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Em 20 de maio de 1941 era fundada a Sociedade Campineira de Educação e Instrução, tendo à frente o bispo diocesano D. Francisco de Campos Barreto. A finalidade desta era ser o elo de ligação entre a diocese de Campinas e seus estabelecimentos de educação, além de cuidar da administração dessas unidades educacionais.

Com a eleição e posse da diretoria da Sociedade Campineira de Educação e Instrução, e posteriormente com o registro de seus estatutos, foi feito o contrato de locação do prédio conhecido como “Barão de Itapura”, localizado à Rua Marechal Deodoro, nº 1.099, com a finalidade de ali se abrigar a Faculdade de Filosofia. Este prédio, no coração da cidade, vai, nos anos vindouros, ser palco de importantes acontecimentos históricos ligados a esta instituição.

Em meados do mês de julho daquele ano foi nomeado pela sociedade o diretor da Faculdade de Filosofia, o cônego Dr. Emílio José Salim, que, em 8 de agosto, pleiteia junto ao Ministério da Educação autorização para organizar e fazer funcionar na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Campinas, oito cursos: Filosofia; Ciências Políticas e Sociais; Geografia e História; Pedagogia; Letras Clássicas; Letras Neolatinas; Letras Anglo-germânicas e Matemática.

No dia 30 de setembro, o Conselho Nacional de Educação aprova, por unanimidade, o Parecer nº 194, favorável à autorização de funcionamento dos cursos da Faculdade de Filosofia, seguido pelo decreto presidencial de nº 8.232, datado de 18 de novembro de 1941, concedendo a autorização.

Importante lembrar que no dia 22 de agosto, em meio aos processos e trâmites legais para o funcionamento da Faculdade de Filosofia, faleceu o Bispo D. Francisco de Campos Barreto. Isso porém não esmoreceu os trabalhos dos responsáveis pela legalização do processo em curso. Como já afirmamos anteriormente, o sonho da constituição de Universidades Católicas estava no horizonte da cúpula dirigente da Igreja Católica do Brasil, por isso o diretor da Faculdade de Filosofia não encontrou entraves para conseguir audiência junto ao núncio apostólico D. Bento Aloisio Masela e também para ser recebido pelo Cardeal Leme, tendo este último oferecido proteção aos trabalhos que se desenrolavam.

No dia 15 de março de 1942, no início do ano letivo, ministrou a aula inaugural dos cursos da Faculdade de Filosofia, no Teatro Municipal de Campinas, o Dr. Alceu Amoroso Lima, um dos intelectuais mais respeitados do Brasil à época e “braço direito” do Cardeal Leme na empreitada de se fundar uma Universidade Católica no Brasil. Aqui é importante ressaltar que Amoroso Lima era a figura de proa do Centro D. Vital – criado em 1922 por Jackson de Figueiredo, leigo e fiel colaborador de D. Leme. O centro D. Vital pretendia formar uma intelligentsia católica (cf. DELLA CAVA, 1975, p. 12) – e esteve durante toda a década de 30 e início da de 40 ligado à direita Católica. Depois, influenciado pelos pensamentos de Jacques Maritain e Emmanuel Mounier, vai ser um dos expoentes leigos da reforma progressista da Igreja, calcada sobretudo na Doutrina Social da Igreja (cf. MAINWARING, 1989, p. 46).

A aula magna de Alceu Amoroso Lima foi precedida pelo discurso do diretor da Faculdade de Filosofia, o cônego Dr. Emílio José Salim, que já apontava qual o verdadeiro intuito daquela empreitada:

Uma Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras em Campinas – e porque não desvendá-lo inteiro o ideal soberbo: uma Universidade em Campinas – eis senhores o sonho que embalou

Igreja e do Brasil: D. Francisco de Campo Barreto (ANUÁRIO, 1942, p. 28-9).

O sonho da Igreja em Campinas coincidia com os anseios do Cardeal Leme em sua cruzada de recatolicização do Brasil a partir de suas elites. As faculdades católicas, e sobretudo as Universidades Católicas, seriam o caminho natural dos oriundos dos colégios católicos para a formação dos quadros dirigentes do país.

No “Regimento Interno da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Campinas” (Cap. II, Art. 4), observa-se, entre outras coisas, que a mesma Faculdade era constituída de quatro secções fundamentais: a de Filosofia, a de Ciências, a de Letras e a de Pedagogia. Em parágrafo único do mesmo artigo afirma-se que haverá uma secção especial de Didática.

