• Nenhum resultado encontrado

Experiências, práticas culturais e cultura(s)

No documento A CIDADE DE CATALÃO EM UM (páginas 129-132)

O propósito deste capítulo foi destacar as práticas culturais e experiências que são construídas no espaço, transformado em lugar pelos valores e significados a ele atribuídos pelos seres humanos (TUAN, 1983, p. 4, 6), e no tempo vivido por esses, que são figurados na obra de Coelho. Lugares de sensibilidades, marcados pelas experiências sensitivas, emotivas e afetivas, por memórias, sofrimentos, angústias e pesadelos, que contrastam com anseios e esperanças na busca de um futuro melhor, que são expressos em sonhos e desejos de um horizonte distinto daquele vivenciado até o momento pelo homem e sua família, mas que só se apresenta cada vez mais distante, inatingível.

presentes e experimentadas na estrutura física da cidade, que são elementos reinventados e transformados pelas pessoas em suas relações sociais. Para Chartier, a Cultura pode ser apreendida e examinada na esfera produzida pela relação interativa entre as práticas e as representações, correspondendo, de certo modo, respectivamente, aos “modos de fazer” e aos “modos de ver” (BARROS, 2011, p. 17). Para ele, “as divisões culturais não se ordenam obrigatoriamente segundo uma grade única do recorte social, que supostamente comanda a desigual presença dos objetos como as diferenças nas condutas” (CHARTIER, 2002, p. 68). No campo social, as representações coletivas são responsáveis por edificar o próprio mundo social e as práticas culturais podem ser pensadas como as instâncias oficiais de produção cultural, as instituições variadas, as técnicas e as realizações, mas também como os usos e costumes que caracterizam a sociedade (BARROS, 2011, p. 17).

Assim, a cultura, entendida como bem simbólico e como sendo apreendida nas práticas humanas e sociais, nos usos e nas apropriações, afasta do conceito elitista de cultura que a pensava apenas como fruto da ação letrada, dos ilustrados e da elite. Isso é visível na obra de Coelho, pois só podemos caracterizar o ambiente marginalizado e precário dos protagonistas em comparação ao ambiente dos demais personagens, isto é, dos endinheirados, nos contrastes do viver e da existência nos bairros pobres e nos ricos.

Desse modo, a concepção de formação cultural e social é relacional, ao mesmo tempo que condensa concepção e prática, pensamento e ação. Esta relação é movida e estruturada no seio das relações de poder, das disputas e forças sociais. Portanto, uma representação coletiva é o fruto de conflitos, ou seja, uma esfera marcada de dominação e de disputas.

Nesse contexto, as experiências humanas são apreendidas nas diferentes maneiras através das quais as pessoas agem, pensam, sentem, conhecem e constroem uma determinada realidade, inclusive por meio dos diversos sentidos, como o olfato, o paladar, o tato, a percepção visual e as formas de simbolização, sendo, portanto, constituída de pensamentos e sentimentos (TUAN, 1983). A “experiência implica a capacidade de aprender a partir da própria vivencia” e “experimentar é aprender”, significando “atuar sobre o dado e criar a parti dele”, seja um sentido, um sentimento, um pensamento (TUAN, 1983, p. 10). Deste moo, o “[...] dado não pode ser conhecido em sua essência. O que pode ser conhecido é uma realidade que é um constructo da experiência, uma criação de sentimento e pensamento” (TUAN, 1983, p. 10).

Essa produção é cultural, por isso, ao trazer o estudo para o âmbito das práticas culturais, verificamos que estas são expressas pelas manifestações dos indivíduos em sociedade, envolvendo costumes, crenças, valores, hábitos, arte, religião e tudo mais pensado

e produzido pelos seres humanos e por eles dotados de sentido, podendo ser passado de uma geração a outra, ser apropriado e ressignificado, sendo expressas nas relações interpessoais através da socialização e das sociabilidades. Vale lembrar que a cultura é dinâmica, muda com a ação humana no tempo e no espaço, produzindo e acompanhando as transformações que ocorrem na sociedade, ou seja, ela é essencialmente humana, só o ser humano é capaz de proporcionar significado simbólico às suas produções.

Vale aqui ressaltar que não existe uma cultura superior a outra, conforme o criticado viés etnocêntrico, não se podendo classificar uma cultura em detrimento da outra, uma vez que toda cultura tem valor, sentido e significados internos. Consoante Geertz (1987), a cultura é uma teia de significados tecidos pelos homens e na qual estão amarrados. Portanto, “A cultura de uma sociedade consiste no que quer que seja que alguém tem que saber ou creditar a fim de agir de uma forma aceita por seus membros”, sendo “pública porque o significado o é”. Ela “consiste em estruturas de significado socialmente estabelecidas”, em redes de sinais e “sistemas entrelaçados de signos interpretáveis”, descritos de forma inteligível. A cultura “como sistema simbólico” possui no uso na vida real, uma lógica informal, sendo os significados a serem decifrados e interpretados (GEERTZ, 1987, p. 15, 21, 22, 23, 27).

Portanto, o autor afirma que essas teias de significado podem ser responsáveis pelas práticas dos indivíduos em sociedade, sendo a cultura formada por estruturas sociais que se entrelaçam de modo a dar sentido às ações humanas. Nessa concepção, podemos constatar que a cultura é de uma heterogeneidade desmedida. O que está inserido na cultura de uma região não necessariamente está relacionado com outra região do mesmo país, evidenciando, portanto, a complexidade das teias de significados.

Dessa forma, ao pensar a cultura como produto e como as práticas humanas diversas, podendo ser por meio dessas acessada, podemos também falar de uma cultura material, a qual abarca a relação humana com as condições materiais que pesam sobre a vida dos homens e refletem na sociedade. Ou seja, como uma dimensão social que se exprime no concreto, nos e pelos objetos, dizendo respeito à relação dos homens com os objetos, ao conjunto de objetos consagrados à vida cotidiana e que caracterizam uma sociedade, como aqueles ligados ao ensino, às técnicas, à alimentação, sendo tanto os objetos e as ferramentas, como os gestos a eles atrelados (PESEZ, 1993, p. 177-215).

Através da obra de Coelho, pode-se vislumbrar aspectos diversos da cultura da cidade de Catalão, inclusive materiais, na qual há alusões à identidade e à memória dos catalanos, pois símbolos carregados de sentidos e significados associados aos objetos. Portanto a cultura não se resume somente aos aspectos físicos, concretos e materiais de uma sociedade, também

é dimensão simbólica percebida nas tradições, nos costumes, nos usos, nos hábitos, nos saberes, nas línguas, nas festas e em diversos outros aspectos e manifestações de uma sociedade, transmitidos oralmente ou gestualmente, por escrito ou outras formas de expressão humana, sendo apropriados, recriados coletivamente e modificados ao longo do tempo. Percebe-se que na obra de Coelho (1997) o mesmo trata tanto da cultura material quanto da imaterial dos habitantes do lugar.

No documento A CIDADE DE CATALÃO EM UM (páginas 129-132)