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2. Trajetórias em diálogo: contextos e sujeitos.

2.1 Universidade Estadual do Ceará – UECE.

2.1.6 Faculdade de Educação de Crateús – FAEC, Crateús/Ceará.

A FAEC foi criada em 1982, mas o início das atividades acadêmicas só teve início no ano seguinte. Até o ano de 2002, a FAEC ofertava graduação presencial apenas para o curso de Pedagogia, a partir de então, foram instalado os cursos de Licenciatura em Química e em Ciências Biológicas que compõem, até o presente momento (2013), a estrutura organizacional da faculdade.

Conforme tabelas acima, ao final do ano letivo de 2010 a FAEC contava com 26 professores efetivos, e tinha 627 alunos regularmente matriculados nos cursos de graduação presencial11. Os estudantes, além de Crateús, são oriundos de municípios circunvizinhos como Independência, Novas Russas, Tamboril, Novo Oriente, Ipaporanga, Sucesso, além de estudantes de municípios do estado do Piauí que fazem divisa com Crateús. Assim, do mesmo modo que os demais campi da UECE, Crateús e a FAEC desempenham importante papel para o desenvolvimento da região, denominada de Sertões de Crateús.

O trabalho de campo em Crateús, que dista aproximadamente 360 Km de Fortaleza, ocorreu em duas visitas: a primeira em 2011 onde entrevistamos dois professores e a segunda no início do período letivo de 2013 com mais dois docentes. As duas visitas foram necessárias já que, na primeira entrevista, uma

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70 professora se apresentou como efetiva mas, ao conferirmos com a lista nominal de todos os professores da UECE disponibilizada – posterior à viagem – pelo departamento de recursos humanos desta universidade, constatou-se que ela era professora substituta do curso de Ciências Biológicas. Assim, por considerarmos que apenas uma entrevista válida era muito pouco, decidimos realizar outra abordagem.

De forma geral, a estrutura física da FAEC em 2010 era bastante precária. A faculdade, na realidade, não possuía até então, nem mesmo um prédio próprio e funcionava junto ao Centro de Atenção Integral à Criança e ao Adolescente - CAIC12. Somente no início do período letivo 2013.1 foi inaugurada uma estrutura própria da FAEC que, na época da pesquisa, ainda se encontrava em fase de conclusão.

Desse modo, estávamos cônscios de que poderíamos ter alguma “variação” no que se refere à percepção dos professores entrevistados pós- inauguração da atual estrutura. Todavia, por se tratar de uma abordagem que visa compreender, a partir das trajetórias, as percepções e representações dos sujeitos e, não apenas a condição em que se encontrava no momento da entrevista, este fato se tonou pouco representativo. Em verdade, o único adendo feito pelos professores sobre este assunto, se relacionava às perspectivas de melhoria nas condições de ensino uma vez que,

Trabalhar em uma faculdade que não tem estrutura de faculdade, não é trabalhar em faculdade. É apenas oferecer ensino superior que, aqui, nem deveria ser chamado assim, devido à estrutura precária da UECE aqui em Crateús. Sei que os campi da UECE no interior, e até os da capital também, são precários, mas aqui a UECE se superorou. Imagina dar aula rodeada de crianças da escola, com as atividades da escola, com o ambiente da escola, com o prédio da escola... não dá! Aliás, dá. Tinha que dar. Vou te dizer que quando passei no concurso em 2002 e vim pra cá a primeira vez, tive a pior das

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Os CAIC´s são escolas de ensino fundamental criadas no decorrer da década de 1990 durante o Governo Collor e foram as primeiras escolas públicas no Brasil que passaram a adotar a denominada Pedagogia de Ate ção I teg al o de os estuda tes fi a dois tu os a es ola se do u deles o modelo regular e, o outro, em atividades diversas como artes, esportes, orientação educacional, reforço escolar, etc.

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percepções. Minha sensação era de tristeza, me perguntei: estudei tanto para parar aqui? Fui para o hotel liguei para o meu esposo e chorei a noite inteira não sabia se era de decepção, de raiva, de vontade de voltar logo no primeiro dia. Mas, enfim, fui aceitando, jamais me conformando, e hoje com a entrega desse prédio novo, pode ser que agora a gente tenha um ambiente minimamente acadêmico, porque até agora, desde quando cheguei aqui, nunca vivi verdadeiramente isso. (Sic. professora Meire, do curso de Ciências Biológicas entrevistada em 2013).

A perspectiva da “percepção” descrita pela professora Meire, foi o elemento mais comum encontrado na fala dos docentes de Crateús. Todos os nossos interlocutores se reportaram negativamente à estrutura da FAEC e, mais ainda, a forma como a faculdade e os campi do interior eram tratados pela administração superior da universidade.

