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As brigas e disputas relativas ao direito feudal, que colocam em lados opostos as diferentes raças e nacionalidades deste império, estavam na origem das numerosas vicissitudes que os estados e as dinastias conheceram. As tribos turcas e seus chefes de milícias aumentaram sua influência. No território que agora compreende o norte e o leste do Irã, o Tajiquistão e o Afeganistão, apareceu o Estado Samanida (875-999), que rapidamente conquistou sua autonomia e fez de Bukhará sua capital. No oeste e no sul do Irã, bem como no Iraque, a soberania passou para a dinastia persa dos Bouyidas (932-1055). Estes últimos conquistam de Bagdá em 945 e não deixam mais do que o poder espiritual para o califa daquela cidade.

Aos poucos o estado islâmico foi enfraquecendo e a soberania do Califado Abássida se desfez. No entanto, às contribuições deixadas pelos califados às ciências e aos demais campos de conhecimento foram inestimáveis. Falaremos de tais compreensões posteriormente.

Como síntese do contexto histórico, político e social do mundo islâmico medieval, elaboramos o quadro 2.

Quadro 2 - Síntese das conquistas do mundo islâmico

CALIFADOS PRINCIPAIS CALIFAS PRINCIPAIS CONQUISTAS

632 -6 6 1 Califado Ortodoxo 632–634 Abu Bakr

Conquista da Síria e o Irã (637); Conquista do Egito (642); Cirenaica (643). 634–644 Omar 644–656 Othmân 656–661 Ali 661 -7 5 0 Califado Omíadas 685–705 Abd al-Malik Conquista da Tunísia (674); Conquista de Khorezm (712); Conquista da Península Ibérica,

África mediterrânea, Oriente Próximo, Ásia Menor, Cáucaso, Ásia Central e parte do Rio Indo

(meados do séc. VII). 715–717 Solimão

717–720 Omar II

750 -1 2 5 8 Califado Abássida

754–775 Al-Mansur Conquista de metade da Espanha (séc. XI) Desenvolvimento de refinados

conhecimentos científicos. 786–809 Al-Rashid

813–833 Al-Mamun

Fonte: Elaborado pelos autores (2019)

Assim, com esse pequeno relato da história militar e política do mundo islâmico, podemos nos voltar, agora, para os primórdios da atividade científica naquela civilização. Desse modo, no próximo tópico apresentaremos a Casa da Sabedoria, local esse de grande importância para o desenvolvimento do conhecimento científico dessa época.

2.3 A CASA DA SABEDORIA

Durante o período inicial da Idade Média, também conhecido de Alta Idade Média, que vai do século V ao X, ocorreu na Europa uma considerável regressão no desenvolvimento dos conhecimentos, em virtude, principalmente, da falta de material científico a ser trabalho na época.

Diferentemente da Europa, no mundo islâmico, o desenvolvimento científico e filosófico se tornava cada vez mais acentuado, pois, os árabes se voltaram para as contribuições deixadas pelos gregos e pelos conhecimentos que vieram à tona na Índia e na China. As caravanas de comerciantes árabes tomaram um papel importante nesse processo de tornar possível o acesso a tais conhecimentos.

Foram diversos os estudos e descobertas realizadas pelos sábios islâmicos. Daqui por diante, deixaremos de usar o termo árabe para nos referir a pessoas e, em vez disso, usaremos o termo islâmico. A justificativa para isso é que entendemos a palavra árabe como termo que se refere à etnia árabe, ou seja, os descendentes das tribos habitantes da Península Arábica no século VIII. Nos primeiros tempos do Islã, os muçulmanos, que seguiam a religião de Maomé eram e súditos do califado, eram todos ou quase todos, árabes. Com a expansão do Islã por meio da conquista militar e da conversão religiosa diversos outros povos (persas, tadjiques, uzbekos, hebreus, entre outros), entre os cidadãos do Califado podiam ser encontrados indivíduos das mais variadas origens étnicas, falantes das mais variadas línguas e praticantes das mais diversas religiões. No entanto, todos viviam sob a mesma estrutura política, o

Califado Islâmico. Este era um estado teocrático, em que o poder religioso (o islamismo) e o poder temporal se entrelaçavam, definindo tanto o governo como as leis que regiam a sociedade. Sendo assim, ao indivíduo desde estado chamamos de islâmico, o que não quer dizer que ele fosse muçulmano: podia ser cristão, judeu ou zoroastra.

