• Nenhum resultado encontrado

A família do pastor presbiteriano no Brasil nos séculos XIX e XX

2. O PASTOR PRESBITERIANO E A SUA FAMÍLIA

2.1. A família do pastor presbiteriano no Brasil nos séculos XIX e XX

Aceitamos com naturalidade a ideia de que o presbiterianismo começou no Brasil com a ajuda do pastor missionário norte-americano Ashbel Green Simon- ton. Seu desembarque foi mencionado numa matéria publicada pelo Jornal do Co-

mércio, do Rio de Janeiro, no dia 13/08/1859. Nilson Oliveira (2012, p. 27) trans-

creve literalmente o trecho do registro do jornal assim: “BALTIMORE 47d., Galera norte-americana Banshee, 408 tons. M. I. Kean, equip. 14; carga farinha e gêneros, a Pippa Irmão e C. \ passags. os Norte-Americanos S. (ilegível) e A. G. Simonton”. Esse registro, ainda que codificado, de alguma forma, é um marco histórico do re- gistro da chegada do missionário americano em nossa pátria.

Émile G. Léonard (2002, p. 61) registra esse início missionário no Brasil com as seguintes palavras: “enviado ao Brasil pela grande Igreja Presbiteriana dos Estados Unidos, a 12 de agosto de 1859, desembarcou no Rio o primeiro desses missionários, o Rev. Ashbel Green Simonton, de Dauphin (Pen)”. O autor aponta ainda que a chegada desse jovem missionário, de apenas 26 anos de idade, cheio de

entusiasmo, deixou inquieto o Dr. Kalley, o qual nesta época estava ameaçado de ex- pulsão. Ele sublinha ainda que essa situação o motivou a recomendar ao missionário Simonton que exercesse um tipo de trabalho em secreto. Proposta essa totalmente rejeitada pelo recém-chegado pastor.

Simonton chegou solteiro. Em 1862, passou um período de férias nos EUA quando se casou com Helen Murdoch. O casal, após um ano e três meses de vida conjugal, teve uma filha. Porém a sua vida familiar tem origem americana. Júlio Andrade Ferreira (1992, p. 19), registra que “Ashbel Green Simonton nascera em West Hanover, município de Dauphin, Pensylvania, em 1833. Seu pai, o Dr. Wil- liam, bom médico e político influente, morrera quando Simonton contava apenas treze anos”.

O missionário Simonton, após casado, na primeira viagem que fez aos EUA, voltou com a sua esposa para o Brasil. Oliveira (2012, p. 39) relata o casa- mento de Simonton e Helen, destacando que o casal embarcou no dia 23 de maio de 1863 do porto de Baltimore rumo ao Brasil. Chegaram ao destino 55 dias após.

O missionário norte americano chega ao Brasil e poucos anos depois se casa formando a sua família. No ano seguinte ao seu casamento, Simonton (2002, p. 164) relata em seu diário a alegria do nascimento da filha, registrando que, no dia 19 de junho de 1864, nasceu a sua primeira filha. Mas, de forma muito surpre- endente, nove dias após, a sua esposa veio a falecer. Diante da morte de sua esposa, Simonton, sem família novamente, no dia 21 de novembro de 1864 segue para São Paulo e deixa a sua filha sob os cuidados do casal Blackford: Alexander, seu cu- nhado e Lille, sua irmã.

O reforço para o trabalho missionário presbiteriano no Brasil se dá no ano seguinte à sua chegada em terras brasileiras. Isto se deu com a chegada de seu cu- nhado e sua irmã, que se juntaram a ele nesta labuta. Assim, Oliveira (2012, p. 30), relata:

O Rev. Alexander Latimer Blackford e a sua esposa Sra. Eliza- beth S. Blackford embarcaram no navio Monticello que zarpou do porto de Baltimore, no dia 25 de abril de 1860. Eles estiveram

em grande perigo no temporal que os obrigou à uma escala em Bar- bados, para reabastecimento e contratação de novos marinheiros. (...) Aportaram no Rio de Janeiro em 24 de julho de 1860.

Alderi Souza de Matos (2009, p.17) também registra a ajuda que o pastor Simonton teve com a chegada de outros missionários, além de Blackford. Ele aponta que o trabalho do pioneiro presbiteriano no “Brasil estendeu-se por poucos anos, nos quais, além da Igreja do Rio de Janeiro, ele criou um jornal (Imprensa

Evangélica), um pequeno seminário e o primeiro concílio da nova denominação, o

presbitério do Rio de Janeiro, organizado em 1865”. Matos escreve ainda que “em 1860 e 1861 havia chegado para ajudá-lo dois colegas – Alexander Latimer Black- ford e Francis Joseph Christopher Schneider. Outros mais vieram nos anos seguin- tes, como George Whitehill Chamberlain e Robert Lenington”.

