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A atividade seguinte seria construir um mapa, pensando no projeto que cada um fazia para sua vida. A dificuldade dos adolescentes estava em escrever. Alguns queriam escrever algumas frases para esclarecer algo e precisaram da ajuda dos membros da equipe.

Para o mapa utilizaram papel canson, tinta guache, recortes de revistas, cola etc.

Percebe-se que foi um momento de muita satisfação, no final os jovens se di- vertiram conversando sobre seus planos e executando a tarefa. Essa satisfação também foi demonstrada na exposição dos trabalhos, quando cada participante po- de mostrar para os demais suas idéias, suas produções e fazer o registro fotográfi- co.

Para tanto, essa foi a última oficina do projeto com esse grupo, encerrada com a recomendação de que não esquecessem as orientações, que ajudassem ou- tros, prevenção por pares, nos círculos de amigos e na família.

4.5.1 Oficinas de Arte/Educação em Saúde

Ayres (2002), em artigo sobre as “Práticas educativas e prevenção em HIV/Aids: lições aprendidas e desafios atuais”, sistematiza as lições aprendidas em prevenção nas duas primeiras décadas de epidemia da AIDS. Uma das lições men- cionadas parece, à primeira vista, um paradoxo, pois afirma que não se ensina pre- venção; mas destaca depois a intersubjetividade nas práticas de prevenção por pa- res como sendo o que produz resultado mais satisfatório. Ele menciona uma educa- ção sem imposição de modelos por ser mais simétrica e porque possibilita o compar- tilhamento de valores, projetos e obstáculos.

A preocupação de não repetir modelos centralizados “naquele que detém o conhecimento” ou na “informação/modelagem dos indivíduos” (AYRES, 2002), a de- cisão de experimentar a Proposta Triangular de Ensino de Arte foram fundamentais nas atividades artísticas, assim como nas relacionadas com o autocuidado e a pre- venção de DST/AIDS, facilitando o compartilhamento de conhecimentos e valores entre as crianças, os adolescentes e os membros da equipe.

As oficinas foram planejadas de forma a possibilitar um ambiente propício à in- teração dos participantes. Contudo, após cada encontro, foi necessário rever e rea- dequar o que havia sido planejado, e retomando as leituras de imagem, revendo os filmes e dispensando mais tempo para ouvir as histórias que tanto as crianças como os adolescentes desejavam contar (MARTINS, 2008). As necessidades que surgiram durante as oficinas e algumas sugestões feitas pelas crianças e pelos adolescentes como, por exemplo, rever os filmes, falar sobre parto e como nascem os bebês, fo- ram discutidas na reunião da equipe, registradas no livro de atividades do projeto, e reformuladas para o encontro seguinte.

A Proposta Triangular viabiliza essa flexibilidade, importantíssima em oficinas onde se pretende a inter-relação de dois ou mais conhecimentos. Ela não exige hie- rarquia de atividades e possibilita aos professores, no caso, os membros da equipe, serem maleáveis e inventivos (BARBOSA, 1998).

Rizzi (2008) lembra que, ao contrário de um procedimento dominante, a Pro- posta Triangular aponta para a pertinência e enfatiza a coerência.

Nas oficinas foram disponibilizados filmes, reproduções de obras de arte, ima- gens de material técnico-educativo, modelos também técnicos, músicas folclóricas e danças circulares (BARBOSA 1998; HERNANDEZ, 2000). Material considerado de grande volume para atividades de leitura da obra de arte, contextualização e fazer artístico em seis encontros com cada grupo. Foi uma possibilidade de contato com diversas obras, imagens, elementos da cultura visual, que possibilitaram a reflexão sobre o pensamento existente em outros tempos, por pessoas de culturas diversas, que se assemelhavam aos nossos ou que eram muito diferentes (HERNANDEZ, 2000).

Nas leituras das reproduções das obras do artista Gustav Klimt (Figuras 1, 2 e 3), as crianças assim como os adolescentes, trouxeram conteúdos do repertório do cotidiano e das experiências condizentes com as realidades da comunidade onde moravam, Ponte Rasa e Abrigo Nosso Lar. Em um dos encontros foi conversado a- cerca da vida e obra do artista, surpreendendo alguns adolescentes pela atualidade dos temas e proximidade com as preocupações atuais (ECO, 2001): saúde da mu- lher e da criança, valorização do corpo como capital (GOLDENBERG, 2007), doen- ças e morte, tabus e preconceitos.

Uma expectativa em relação às atividades com o material técnico (Filme da ABIA, da Promundo, Semina, Claves e Kaplan) indicavam a preocupação da equipe de como seriam resolvidas as atividades e o resultado do fazer artístico. Orloski, em reflexão sobre a prática do educador e potencial educativo de alguns materiais res- salta:

É importante que o educador tenha consciência da potencialidade educativa existente na visualidade de uma peça gráfica. E de que maneira essa cons- ciência pode contribuir para sua atuação como educador? ... É possível e- xercitarmos o olhar estético com elementos do cotidiano? E nas aulas, nos preocupamos com a apresentação dos materiais de que fazemos uso? Co- mo os alunos apresentam as suas produções? Como analisamos uma peça gráfica? Quais conteúdos encontramos? (ORLOSKI, 2006, p. 32).

As imagens, os materiais e os modelos ficaram à disposição nas oficinas para serem utilizados, caso fossem requisitados. As crianças e os adolescentes podiam recorrer a qualquer um deles quando desejassem.

A reação de todos eles foi de grande interesse na oficina em que foi exibido o filme de animação sobre a infecção do vírus HIV, da ABIA. As imagens, no computa- dor, que representavam as células na corrente sanguínea, a multiplicação do vírus e a ação dos medicamentos antiretrovirais para conter a replicação despertaram o de- sejo de rever o filme algumas vezes.

Os que moravam na comunidade pareciam perplexos com a possibilidade de aquilo tudo acontecer no corpo humano. As crianças e os adolescentes que estavam morando no Abrigo Nosso Lar, talvez por conviverem mais de perto com essa reali- dade, pareciam estar sendo apresentados a “alguém” de quem muito ouviram falar, mas que não conheciam pessoalmente. Nas conversas, não se posicionaram aber- tamente.

Assim, os que eram soropositivos para HIV/AIDS fizeram uso do direito que têm de manter em sigilo sua soropositividade. No fazer artístico representaram a ca- deia de ácido desoxirribonucleico (DNA), o vírus, os remédios, dinamicamente arran- jados como acontece quando o corpo fica sem imunidade. Na oportunidade de expor os trabalhos, falaram como tendo a situação, do vírus sob controle.

Foto 46 - Fazer Artístico, após a leitura de imagem filme ABIA – vírus HIV/AIDS.