Alguns desses cursos ordinários, como eram denominados, compreendiam subdivisões internas. No artigo 8 do mesmo capítulo II, lemos:

A secção de Ciências compreenderá seis cursos ordinários: a) curso de Matemática;

b) curso de Física; c) curso de Química; d) curso de História Natural; e) curso de Geografia e História;

f) curso de Ciências Sociais. (ANUÁRIO – 1942, p. 50)

Isso, porém, não significou que todos esses cursos estivessem em pleno funcionamento. No parágrafo único do mesmo artigo observa-se: “A princípio, na secção de Ciências, só serão abertos os cursos de Matemática, de Geografia, História e de Ciências Sociais”.

A secção de Letras, por sua vez, compreendia os cursos de Letras Clássicas, de Letras Neolatinas e Anglo-germânicas (cf. art. 9º). Quanto às secções de Filosofia, Pedagogia e Didática, constituíram-se em cursos ordinários de mesmo nome das secções.

Todos os cursos – com exceção do de Didática, que durava apenas um ano, mas exigia dos candidatos à matricula apresentação do diploma de bacharel em quaisquer dos outros cursos – tinham uma grade curricular seriada em 3 anos (cf. ANUÁRIO – 1942, p. 51-6).

O caráter confessional da Instituição era assegurado pelo conteúdo do artigo 26 (ANUÁRIO, 1942, p. 56): “É obrigatório, para qualquer aluno, a inscrição no curso superior de Cultura Religiosa, que constará das seguintes disciplinas: Dogma, Moral, História da Igreja, Apologética e Pedagogia Catequética”. As disciplinas eram alocadas ao longo do curso e teriam uma carga horária semanal máxima de duas aulas.

No Capítulo XIII, que trata da Vida Social da Faculdade, afirma-se que serão adotados meios para a integração entre professores, alunos e ex-alunos, formando um “espírito universitário". Mas em nossa opinião o que sobressai neste capítulo é o conteúdo do artigo 102:

Os professores constituirão a Associação dos professores, que elaborará seus estatutos, aprovados depois pela Sociedade, tendo em vista as seguintes finalidades: a) efetuar reuniões e discussões e o estudo de assuntos de caráter científico sob forma de comunicação e leitura de comunicados ou resumos de revistas técnicas e de cultura; b) promover reuniões de caráter social; c) instituir e efetivar medidas de previdência e beneficência e promover a defesa dos interesses gerais da classe (ANUÁRIO, 1942, p. 70, grifo nosso).

No parágrafo seguinte garante-se o mesmo direito de associação aos alunos. Aliás, não se tratava de um direito, mas de um imperativo da Instituição, pois essa Associação Acadêmica agregaria alunos e ex-alunos e seria o órgão legítimo de representação do corpo discente da Faculdade (cf. ANUÁRIO, 1942, p. 70).

Em relação à associação dos estudantes, seus estatutos teriam que ser aprovados pela Sociedade Campineira de Educação e Instrução e pelo Conselho Técnico- Administrativo (CTA) da Faculdade, restando uma ambigüidade em relação à associação dos professores pois, como está expresso no documento acima, “seus estatutos, aprovados depois pela Sociedade”, não trazem especificado se a Sociedade em questão era a Sociedade dos professores ou a Sociedade Campineira de Educação e Instrução.

O que se supõe é que, sob a ditadura do Estado Novo, muito dificilmente Instituições representativas de interesses de categorias de trabalhadores conseguiriam uma grande autonomia. Os sindicatos ficaram sob tutela do Estado, manietados pelo Ministério

ditatorial de 1937 que limitava ainda mais o poder de organização dos trabalhadores e da sociedade civil como um todo. Outra coisa importante também, como apontamos em outro estudo, é que

[...] mesmo sob a ditadura, as relações entre Estado e a Igreja (Getúlio e D. Leme) foram de muita proximidade, visto que havia um sentimento de satisfação quase que generalizado no interior da Igreja com alguns princípios católicos que continuavam expressos na Constituição ditatorial de 1937 (TANGERINO, 1997, p. 77).

De qualquer forma, ficariam garantidos aos professores o direito de associação e a luta pelos seus direitos, princípios assegurados pela Doutrina Social da Igreja desde o final do século XIX, com a publicação, em 1891, da Rerum Novarum, do papa Leão XIII. Talvez, exatamente por isso, é que esse “direito”, esse “dever”, estivesse expresso no Regimento da Faculdade.

