• Nenhum resultado encontrado

4.1. Apresentação do material analisado

4.1.3. Fantástico: a origem da “revista eletrônica” dos domingos

“Olhe bem, preste atenção, Nada na mão, nesta também Nós temos mágicas para fazer” (Música de abertura do Fantástico em 1973)

20

O programa Fantástico foi ao ar pela primeira vez em cinco de agosto de 1973 e trata-se de um dos programas há mais tempo em execução na televisão brasileira, sempre na mesma faixa horária: as noites de domingo. Pertence à Rede Globo de Televisão que, assim como a Folha de São Paulo, faz parte de um conglomerado de comunicação, o Grupo Globo. Seguindo a mesma lógica da concentração de capital e produção que se verifica na grande indústria ao longo do século XX, o Grupo Globo apresenta inúmeras ações no mercado midiático para o qual, além da TV Globo, também produz filmes (Globo Filmes), livros (Editora Globo), produz e comercializa músicas (Som Livre), etc. Possui também um grupo no segmento de jornais, como O Globo, o segundo maior do Brasil, atrás apenas da Folha de São Paulo, além dos periódicos “Extra”, “Expresso” e participação do “Valor Econômico”, publicado em parceria com o Grupo Folha.

A Rede Globo de Televisão teve sua criação em 26 de abril de 1965, aproveitando-se do mesmo contexto histórico da Folha de São Paulo, “inaugurado ao final de nossa industrialização, com o ingresso do país na etapa monopolista do capitalismo, do ponto de vista de seu processo interno de acumulação. Por ser tardio, este ingresso fez-se fortemente ancorado no Estado e no capital estrangeiro. Além disso, deu-se nos quadros de um regime político autoritário” (TASCHNER, 1992: 197).

Especialmente o Fantástico tem sua criação para resolver um grave problema de audiência. Até o final de 1972, no horário nobre das noites dominicais, o programa da TV Globo era o Buzina do Chacrinha, apresentado também às quartas-feiras. Demonstrando grande vigor e elevadíssimos índices de audiência, seu apresentador, José Abelardo Barbosa de Medeiros (conhecido como Chacrinha), rompe com a Globo e passa a apresentar seu programa na emissora concorrente, inicialmente a TV Tupi e depois a Rede Bandeirantes21.

O temor inicial, como nos apresenta José Bonifácio de Lima Sobrinho (2011), era perder espaço da audiência com a saída repentina de Chacrinha e sua ida para a concorrência. Em termos gerais, a audiência é a contabilização da monetarização dos espaços publicitários de uma empresa de mídia. Numa ótica mercadológica, elevadas audiências potencializam cobranças maiores nos espaços publicitários e o programa torna-se uma mercadoria vendável pela sua capacidade de capitalizar rendimentos para

21

Tempos depois Chacrinha voltaria para a Rede Globo, mas apresentando um programa aos sábados, nunca mais aos domingos à noite, horário cativo do Fantástico desde sua origem.

a empresa. Na mídia televisiva isso é predominantemente sensível, determinando o que é produzido e transmitido e os projetos engavetados. Bourdieu (1997) cita que:

“os índices de audiência estão atualmente em todas as cabeças. (...) Por toda parte pensa-se em termos de sucesso comercial. Há apenas uns trinta anos, e isso desde meados do século XIX, desde Baudelaire, Flaubert, etc, no círculo dos escritores de vanguarda, dos escritores para escritores, reconhecidos pelos escritores, ou, de mesma maneira, entre os artistas reconhecidos pelos artistas, o sucesso comercial imediato era suspeito: via-se nele um sinal de comprometimento com o século, com o dinheiro... Ao passo que hoje, cada vez mais, o mercado é reconhecido como estância legítima de legitimação” (37)

Em outras palavras, sem seu grande sucesso dos domingos e sob a ótica do mercado, cabia à Globo inventar uma alternativa que lhe garantisse audiência.

Provisoriamente, no horário do extinto Buzina do Chacrinha, foi ao ar um

programa chamado Só o amor constrói. Nos bastidores, José Bonifácio de Lima Sobrinho e Mauro Borja Lopes, responsáveis pela programação da emissora, pensavam em um programa inovador para o domingo à noite. Como nos conta Oliveira Sobrinho (2011):

“Eu e o Borjalo (Mauro Borja Lopes) jantávamos todos os domingos e nos vinha sempre à cabeça a ideia de uma revista dominical. Mas eu não queria apenas um programa de reportagens com números musicais entremeados e sim alguma coisa que reunisse tudo o que a televisão fazia, com notícias, reportagens, música, humor, circo, dramaturgia e curiosidades. Enfim, um mosaico com todas as peças costuradas entre si para formar uma unidade. Anotei isso em um memorando e chamei o projeto de ‘O show da vida’” (154)

Em 5 de agosto de 1973 ia ao ar um programa que se propôs uma “revista eletrônica” chamado “Fantástico – o show da vida”, elevando a audiência da Rede Globo para índices maiores que nos tempos do Buzina do Chacrinha e que, desde então, apesar de alguns ajustes, mantem praticamente o mesmo formato geral.

Trata-se, portanto de um programa com diferentes linguagens, entremeando jornalismo com música, esquetes humorísticos com denúncias, curiosidades com documentários. Esse caráter inovador fez o Fantástico se transformar numa excelente

mercadoria, estando não apenas há mais de 40 anos no ar mas também tendo seu formato vendido para mais de sessenta países.

Transformou-se também em um espaço de experimentação, pois muitos

programas da emissora, antes de serem produzidos e inseridos na grade de programação, passavam por pequenas experimentações em que eram apresentados ao público em formatos menores e, caso agradassem como produto, poderiam ter seu espaço na grade da Rede Globo. Por exemplo,

“Na geral (Belisário França), quadro exibido em abril de 1994, no qual Regina Casé ia às ruas fazer reportagens sobre assuntos culturais e sociais do Brasil, foi o embrião do programa Brasil Legal (Estevão Ciavatta e Luis Felipe Sá), exibido às terças-feiras entre 1995 e 1997. O quadro Homem- Objeto (João Falcão), inspirado na peça teatral de mesmo nome de Luis Fernando Verissimo, do qual participavam os atores Lucio Mauro Filho, Lázaro Ramos, Wagner Moura e Bruno Garcia, exibido em 2003, deu origem ao programa Sexo Frágil (João Falcão), apresentado às noites de sexta- feira em 2004. Profissão Repórter (Marcel Souto Maior), programa que está no ar até hoje na grade de programação da Rede Globo, revelando os bastidores da produção jornalística, estreou como quadro do Fantástico em maio de 2006 e se tornou um programa independente em junho de 2008” (ALVES, 2012: 82)

Especificamente o quadro Vozes do Clima, respeitando a lógica de ser uma parte do programa Fantástico, foi ao ar em 22 de março de 2009 com seu primeiro episódio. Ao longo das demais cinco semanas foram apresentados os efeitos do resultado do AR4 para o contexto brasileiro em pequenas reportagens com cerca de 6 minutos cada episódio, totalizando aproximadamente 38 minutos de vídeo analisado apresentando os impactos dos dados do AR4 para a condição climática brasileira. O programa poderia apresentar o documentário em um horário específico e em apenas um programa, mas perderia a lógica estrutural de pequenas reportagens entremeadas por outros assuntos e temas associados ao universo televisivo. Sob esse aspecto, dividir o documentário em pequenas 6 partes, mesmo que curtas, parece respeitar o projeto de execução do