Como fruto do trabalho árduo dos primeiros missionários protestantes no Brasil, o protestantismo prosseguia tomando a sua forma e ganhando força cada vez mais. Léonard (2002, p. 140) mostra que “nós veremos que o protestantismo brasi- leiro, em seu todo, felizmente não correu o risco daquela limitação, e as persegui- ções que sofreu serviram-lhe mais de elementos catalisadores e de apelo à disciplina e à união interior”.

Um dos momentos que marcara a história da Igreja Presbiteriana, logo nos seus primórdios, foi o caso do primeiro brasileiro a ser ordenado pastor. O ex-padre José Manoel da Conceição recebeu a ordenação no dia 17 de dezembro de 1865, num dia de muitas alegrias e entusiasmos, observa Matos (2009, p.17).

A vida e as circunstâncias que envolviam o primeiro brasileiro ordenado pastor protestante foram muito curiosas e diferentes do padrão familiar posterior. Conceição continuou celibatário e passou a ser chamado de “padre protestante”. Léonard (2002, p. 63) menciona que “nascido em São Paulo, em 1822, José Manoel da Costa Santos, que tomou o nome de José Manoel da Conceição, tornou-se padre em 1845, após brilhantes estudos realizados em Sorocaba, onde seu tio-avô era cura, e no seminário diocesano”. O autor menciona ainda que a boa relação que este padre teve com os protestantes, desde Sorocaba, onde havia alguns deles, e o gosto pela leitura

da Bíblia, o inspirou ou o incentivou a torná-lo “padre protestante” e ainda mais, criou-se um conflito com as autoridades diocesanas.

Léonard (2002, p. 64) observa ainda que o bispo católico mantinha José Manoel da Conceição nas suas funções de “vigário encomendado” e, por isso, ele “foi enviado durante quinze anos a uma dezena de paróquias: Limeira, Piracicaba, Monte-Mor, Taubaté, Ubatuba, Santa Bárbara e, finalmente, Brotas, para onde foi transferido em 1860”. É interessante que essa trajetória traçado pelas autoridades diocesanas, para proteger os fiéis da sua diocese de possível influência indesejável do padre “perigoso” para a religião católica, mal podiam esperar os bispos que, de alguma forma eles estavam “sem que o percebessem”, traçando o itinerário da Re- forma na sua diocese”. O autor destaca ainda que Conceição lutou para tentar uma reforma na igreja por meio da pregação da Palavra de Deus, mas isso não lhe trouxe resultado, a princípio. No entanto, foi só em Brotas que ele teve mais sossego. Quando as noivas o procuravam para se confessar antes de seu casamento, Concei- ção respondia: “Eu e você precisamos nos confessar a Deus e não aos homens”.

É importante frisar que na segunda metade do século XIX a realidade so- cial brasileira era bastante singular. A educação era muito precária e a quantidade de analfabetos era enorme. Mas não apenas este aspecto voltado para a educação deve ser sublinhado. Nelson de Paulo Pereira (2012, p.109) ressalta que o Império brasileiro era grande, as estradas de ferro começavam a se projetar e estavam dando seus primeiros passos. As regiões, em sua maioria, eram agrícolas e pastoris e a mão de obra utilizada era a escrava.

O início do presbiterianismo está, portanto, inserido dentro desse contexto e enfrenta um problema importante para resolver: como evangelizar a população de maioria analfabeta através da leitura da Bíblia? E foi pensando neste desafio que o Rev. Chamberlain se dispôs a atender essa demanda. Nessa abordagem, Pereira (2012, p. 109), discorre: “o Rev. G. W. Chamberlain e sua esposa Mary, iniciam em 1870 uma pequena classe na sala de sua casa em São Paulo, que daria origem ao Instituto Presbiteriano Mackenzie – IPM, que hoje conhecemos”.

Tal informação aponta para o envolvimento direto dos presbiterianos com a educação logo nos seus primórdios, registrando a participação direta da família neste processo, haja vista que George e Mary eram marido e mulher e a escola nascente

ter surgido dentro da casa em que habitavam. É, assim, fato que merece destaque, por sua direta participação em um processo civilizatório por meio da educação.