Retórica, tudo retórica. Desde quando estou aqui, se fala de melhorias na nossa estrutura física e, mais do que isso, de melhorias nas condições de trabalho. Não é só sala de aula, estou falando de material de expediente. Até tirar uma Xerox aqui é complicado. Se quebra um ventilador ou outro equipamento é um “Deus nos acuda” e olha que o pessoal da direção é muito bom, muito atuante, mas nós aqui não temos força. Ter passado no concurso até que não foi difícil. Difícil mesmo é, depois de o baque inicial, conseguir encontrar motivações para desenvolver suas atividades acadêmicas dentro dessa realidade. Então, veja, eu sou Químico, com mestrado em Química, mesmo sendo e sabendo que sou professor de um curso de licenciatura, num curso de Química você precisa de alguns materiais que são básicos, nem que seja para apresentar pro seu aluno. Aí o que acontece? A faculdade não tem, quando tem não são bons, quando quebra, nunca mais teremos, aí não aguento, fui lá e comprei e trago eu mesmo o mínimo do mínimo pra o aluno daqui saber, pelo menos o que é, como é e como funciona e pra que serve um material que ele vai falar nas suas aulas da escola. Aí fica assim, a gente tem que ir levando dessa forma. É frustrante, enquanto professor universitário, passar por situações assim. Não queria admitir, mas fazemos número aqui, no sentido estatístico mesmo, tantos alunos

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matriculados, tantos professores, tantos egressos. Mas os números não dizem tudo, não dizem, por exemplo, isso que estou dizendo a você. (Sic. professor Secundo, do curso de Química entrevistado em 2011).

De forma geral, os professores que entrevistamos na FAEC, embora tendo se reportado sobre a estrutura urbana da cidade, diferente dos docentes de outros lugares, não deram muita ênfase a estas questões. A impressão é de que havia um envolvimento com as questões da faculdade e, nesse sentido, os demais problemas levantados nesta tese, pareciam ser irrelevantes para eles ou, pelo menos, não tão urgente. Outro ponto a destacar no campo das impressões, é que existia uma clara intenção de fazer com que suas vozes ecoassem, como se estivéssemos fazendo uma reportagem par algum jornal ou revista: “é assim, aqui é assim. Publique isso aí. As pessoas precisam saber como funcionam as coisas... Publique isso o quanto antes. Pode ser uma pressão para a administração superior. Se você coloca isso no jornal iria nos ajudar muito...” (sic. Idem).

Nos demais pontos relevantes a esta pesquisa, a maioria do corpo docente da FAEC também mora em Fortaleza e organiza e concentra suas atividades docentes na instituição, basicamente na mesma média dos professores das demais cidades dois ou, no máximo, três dias. Quando não exercem atividades administrativas, a ampla maioria, segundo relatos, “só dá aula mesmo, não dá pra fazer mais nada que não seja isso”. (professora Cecília do curso de pedagogia).

A professora está em Crateús desde o final da década de 1990 (não revelou o ano exato), é solteira e, segundo afirma, mora em Fortaleza e em Crateús.

Literalmente tenho duas casas. Uma aqui e outra em fortaleza. Assim não me vejo pressionada ou condicionada por ninguém a ficar aqui ou lá. Fico aqui quando tem algo pra fazer e não acho tão ruim assim não. Quando fico de “saco cheio”, vou para Fortaleza e fico lá uns

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dias. Entendo o desgaste dos professores que vão e voltam. Parecem que chegam aqui com raiva, estressados... Digo do momento da chegada. Depois não vão se acostumando e até acho que temos um excelente ambiente de trabalho. Tem uma rixa aqui outra ali, mas no geral é tudo bem. O bom daqui é que não tem essa loucura pra publicar, para produzir. Só fiz mesmo o currículo Lattes por muita insistência da direção, da universidade. Mas está lá, só pra dizer que tenho. Não gosto desse negócio de fazer pesquisa. Não entendo que seria melhor ou pior professora se tivesse produzindo demais. A questão que você tem que entender é que esse negócio não se aplica pra todo mundo, não. Na nossa realidade é perda de tempo. No meu caso, me preocupo muito mais em formar bons professores, em desenvolver atividades no CAIC, inserir nosso estudante nessa realidade do que ter que me preocupar com metodologia de pesquisa A ou B. Sinto-me realizada assim. (Sic. Idem).

É possível, a partir da fala da professora, configurar um cenário não favorável ao desenvolvimento de pesquisas científicas, até mesmo se associarmos a estrutura precária com a natureza dos cursos de Química e de Ciências Biológicas. Importante destacar que os cursos na modalidade de Licenciatura, não excluem, de modo algum, a importância da pesquisa como atividade fundamental no/ao ambiente universitário. Por ter funcionado durante vários anos no CAIC, o curso de Pedagogia é o que melhor aproveitou esse espaço, uma vez que, conforme entrevistas, a escola servia como um “verdadeiro laboratório” para o desenvolvimento e aperfeiçoamento das atividades da faculdade.

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