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3.1.1 Introdução

O envelhecimento é um fenômeno inerente a todos os seres vivos e se expressa pela perda da capacidade de adaptação e redução da funcionalidade. Logo, quando tratamos da capacidade de realizar as tarefas da vida diária, a redução da força muscular e seu controle se destacam. Contudo, evidências demonstram que o declínio da força é multifatorial, uma vez que, para além da atrofia e hipoplasia existem ainda reduções na capacidade de recrutamento neural que pode contribuir de modo significativo para essas alterações funcionais (59). Assim, o prejuízo funcional da redução de força para o idoso é refletido em atividades de grande relevância no contexto diário do ser humano, como vestir-se, alimentar-se, ir ao banheiro, usar o telefone, escrever, manipular livros, preparar alimentos, higienização pessoal, sentar-se, virar na cama e locomover-se (60, 61).

No que concerne às capacidades inerentes à mão, especificamente, a habilidade de alcançar e manipular objetos talvez seja a função mais importante dessa estrutura e qualquer deterioração nestas habilidades podem gerar severos prejuízos funcionais (2, 62-64). Dessa maneira, o declínio da função motora manual, decorrente do envelhecimento, tem sua origem em mecanismos neuromusculares identificados a partir de índices experimentais de desempenho motor manual. Estes índices são gerados a partir de testes de estabilidade onde uma força constante é executada durante contrações isométricas, partindo de um músculo isolado ou grupo muscular. Contudo, a contração exercida pelo membro não é exatamente constante, uma vez que oscila em torno de um valor médio. A variabilidade de força sobre o valor médio pode ser quantificada partindo de uma consideração absoluta, com o desvio padrão ou relativa, com o coeficiente de variação de força (CV), calculado a partir da equação CV (%) =DP/Média, recebendo o nome de flutuação de força ou variação de força (49, 64).

Estudos sobre a flutuação de força têm investigado amplamente os mecanismos envolvidos, as possíveis influências da idade e do treinamento,

bem como a associação com função motora fina, porém, existe uma carência de informações no meio científico acerca do número de sessões de familiarização necessário para a estabilização da flutuação de força. Apesar de ser reconhecida a importância da aplicação de um processo de familiarização em testes neuromusculares (65-73), sobre tudo em populações idosas (65, 70, 72, 73) ainda há uma carência muito grande de estudos que busquem conhecer o número de sessões necessárias para familiarização em testes de flutuação de força. Assim, resultados obtidos em pesquisas onde não são realizados procedimentos consistentes de familiarização encontram-se sujeitos a questionamentos, comprometendo a qualidade das informações geradas. Este fato é plenamente justificável, uma vez que a ausência da familiarização prévia com os procedimentos exigidos em testes pode favorecer a subestimação dos valores obtidos.

Estudos produzidos por Christou et al e Kornatz et al, demonstrando a eficácia do exercício físico para redução da flutuação de força em idosos se enquadram nas poucas pesquisas que se preocuparam em aplicar sessões de familiarização com o protocolo experimental proposto. Porem, ainda assim, apenas uma única sessão foi destinada à agregação do conhecimento acerca do movimento a ser executado (48, 50). Ainda que o indivíduo tenha sido submetido a uma sessão de familiarização, não é apresentada fundamentação argumentativa científica consistente para afirmar que esta já foi suficiente para que sejam evitados equívocos de mensuração posteriores.

Diante dessas informações, o presente estudo objetivou verificar o número mínimo de sessões de familiarização para a estabilização da flutuação de força em idosos.

3.1.2 Materiais e Métodos

3.1.2.1 Participantes do estudo

Doze mulheres idosas (65,25 + 4,7 anos), com massa corporal 63,22 +7,3, estatura 1,53 +0,0 e Índice de Massa Corporal (IMC) 27,14 +3,8. Praticantes de atividade física regular participaram voluntariamente desse estudo. O número de sujeitos por grupo etário foi calculado com base no nível de significância de 0,05, poder estatístico de 0,7 e magnitude de efeito grande (ƒ ²=0,35) (74). Para evitar possíveis problemas quanto à perda amostral, foi acrescido uma quantidade de 50% no número de voluntários (ou seja, 4 indivíduos).

