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Expressões Multipalavra: características e classificações propostas

2 RESENHA DA LITERATURA

2.5 EXPRESSÕES MULTIPALAVRA

2.5.2 Expressões Multipalavra: características e classificações propostas

Santos (2008) aponta para o problema da tradução automática na qual, ora as EM são traduzidas em uma palavra de um idioma a outro, ora se dá o contrário como no caso de sentir falta, que em inglês ficaria apenas miss e, de outros que se traduzem como EM para ambos os idiomas como no caso de bater as botas do português e que, em inglês, se torna kick the bucket.

Conforme, Villavicencio et al (2010), outro aspecto a ser levado em consideração quanto às EM, é que elas costumam aparecer com frequência na linguagem cotidiana, aparecendo em diversas gramáticas e dicionários nos quais boa parte das entradas são EM.

Para Sag et al (2002), algumas EM são fixas e não apresentam variação interna, como ad hoc, enquanto outras permitem diferentes graus de variabilidade interna e modificação como, por exemplo, levar chumbo/pau.

Outras EM são semanticamente opacas como lavar roupa suja e outras ainda apresentam-se mais transparentes, tendo seus significados inferidos a partir de seus elementos, como em carro de polícia. Aqui o sintagma preposicional de polícia acrescentaria informação de função à palavra carro.

De acordo com Krieger e Finatto (2004), em texto de domínio específico, as EM estão relacionadas ao termo cuja definição seria a de uma representação do conhecimento da área específica, contendo unidades lexicais expressando conceitos abstratos ou elementos concretos de um domínio.

Sag et al (2002) classificam as EM em dois grandes grupos: expressões institucionalizadas e expressões lexicalizadas.

As institucionalizadas seriam sintática e semanticamente composicionais, mas estilisticamente idiossincráticas se comparadas a qualquer outra alternativa do mesmo conceito (café forte versus café possante).

Dentre essas EM convencionalizadas observadas com maior frequência do que qualquer outra formulação equivalente. As mais representativas são as colocações (por exemplo, bagagem emocional).

Collocations vary tremendously in the number of words involved, in the syntactic categories of the words, in the syntactic relations between the words, and in how rigidly the individual words are used together. For example, in some cases, the words of a collocation must be adjacent, as in sentences 1-5 above, while in others they can be separated by a varying number of other words.

Essa característica acarreta dificuldades para a identificação de uma EM, porque não se consegue saber, a priori, quais os limites das EM a serem extraídas automaticamente de textos. Ainda para Smadja (1993), algumas características relevantes das colocações são:

a) não composicionalidade: o seu significado é constituído pela composição dos significados de suas partes, somando-se a isto um componente semântico adicional não previsível a partir das palavras isoladas que as compõem.

b) não substituibilidade: não é possível substituir cada uma das suas componentes por palavras com o mesmo significado que estas (sal e pimenta versus sal e malagueta)

c) não modificação: existem restrições quanto às possibilidades de modificação sintática de uma colocação, as quais variam em grau de rigidez de expressão para expressão (bagagem vermelha emocional)

Conforme Ramisch e Villavicencio (2010), as EM poderiam ser classificadas de acordo com sua “decomponibilidade semântica”, pois diversas expressões demonstram ser composicionais e alguns de seus componentes apresentam significados não padrão.

Assim, seriam três os grupos de EM:

a) as não decomponíveis que apresentam uma interpretação atômica7 como em sinal verde;

b) as idiossincraticamente decomponíveis podendo ser interpretadas isoladamente como em engolir um sapo;8

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Quando não é possível definir qual das partes corresponde ao significado de autorização.

c) as decomponíveis cujas palavras que as compõem possuem significado usual como em entre quatro paredes.9

De acordo com Villavicencio et al (2010, p. 17), as expressões lexicalizadas, por outro lado, compreendem EM que possuem, pelo menos, sintaxe ou semântica parcialmente idiossincráticas, ou contêm palavras que não ocorrem isoladamente, ou seja, são expressões com certa rigidez formal.

Assim, como tipos de expressões lexicalizadas, há as expressões fixas, as semifixas e as sintaticamente flexíveis, caracterizadas a seguir:

 expressões fixas, tais como ad hoc, Porto Alegre são consideradas as mais rígidas de todas e se caracterizam por não apresentarem variações morfossintáticas e não permitirem modificações internas;  expressões semifixas permitem certo nível de variação lexical se

referindo à flexão, à forma reflexiva e à escolha de determinantes. Dentre elas, há as EIs não decomponíveis, permitindo variações apenas quanto à flexão e quanto à forma reflexiva, mas não apresentando variabilidade sintática, tais como modificações internas ou até mesmo a transformação para a voz passiva como em bater as botas que, mesmo permitindo a conjugação do verbo bater, não admite modificações feitas internamente. Outros casos são os compostos nominais que não permitem variabilidade sintática e são caracterizados por permitir flexões de número (suco de laranja, guarda-chuva) e os nomes próprios altamente idiossincráticos do ponto de vista sintático.