Este indivíduo tampouco era obrigatoriamente árabe: a terra de seus antepassados poderia ser bem distante da Península Arábica. Tal é o caso de al- Khwarizmi, oriundo de Khorezm, perto do mar de Aral e que, portanto, não era árabe. Note-se então que ao tomar em nossas mãos à obra de um sábio islâmico, não podemos supor, de imediato e sem maiores informações, que ele fosse árabe ou muçulmano, mesmo que a obra tenha sido escrita inicialmente em língua árabe.

Depois dessa pequena digressão terminológica, voltemos ao tema original. Os estudos empreendidos eram escritos e divulgados na língua oficial do islamismo, o árabe. Devido à falta de tradução, alguns desses conhecimentos desenvolvidos e descobertos pelos árabes não chegaram à Europa, mas, em contrapartida, os que chegaram, fomentaram a retomada do desenvolvimento do conhecimento europeu, no período que conhecemos como Baixa Idade Média, que vai do século XI ao XV.

Os islâmicos deram grandes contribuições ao que chamamos hoje de ciência, visto que eles marcaram o desenvolvimento da álgebra, fizeram medições da circunferência da Terra, deram grandes contribuições à astronomia e consequentemente às navegações, com a invenção do astrolábio, divulgaram o sistema de numeração decimal para a Europa, dentre outros grandes feitos.

Logo no início da dinastia Abássida, em 762, a capital do califado foi transferida de Damasco, na Síria, para Bagdá, as margens do Rio Tigre. Além disso, em Bagdá foi criada uma instituição de grande importância para criação e divulgação do saber. Esta foi a chamada Casa da Sabedoria (em árabe, Bayt Al-Hikmah), vista como uma das principais bibliotecas da história islâmica. Há diferentes opiniões a respeito do fundador dessa grande biblioteca. Alguns registros apontam que seu fundador foi

[...] Abu Jafar al-Mansur (95-135 AH6) que coletou livros sobre medicamentos, astronomia, engenharia e literaturas que foram traduzidos em seu reinado, além de algumas outras publicações sobre Hadith (tradição profética), história, ciências do Alcorão, al-Mansur reuniu todas as coleções de livros em uma grande sala que era o núcleo da Casa da Sabedoria (al-Diyaji, 1975). Ele foi o primeiro califa que motivou os muçulmanos a estudar ciências e

6Ano da Hégira 95 corresponde ao ano 716d.C e o ano 135 corresponde ao ano 756d.C, em nosso calendário.

desenvolvê-los, ele também os aconselhou a traduzir livros de persa, grego e indiano línguas (ALGERIANI; MOHADI, 2017, p. 180-181, tradução nossa). Uma segunda opinião diz que a Casa da Sabedoria foi fundada durante o governo de Harun al-Rashid (786-809). Essa fundação foi resultado de um progresso intelecto e civilizacional que caracterizou seu califado, principalmente durante a era das traduções, cujo objetivo era o enriquecimento muçulmano com diferentes conhecimentos e ciências (ALGERIANI; MOHADI, 2017).

Embora não saibamos o verdadeiro fundador da Casa da Sabedoria, podemos dizer que essa importante biblioteca brilhou durante o reinado de al-Mamun, pois, de acordo com Algeriani e Mohadi (2017, p. 181), “ele era um homem de literatura, um cientista e um amante de estudiosos a quem ele tinha dado maior interesse e apoio para sua pesquisa, debates e livros de autoria”.

A Casa da Sabedoria era, conforme aponta Lyons (2011), um local para acomodação dos inúmeros trabalhos traduzidos, copiados e escritos pelos estudiosos islâmicos. Além de ser um espaço destinado ao estudo, também era um “espaço de trabalho, suporte administrativo e auxílio financeiro para o pequeno exército de eruditos que assumiria essas tarefas e depois as usaria de forma criativa e original” (LYONS, 2011, p. 88).

Bayt al-Hikma, era um é símbolo da ambição intelectual e política do Estado

dos Abássidas. Ao decorrer do tempo, de acordo com Lyons (2011, p.88),

[...] a Casa da sabedoria veio a abranger um escritório de traduções, uma biblioteca e repositório de livros e uma academia que contava com eruditos e intelectuais de todo o império. Sua função primordial, no entanto, era a salvaguarda de conhecimento valioso, fato que se refletia em outros termos utilizados de vez em quanto pelos historiadores árabes para descrever o projeto, tais como Tesouro dos Livros de Sabedoria ou simplesmente Tesouro da Sabedoria.

