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C. parapsilosis é um microrganismo ubíquo que tem sido isolado de várias fontes ambientais, incluindo solo e água do mar (de Bernardis et al., 1999; Pipper et al., 1998; Weems, 1992). Pode ser encontrado também em superfícies epiteliais e da mucosa, tais como pele e unhas onde são normalmente considerados parte da microbiota do homem (de Bernardis et al., 1999).

Estudos experimentais mostraram que cepas de C. parapsilosis são menos virulentas que C. albicans e C. tropicalis. Em um trabalho conduzido por Mellado et al. (2000) foi avaliado a capacidade de 9 isolados clínicos de espécies de Candida (3 de C. albicans, 3 de C. tropicalis e 3 de C. parapsilosis) de colonizar o trato gastrointestinal e causar infecção. Eles verificaram, também, o impacto da suplementação dietética dos animais com tetraciclina e glicose sob o perfil microbiológico e a colonização intestinal. As cepas foram inoculadas nos animais por gavagem concomitantemente com dois padrões de suplementação dietética: antibiótico e glicose. A tetraciclina e a glicose alteraram substancialmente a microbiota aeróbia, especialmente a estreptocócica. Depois de duas semanas, os autores observaram uma alta colonização do trato gastrointestinal pelas espécies de Candida nos camundongos que receberam a suplementação. Secções histológicas do estômago desses animais revelaram micro abscessos intraepiteliais com presença de hifas. Sobre imunossupressão, a disseminação sistêmica de C. albicans e C. tropicalis foram observadas em 62 e 24% dos animais que receberam suplementação dietética, respectivamente. Neste estudo, não foram observadas disseminações nos animais infectados por C. parapsilosis.

A patogenicidade relativa de oito espécies de Candida de importância médica foi investigada em modelo animal por Arendrup et al. (2002). Foram incluídos neste estudo 17 isolados de Candida, sendo 2 de C. albicans, 2 de C. glabrata, 2 de C. tropicalis, 2 de C. lusitanae, 2 de C. parapsilosis, 2 de C. Kefyr, 2 de C. guilliermondii e 3 isolados de C. Krusei. Grupos de 3 ou 4 camundongos imunocompetentes foram

inoculados com 105 e 107 unidades formadoras de colônia (UFC), respectivamente. Nos dias 2 e 7, os pesquisadores removeram os rins para verificar a UFC/g. A mortalidade foi documentada somente em camundongos infectados com C. albicans e C. tropicalis. A média do log da UFC/g de rim dos camundongos inoculados com 107 UFC de C. tropicalis, C. glabrata, C. kerfyr, C. lusitanea, C. parapsilosis, C. krusei e C. guilliermondii foi significativamente diferente (P<0,0001) entre as espécies estudadas. Mudanças histológicas nos rins também foram verificadas. Os autores observaram que a virulência das espécies estudadas pode ser dividida em 3 grupos em ordem decrescente de patogenicidade: 1) C. albicans e C. tropicalis, 2) C. glabrata, C. kerfyr e C. lusitanea e 3) C. parapsilosis, C. krusei e C. guilliermondii.

Em estudo clínico, Pappas et al. (2003) investigaram o índice de mortalidade de pacientes com ICS por espécies de Candida. Neste estudo, pacientes adultos com candidemia por C. parapsilosis tinham menores índices de mortalidade (24% x 46%; P<0,001) e menores índices de mortalidade atribuída (2% x 12%; P<0,001) do que outras espécies de Candida. Na população infantil desse mesmo estudo, foi relatada a mesma tendência, ou seja, baixos valores de mortalidade e mortalidade atribuída quando comparados a outras espécies de Candida (15% x 28%; P=0,08) e (4% x 12%; P=0,219), respectivamente.

Apesar dos dados apresentados acima, Brito et al. (2006) estudaram aspectos clínicos de candidemia devido à infecção por C. parapsilosis e C. albicans. A mortalidade dos pacientes com candidemia devido à C. parapsilosis foi significativamente menor (45% C. parapsilosis x 62% C. albicans; P=0,03). Entretanto, quando o APACHE II score foi incluído em modelo multivariado de análise de risco para óbito, C. parapsilosis não apresentou mortalidade significativamente menor que C. albicans. Entre os pacientes tratados com antifúngicos, a taxa de mortalidade foi 49% em C. parapsilosis e 51% em C. albicans (P=0,79).

Os dados apresentados sugerem que apesar da menor patogenicidade de C. parapsilosis em modelos experimentais, em pacientes críticos esse patógeno pode causar doença disseminada e óbito.

Importante realçar que a virulência de C. parapsilosis não é bem caracterizada na literatura. Supõe-se que determinantes de virulência de todas as espécies patogênicas do gênero Candida sejam similares à C. albicans (Haynes, 2001). Entretanto, em contraste à C. albicans, infecções por C. parapsilosis podem ocorrer sem colonização prévia dos pacientes (Shin et al., 2001), principalmente em neonatos e pacientes de UTIs (Bassetti et al., 2006; Fridkin et al., 2006; Levy et al., 1998). Acredita-se que alguns fatores são importantes para colonização e infecção por este agente, entre eles, a produção e secreção de aspartil-proteinase, bem como a capacidade de adesão a materiais médicos, produção de polissacarídeos extracelulares e a habilidade de formar biofilme (Merkerová et al., 2006; Kojic e Darouiche, 2004; Kuhn et al., 2004; Haynes, 2001).

