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Um trabalhador de uma fábrica tem o seu processo de autonomia controlado, pois previamente é decidido o produto do seu trabalho. No entanto, na saúde, mesmo que o “trabalho vivo” seja “capturado” pelas tecnologias mais estruturadas (tecnologias duras e leves-duras) ou também estiver submetido ao controle empresarial, no encontro entre o usuário e o consumidor, ocorre o “espaço intercessor”, com possibilidades de mudanças, de atos criativos. Esse é um aspecto conflituoso, visto que há diversas possibilidades de desdobramentos.

Dessa forma, é possível considerar que, no encontro do trabalhador de saúde e o seu cliente, é estabelecido entre eles um espaço intercessor que sempre ocorrerá em seus encontros e em ato.

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Quer saber mais sobre o trabalho em saúde? Recomendamos a leitura do artigo “Trabalho em Saúde”, disponível em: https://

bit.ly/3iTrftu

Segundo Merhy (1997), no encontro de sujeitos, são criados espaços de relações em que ocorrem interseções entre os dois. Esse encontro não se configura uma simples somatória de um com outro, mas é o resultado de um processo singular pelo encontro dos dois em um único momento. Nesse encontro, o “agente produtor” porta conhecimentos, equipamentos, tecnologias, enquanto o “agente consumidor” também expressa seus conhecimentos e representações.

Figura 6 – Agente produtor e consumidor

Fonte: Elaborado pela autora.

No entanto, há, ainda, nos espaços de saúde, as relações nas quais se predomina a “voz” do trabalhador e a “mudez” do usuário.

IMPORTANTE

Segundo Malta e Merhy (2003), se o trabalhador não se sente sujeito ativo no processo de reabilitação, ele perderá contato com elementos que potencialmente estimulam a sua criatividade, não se responsabilizando pelo objetivo final da sua intervenção. Para reverter esse quadro, é preciso aproximar o trabalhador do resultado do seu trabalho e valorizar o seu orgulho profissional pelo esforço singular de cada caso.

Outro aspecto importante é a necessidade de se construir caminhos para sair das polaridades representadas que se configuram na especialização excessiva. Ela é a geradora da verticalidade na organização dos processos de trabalho em saúde, com profundo desentrosamento das equipes, e de uma completa horizontalização, na qual todos os profissionais são igualados sem se ater às especificidades de cada profissão.

Nesse contexto, surgem dois conceitos fundamentais: “núcleo” e “campo” de competência e responsabilidade.

Figura 7 – Núcleo e campo da competência e responsabilidade

Dessa forma, é preservada a maior autonomia profissional e das equipes. Não só, mas se mantém:

o exercício de “núcleos” específicos, próprios da intervenção de cada profissional, além de alargar os “campos” comuns, melhorando a qualidade da assistência, permitindo respostas mais abrangentes por parte dos profissionais. (MALTA; MERHY, 2003, p. 65) Nesse sentido, o processo de trabalho em saúde, como micropolítica, configura-se como um lugar estratégico de mudança. Suas ações devem fugir do modelo médico-hegemônico e se pautar na ética do compromisso com a vida, ao assumir uma postura acolhedora e ao estabelecer vínculos, com o objetivo de se obter a resolutividade e a criação da autonomia dos usuários.

Segundo Merhy e Franco (2003), ao observar a conformação dos modelos assistenciais, existem os conceitos de “tecnologias materiais” para os instrumentos e de “tecnologias não materiais”. Contudo, para além dos instrumentos e conhecimento técnico, há outro: o das relações, o qual tem se verificado como fundamental para a produção do cuidado.