A Casa da Sabedoria foi uma das principais bibliotecas que distinguiram os tempos Abássidas. Ela abriu as portas para os pesquisadores, estudiosos e líderes. Conforme aponta Algeriani e Mohadi (2017) a Casa da Sabedoria era o destino preferido dos intelectuais da época, uma vez que esse local oferecia tudo o que precisavam, incluindo sala para leitura, salas de aula, tradução, autoria e mapeamento, por exemplo.

Não se sabe ao certo de onde vinham os recursos que mantinham a Casa da Sabedoria funcionando, porém, muitos estudos apontam, conforme Algeriani e Mohadi (2017), que essa biblioteca contava com um orçamento especial, o que correspondia

a grandes somas de dinheiro, seja para comprar materiais de trabalho, como papel, caneta, livros, entre outros, ou para fazer o pagamento dos salários dos funcionários, como os tradutores, autores, palestrantes, servidores, dentre outros.

A Casa da Sabedoria teve um papel crucial no desenvolvimento dos conhecimentos islâmicos medievais, uma vez que foi a primeira biblioteca científica e educacional que juntou, em um só lugar, cientistas, estudiosos e tradutores, para estudar e pesquisar. Por esse e outros motivos, muitos califas tentaram simular e fundar novas bibliotecas e casas das sabedorias que pudessem competir com a Casa da Sabedoria de Bagdá.

A respeito disso, Algeriani e Mohadi (2017) relatam que houve, pelo menos, três bibliotecas no mesmo estilo da Casa da Sabedoria de Bagdá, a saber: a Casa da Sabedoria de Aglábida, fundada pelo Amir Ibrahim Ibn Mohammad al-Aghlabi (882- 911) em Raqqada; a Casa de Sabedoria da Andaluzia, fundada pelo Califado Omíada na Andaluzia Hakam al-Mustansir (923-987); e a Casa da Sabedoria do Cairo, cujo o início da sua fundação está relacionado com o tempo da Fatimid al-Aziz billah (986- 1007).

De modo geral, Algeriani e Mohadi (2017) apontam que um grande número de bibliotecas surgiram na Península Arábica, assim como em outros territórios, no entanto, embora houvesse uma tentativa de superar a Casa da Sabedoria de Bagdá, essas bibliotecas nunca conseguiram atingir o potencial estruturado da Bayt al-Hikma. Vale ressaltar que a influência da Casa da Sabedoria de Bagdá rompeu fronteiras, ao passo de chegarem a solos europeus, principalmente na Espanha, Córdoba, Sevilha e Toledo (ALGERIANI; MOHADI, 2017).

Com a invasão de Bagdá pelos mongóis em 1258, houve a destruição da Casa da Sabedoria, bem como a destruição de livros, manuscritos, mapas, observatórios, entre outros materiais. Os mongóis7 queimaram a maioria dos as coleções, enquanto

outros foram jogados no rio Tigre. A invasão dos mongóis e destruição dessa biblioteca marcou a queda de Bagdá e, finalmente, o colapso do califado abássida que havia deixado o mundo muçulmano em crise nos anos vindouros (ALGERIANI; MOHADI, 2017).

7 Os mongóis formam um grupo étnico que habita as estepes da Ásia Central. Sua existência é documentada desde o século VIII. Os mongóis formaram sociedades complexas na Idade Média, especialmente no Império Mongol e, depois, sob Tamerlão.

2.4 A PRODUÇÃO EM CIÊNCIAS E MATEMÁTICA

Após o colapso do mundo antigo e o declínio da matemática helenística, o desenvolvimento das ciências exatas continuou principalmente nos países do Extremo, Médio e Próximo Oriente, como é o caso da Matemática islâmica. Nesse período da História da Matemática, foram desenvolvidos importantes métodos e conhecimentos matemáticos, que se tornaram componentes imprescindíveis da matemática do mundo atual (WUSSING, 1998). Durante esse período, nos países de influência islâmica, a matemática se desenvolveu até, aproximadamente, o século XIV-XV. Em comparação ao desenvolvimento da matemática em áreas de influência cristã, podemos dizer que os países islâmicos alcançaram um maior nível de desenvolvimento.

O Islã, em sua expansão, conquistou, como já falamos anteriormente, terras que haviam sido partes da civilização bizantina ou persa, e limitou terras como a Índia e a China com suas próprias altas civilizações. Berggren (2007) comenta que o fato da elite islâmica se interessar pelos conhecimentos desenvolvidos nas sociedades conquistadas não é nada surpreendente, uma vez que, em alguns casos, eles encontravam conhecimentos científicos superiores ao que outrora eles haviam desenvolvidos.

