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2. Trajetórias em diálogo: contextos e sujeitos.

2.1 Universidade Estadual do Ceará – UECE.

2.1.1 Faculdade de Filosofia Dom Aureliano Matos – FAFIDAM, Limoeiro do Norte/Ceará.

A FAFIDAM está localizada na cidade de Limoeiro do Norte, região do baixo Jaguaribe, distante, aproximadamente, 190 km da capital Fortaleza. Criada pela Lei 8.557 de 19 de agosto de 1966 pelo Bispo da Diocese da cidade Dom Aureliano Matos. Em 1967 foi estruturada como Autarquia Estadual, portanto, dotada de autonomia financeira, pedagógica e disciplinar.

Desde sua criação até os dias atuais o objetivo principal da FAFIDAM é formar profissionais para atuarem na educação básica, ou seja, desde 1968, com a abertura dos cinco primeiros cursos – Letras, Geografia, Pedagogia, História e Matemática – a faculdade prioriza a formação de professores com cursos de licenciatura plena. Mesmo sendo uma instituição de ensino superior do estado do Ceará, somente a partir de 1981 a FAFIDAM é integrada à Universidade Estadual do Ceará – UECE, por parecer do Conselho Federal de Educação, passando a obedecer ao Regimento Interno desta Universidade7.

47 Durante as décadas de 1980 e 1990 a FAFIDAM criou novos cursos, sempre de licenciatura, e se consolidou como referência ou pólo educacional da região que possui 21 municípios cearenses. Assim como outros municípios que possuem faculdades, Limoeiro do Norte, através da FAFIDAM, acaba por atrair diariamente durante o período letivo, desde as décadas passadas até o tempo presente, centenas de estudantes de outras cidades, inclusive do estado do Rio Grande do Norte e, especialmente, de cidades circunvizinhas que compõem as microrregiões do médio e baixo Jaguaribe.

Boa parte dos nossos alunos, que é uma característica nossa, aqui da FAFIDAM, desde a sua fundação, são de fora de Limoeiro, ou seja, algo em torno de 70% dos nossos alunos não são limoeirenses, eles moram em outras cidades... (Professor Hildebrando, diretor da FAFIDAM no período da entrevista).

Como é possível observar na tabela 03 logo acima, no final do período letivo 2010.2 a FAFIDAM tinha 1468 alunos matriculados nos cursos de graduação – Ciências (atualmente extinto), Geografia, História, Física, Química, Biologia, Pedagogia, Matemática, Letras Inglês e Letras Português – e formou 140 novos professores, sendo, portanto, devido à quantidade de cursos, de alunos matriculados e graduados e pelo efetivo docente, a maior unidade da UECE instalada no interior do estado do Ceará.

O trabalho de campo (visita ao campus, entrevista com o diretor da faculdade e demais professores) nesta unidade foi realizado no início do período letivo 2011.1. Foram realizadas além do professor Hildebrando (Diretor da unidade e professor do curso de Geografia) outras seis entrevistas sendo, 3 professores e 3 professoras que, quando oportuno, designaremos nomes fictícios, sendo esta, inclusive, uma solicitação da ampla maioria de todos os professores envolvidos neste trabalho. Todos os entrevistados em Limoeiro do Norte trabalham na FAFIDAM há pelo menos seis anos e, destas sete entrevistas, apenas o professor Hildebrando e o professor João residem na

48 cidade. Sobre este propósito, o professor Hildebrando que é natural da cidade de Canindé, interior do Estado do Ceará, mas que morava em Fortaleza antes de se mudar para Limoeiro do Norte, afirma que é muito difícil o professor morar e se adaptar à cidade, principalmente no início, uma vez que, basicamente, o único vínculo que este docente mantém com a cidade é através da faculdade e o professor que já possui certa estrutura em outra cidade – quase sempre Fortaleza – não encontra em Limoeiro a mesma estrutura seja ela urbana ou mesmo social, familiar, designando um desejo recorrente de retorno ou mudança para outra cidade.

A decisão de morar aqui foi – e acredito que ainda seja – muito difícil, porque o único vínculo que a maioria de nós, professores que viemos de outras cidades temos com a cidade de Limoeiro é com a faculdade. Então, no início a minha vida era dar aula e frequentar as reuniões da faculdade. No momento em que eu não tinha mais isso, eu também não tinha mais um ciclo de amizades na cidade para poder me sociabilizar. A adaptação é muito complicada porque além da maioria dos nossos estudantes serem de outras cidades, os colegas – professores – do mesmo jeito, ou seja, aproximadamente 80% dos professores também não moram em Limoeiro do Norte, aliás, na região. Em Limoeiro do Norte mesmo, talvez esse número não chegue a 20%. Então você também não tem uma rede com os professores que residem aqui, porque “a turma se manda” no final de semana. Então você se sente muito isolado. Eu passei aqui um tempo razoável muito isolado. Agora, quando você começa a estabelecer amizade, começa a estabelecer uma rotina fora do trabalho, que também lhe integra ao ambiente, as coisas vão facilitando. Mas isso demorou um pouco, viu? Realmente tinha dias na semana, no final de semana, que a vontade era “me mandar” pra minha casa, pra Canindé, porque meus pais estão em Canindé ainda... Porque ficava difícil ficar aqui sozinho...

