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Reflexos do conflito de gerações na família

1. POR UMA PRÉ-HISTÓRIA DA FAMÍLIA DO PASTOR PRESBITERIANO

1.2. As transformações na família

1.2.2. Reflexos do conflito de gerações na família

O conflito das gerações merece atenção e cuidados, haja vista que se faz necessário entender os comportamentos diversos dos envolvidos. Foracchi (1977, p. 31) analisa as relações entre jovens e adultos sublinhando a valorização da inex- periência pela eficiência com que opera como fator de acomodação. Para a autora, “o jovem coloca-se diante do adulto como um ser em formação capaz de discernir as inconsistências do seu próprio comportamento.” A questão da falta de experiência do jovem só tem definição mediante confrontação com a experiência do adulto.

Numa sociedade estática, onde se valoriza a experiência do adulto, em de- trimento da força da juventude que poderia ser útil em movimentos sociais, a ten- dência é conflitante. Nesta assertiva, Mannheim (1966, p. 92) destaca que estas so- ciedades focarão a educação em preservar a tradição com seus métodos de ensino.

Pois o autor aponta ainda que o dilema, nesta questão, está no fato de que “as reser- vas vitais e espirituais da juventude serão deliberadamente negligenciadas, en- quanto não houver desejo colidente contra as tendências até então vigentes na soci- edade”.

Diante das abordagens que se coadunam no conflito das gerações, Foracchi (1977, p. 32) observa que:

A tensão inerente ao contato do jovem com o adulto deve, nessas condições, ser entendida como manifestação empírica da contra- dição que existe entre o comportamento e as atitudes do jovem estudante. (...) A análise desta situação é, como se infere, funda- mental para a compreensão dos fatores predominantemente que plasmam o comportamento do jovem porque nela os vínculos são extensos e totais.

É importante frisar que a situação do jovem formata-se por uma questão bastante delicada, dada a sua condição de dependência e pela sua imaturidade. Fa- zendo abordagem sobre as questões das gerações, Eugène Enriquez (1990, p. 208), menciona a situação precária do jovem, apontando que: “Quando Freud evoca o assassinato do chefe da horda, é porque imaginou um tempo em que o chefe man- teria seus filhos em estado de infantilização permanente, proibindo-lhes o acesso às mulheres, ou seja, ao que permite a um menino tornar-se homem.” Desta feita, com- preende-se que há uma clara e objetiva rivalidade entre pai e filho.

O jovem precisa crescer e alcançar a sua autonomia quando se torna pai. Por esta razão Enriquez (1990, p. 209) entende que “a paternidade o transforma em membro aceitável, racional, um indivíduo social”. Mas enquanto isto não chega, ocorre a ambivalência conflitante dos sentimentos entre pai e filho em decorrência da disputa, de alguma forma, pela mãe.

É preciso notar os valores existentes no jovem, dada a sua potencialidade do vigor, o qual poderá ser muito útil para a sociedade. Por este motivo, Mannheim (1966, p. 95) indica que “a juventude não se apresenta progressista nem conserva- dora por natureza, mas é uma potencialidade que está pronta para qualquer nova orientação da sociedade”. Essa realidade, aqui elucidada, não poderá ser eclipsada por parte dos adultos que exercem condições e influência, de alguma forma, sobre a força da juventude.

O quadro socioeconômico pelo qual a sociedade brasileira passa, por exemplo, tem sido muito difícil para com as relações familiares. Consequente- mente, as suas repercussões se estendem aos demais setores da sociedade. Mas, de forma acentuada a família é quem mais sofre as pressões das crises, haja vista seu envolvimento direto no setor de trabalho, provando muitas vezes o desemprego, o problema de inflação que lhes bate à porta terrivelmente, entre outros.

É de suma importância que o indivíduo tenha a consciência e a condição de poder se situar no convívio da sociedade. Para ele, é importante poder interagir de forma certa para não sofrer as consequentes coerções e oposições que o meio pode lhe proporcionar. Assim, fazendo menção a este aspecto pelo qual o homem depara quanto à sua localização na sociedade, Peter Berger (1983, p.79), discorre que, “estar localizado na sociedade significa estar no ponto de interseção de forças sociais específicas. Geralmente quem ignora essas forças age com risco. A pessoa age em sociedade dentro de sistemas cuidadosamente definidos de poder e prestí- gio”.

Dificilmente podermos descrever na sua totalidade as consequências e traumas decorrentes das crises na sociedade. No entanto, focando a família inserida nesse contexto, Zenon Lotufo Jr. (1999, p. 1), aponta que, pela falta de uma boa educação, de uma boa escola, por causa da criminalidade, das drogas, por causa dos péssimos programas de TV e também o desemprego e subemprego, encontramos fatores de dissolução da família.

Os problemas sociais de ordem econômica e outras que afetam diretamente a família desembocam diretamente nas suas relações. Esta situação afeta o envolvi- mento dos cônjuges, entre pais e filhos, e até mesmo entre parentes. De forma di- reta, essa instituição tem sido depredada sorrateiramente pelas crises sociais, pro- vocando-lhes consequências danosas na sua vivência social.