 as expressões sintaticamente flexíveis apresentam uma variabilidade sintática mais ampla, porque as EM desse tipo incluem construções verbo-partícula em inglês (look up), EIs decomponíveis (ser barra pesada, a barra pesou) e verbos de suporte (dar uma caminhada). Os componentes de EM desse tipo podem estar separados uns dos outros por aceitarem constituintes variáveis ou devido à variação na ordem sintática causada por

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cada um dos componentes assume um sentido não convencional na expressão: engolir = acatar; sapo = desaforo que quando estendidas podem ser interpretadas de forma composicional

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porém quando usadas em conjunto, uma camada de significado adicional é criada, no caso, de intimidade e/ou privacidade. No entanto, percebe-se que o sentido das palavras entre, quatro e paredes não é modificado pela expressão

fenômenos como passivização, topicalização, entre outros. Em alguns verbos frasais do inglês, o verbo pode estar separado da partícula por complementos de tamanhos não previsíveis (eat up the delicious and very expensive Belgian chocolate versus eat the delicious and very expensive Belgian chocolate). Riehemann (2001) aponta que este grau de flexibilidade varia de expressão para expressão e é geralmente imprevisível. Em spill the beans e kick the bucket, há duas EIs formadas por verbos transitivos e sintagmas nominais, mas apresentando comportamentos bem diversos em termos de flexibilidade, com a primeira sendo sintagmaticamente flexível e a segunda semifixa.

O desafio aqui, segundo Villavicencio et al, está em decidir os limites das EM, e se há nelas elementos variáveis, como determinantes alternativos (por exemplo, engolir [um/o] sapo). Ainda para as expressões flexíveis, haveria a dificuldade de a ordem dos seus componentes poder variar de diversas maneiras, e eles podem estar separados por um número imprevisível de palavras. Para isso, há o alinhamento.

Dessa forma, na tentativa de organizar algumas das EM encontradas em seus estudos, Ramisch e Villavicencio (2010, p. 32) apresentam uma tabela, conforme segue:

Tipo de EM Exemplo

Colocação sal e pimenta, bagagem emocional,

strong tea

Expressão idiomática cutucar a onça com vara curta, rock the boat

Nome próprio São Paulo, Estação da Sé,

Manchester United

Composto nominal Subst + de +subst: pitada de sal, carro de polícia, faca de pão, flock of geese

Subst + adj: taxas federais, momento cívico, friendly fire

Substantivo + preposição cópia de, viagem para Verbo de suporte (VS) VS com sujeito: fire burns

VS com objeto: tomar uma decisão, take a shower

VS ditransitivo: dar conselho a [SN] VS com adjetivo: ficar biruta, get

naked

Preposição de suporte em perigo, at risk

Verbo preposicionado (VP) VP intransitivo: procurar por [SN], look into [NP]

VP transitivo: confiar [SN] a [SN] Construção verbo-partícula (CVP) CVP intransitiva: sit down, shut up CVP transitiva: take [NP] out, take [NP] off

CVP com preposição put up with Verbo + subst + prep take advantage of Adjetivo + preposição similar a, fond of

Sequência lexical Eu gostaria de, I don’t know whether Expressão Fixa ad infinitum, in vitro

SP sem artigo de cama, em reunião, at school Figura 2: Tipos de EM encontradas nos estudos de Villavicencio (2010, p. 32)

Ainda segundo Villavicencio et al. (2010), para se restringir a extração de EM a um tipo particular de expressões, filtros morfossintáticos podem ser aplicados dando-se ênfase a expressões nominais, a partir de recursos tais como dicionários e glossários terminológicos.

Assim é que, como base para ajudar a determinar se uma dada sequência de palavras é realmente uma EM (por exemplo, ad hoc é uma EM porém o menino pequeno não):

a) algumas dessas propostas empregam conhecimentos linguísticos, enquanto outras empregam métodos ditos fracos ou estatísticos; b) outras ainda combinam vários tipos de informações tanto

linguísticas, como com propriedades sintáticas e semânticas; c) quanto de frequência e estatísticas, resultantes de processos como,

por exemplo, o alinhamento lexical automático em um par de línguas.

Para Ramisch e Villavicencio (2010, p. 33), a decisão sobre se uma sequência de palavras constitui uma EM ou não se torna um desafio, implicando em avaliar tanto as características de cada tipo de EM, bem como suas propriedades gerais.

Desse modo, Ramisch e Villavicencio (2010) apresentam algumas características para as EM, tais como:

a) têm significado convencionalizado;

b) são mais rígidas e menos flexíveis sintaticamente; c) envolvem figuras de linguagem;

d) descrevem informal e proverbialmente uma situação recorrente; e) expressam julgamento sobre determinado tema.

Como se verá nesta investigação das EM encontradas tanto no córpus de espanhol quanto no de português, alguns desses aspectos acima arrolados precisarão ser analisados para serem identificados quanto às EM, tais como:

a) a estrutura e o contexto onde se inserem; b) quais aspectos as restringem;

c) quais são suas coocorrências; d) a ordem dos seus componentes; e) se são mais ou menos flexíveis; f) se são decomponíveis;

g) se podem ou não ser modificadas e ou substituídas, ou ainda ter seus componentes trocados;

h) e, ainda, se são de domínio específico ou não.

2.5.3 Diferenças entre EM, termos e outros compostos da língua