Como critérios de inclusão dos participantes no estudo as voluntárias deveriam se enquadrar-se na faixa etária idosa respeitando as considerações da Organização Mundial de Saúde (OMS), serem destras e apresentar respostas negativas em todos os itens do Physical Activity Readiness

Questionnaire (PAR-Q) (Anexo 02).

Como critérios de exclusão estabeleceu-se a presença de deficiência severa de equilíbrio postural que impedisse a voluntária de realizar movimentos em pé ou sentado; histórico de doenças neurológicas (p.ex. epilepsia); histórico de hemiparesias; idosas com deficiência auditiva e/ou visual que pudessem impedir a voluntária de receber as instruções durante os testes.

Após serem informadas sobre os objetivos do estudo e os procedimentos aos quais seriam submetidas, todas as participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido (Anexo 01) e preencheram uma ficha de anamnese (Apêndice 01).

3.1.2.2 Delineamento experimental

Inicialmente, foi proferida uma palestra direcionada ao grupo de idosas praticante de atividade física regular com intuito de prestar informações esclarecedoras a respeito dos objetivos e procedimentos do estudo. As voluntárias foram submetidas a um consistente protocolo de familiarização marcado por uma sessão destinada a estabelecer os valores individuais de

Contração Voluntária Máxima (CVM) empregando-se a dinamometria manual. Adicionalmente aos procedimentos supracitados, foram realizadas mais oito sessões de familiarização com os mesmos instrumentos, porém numa intensidade de 30% da CVM peculiar a cada idosa avaliada e num período de 30 segundos, assinalando um processo que permitisse agregar conhecimento acerca do ato motor executado durante as sessões experimentais. Nesta fase do processo foram adotadas instruções padronizadas referentes à magnitude de força a ser aplicada na dinamometria manual.

Para o registro dos dados referentes à força, utilizou-se uma célula de carga adaptada a um dinamômetro. Ao final dessa etapa foram conduzidos os procedimentos de mensuração da Pressão Arterial (PA). Logo após, as voluntárias foram submetidas ao protocolo de flutuação de força com dinamometria manual e célula de carga. Todas as voluntárias foram instruídas a buscar condições de conforto e descanso na noite anterior às sessões experimentais, bem como a comparecerem ao ambiente laboratorial trajando vestimentas confortáveis para a realização das atividades.

Os procedimentos experimentais foram realizados em ambiente laboratorial com temperatura ambiental do local controlado, mantendo-se uma variação entre 18º e 22º Celsius com uma umidade relativa menor do que 60% (POTTEIGER; WEBER, 1994; PINA, et al., 1995).

3.1.2.3 Sessões de testes de flutuação de força

Ao início da primeira sessão experimental, um inquérito estruturado foi conduzido por um entrevistador previamente treinado com a finalidade de averiguar a adequação individual aos critérios de inclusão e exclusão de antemão estabelecidos para o presente estudo (Apêndice 01). Em seguida, as voluntárias já com eletrodos acoplados nos músculos pré determinados, foram acomodadas em posição sentada, tronco apoiado no encosto da cadeira e braço direito em flexão de 90º segurando o dinamômetro adaptado com a mão. Posteriormente, solicitou-se que as idosas realizassem uma contração voluntária isométrica com 30% da CVM previamente estabelecida no protocolo de familiarização durante 30 segundos, controlando esse percentual a partir do retorno visual oferecido pelo computador que estava conectado com a célula

de carga acoplada ao dinamômetro manual. O percentual da CVM estabelecido baseia-se no fato de que outros estudos terem adotado a mesma margem de percentual, demonstrando não gerar sensação de fadiga prematura durante a execução da contração nas voluntárias (75-78).

Assim, considerando a impossibilidade de executar uma ação muscular de modo constante, fazendo com que os níveis de força se mantenham flutuando em um dado nível médio, calculou-se a magnitude de flutuação da força a partir da consideração em valores absolutos, com Desvio Padrão (DP). 3.1.2.4 Instrumentos

Para quantificar a força, em Kgf, utilizou-se uma célula de carga da marca Miotec® acoplada ao dinamômetro adaptado e ao aparelho de eletromiografia da mesma marca. Para tanto, reitera-se que células de carga são estruturas mecânicas planejadas para receber esforços e deformar-se dentro do regime elástico a que foram planejadas. Sendo aplicada sempre que se faz necessário a mensuração de peso ou força em tração ou compressão relacionando-a a atividade muscular.

