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A família é um dos principais grupos de referência no consumo, pois influencia sobremaneira, desde o nascimento, os processos de observação, seleção e consumo efetivo dos indivíduos. Grande parte dos fatores motivacionais, culturais, socioeconômicos e de personalidade é influenciada por esta primeira instituição de contato do indivíduo (SILVA, 2006; SOLOMON, 2008).

O conceito de família não é único e foi sofrendo modificações com o tempo. Para Blackwell, Miniard e Engel (2009, p. 377), a família é “um grupo de duas ou mais pessoas ligadas pelo mesmo tipo de sangue, pelo casamento ou pela adoção, que vivem juntas”. Analogamente, conforme Solomon (2008, p. 440), o U.S. Census Bureau (um importante instituto de pesquisas do governo norte-americano) considera uma

household (ou unidade doméstica) como “qualquer residência ocupada que (...) contém

pelo menos duas pessoas aparentadas por laços sanguíneos ou pelo casamento”.

Nos dias atuais, vários arranjos familiares, de acordo com diversos conceitos, são amplamente encontrados na sociedade, oriundos dos eventos familiares que tornam dinâmico o movimento de formação, expansão e contração das famílias ao longo de seu ciclo de vida, como o casamento, o nascimento dos filhos, o lançamento dos filhos, o divórcio, o recasamento e a viuvez, entre outros.

Nos dizeres de Carter e McGoldrick (2005), as famílias contemporâneas consistem em famílias nucleares tradicionais ou muitos outros tipos de unidades domésticas familiares imediatas com ou sem filhos: pais divorciados sozinhos, pais solteiros sozinhos, famílias recasadas, parceiros solteiros, parceiros homossexuais, adultos sozinhos ou viúvas ou viúvos cujos outros membros familiares podem morar em outras casas, entre outros tipos, sendo que muitas destas famílias vivem em mais de uma casa. As famílias oriundas do divórcio e do recasamento e as famílias cujos membros não se casaram ou se divorciaram podem ter crianças e/ou ex-cônjuges que os visitam periodicamente. Se os pais viverem separadamente, as autoras consideram as crianças como emocionalmente membros de ambas as casas, indiferentemente dos arranjos de custódia legal, o que pode ser denominado de família binuclear. As autoras ainda afirmam que “o divórcio reestrutura, mas não termina com a família” (CARTER e McGOLDRICK, 2005, p. 10).

Existem alguns tipos de famílias que vale a pena serem conceituados: (1) a

compõe de mãe, pai, criança(s) e, mais recentemente, já há a inclusão de um cão1; (2) fazem parte da família estendida ou ampliada o núcleo familiar e demais parentes que vivem agregados ao núcleo central, como avós, tios, primos, netos, cunhados e sogros, entre outros; (3) famílias não tradicionais: as que não seguem a estrutura tradicional (nuclear ou estendida), como casais homossexuais, famílias monoparentais e famílias oriundas do divórcio, além das sociedades tribais com características bastante distintas (BLACKWELL et al., 2009). Além destas, ainda pode-se considerar o arranjo unipessoal (apenas uma pessoa no domicílio) e a divisão da família nuclear entre simples (casal) e composta (casal e filhos).

Conforme a Síntese dos Indicadores Sociais do IBGE (2008c), a família brasileira distribuiu-se recentemente conforme os seguintes arranjos: família nuclear composta (“casal com filhos”), 48,9%; família monoparental (“pessoa de referência

sem cônjuge e com filhos”), 19,7%; família nuclear simples (“casal sem filhos”), 16%;

unipessoal, 11,1%; família unipessoal estendida (“pessoa de referência sem cônjuge,

sem filhos e [com] outros parentes [ou] agregados”), 4,3% (Figura 3).

Como detentoras de renda das unidades domésticas, as famílias destinam recursos para o consumo conforme os seus desejos e as suas necessidades, muitas vezes decididas de acordo com as classes de renda a que pertencem. Segundo o IBGE (1997), famílias de diferentes classes gastam diferentes percentuais de recursos em despesas de consumo familiar, como demonstrado no Anexo C. De acordo com esses dados, há uma tendência de maior gasto percentual, conforme aumenta a renda, em transporte, educação, cultura, veículos (aquisição), imóveis (reforma), pagamento de empréstimos, carnês e outras despesas, em virtude de uma maior elasticidade-renda do consumo. Por outro lado, com o aumento da renda, diminuem os gastos percentuais com alimentação, habitação, higiene, saúde e fumo, por serem bens e serviços cujas demandas são menos elásticas que de outros grupos. Existem ainda os gastos com vestuário e despesas pessoais, cujo consumo percentual se eleva até certo estrato de renda, decrescendo depois.

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Família unipessoal estendida; 4,3% Família unipessoal; 11,1% Família nuclear composta; 48,9% Família monoparental; 19,7% Família nuclear simples; 16,0%

Figura 3 – Distribuição percentual dos arranjos familiares dos domicílios brasileiros em 2007 Fonte: Adaptado de IBGE (2008).

Comparando os dados da POF de 1995/96 e 2002/03 (Apêndice A), percebe-se um aumento percentual nas despesas com alimentação, higiene e cuidados pessoais. O aumento com habitação e transporte, em 2002/03, deve-se à incorporação, conforme mudança de classificação, das despesas de aquisição de imóveis e veículos, antes compondo o item de investimento. Por outro lado, foi constatada uma redução percentual nas despesas com vestuário, saúde, educação, recreação e cultura, fumo e despesas pessoais, o que denota que a família está gastando mais com itens que dizem respeito às necessidades primárias(alimentação e higiene) e menos com outros tipos de necessidades.

Quando se relaciona o consumo com as classes de renda de segmentos específicos do ciclo de vida familiar, os resultados tendem a ser diferentes daqueles que abrangem toda a população. No Anexo D, organizado por ALMEIDA (2002), as famílias onde há idosos utilizam, por exemplo, mais produtos farmacêuticos, serviços de saúde e viagens que as famílias que não possuem idosos, que, por sua vez, utilizam mais bens pessoais e roupas que as primeiras.

Um dos fatores importantes ligados à família que definem o comportamento do consumidor, portanto, é o ciclo de vida familiar (CVF), ou family life cycle (FLC), cujos estágios diferentes levam a consumos diferenciados. Segundo pesquisa do Instituto Nacional de Estatísticas e Estudos Econômicos francês (Insee), citada por Karsaklian (2009), o consumo altera significativamente quando a estrutura da família se modifica (Anexo E).

Entretanto, para que se possa estabelecer melhores relações conceituais entre o consumo e o ciclo de vida das famílias, é preciso conhecer o que se entende por ciclo de vida na literatura e os estágios a ele vinculados, o que será apresentado nos itens seguintes.