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A existencialidade enquanto modos-de-ser

1. MORTE EXISTENCIAL E MORTE BIOLÓGICA: elementos fenomenológicos

2.3 A existencialidade enquanto modos-de-ser

faz dos objetos como utensílios, como pela preocupação que sente pelas pessoas que compartilham a existência com ele. A existência humana é “ser- com”, tanto com as pessoas como com as coisas. (GILES, 1989, p. 101).

A existência sob a perspectiva das diferentes características do ser-no-mundo é complexa. Cada Dasein pode estabelecer uma relação onde sejam utilizadas as coisas, de maneira que venham a contribuir e satisfazer o cumprimento de funções pré-determinadas. Os instrumentos só ganham sentido se alguém lhe der utilidade e valor, e quem faz isso é o Dasein, caracterizando-se como ser-com, tendo a capacidade de conferir sentido e nomear funções. O Dasein pode fazer uso do que se encontra a disposição no mundo das ocupações, simplesmente, manifestando-se como um ser de relações, com seus semelhantes e com os objetos que compõe o seu universo. Não há existência do Dasein sem o ser-no-mundo, e no ser-no-mundo há o ser-com-o-outro. E isto é independente, se este outro está espacialmente ou fisicamente próximo ou distante.

2.3 A existencialidade enquanto modos-de-ser

A essência do Dasein é existir, portanto, ele é sempre um poder-ser. “O Dasein sempre compreende a si mesmo, a partir de sua existência, isto é, a partir da sua possibilidade de ser si mesmo ou de não ser si mesmo.” (HEIDEGGER, 2012, p. 61). Este poder-ser diz respeito, também ao modo mais singular do ente concreto, empenhado no mundo, cuja decisão de existir é sempre colocada em pauta. O Dasein pode falar do ser ao falar de si, e isso é um manifestar-se nos mais diferentes modos, inclusive em modos ônticos. O Dasein é autêntico (Eigentlich), na medida em que compreende em seu ser a abertura para os demais entes, desvelando o ser. Quando o Dasein se compreende desta forma, encontra-se em seu estado mais próprio (Eigen).

São as possibilidades de ser enquanto existenciais que atestam o mundo e permitem a descrição de um “quem” do Dasein. No entanto, uma espécie de “eu” do

Dasein nunca será uma substância e nem subjetividade, pois o “eu” é sempre poder

escolher, esta ou aquela possibilidade, descrito por um ou outro existencial, em uma trama de existenciais. A esta trama de existenciais, Heidegger chama de

“existencialidade”. Para fins de relação com o mundo ôntico, há na existencialidade, sempre uma oscilação possível: “O Dasein existe, é meu, é autêntico ou inautêntico.” (PASQUA, 1993, p. 41).

No contexto do permanecido, ente abordado nesta dissertação, há um caráter de escolha e de compreensão que não está definido. Esta definição não ocorre porque o permanecido, em muitos momentos não tem o seu poder-ser e não se “compreende” em seu próprio ser, autêntica ou inautenticamente, estando acometido temporária ou permanentemente, por múltiplos impedimentos, seja pela doença propriamente dita, por efeitos de tratamentos, ou pelo conjunto de entes que compõem o seu dia a dia enquanto moribundo. Entretanto, em um contexto no qual os existenciais estão disponíveis sob a forma de constructos filosóficos para a descrição do ente Dasein, esta indefinição provinda do permanecido é um problema. Por outro lado, o estatuto ontológico do permanecido ainda necessita de análise, pois trata também de questões sobre aqueles que estão entorno, os permanecentes.

Pode-se dizer que as condições fenomenológicas presentes na existencialidade (trama dos existencias) são o ser-para-a-morte e o ser-no-mundo, mencionadas anteriormente, neste capítulo. Elas são importantes porque oferecem uma base para os existenciais em suas descrições das manifestações fenomenológicas da existência do Dasein. É preciso expor minimamente alguns dos existenciais para mostrar esta trama dentro da condição de ser-para-a-morte, que será abordada posteriormente.

São enfatizados os existenciais: sentimento de situação, compreensão, decaída, discurso, angústia e morte, da analítica da existência de Heidegger, na medida em que estes ocupam, um papel estratégico na proposta de Ser e tempo, de novamente colocar a questão do sentido do ser, sob o fundo do esquecimento do ser provocado pela metafísica ocidental. Será abordado brevemente o nada, através da obra Que é metafísica?, de Heidegger, com o intuito de complementar a apreensão dos existenciais angústia e morte.