Inicialmente, a célula de carga foi calibrada seguindo as orientações da Miotec®. Em seguida, foi fixada junto ao dinamômetro manual adaptado com a finalidade de receber essa estrutura (Figura 12). O protocolo correspondente à célula de carga foi aplicado com os indivíduos sentados, cotovelo direito em flexão de aproximadamente 90º o e punho fixo a um cabo inextensível perpendicular, preso a uma célula de carga com capacidade máxima de medição de até 200 kgf (Miotec®). O cotovelo esquerdo permanecia flexionado com a palma da mão apoiada sobre a coxa. A leitura do sinal do transdutor foi realizada através do software MIOGRAPH 13.

Figura 12: Dinamômetro manual adaptado com a célula de carga.

3.1.2.5 Tratamento dos Dados e Estatística

Inicialmente a normalidade dos dados foi verificada a partir do teste de Shapiro-Wilk e em seguida os dados foram tratados a partir de procedimentos descritivos, sendo as informações processadas no pacote computacional GraphPad Prism. O teste de variância bivariado de Friedman foi empregado para comparar os valores obtidos nas diferentes sessões de familiarização. com medidas repetidas foi utili ada para as comparaç es entre os valores de desvio padrão obtidos em diferentes sess es. O teste post hoc de Dunns foi empregado para a identificação das diferenças espec ficas nas variáveis em que a signific ncia estat stica foi confirmada (p 0,0 ). limite de concord ncia entre as sess es de familiari ação em que ocorreu a suposta estabili ação da flutuação de força muscular foi analisado mediante os procedimentos propostos por Bland e Altman (79).

3.1.3 Resultados

A figura 13 apresenta informações referentes aos valores de flutuação de força obtidos no decorrer das oito sessões de familiarização com o protocolo experimental. Onde foram verificadas diferenças estatisticamente significativas segundo aplicação do teste ANOVA (p= 0,0096). Conforme percebido no comportamento dos valores de Desvio Padrão referente à flutuação de força, sugere-se que as idosas conseguiram atingir alta reprodutibilidade ao teste de flutuação de força após realizar duas sessões do protocolo experimental (Figura 13).

Figura 13: Comportamento do desvio padrão durante exercício isométrico realizado em 8 sessões constituintes do processo de familiarização. Valores expressos em desvio padrão (N=12). Diferença significante em relação as sessões 2 e 1 (P<0,01), porém a partir da sessão 3 os valores começam a se estabilizar.

Para averiguar os limites de concordância entre as sessões de estabilização e a sessão anterior à estabilização (sessões 2 e 1) a flutuação de força foi analisada a partir da plotagem de Bland e Altman demonstrada na figura 14. Assim, verificou-se que a diferença média (linha central) e o espaço compreendido entre os limites de concordância (linhas superior e inferior) foram relativamente curtos.

Processo de Familiarização

1 2 3 4 5 6 7 8 0.0 0.1 0.2 0.3 0.4 0.5 Nº de sessões DP * * * * * *

Figura 14: Plotagem de Bland-Altman para comparação entre as sessões 2 e 1 do protocolo experimental de flutuação de força em idosas (N=12).

0,00 0,05 0,10 0,15 0,20 0,25 0,30 0,35 AVERAGE of DP2 and DP1 0,15 0,10 0,05 0,00 -0,05 -0,10 -0,15 -0,20 -0,25 -0,30 Mean -0,085 -1.96 SD -0,279 +1.96 SD 0,108 3.1.4 Discussão

O objetivo do presente estudo foi verificar o número mínimo de sessões de familiarização necessário para a estabilização da flutuação de força em idosos. O registro de diferenças estatisticamente significativas na primeira sessão de familiarização confirmam a hipótese de que, mesmo em idosas fisicamente ativas, duas sessões de familiarização são necessárias para que haja uma estabilização da flutuação de força.

Estes achados confirmam a importância da familiarização ao protocolo de flutuação de força, revogando que a ausência desse processo pode resultar em interpretações equivocadas, o que por sua vez, pode gerar um comprometimento na prescrição do exercício, bem como na avaliação da efetividade ou não de programas de intervenção direcionados ao aumento da força (70). Assim, funcionalmente, estes dados devem ser considerados ainda na fase de planejamento de programas de treinamento físico.