C. albicans, C. tropicalis e C. parapsilosis podem ser distinguidas de outras leveduras pela secreção de proteinase in vitro. Em relação à C. albicans e C. tropicalis, a atividade secretória proteolítica é considerada um importante fator na virulência dessas espécies (Medrano et al., 2006; Nakamura e Takahashi, 2006; Calderone, 2002; Shin et al., 2002). Para C. parapsilosis, a correlação entre atividade proteolítica e virulência ainda não foi estabelecida. De acordo com o potencial proteolítico desta espécie, a virulência é baixa in vitro, assim como em animais e em alguns cenários de doença em humanos (Rüchel et al., 1986).

A habilidade de produzir biofilme está fortemente associada com a habilidade de causar infecção e, desta forma, pode ser considerada um importante determinante de virulência durante a infecção por Candida spp.

Os biofilmes são estruturas complexas, formadas de microrganismos aderidos a superfícies biológicas ou inorgânicas. Para colonizar algumas superfícies, as

células fúngicas primeiro aderem a estas por intermédio de fatores não específicos (hidrofobicidade da superfície da célula e forças eletrostáticas) e fatores específicos do hospedeiro, tais como proteínas do soro (fibronectina e fibrinogênio). Em seguida, as células aderidas ao substrato se dividem formando microcolônias e desenvolvem o biofilme, que são notadamente difíceis de eliminar (Ramage et al., 2005; Donlan, 2002). Nos biofilmes, os organismos encontram-se envolvidos em uma densa matriz de exopolissacarídeos, habitando algumas superfícies (Blankenship e Mitchell, 2006; Adam et al., 2002), particularmente, aquelas de sistemas de água, ambientes aquáticos, assim como, dispositivos médicos hospitalares. Dessa maneira, os biofilmes são altamente relevantes para a saúde pública. Esta matriz de polissacarídeos pode ser composta de populações que se desenvolvem a partir de uma única espécie ou de uma comunidade derivada de múltiplas espécies microbianas (Adam et al., 2002).

Especulações sobre as vantagens de formação do biofilme para os microrganismos incluem: proteção contra as agressões geradas pelo meio ambiente (drogas antifúngicas e sistema imunológico do hospedeiro), disponibilidade de nutrientes, cooperação metabólica e aquisição de novos traços genéticos (Douglas, 2002).

A capacidade de aderência e conseqüente formação de biofilme em superfícies plásticas podem explicar porque a C. parapsilosis está freqüentemente associada a infecções de cateteres vasculares (Nett et al., 2007; Medrano et al., 2006; Nakamura e Takahashi, 2006; Calderone, 2002; Shin et al., 2002). C. parapsilosis isolada de sangue ou de cateteres infectados devem possuir probabilidade mais alta de produzirem biofilme do que isolados de outras localidades, assim como, isolados de candidemias recorrentes (Nett et al., 2007; Tumbarello et al., 2007; Kojic e Darouiche, 2004; Kumamoto, 2002). Ademais, há evidências de que células do biofilme formado sobre materiais implantados estejam sendo constantemente liberadas para a corrente sangüínea. Por estas razões, estudos sobre formação de biofilme de Candida spp. adquiriram interesse considerável (Seidler et al., 2006; Douglas, 2003; Calderone, 2002).

Branchini et al. (1994) investigaram a diversidade genotípica e a produção de biofilme de 31 cepas de C. parapsilosis isoladas de sangue e cateter. Estas resultaram em 14 subtipos de DNA. Dos 31 isolados estudados, 80% (24) produziram biofilme, sendo 67% (16) entre moderado a fortemente produtores e 13% (4) fracos produtores. O estudo demonstrou que este traço fenotípico não é compartilhado por todos os membros de um determinado subtipo de DNA. Além disso, a maior propensão de isolados clínicos de C. parapsilosis formarem biofilme em soluções contendo glicose sugere que fatores ambientais podem contribuir para a habilidade de C. parapsilosis aderir a cateteres e causar infecções.

Vários estudos demonstraram que o biofilme de Candida aumenta dramaticamente os níveis de resistência aos agentes antifúngicos mais comumente usados (Ramage, 2005; Schierholz et al., 2001). Novos agentes antifúngicos, tais como equinocandinas e formulações lipossomais de anfotericina B, mostraram atividade contra biofilme de Candida (Ramage, 2005). Os biofilmes parecem ter múltiplos mecanismos de resistência (Baillie e Douglas, 2000). Presume-se que pelo menos três fatores possam influenciar ou agir concomitantemente para promovê-los, como, a expressão de genes biofilme-específicos por contato com determinadas superfícies, modificações fenotípicas em decorrência da queda na taxa de crescimento ou de nutrição e a matriz extracelular presente como barreira contra a penetração das drogas (Douglas, 2003). Hawser e Douglas (1995) observaram que CIM (Concentração Inibitória Mínima) de alguns antifúngicos em biofilmes eram 30 a 2.000 vezes mais altos que os CIMs de células planctônicas. A resistência pode variar dependendo do organismo e da natureza do material sobre o qual o biofilme é formado. Kuhn et al. (2002) verificaram a susceptibilidade frente ao fluconazol de biofilmes produzidos por 2 cepas de C. albicans. Ambas desenvolveram rápida resistência a essa droga, em um período de incubação de apenas 6 horas, com CIM50 > 128 μg/mL. Os mesmos isolados em condições planctônicas

apresentaram CIM50 ≤ 1 μg/mL.

A quantificação da produção de biofilme tem relevância na avaliação da virulência das cepas em estudo. Diante desses dados apresentados, é possível concluir

que C. parapsilosis, apesar de ser um microrganismo de menor virulência quando comparado a outros microrganismos do mesmo gênero, pode desencadear infecções invasivas. Torna-se importante a realização de pesquisas com intuito de acrescentar informações à história natural deste patógeno, bem como estudos sobre diferentes fatores de virulência produzidos durante a infecção invasiva por este agente.

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