Questiona-se então o “aí” do Dasein, diante do tratado anterior que era o ser deste ente privilegiado. Destaca-se que a abertura da qual se trata aqui, é a da abertura enquanto tal, que não é assumida pelo Dasein. Esta abertura, primeira e fundamental de mundo, se dá para o Dasein através de uma estrutura que envolve o sentimento de situação, a compreensão e a interpretação. Pode-se dizer que o Dasein

se encontra envolvido em um mundo, lançado em disposições anímicas, que indicam a facticidade da responsabilidade de sua existência. É acometido por sentimentos, ou estados de alma, que abrem para ele, precipitadamente, o mundo. Nesse afetar anímico, o Dasein compreende o mundo não por meio de conceitos e, sim, numa compreensão que ocorre porque o próprio Dasein está “compreendido” numa situação de mundo. (WERLE, 2003).

O “estar aí” não é uma condição geográfica, é ôntica e ontológica e explicitada pelo existencial sentimento de situação, exprime a circunstância fundamental pela qual o Dasein se encontra diante de si. Para corroborar o exposto, o sentimento de situação é interpretado por Pasqua e se faz muito esclarecedor:

O Dasein encontra o seu ‘Aí’ sem o ter procurado. Sente-se abandonado a si próprio. É um sentimento (afetar anímico) mais do que um saber, que lhe faz sentir a sua precariedade, a sua contingência, a sua instabilidade. Neste aspecto, ele é mais revelador do que qualquer conhecimento, uma vez que coloca o ser diante dele e o obriga a tomar responsabilidade sobre si próprio. (PASQUA, 1993, p. 76).

Assim, o sentimento de situação, é o que confere a condição fundamental do

Dasein abandonado, no estar lançado, uma vez que afeta o seu ser-no-mundo. É

existencial na medida em que ser é sempre ser ‘aí’, fático, não se tratando de um sentimento emocional. Lançado no mundo, o Dasein se encontra com os demais entes, perfazendo desse encontro, uma possibilidade de perda de si mesmo. Este encontro também é, a possibilidade de ser-com, pois o Dasein convive com outros

Dasein, e esse conviver, será apresentado nesta dissertação como problema, no

momento em que um deles é moribundo.

No que diz respeito à compreensão, pode-se dizer que não é o Dasein que primeiramente compreende o mundo, e sim ele é compreendido pelo mundo, estando inteiramente compreendido em seu mais próprio poder-ser numa situação de mundo, o que remete ao conceito de projeto (Entwurf). A compreensão projeta o Dasein em possibilidades de existência, em que ele pode ou não assumir plenamente. Somente então ocorre a interpretação de mundo no discurso e na linguagem, tendo em vista, que a proposição e o enunciado implicam um momento posterior na existência. A compreensão do mundo vem antes da interpretação e não como usualmente se imagina, que é preciso primeiro interpretar para então compreender, pois muitas vezes compreende-se sem dizer nada, contrariamente ao falatório que é um dos fenômenos obscurecedores da compreensão.

A compreensão não se limita às atividades cognitivas e também não se trata de compreender como se pensa num caráter psicológico ou espiritual. Ela possui uma relação direta com o projetar-se do Dasein, e o projetar-se conforma-se ao modo em geral do sair de si mesmo, de ek-sistir. Compreender é poder-ser.

O compreender inclui existencialmente o modo-de-ser do Dasein como poder- ser e não é um ente subsistente que possuiria além disso um dom de poder qualquer coisa, ele é primariamente ser-possível. É a cada instante o que pode ser e a própria forma como é a sua possibilidade. (PASQUA, 1993, p. 76).

A explicação da relação entre Dasein e compreensão é a possibilidade. O

Dasein é sempre-já empenhado em possibilidades, e o poder-ser, essencial ao Dasein, define-o por completo. Ele se lança em suas possibilidades, entre as quais ele

deverá efetuar a escolha para ek-sistir num mundo, mostrando assim sua autenticidade e inautenticidade. Por isso, o ser-possível-do-Dasein diz respeito aos seus modos, para e por ele mesmo, sendo a cada instante o que ele pode ser, na medida em que é a sua possibilidade. O compreender é o projeto do Dasein e este projeto é articulado pelo discurso (Rede).