Pereira e Gomes (2003) sustentam a assertiva anterior quando discutem a questão da confiabilidade de um instrumento de medida como sendo fundamental para garantir a qualidade e significado dos dados de um estudo, como por exemplo, a determinação acerca do impacto de um programa de exercícios. Ainda que determinado instrumento seja consagrado pela sua aplicação, a ausência de estudos que comprovem sua confiabilidade podem

gerar comprometimentos nos resultados e interpretações de pesquisas aplicadas (80).

A análise estatística deste estudo baseou-se em distintas comparações, onde a Análise de Variância para medidas repetidas (ANOVA) foi aplicada para a comparação entre os valores de desvio padrão entre as sessões testadas; o

Post Hoc de Tukey foi empregado para a identificação das diferenças

específicas e o Bland-Altman para proporcionar um relatório mais detalhado sobre o limite de concordância entre as sessões de familiarização onde se configurou a suposta estabilização de força.

Apesar da expressiva importância percebida quanto à instauração de processo de familiarização em protocolos de pesquisa, principalmente no que se refere à flutuação de força muscular, existe ainda uma carência considerável de estudos que remetem essa abordagem. Entretanto, comparando estudos que envolvem a determinação de um número específico de sessões necessárias ao alcance da alta reprodutibilidade de um protocolo, situações semelhantes foram apresentadas em estudos realizados por Dias et al (2009), Dias et al (2005) e Silva-Batista et al (2011), onde os resultados demonstram que, para minimizar equívocos na avaliação de determinadas variáveis, são necessárias realização de pelo menos duas sessões de familiarização ao protocolo [3–5]. Além disso, quando investigado a influência do processo de familiarização com o teste de uma repetição máxima (1RM) realizado no total de cinco sessões com 18 mulheres experientes no treinamento de força, Dias et al (2009) perceberam que a estabilização da força máxima ocorreu entre a segunda e terceira sessão de teste, sugerindo que pelo menos duas sessões de familiarização com testes de força são necessárias para minimizar erros nos procedimentos de avaliação (68).

Esta condição tem sido frequente, sobretudo, com a população idosa, onde programas de treinamento físico direcionados a este público têm recebido atenção considerável por parte dos meios científicos. Assim, Ploutz-Snyder e Giamis propuseram a comparação do número de sessões necessárias para a familiarização ao teste de 1RM entre mulheres jovens e idosas, observando as idosas necessitam de um número maior de sessões se comparadas as jovens (70).

Com relação à estabilidade da flutuação de força, sabe-se que o ser humano apresenta um progressivo declínio nas capacidades de movimento decorrentes da senescência, sendo esta uma adaptação induzida pelas alterações no sistema neuromuscular. A redução da força muscular em virtude da apoptose de motoneurônios e uma reinervação incompleta das células neurais sobreviventes são fatores limitantes para a execução de um movimento eficiente. Além das adaptações morfológicas, o declínio na eficácia da transmissão neuronal deve também ser considerado como influente no processamento de informações (48).

Dessa forma, o aumento da variabilidade na descarga motora reflete uma possível consequência destas adaptações morfofuncionais no sistema neuromuscular. A relevância funcional deste aumento consiste na possibilidade de desencadear significativo prejuízo no que se refere à capacidade de exercer movimentos em trajetórias constantes ou mover um membro a um alvo desejado (48-50, 64). Portanto, é interessante reforçar a necessidade de aplicação de um processo de familiarização que possa agregar conhecimento referente ao movimento que será realizado durante testes afim de que não haja equívocos de interpretação. Bem como ampliar as informações acerca desta variável, flutuação de força, que é de grande importância para a autonomia funcional dos idosos.

Nesse sentido, para futuros estudos recomenda-se, por exemplo, a análise das mesmas variáveis em diferentes tipos de exercícios, músculos, intensidades, populações (atletas, sedentários, portadores de doenças crônicas degenerativas como Alzheimer, Parkinson) e faixas etárias.

3.1.5 Conclusão

Os resultados do estudo sugerem a necessidade de se aplicar um processo de familiarização com teste de flutuação de força permitindo assim que as participantes do estudo possam agregar conhecimento acerca do ato motor a ser executado durante as sessões experimentais. Assim, sugere-se para a avaliação adequada da estabilidade de flutuação de força em idosas, a realização de pelo menos duas sessões de familiarização em teste de estabilidade de flutuação de força em idosas.

3.2 EXPERIMENTO II: Efeitos da Estimulação Transcraniana por Corrente

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