Figura 8 – Modelo assistencial proposto por Merhy e Franco

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Quer saber mais sobre a ideia de modelo assistencial proposto por Merhy e Franco? Recomendamos a leitura do artigo “Por uma composição técnica do trabalho centrada no campo relacional e nas tecnologias leves”, disponível em: https://bit.ly/3mJKXtX

Propõe-se, portanto, o desenvolvimento de um processo de trabalho em saúde não apenas em sua capacidade de execução de procedimentos biomédicos, mas um trabalho que valorize as singularidades de cada indivíduo. Tudo isso, a fim de impactar o núcleo do cuidado ao compor uma hegemonia do trabalho vivo sobre o trabalho morto.

Com objetivo de reorganizar o processo de trabalho na saúde esse passa pela qualificação da força trabalho dos profissionais, integração dos profissionais na assistência, resgate do sentido do trabalho multiprofissional e qualificação o produto final ofertado.

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Quer conhecer a visão dos profissionais da saúde sobre o seu processo de trabalho? Recomendamos a leitura do artigo “Reflexões de profissionais de saúde acerca do seu processo de trabalho”, disponível em: https://bit.ly/3iQ7pz8

Outro aspecto que também tem sido bastante considerado é a ampliação dos espaços de discussão e decisão pautados na democracia, a fim de ampliar os espaços de escuta, de trocas e

decisões coletivas. Não só, mas também se busca a criação de novos formatos do trabalho em saúde pautados na necessidade de se responder ao sofrimento dos usuários. Para que os modelos de assistência possam romper essa situação, devem ser calcados nos seguintes pressupostos:

1. Garantia do acesso e acolhimento aos usuários.

2. Responsabilização/vínculo.

3. Integralidade na assistência.

4. Democratização (participação de trabalhadores e usuários na gestão).

5. Gestão pública e adequação à realidade local.

Para que isso se concretize, são necessários alguns aspectos que um modelo tecnoassistencial deveria conter:

a. Garantir a universalidade, a integralidade e a equidade.

b. A atenção a grupos populacionais específicos (idosos, adolescentes e outros).

c. Atenção a doenças crônicas, tendo em vista os custos crescentes e a incorporação tecnológica.

d. Metodologias e tecnologias de educação e promoção de hábitos e comportamentos saudáveis, entre outros.

Tais pressupostos e aspectos que devem ser considerados estão embasados nos princípios do SUS. Isso evidencia a importância de se persistir nessa proposta de um sistema de saúde universal, equânime e de qualidade.

RESUMINDO

Compreendemos que o processo de trabalho está relacionado a um conjunto ordenado de atividades interligadas logicamente. Além disso, aprendemos que há, como componentes do processo de trabalho: objetos; objetivos ou finalidades; agente ou sujeito; objetivos existenciais ou sociais

Como conceitos importantes, estudamos o trabalho vivo (refere-se ao trabalho em ato, o trabalho criador) e o trabalho morto (refere-se a todos os produtos-meios que são resultado de um trabalho anterior e que o homem os utiliza para realizar um dado trabalho). Além disso, há a expressão “trabalho vivo capturado”, que é utilizada quando o homem não consegue exercer nenhuma ação de forma autônoma, tornando-se um trabalho morto.

Aprendemos que o processo de trabalho na saúde possui, entre suas particularidades, o encontro de sujeitos, no qual temos o agente produtor (porta conhecimentos, equipamentos e tecnologias) e o agente consumidor (expressa seus conhecimentos e representações). Porém, foi ressaltada a predominância, ainda, no processo de trabalho, da voz do profissional e a mudez do usuário.

Outra questão importante trabalhada foram as polaridades percebidas, representadas pela especialização excessiva (verticalização) e a definição de todos os profissionais como iguais, sem considerar suas especificidades profissionais (horizontalização). Constatamos, assim, a necessidade de se pensar em um modelo assistencial que tem sido empregado na prática. Alguns autores sugerem, como modelo assistencial, a associação entre as tecnologias materiais, as tecnologias não materiais e as relações. Por fim, não pudemos nos esquecer de que, para conseguir uma reorganização do processo de trabalho, precisamos que os profissionais sejam qualificados para isso e as ações devem sempre seguir os princípios propostos pelo SUS.

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