A decisão de ficar: uma opção conflituosa

Assim como o professor Hildebrando, o professor João, também decidiu permanecer na cidade, mas ao contrário do primeiro que passou os seis primeiros meses fazendo o percurso Fortaleza/Limoeiro do Norte/ Fortaleza, João, desde que se tornou professor efetivo da UECE em 2003,

49 decidiu por se transferir de vez para Limoeiro pois, para ele, apesar de alguns transtornos de adaptação e serviços básicos, a ideia era trabalhar com aquilo que era menos desgastante na perspectiva pessoal e profissional.

João é natural da cidade de São José da Lagoa Tapada, interior do estado da Paraíba, mas residia em João Pessoa desde o início da década de 1980 onde concluiu a educação básica. Graduou-se em Ciências Biológicas em 1984, foi professor de ensino fundamental e médio até o início dos anos 2000, onde neste mesmo período, concluiu o mestrado e passou a prestar concursos para ingressar no ensino superior, fato que veio a ocorrer em 2002 com a aprovação no concurso da UECE. Para João, a decisão de mudar para uma cidade que não se conhece é uma decisão ao mesmo tempo corajosa e conflituosa. Corajosa porque exige adaptações não só profissionais como familiares, e conflituosa porque sempre envolve outras pessoas como esposa, filhos, amigos, “a decisão nunca é só sua, mas é principalmente sua... as consequências nunca recaem só sobre você e, por isso, as cobranças sempre são maiores”, afirma. Na sua visão nunca se pode generalizar tais decisões, pois as percepções e implicações não são as mesmas para todos, “depois de um tempo percebi que minha decisão tinha sido correta, ou, pelo menos, eu e minha esposa nos sentimos satisfeitos em ter ficado aqui, avaliamos que os transtornos são menores, mas essa é uma percepção nossa, claro, referente a nós, há percepções bem diferentes dessa porque são pessoas com dinâmicas de vida e necessidades diferentes da nossa”, enfatiza.

A minha decisão de vir para cá foi devido ter percebido a possibilidade de atuar no ensino superior que sempre foi meu objetivo, pela estabilidade e pela carência de professores da minha área naquela época. Nunca tinha vindo aqui, não sabia como era essa cidade, nem o que iríamos encontrar, o que queria mesmo era passar num concurso para professor do ensino superior. Neste período fiz concurso na Paraíba, no Rio Grande do Norte e aqui no Ceará. Queria estabilidade e fazer carreira na educação superior. Como dos concursos que fiz, passei aqui, vim pra cá. Sabia que a adaptação não seria fácil, mas nunca imaginei que no começo fosse tão difícil. Decidi vir de vez porque minha família é pequena (eu

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minha esposa e minha filha que na época tinha apenas dois anos). Eu tinha a possibilidade de morar em Fortaleza e fazer esse percurso, inclusive quando eu assumi, inúmeros colegas daqui me falavam para ficar em Fortaleza, mas como minha família era pequena, eu resolvi desde o início vir morar aqui e me fixar no interior já que eu não tinha coisas para resolver em Fortaleza, também não tinha família nem amigos por lá. No início foi um pouco complicado por parte da minha esposa, por a gente viver lá em João Pessoa, muito próximo de familiares e tudo, mas já a partir do segundo ano a gente já estava inteiramente adaptado aqui em Limoeiro. As principais dificuldades sempre foram quanto a oferta de serviços, a saúde por exemplo é muito complicada aqui, qualquer coisa que aconteça “mais assim” a gente tem que se deslocar para Fortaleza, e a outra grande dificuldade é a parte de lazer, onde não tinha e ainda não tem muitas opções para se divertir como ir ao cinema, ao shopping, boas opções culturais, essas coisas... As estratégias que utilizamos até hoje é que viajamos duas vezes por ano para João Pessoa ou para o Rio Grande do Norte onde temos familiares e acesso a estes e outros tipos de lazer. Então o que pesamos foi o seguinte: é muito melhor eu me deslocar com minha família quando for preciso ou quando quisermos passear, irmos uma vez ou outra para Fortaleza nos finais de semana, mas podermos programar quando podemos e queremos ir, do que ter que me deslocar obrigatoriamente toda semana, ficar parte desta semana distante da família... acreditamos que esse processo, da obrigatoriedade de viajar, seja mais desgastante e complicado. (sic).

Os relatos acima nos conduzem a considerarmos, ao longo de todo o trabalho, que as experiências são comuns, coletivas, se reproduzem sistematicamente nos sujeitos envolvidos nesta pesquisa e na ampla maioria daqueles que vivenciam realidades semelhantes. Para estes, as percepções são particularizadas, como se não fosse possível sua reprodução ou mesmo histórias e representações comuns. A ênfase dada por João, de que suas decisões e experiências pessoal e familiar, são particularizadas e, conforme seu julgamento, terem sido acertadas, não podem servir de modelo para os demais colegas, uma vez que estes possuem vivências distintas, ilustra bem o sentido de percepção que permeiam suas falas, suas práticas e reflexões.

51 Todavia, veremos no decorrer que não encontramos disposições únicas. As trajetórias dos professores que permanecem nas cidades onde trabalham ou que vivenciam a mobilidade socioespacial diária ou semanal, em um dado momento – ou em diversos momentos – se entrecruzam e produzem hábitos, práticas e percepções que se equivalem e se aproximam muito mais do que se distanciam.

2.1.2 Faculdade de Educação, Ciências e Letras do Sertão Central

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