As possibilidades de abertura de mundo: disposição, compreensão e discurso, embora constituintes, não são assumidas de fato pelo Dasein, de modo que levam novamente a um encobrimento do fenômeno originário deste ente especial, direcionando-o para uma queda (Verfallen), ou seja, para uma decadência no dia a dia e ao esquecimento da verdadeira essência. Trata-se aqui dos fenômenos do discurso, da curiosidade e da ambiguidade, que levam o Dasein a se perder na publicidade e impessoalidade. Assim, se Heidegger de um lado aponta a possibilidade para a qual o Dasein poderia de fato assumir a sua existência e colocar a questão do ser nestes existenciais, novamente recua deste momento da abertura para denotar que de fato a tendência de encobrimento no Dasein é demasiadamente forte. Mais uma vez vê-se este traço fundamental do encobrimento e da fuga de si mesmo se fazer valer e determinar o ser-no-mundo do Dasein. (HEIDEGGER, 1986, p.185).

O discurso é existencialmente co-originário com o sentimento de situação e com a compreensão. A discursividade exprime uma interrelação do Dasein, não apenas voltada para o âmbito ôntico, mas também para a dimensão ontológica da existência, e nesse sentido, essa interrelação corresponde ao ser-no-mundo como condição fundamental do Dasein. Através desse conjunto de aspectos, o ser do

Dasein se articula continuamente, de forma própria ou imprópria. Pode-se dizer que a

linguagem manifesta a abertura ou a revelação do ser do ente no mundo. Falar também é ek-sistir e “o discurso é existencialmente linguagem”.

O Dasein articulando-se no mundo e, por isso, junto aos entes, pode em função deles decair. O Dasein “cai”, o Dasein foge, o Dasein escapa de si mesmo, buscando fugir da tarefa que sempre lhe é imposta: a tarefa de ter-que-existir. Esta fuga, tematizada pela decaída, determina um encobrimento do caráter de ser deste ente. (VEIGA, 2007). A ek-sistencia permite um desvio e este desvio, denota uma expulsão do modo próprio de ser. Ele procura “proteger-se em algum lugar”, mas em vão, pois “é ainda e sempre fora de si mesmo”, ele é ek-sistir.

Esta queda tem diferentes formas de manifestação fenomênica, por exemplo, na palavra, é o falatório, que consiste em falar por falar, não compreendendo o que se fala, uma comunicação que não comunica, e não configura apenas numa repetição oral, mas também escrita. “É a possibilidade de tudo compreender sem apropriação prévia da coisa”. (PASQUA, 1993, p. 77). Outros modos da decaída são a curiosidade e há também o equívoco.

Diante de todos estes diversos aspectos existenciais que constituem o Dasein como ser-no-mundo, Heidegger coloca que o traço que define a essência do ser humano se encontra na angústia, que também é uma forma do Dasein sair do modo da decaída, enquanto disposição compreensiva que oferece o solo fenomenológico- hermenêutico para a apreensão manifesta da totalidade originária do Dasein.

A angústia não é então somente um fenômeno psicológico e ôntico que se refere somente a um ente ou a algo dado, é um existencial, pois remete à totalidade da existência como ser-no-mundo. Tal como em Kierkegaard, a angústia assume em Heidegger um cunho existencial essencialmente humano, onde só o homem se angustia, o animal não. A diferença entre Kierkegaard e Heidegger, encontra-se no fato de que em Kierkegaard a angústia revela o ser finito, o nada da existência diante da infinitude e eternidade de Deus, ao passo que Heidegger deixa a perspectiva teológica e trata a angústia apenas como fenômeno existencial da finitude humana.

Esse existencial é um importante elemento que propicia uma passagem de um modo inautêntico para o modo autêntico do Dasein, não devendo-se confundir a angústia com o medo, pois o medo se revela como algo intramundano e passível de se dispersar pela queda, quando o Dasein se afasta de um ente qualquer e, também,

de si próprio. A esta fuga pode ser conferido um outro sentido, um sentido ontológico, dado pela angústia:

A aversão pela qual o Dasein se perde de si mesmo e que provoca a sua decadência, não é uma fuga embasada no medo, mas na angústia. Assim como a grande parte dos existenciais, a angústia está relacionada com o sentimento de situação. (PASQUA, 1993, p. 79).