O período de 750 a 900 foi chamado por Berggren (2007) de aquisição muçulmana de áreas inteiras de aprendizado antigo, incluindo a matemática e sua companheira, a astronomia. É importante ressaltar que a palavra aquisição, conforme explica Berggren (2007, p. 516) “significa aqui a participação ativa dos muçulmanos no processo, não apenas como patronos de estudiosos de outras religiões, mas como aprendizes interessados e, cada vez mais, os próprios estudiosos”. Em outras palavras, os muçulmanos não apenas dominaram esses conhecimentos científicos, mas se apropriaram deles.

Youschkevitch (1979) comenta que o terreno para o florescimento da ciência nas regiões centrais do Califado Abássida já estava preparado, visto que

[...] mesmo anteriormente à chegada dos árabes existiam na Síria, na Mesopotâmia e no Irã escolas científicas ativas, nas quais, além da filosofia de Aristóteles, as ciências naturais e as matemáticas eram ensinadas. A medicina, e especialmente as doutrinas de Hipócrates e Galeno, também eram ali estudadas. (YOUSCHKEVITCH, 1979, p.3-4, tradução nossa).

Mais precisamente no governo de Omar II, que consistiu no período de 717 a 720, as cidades sírias perderam a primazia, pois as escolas foram transferidas primeiramente para Narran e depois para Bagdá. Por essa e outras razões, no final do século VIII e início do século IX, muitos tradutores e estudiosos de diversos países se reuniram em Bagdá.

Califas como al-Mansur, que viveu entre 754 e 775 e Harun al-Rashid, que viveu entre 786 e 809, encorajaram o desenvolvimento científico nas áreas das ciências naturais e matemática. A cidade de Bagdá possuía diversas bibliotecas, mas quais muitas eram encarregadas de copiar trabalhos outrora escritos (YOUSCHKEVITCH, 1979).

Pouco mais tarde, al-Mamun reuniu, em seu governo que durou de 813 a 833, estudiosos em uma espécie de academia denominada Casa da Sabedoria. Nessa biblioteca, foram realizados trabalhos extensivos em astronomia e geografia. Parte destes trabalhos foram as novas medidas da inclinação da eclíptica e do comprimento de um arco meridiano, bem como novos mapas geográficos.

Não era apenas a astronomia, devido às descobertas indianas, e a matemática que tiveram desenvolvimento extraordinário naquela época, mas também, a química, a medicina, a farmacologia, a botânica e a mineralogia. Foi durante esse período que [...] se constituíram as escolas filosóficas que foram de grande importância para o conjunto das ciências naturais e matemática. Como Aristóteles, os pensadores do mundo islâmico se distinguiam pelo interesse em diversas áreas do conhecimento, seu conhecimento enciclopédico e pela dedicação à pesquisa em diversos ramos: os matemáticos, por exemplo, frequentemente se dedicavam à medicina. (YOUSCHKEVITCH, 1979, p. 5, tradução nossa).

O pano de fundo para os desenvolvimentos matemáticos que começaram em Bagdá em torno de 800 não é bem compreendido. Certamente houve uma importante influência que veio dos matemáticos hindus, cujo desenvolvimento anterior do sistema decimal e dos numerais era importante. Conforme Berggren (2007) nos informa, a matemática islâmica medieval incluiu as teorias e práticas matemáticas que cresceram e floresceram frequentemente na Península Ibérica, cujo período histórico envolvido teve início em 750 e término em 1450 d. C., o que corresponde à, aproximadamente, 700 anos.

Embora os tratados matemáticos tenham sido escritos em vários idiomas, incluindo persa e turco, Berggren (2007, p. 515, tradução nossa) aponta que

[...] a principal língua utilizada era o árabe e, por essa razão, é ocasionalmente chamada de matemática árabe. Esse nome, no entanto, torna-se facilmente “matemática árabe”, com a implicação de que a maioria de seus praticantes eram árabes, embora muitos fossem (por exemplo) iranianos, egípcios, marroquinos e assim por diante. Então, a designação "matemática islâmica" é preferível.

Essa confusão no termo matemática árabe envolveu e ainda envolve diversos estudiosos desse período islâmico, como por exemplo, al-Khwarizmi, que iremos falar mais à frente.

A escola matemática de Bagdá manteve atividade intensa durante dois séculos. Youschkevitch (1979) explica que, em seu primeiro período, a escola matemática se dedicou, primordialmente, ao estudo das obras da antiguidade e a suas respectivas traduções para o árabe. Graças a esses estudos iniciais, uma terminologia científica árabe se desenvolveu rapidamente e em um espaço de 100 a 150 anos, as principais obras de Euclides, Arquimedes, Apolônio, Ptolomeu e outros foram traduzidas para o árabe (YOUSCHKEVITCH, 1979).