Não se pode desprezar a seriedade com a qual a sociedade trata o indivíduo e o coloca devidamente em seu lugar. Por esta razão Berger (1983, p. 85) adverte

que: “o ridículo e a difamação são instrumentos potentes de controle social em gru- pos primários de todas as espécies”. Para o autor, a questão da difamação ou o co- nhecido mexerico, são importantes instrumentos de coerção que pode trazer certo equilíbrio no meio do convívio social onde a maior parte das pessoas está exposta e se torna conhecida.

Facilmente se percebem as aflições nas famílias, em consequência das cri- ses. Em razão disso, é possível encontrar muitos chefes de família que tem sido incapazes de resolverem seus problemas, envergonhados pelas dívidas, se entregam a mecanismos de fuga, deixando esposas e filhos totalmente desprotegidos e aban- donados.

Na sua abordagem acerca dos efeitos da crise econômica sobre as famílias, Lotufo Jr (1999, p. 3), aponta que este sistema,

Apoia-se em crenças e valores que subsistem porque são acolhi- dos e defendidos pelo homem comum. (...) E pela maneira que procuramos estruturar nossas famílias e, particularmente pelo modo como educamos nossos filhos, podemos estar sendo os principais agentes transmissores dos valores e ideologias que, precisamente, mas contribuem para deteriorar a vida família. As relações do cidadão na família e na sociedade precisam estar revestidas de uma flexibilidade no que diz respeito ao conceito previamente estabelecido quanto ao seu próprio conhecimento de mundo. Isso não diz respeito ao fato de se anular, mas sim, ter condições de resiliência na sua cosmovisão para entender e conviver melhor nas diversas relações. Neste intento, Peter L Berger (1983, p. 84) indica que, “já se descobriu que em discussões grupais que se entendem durante certo período, os indivíduos modificam suas opiniões, ajustando-as à norma grupal, que corresponde a uma espécie de média aritmética de todas as opiniões represen- tadas no grupo”.

A família também precisa ser analisada na perspectiva sistêmica, dada a sua conjuntura de relacionamentos. Estes relacionamentos não acontecem apenas entre os seus membros, mas também se dão também destes com outras pessoas no circulo do parentesco e outras mais, de setores diversos da sociedade.

A teoria sistêmica parte do entendimento teórico proposto por Ludwing Von Bertalanffy para que se possa situar a realidade científica e o seu desenvolvi- mento. Assim Fritjof Capra (1999, p. 43) apresenta tal teoria afirmando que:

Antes da década de 40, os termos ''sistema" e "pensamento sistê- mico" tinham sido utilizados por vários cientistas, mas foram as concepções de Bertalanffy de um sistema aberto e de uma teoria geral dos sistemas que estabeleceram o pensamento sistêmico como um movimento científico de primeira grandeza. Com o forte apoio subsequente vindo da cibernética, as concepções de pensamento sistêmico e de teoria sistêmica tornaram-se partes integrais da linguagem científica estabelecida, e levaram a nume- rosas metodologias e aplicações novas.

A abordagem sistêmica familiar está diretamente relacionada com o en- volvimento em instituição, o que é apropriado para amparar o discurso em tela. Assim, Ceneide Maria de Oliveira Cerveny (2010,p. 223) aponta a importância de ressaltar que esta se caracteriza pela adoção de um pensamento sistêmico. Isto sig- nifica fazer uma leitura da realidade como um processo que inclui todas as partes envolvidas em constante interação e com responsabilidades compartilhadas na construção do todo.

O conceito de rede social está também relacionado com a questão sistê- mica, cuja teoria desdobra as relações mais diversas da realidade. Para análise da família, essa teoria certamente contribui diretamente e poderá trazer conclusões in- teressantes, a depender da busca e dos interesses a que se proponha. Desta forma, tratando, por exemplo, da questão de saúde, Carlos E. Sluzki (1997, p. 27) aponta que o modelo da rede social nos provê uma ferramenta conceitual útil e poderosa para organizar as experiências pessoais e coletivas.

Apresentado uma conceituação de sistemas, Regina Szylit Bousso (2016, p. 1) afirma que são:

Um conjunto de elementos interdependentes que interagem com objetivos comuns formando um todo, e onde cada um dos ele- mentos componentes comporta-se, por sua vez, como um sistema cujo resultado é maior do que o resultado que as unidades pode- riam ter se funcionassem independentemente.

As mudanças que ocorreram na família no decorrer da história trouxeram inovações no modus de viver da sociedade de que, até hoje, podemos atestar os comportamentos mais diferentes possíveis nas relações das famílias. E a família do pastor não ficou de fora destas mudanças. Ela foi afetada diretamente e merece atenção e análise do seu comportamento para se fazer um justo diagnóstico da sua maneira de viver e ser nos dias de hoje.