A angústia é, então um estado anímico profundo e não advém de um ente intramundano, pois o que angustia a angústia é completamente indeterminado, é o mundo enquanto tal, independentemente dos entes. O que oprime na angústia é a possibilidade mais genuína de ser-no-mundo. (HEIDEGGER, 2012).

Finalmente, a angústia não deve ser tomada como um mero medo, embora em

Ser e tempo, também seja um existencial fundamental mediante o qual o Dasein se

encontra no mundo e implique, por assim dizer um estágio ameno da angústia. O medo configura-se numa disposição anímica que desvia ou afasta de algo que se teme e com isso ao mesmo tempo manifesta o todo do mundo, em sua estranheza e assombro, antes mesmo que se possa realizar um ato de conhecimento desse mundo. Há muito mais força de revelação do mundo no medo, do que em qualquer outro tipo de acesso ao mundo, como na alegria ou na felicidade, os quais são transitórios e menos marcantes. (WERLE, 2003).

O medo é um estado afetivo que interessa à analítica e, no objeto de estudo desta dissertação, o medo apresenta-se como uma relação ôntica possível do Dasein, pois a morte tem uma dimensão ôntica inegável, onde não somente cada Dasein tem a sua própria morte, mas cada Dasein teme a sua morte. Perfazendo desta forma, uma possibilidade para a tentativa de subtrair o caráter existencial da morte do permanecido, pelos permanecentes. Quanto à compressão, no sentido ôntico, o medo descreve a fuga do Dasein diante de uma ameaça possível. O medo pode ser analisado sob três aspectos: aquilo de que se tem medo, o sentimento do medo enquanto tal e aquilo por quê ou por quem se tem medo.

Precisamente, o medo é uma disposição central na existência pelo fato de que manifesta o mundo na fuga do Dasein de si mesmo. Somente se tem medo por algo determinado, porque em última análise, é o Dasein mesmo afetado e maior interessado. É como se o medo se voltasse para quem teme e não para o que se teme. Ele volta-se apenas, aparentemente para "fora", por isso, é sempre em primeiro lugar, um fenômeno privado, embora também se possa ter medo por outros, ao assumir o

medo dos outros. Assim, o medo é também uma forma de estar com os outros, e como no contexto estudado sobre o permanecido, na medida em que se teme por alguém. Por fim, o medo pode ter variações, podendo ser: o que é assustador, o horror, o terror, a timidez, o receio, o espanto, a covardia e também a decepção. (HEIDEGGER, 1986, p.142).

A discrepância entre a angústia e o medo encontra-se no fato de que a angústia é mais ampla que o medo, pois nela, não se sabe diante do que se angustia. Em Que

é metafísica?, obra heideggeriana do ano de 1929 que explora pontos centrais de Ser e tempo, o filósofo diz: "Por esta angústia não entendemos a assaz frequente

ansiedade que, finalmente, pertence aos fenômenos do temor que com tanta facilidade se mostram" (HEIDEGGER, 1989, p.39).

A razão pela qual a angústia se angustia não é um modo determinado de ser do Dasein. A ameaça é indeterminada ela mesma, não chegando a penetrar como ameaça neste ou naquele poder-ser concreto e de fato. A angústia tira do Dasein a possibilidade de decaído, compreender a si mesmo a partir do mundo e numa interpretação pública (HEIDEGGER, 1986, p.187). Isso significa que o Dasein se angustia por simplesmente estar no mundo. É a existência que se faz angustiante.

Não sendo nenhum objeto determinado, o que angustia o Dasein é um “nada” enquanto tal. E, novamente, como apontado em Que é metafísica?, a angústia é a disposição fundamental da existência que "manifesta o nada" (HEIDEGGER, 1989, p.39) e implica o estágio anterior e necessário para que se possa colocar a questão do ser. O Dasein está detido na angústia, ela o suspende porque põe em fuga o ente em sua totalidade.

