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7. Os motivos de Emigração

7.2 Factores Profissionais

Neste capítulo procura-se avaliar a influência das condições de trabalho e das perspectivas de carreira para a decisão das enfermeiras portuguesas de emigrar para a Alemanha. Como já foi referido no capítulo anterior, sete das entrevistadas nunca tinham trabalhado como enfermeiras antes da emigração e cinco não estavam empregadas de acordo com as suas qualificações (Entrevistadas D,F,H,I,J) e trabalhavam ou como auxiliares de enfermagem ou noutra área. O facto de não poderem exercer a profissão para a qual estudaram, pode ser observado como um primeiro motivo profissional que favoreceu a decisão de emigração das entrevistadas D,E,F,H,I,J,L,P. As seguintes citações podem ser vistas como motivações representativas destas entrevistadas:

“A minha ideia sempre foi: Eu vou para onde for preciso para ganhar uns anos de experiência e quando a situação estiver melhor, depois logo se vê se volto ou não.” (Entrevistada L)

“Já trabalhava em Portugal, mas não como enfermeira77 mas na Zara e eu tinha estudado e não queria isso para a minha vida. Isso acontece muito em Portugal. Muitos enfermeiros não trabalham na sua área. E para mim, isso não pode ser. Estudei quatro anos e tenho de trabalhar como enfermeira.” (Entrevistada H)

As entrevistadas que não tiveram a possibilidade de pôr em prática os conhecimentos obtidos nos seus estudos, face ao desemprego ou a uma actividade fora da sua área profissional, mostraram-se frustradas e mencionam a preocupação de perder conhecimentos profissionais perante o prolongamento dessa situação como mais um factor que influenciou a sua decisão de emigrar.

77 Ela trabalhou 6 meses como auxiliar de enfermagem numa clínica privada mas como era só um trabalho part-time a recibos verdes, passou o maior tempo de emprego fora da área.

Um segundo factor profissional da tomada de decisão é a realização de determinados planos profissionais (Entrevistadas A,O,C,M). As entrevistadas C e M, que trabalhavam num lar de idosos e nos cuidados continuados, mencionam o desejo de trabalhar num hospital como um factor importante na decisão de emigrar. A entrevistada A seguiu o plano de se especializar como enfermeira pediatra nos cuidados intensivos. Em Portugal, no entanto, esta especialização apenas seria possível concretizar depois de já ter ganho alguma experiência profissional, a qual a entrevistada recém licenciada, perante as respostas negativas às candidaturas, não era capaz de obter:

“(…) para fazer especialidades eu precisava dois anos a trabalhar, o que é um bocadinho...uma pescadinha de rabo na boca porque eu não posso trabalhar, também não posso fazer uma formação e também não posso trabalhar onde eu quero. E então não posso realizar os meus planos em Portugal.” (Entrevistada A)

Também no caso da entrevistada O, foi a impossibilidade de encontrar emprego no serviço desejado, juntamente com a necessidade de ganhar experiência nas tarefas deste respectivo serviço para poder responder melhor aos requisitos do seu trabalho actual que contribuíram para a decisão de emigrar. Devido ao seu trabalho num serviço de cuidados paliativos em Portugal, viu-se confrontada com situações de emergência devido a falta de pessoal, para as quais não se sentiu preparada por falta de experiência prática na profissão. Assim o desejo de ganhar mais experiência profissional nos cuidados intensivos, também motivado pela possibilidade de consequentemente poder prestar um serviço de saúde melhor, não era possível concretizar em Portugal, o que levou à decisão de emigração:

“(…) o meu problema era que à noite só estava eu e um auxiliar. E eu saio do curso, e ler o papel é muito bonito mas quando uma situação de emergência acontece, e nós sem prática não podemos ficar a pensar `Espera quando isto acontece, o que eu faço?´ Não, temos que agir! E eu não tinha experiência nenhuma! E tinha medo, sinceramente. (…) E eu disse `É isto o meu plano de vida e então vamos procurar no estrangeiro!´ ” (Entrevistada O)

Esta citação da entrevistada O refere um terceiro factor profissional, que influenciou a decisão de emigrar: as condições de trabalho em Portugal. Enquanto as condições precárias de trabalho, os rendimentos baixos, os empregos

voluntários ou os recibos verdes, foram já mencionados no capítulo anterior, o foco dirige-se agora para a carga e horários de trabalho e para as condições de equipamento e material no posto de trabalho, os quais as entrevistadas A,B,C,D,O avaliaram ser um dos factores que as motivou para a emigração.

As entrevistadas A e D, que ainda não tinham trabalhado como enfermeiras antes da sua emigração, ficaram também assustadas com a experiência de trabalho de outros colegas no seu primeiro emprego, nomeadamente com a sobrecarga de trabalho por causa de falta de pessoal:

“também começou a assustar-me e comecei a achar que não era uma boa opção trabalhar...para a minha carreira não era bom... e para mim... trabalhar em Portugal.” (Entrevistada A)

A entrevistada D, especificando o desejo de ter melhores condições de trabalho, chega à conclusão que, face à enorme carga de trabalho e à falta genérica de material, não seria capaz de exercer a sua profissão em Portugal como gostaria e resume muitos aspectos, também mencionadas pelas suas colegas:

“(…) o hospital e os enfermeiros são constantemente sobrecarregados. E mesmo ao nível de material e tudo mais há sempre imensa escassez, precisamos pensar: `ok, eu tenho isto, o que eu posso fazer com isto para ajudar ao meu paciente em Portugal?´ E não me sentiria realizada em Portugal. As condições duma forma geral eram essas, as condições de trabalho que não podia ter e que gostaria em Portugal, também o facto de me sentir realizada profissionalmente que não me iria sentir com um ordenado baixo e não podia prestar os cuidados de saúde que sempre pensaria prestar e não podia ajudar aos outros também de uma maneira como também gostava de ser ajudada quando estivesse doente. Olhava para o panorâma de Portugal e pensava: ok, mesmo que fique a trabalhar aqui eu nunca me vou sentir bem porque não vou conseguir fazer o bem como gostaria. E essas foram as principais razões que me levaram à decisão de sair.” (Entrevistada D)

Enquanto estas duas enfermeiras decidem começar a sua carreira no estrangeiro por causa de informações de colegas sobre as suas experiências profissionais em Portugal, para as entrevistadas C, B e O a decisão de emigração decorre das próprias experiências profissionais em Portugal. Todas elas se queixam da carga de trabalho, como o resultado de uma falta genérica de pessoal, com a consequência de não terem tempo suficiente para a vida privada:

“O problema era assim, foi o que disse...sessenta horas por semana, 32 turnos por mês. Eu só o via [o namorado], porque quando ia para cama, ele já lá estava, eu chegava a dar um beijinho, a dizer: “até amanha”. No dia a seguir de manha, dizia: “Até logo, amor.” E trabalhava. Depois quinta-feira tenho folga e precisavam alguém quinta feira e fui trabalhar e entretanto já não tive folgas. Ele não me viu quase. Por um lado, vim porque quero essa carreira e por um lado porque preciso ter tempo para os meus.” (Entrevistada O)

A sobrecarga e a falta de períodos de descanso reflecte-se também em sentimentos de stress e exaustão:

“Eu cheguei em casa e chorava, não estava triste, era exaustão. Chorava simplesmente.” (Entrevistada O)

Em resumo, para além do desejo de atingir a independência financeira, a concretização de determinados planos e carreiras profissionais, a obtenção de melhores condições de trabalho e a possibilidade de ter mais tempo livre são factores condutores da emigração.