Podemos distinguir, de acordo com Youschkevitch (1979), três etapas no desenvolvimento da matemática nos países islâmicos, sendo imperceptível a passagem de uma etapa para a outra: a etapa da assimilação do conhecimento ou das traduções, a etapa da produção e traduções e a etapa da divulgação e produção de conhecimento.

Na etapa da assimilação da herança cultural grega e oriental, com a predominância dos elementos gregos por algum tempo, houve a criação de um enorme acervo para estudo, na própria língua árabe. Na verdade, juntamente com a criação de uma enorme bibliografia traduzida e comentada, a esta bibliografia, já no século IX, se formou uma cultura matemática particular. A partir deste período, o conhecimento e os métodos dos gregos foram frequentemente aplicados à solução de problemas de cálculo numérico. Essa tendência se intensificou cada vez mais nos séculos X e XI, uma vez que os cálculos astronômicos e os métodos de aproximação da álgebra e da trigonometria tornaram-se cada vez mais precisos. Esta tendência se fortaleceu ainda mais do século XIII ao XV. O estabelecimento de relações mais estreitas com a China provavelmente foi de grande importância neste domínio (YOUSCHKEVITCH, 1979).

Berggren (2007) não chama atenção para as etapas, mas para as fontes. Segundo o referido autor, a matemática islâmica veio principalmente de três tradições. A primeira tradição foi a matemática grega, perpassando pelos clássicos geométricos

de Euclides, Apolônio e Arquimedes, às soluções numéricas dos problemas indeterminados da Aritmética de Diofante até chegar nos manuais práticos de Heron. Admitindo-se que os gregos não eram os únicos que possuíam conhecimentos científicos naquela época, Berggren (2007) aponta que a segunda tradição influenciadora da matemática islâmica medieval é a hindu, com o seu engenhoso sistema aritmético posicional, baseado em apenas nove signos e com seus métodos de geometria sólida para resolver situações corriqueiras na astronomia.

Para finalizar, Berggren (2007) chama a terceira tradição de matemática dos praticantes. Esses praticantes incluíam

[...] agrimensores, construtores, artesãos em desenho geométrico, funcionários fiscais e de tesouraria e alguns comerciantes. Parte de uma tradição oral, essa matemática transcendia as divisões étnicas e era uma herança comum de muitas das terras incorporadas ao mundo islâmico. (BERGGREN, 2007, p. 516, tradução nossa)

A assimilação da herança clássica permitiu que os matemáticos dos países islâmicos atingissem um nível mais alto no desenvolvimento de algoritmos numéricos e problemas correspondentes do que os matemáticos chineses e indianos poderiam acessar. Ela também permitiu

[...] que os islâmicos encontrassem formas mais eficazes de resolver e generalizar esses problemas do que aqueles disponíveis para os chineses e indianos. Se os indianos e os chineses se contentavam em estabelecer uma determinada regra de cálculo, os matemáticos islâmicos muitas vezes conseguiam desenvolver uma teoria inteira. Assim, com base na teoria das seções cônicas, um legado da antiguidade, eles criaram uma teoria geométrica bastante desenvolvida de equações de terceiro grau. Eles também desenvolveram novas ideias em seus comentários sobre as obras gregas e substituíram, por exemplo, a teoria das proporções de Eudoxus e Euclides por outra teoria em que apareceu um conceito mais amplo do número real que correspondia melhor aos novos requisitos da ciência e suas aplicações. (YOUSCHKEVITCH, 1979, p. 8, tradução nossa)

Com isso, podemos observar, segundo Youschkevitch (1979), que a influência da matemática grega é revelada nos métodos de pesquisa, bem como no estilo das obras árabes, cujos autores tentaram apresentar demonstrações, classificar os assuntos de forma sistemática e fazer exposições completas. Quando os autores não indicavam a maneira como eles desenvolviam as fórmulas que aplicavam, eles claramente as enunciavam em detalhes. Desse modo, em muitas obras, é encontrado ao mesmo tempo uma grande quantidade de exemplos e problemas. Tal abundância

é característica das obras orientais da matemática e seu conteúdo é muitas vezes emprestado de problemas prático, em particular, de problemas da vida cotidiana.

Segundo Djebbar (2005), a ciência árabe nasceu dentro de um contexto excepcional e se estendeu à todas as produções e práticas científicas realizadas, em

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