Com relação aos aspectos administrativos, afirma-se no artigo 107 que o diretor da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Campinas, será nomeado pela Sociedade Campineira de Educação e Instrução para um período de 3 anos (cf. ANUÁRIO, 1942, p. 71).

Consideramos importante ainda, em relação a este regimento, chamar a atenção para o capítulo XX, que trata “Das rendas e Patrimônios”. No artigo 154 afirma-se "que as rendas da Faculdade seriam provenientes, entre outros, das rendas da Entidade mantenedora, das taxas escolares e das subvenções dos poderes da República".

Como bem sabemos a Constituição Republicana de 1891 impedia que recursos públicos subvencionassem as Escolas Católicas, dado o caráter laico da República. Porém, a Constituição de 1934 restituiu à Igreja os privilégios que havia perdido1.

No artigo 56, o último do capítulo XX, se afirma: “mantida pela Diocese de Campinas, a Faculdade e quanto lhe pertencer se considera figurando no acervo patrimonial da mesma Diocese” (cf. ANUÁRIO, 1942, p. 81). Então, mesmo pleiteando

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A Liga Eleitoral Católica, criada em 1932 por D. Leme, foi a responsável por orientar o voto dos católicos nas eleições de 1933, ajudando a eleger a maioria dos candidatos que apoiou para a Assembléia Constituinte. “A Constituição de 1934 incorporou as principais exigências da LEC, incluindo o apoio financeiro do Estado à Igreja” (MAINWARING, 1989, p. 48).

subvenções do Governo Federal para manutenção da Faculdade, explicita-se que tudo o quanto pertencer à mesma fará parte do patrimônio da diocese, da Igreja.

A ligação entre Igreja e Estado se faz sentir também no interior da Faculdade quando se lê na Crônica da Faculdade de Filosofia, referente ao ano de 1942, que no dia 31 de agosto “a Faculdade comparece à missa de Ação de Graças mandada celebrar pelo restabelecimento do presidente Vargas” (cf. ANUÁRIO, 1942, p. 10).

Está certo que eram outros tempos, o desejo de unidade entre Igreja e Estado, explícito por parte da primeira, talvez explique o por que dessa atitude e sobretudo o fato de registrar isso como uma ação da Faculdade. Outra explicação possível é que se estava em plena 2ª Guerra Mundial e, inclusive, no dia 21 de agosto professores e alunos participaram do protesto pelo torpedeamento de navios brasileiros, o que pode ter provocado um certo “espírito nacionalista”, o desejo de unidade em torno dos símbolos da pátria.

Depois da fundação da Universidade Católica de São Paulo, em 1946, as Faculdades Campineiras, aqui consideradas a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras e a Faculdade de Ciências Econômicas, se tornaram unidades agregadas da primeira, condição em que permaneceram até 1955, com a Fundação da Universidade de Campinas (cf. CASALI, 1995, p. 157).

As Faculdades Campineiras eram compostas por Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, criada em 27 de junho de 1941, cujos cursos foram reconhecidos pelos Decretos nº 15.523, de 16 de maio de 1944 e nº 21.941, de 10 de outubro de 1946; Faculdade de Ciências Econômicas, criada em 18 de dezembro de 1941 e reconhecida em 22 de agosto de 1946, pelo Decreto nº 9.632; Faculdade de Odontologia, criada em 22 de agosto de 1949 e reconhecida em 26 de novembro de 1952, pelo Decreto-Lei nº 31.844; Faculdade de Direito, criada em 16 de abril de 1951 e autorizada a funcionar pelo Decreto- Lei nº 30.282, de 18 de dezembro de 1951; Conservatório de Canto Orfeônico, criado em março de 1947 e reconhecido pelo Decreto-Lei nº 28.168, de junho de 1950; Escola de Biblioteconomia, criada em 15 de março de 1945 e equiparada à Escola de Biblioteconomia da Escola de Sociologia e Política de São Paulo; Curso de Formação de Professores de Economia Doméstica e Trabalhos Manuais, reconhecida em 22 de junho de

nº 6.841, de 04 de dezembro de 1934; Curso de Orientador Educacional, reconhecido e fiscalizado pela Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, pela Portaria nº 34, de 13 de outubro de 1947 (cf. REVISTA DAS FACULDADES CAMPINEIRAS, n. 2, 1954, contracapa).