Argentina 20–30 N/A Estados Unidos 2–30 30 França 5–10 20–85 Itália 10–30 15–40 Espanha 5–10 40

O fato de as incorporadoras acabarem perdendo parte do seu patrimônio líquido e causando impactos à economia abriu espaço para discussão de propostas de regulamentação. O projeto de lei de 1.220/2015 foi aprovado na Câmara dos Deputados em junho de 2018 e enviado para o Senado Federal, como PLC 68/2018. Ele estabelece uma multa de 50% do valor já desembolsado, pelo cliente que desistir de um imóvel comprado na planta, quando este estiver em regime de patrimônio de afetação – regime mais comum, em que cada empreendimento é separado da construtora legalmente, tendo seu próprio CNPJ e contabilidade. Quando não for esse regime, a multa é de 25% do valor desembolsado. O cliente pode ser isentado da multa se encontrar um novo comprador disposto a assumir a dívida e se a incorporadora aprovar o substituto e sua capacidade financeira. O projeto também prevê a isenção de multa para a incorporadora que atrasar a entrega de um imóvel em até 180 dias. O texto foi rejeitado pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado em 10 de julho de 2018.

Mesmo assim, ainda pode ser colocado para votação no plenário do Senado, se o presidente da Casa incluir na pauta.

O projeto rejeitado traria maior segurança jurídica, evitaria jurisprudências que trazem multas desproporcionais e seria benéfico para o desenvolvimento saudável do setor.

Outros países são mais rígidos com os adquirentes, desestimulando a disseminação dos distratos. Por exemplo, na maioria deles, pode existir a venda forçada, ou seja, em algum momento durante a negociação, o comprador pode ser proibido de cancelar a compra. (Figura 21)

É importante ressaltar que os países dessa amostra permitem contratos específicos entre compradores e vendedores e não possuem lei específica para distratos – as cláusulas diferem conforme os contratos e são respeitadas.

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SISTEMA DE REGISTRO E GERENCIAMENTO DE GARANTIAS

Uma forma de elevar as taxas de recuperação e diminuir o custo de inadimplência é melhorar o sistema de registro e gerenciamento de garantias.

Uma melhoria no sistema de registro e gerenciamento de garantias poderia mitigar os problemas decorrentes da recuperação de crédito. No Brasil, o tema vem sendo discutido: o PL 9.327/2017 tem como objetivo legitimar o registro digital de duplicatas, criando as “duplicatas escriturais”. A proposição está sujeita à apreciação do Plenário e, se aprovada, o uso de duplicatas eletrônicas deverá ser incentivado em detrimento do registro cartorial. Conforme as registradoras se estabelecerem, será necessário requerer compartilhamento de dados entre elas para criar uma base consolidada.

Outro exemplo de avanço institucional é o Sistema Nacional de Gestão de Informações (SINTER), que centralizará em um ambiente único as informações de bens imóveis, e que também deverá contribuir para o desenvolvimento do mercado de crédito no Brasil. O sistema já foi instituído pelo Decreto nº 8.764, de 2016, mas ainda não está em funcionamento.

Um registro centralizado de garantias é um passo importante para aumentar a segurança jurídica, barateando o crédito e melhorando o acesso. Países como o Chile e a China são bons exemplos.

No Chile, foi criado um registro eletrônico de garantias combinado à estruturação de garantia guarda-chuva para ampliar o acesso a crédito. O serviço começou a ser oferecido em 2011 devido à necessidade de ampliar o acesso ao crédito no país: 33 • Podem ser registrados bens presentes ou futuros, que poderão servir como garantia

em única ou múltiplas operações de crédito, desde que não ultrapassem o valor total das obrigações creditórias;

• Diversos bens são aceitos no registro de garantias móveis: propriedade pessoal móvel (veículos motorizados, máquinas, animais de corte); direitos (créditos, direitos de concessão); títulos de crédito (ações, títulos, notas promissórias); outros (lucros futuros, inventários);

• A múltipla utilização de ativos como garantia de crédito maximiza o poder de barganha dos tomadores de crédito, levando a uma redução das taxas de juros; As mudanças no Chile contribuíram para a expansão do crédito a pequenas e médias empresas: em 2010, antes do novo sistema, as novas concessões para PMEs representavam 4,9% do total, passando para 7,6% em 2016. 34

A China reformou seu sistema de garantias em 2007, quando constatou que 71% das pequenas e médias empresas consideravam o baixo acesso ao crédito como principal barreira ao crescimento.35

• Houve alteração de legislação, criando um esquema de prioridades mais transparente para credores com e sem garantia e abrindo espaço para o uso de ativos móveis como garantia;

• Foi criado um cadastro nacional online de penhores de contas a receber e inventário,

supervisionado por uma unidade vinculada ao Banco Popular da China; • Conscientização e treinamentos para que os stakeholders dos setores público e

privado conhecessem produtos de financiamento com garantias móveis foram importantes para o sucesso do projeto.

Entre outubro de 2007, quando o novo sistema passou a funcionar, e junho de 2011, houve US$ 3,58 trilhões de empréstimos com garantia de recebíveis, dos quais US$ 1,1 trilhão foram destinados a pequenas e médias empresas. Quase 90% das instituições financeiras chinesas consideraram a reforma importante para que elas servissem novos segmentos do mercado PME. Dos cinco maiores bancos chineses, quatro reportaram um crescimento médio anual em empréstimos com garantias móveis de 25% entre 2008 e 2010, versus 2% entre 2006 e 2008. Outros sete grandes bancos comerciais apresentaram um crescimento médio anual de 45% entre 2008 e 2010, versus 20% entre 2006 e 2008.36

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