Cotidianamente, a resposta à pergunta pelo motivo da angústia, é tida como: “não é nada", pois não se sabe identificar o objeto ou motivo, ou o que precisamente gera a angústia. Para Werle (2003), esse "não é nada", provém de um nada mais originário e fundamental da angústia. O nada determina a angústia, e nela não há uma apreensão do nada. Menos ainda, a angústia, enquanto um fenômeno psicológico, gera o nada como se o nada se mostrasse como determinado, como um ente que pode ser identificado. Neste caso, se confundiria o nada com a negação.

O nada não é a negação, mas a origem dela, onde nega-se algo, isso ou aquilo na vida, se diz não a este ou aquele compromisso ou a esta ou aquela solicitação, renuncia-se a esta ou aquela oferta, porque se está estagnado no nada fundamental

e envolvido por ele. Somente porque existe o nada, é que se coloca a negação, no sentido de ato de determinação humano, ou mesmo de resolução do nada. Não é porque se nega que surge o nada, mas o inverso. Inclusive, esse é o problema da ciência, criticado por Heidegger em Que é metafísica?, uma vez que ela resolve rapidamente o problema do nada como não sendo nada, ou seja, pela negação. A ciência pesquisa apenas o ente e nada mais, delimitando campo de atuação para o que pode ser determinado de forma lógica e matemática na esfera do ente, excluindo o nada e, consequentemente, o ser, que possui uma proximidade com o nada no horizonte da diferença ontológica. (WERLE, 2003).

É importante também diferenciar que o nada que Heidegger trata, não é a negatividade, o negativo ou a “negação determinada” de Hegel. Para o autor de Ser e

tempo, o problema é mais amplo que o da subjetividade em Hegel, pois o nada é mais

“incisivo” que a negação e não pode ser resolvido por ela ou por uma possibilidade de determinação subjetiva. A subjetividade é muito frágil diante do nada, e é como se o nada a paralisasse enquanto atividade.

Para o filósofo, o nada se põe por si mesmo na angústia, não precisando ser criado, se revelando na angústia e ao mesmo tempo provocando-a, sendo a causa e o efeito concomitantemente. Para isso, emprega a expressão: "o nada nadifica", expressando que o modo de o nada se manifestar somente ocorre por meio do nada mesmo. O nada lança num constante nada, ele mesmo é o sujeito de si, não é um objeto que está ao alcance, que pode, porventura, ser definido por meio de uma negação. Pelo contrário, é ele mesmo que nadifica. O nada, está acima de um ente determinado, é assim o próprio “véu do ser” que se revela na existência através da angústia. O ser tem em comum com o nada o fato de não se esgotar em nenhum ente determinado e não poder ser nunca definido, pois tanto o ser como o nada determinam o todo da existência. Assim, toda a existência perde seu sentido diante do nada. O

Dasein suspenso na angústia, muitas vezes nem a percebe. À propósito, geralmente

o nada oferece uma certa tranquilidade.

A angústia e o nada tomam o todo do ser do Dasein, fazendo com que o próprio ser-no-mundo seja afetado e percebido em seu fundamento como angustiante. A angústia situa-se no trivial fato de existir. O simples ser-no-mundo, o mundo como mundo, é a origem da angústia que toma o Dasein na sua inteireza. (HEIDEGGER, 1989).

O nadificar não é algo casual, mas como rejeição ao ente em sua totalidade em fuga, revelando este ente em sua plena e até então obscura, estranheza como o absolutamente outro – em face do nada. “A essência do nada originariamente nadificante consiste em conduzir primeiramente o Dasein diante do ente enquanto tal”. (HEIDEGGER, 1989, p.141).

Só na angústia subsiste a possibilidade de uma abertura privilegiada na medida em que ela singulariza. Essa singularização retira o Dasein de sua decadência, e lhe revela a autenticidade e inautenticidade como possibilidades de seu ser. (HEIDEGGER, 1989, p.255).

Positivamente, este fenômeno é que coloca pela primeira vez a existência humana diante de si mesma. A angústia singulariza, embora não seja ela mesma singular. Nesta situação o Dasein é “chamado” pelo ser, a experimentar o que de fato o ente é, em outras palavras, a antecipar-se diante da existência fática e lançada na decadência, onde se segue a estrutura fundamental da preocupação enquanto cuidado. (WERLE, 2003).

Na angústia e na preocupação, Heidegger localiza a verdadeira possibilidade de transformar a existência, a possibilidade de sair da inautenticidade, na qual geralmente se vive, para assumir a autenticidade. Através da preocupação, isto é,

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