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O FAZER ROMANO DA LEI 35.

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1. O FAZER NO CONTEXTO DO IMPÉRIO ROMANO 15.

1.4. O FAZER ROMANO DA LEI 35.

Uma das categorias de pessoas amparadas pelo fazer da comunidade mateana são aquelas que se encontram encarcerados ou estão em custódia esperando o julgamento. Por isso, este tópico vai trabalhar algumas características do fazer romano com aporte na lei.

Ao falar de lei, no Império Romano, tem-se um arcabouço teórico amplo e extenso de autores em diversas áreas dos saberes que pesquisaram com profundidade sobre essa temática. Como não é intuito desta pesquisa, aprofundar neste assunto, mas sim apresentar pontos que são divergentes entre o fazer do Império, do fazer apresentado pela comunidade mateana.

O fazer da lei no Império está inserido dentro do Direito romano, um legado que fundamenta as principais constituições e códigos de leis de diversos povos. Uma das razões para a proximidade com esse direito, se dá pela extensão do Império e pela maneira com que inseria os seus valores e normas a todas as culturas conquistadas.

Ao iniciar a reflexão sobre a lei, cabe então situar, quem são aparados de maneira irrestrita pela lei romana, que são os cidadãos romanos que não são aqueles que residem ou nasceram em Roma. Aqui a importância no nível de status é concedida por meio da cidadania romana, que “implicava em responsabilidade de servir nas legiões do exército, assim como implicava privilégios de um voto nas assembleias populares romanas, plena proteção da lei romana e isenção da maioria das taxas” (STAMBAUGH; BALCH, 2008, p. 25). Dessa maneira, aqueles que estavam protegidos pela lei romana, estavam imbuídos de responsabilidade para com Império e tinha também mais benefícios, por ter isenção em boa parte dos impostos.

Sobre os meios de conseguir a cidadania romana, era por nascimento de um pai romano, ou por estar em uma cidade que foi concedida globalmente a franquia desta honraria. Além disso, existiam outros meios para conquista esse status, assim, Comby e Lemonon, apresenta três meios de tornar-se cidadão romano:

Pelas magistraturas municipais. Que os magistrados recebam a

cidadania romana. Que aqueles que tiverem sido duúnviro, edil ou questor, em conformidade com esta lei, sejam cidadão romanos quando, no fim do ano abandonarem a magistratura. Que sejam igualmente cidadãos romanos

seus pais, suas mulheres e seus filhos nascidos de casamento legítimo, ainda sob o pátrio poder, bem como seus netos e netas, filhos de seus filhos, ainda sob o pátrio poder; contanto que não haja mais cidadão romano do que os magistrados necessários em conformidade com esta lei.

Pelo serviço militar. O texto seguinte é um diploma militar: dias placas de

bronze, nas quais está gravado o texto de lei que concede a cidadania romana a militares. O imperador Tito César Vespasiano Augusto, sumo pontífice, em seu novo poder tribunício, aclamado imperador pela décima quarta vez, aos veteranos que fizeram o serviço na frota que está no Egito, que completaram vinte e seis anos de serviço ou mais e que foram desmobilizados com um certificado de bom soldado e cujos nomes estão escritos aqui embaixo, bem como os seus filhos e à sua descendência concedeu o direito de cidadania e o direito de matrimônio legítimo com as mulheres que tiverem quando receberem o direito de cidadania que lhes é concedido ou, se foram celibatários, com a mulher que desposarem depois, contanto que tenha uma só.

E como favor individual. Plínio ao imperador Trajano. Senhor, agradeço-te

por teres concedido sem tarda tanto o direto dos quirites2 aos libertos de uma mulher, que é minha amiga, como a cidadania romana a Harpocras, meu médico. ... Peço-te, pois, a fim de que eu possa tira proveito de teu benéfico no respeito à lei, que lhe concedas tanto a cidadania alexandrina como a romana. Para não retardar mais o efeito de tua benevolência, enviei sua idade e suas rendas àqueles de teus libertos aos quais me disseras que o fizesse (COMBY; LEMONON, 1987, p. 63-64).

Essas seriam as outras formas de conseguir a cidadania romana, duas por meio de serviços prestados ao império, e outro através de favor pessoal, reproduzindo padrão estrutural do patronato.

Dentro da estrutura organizacional do Império tinham algumas cidades que recebiam autorização para organizarem o direito de forma autônoma, para exemplificar, na “Judéia, o Sinédrio e o sumo sacerdote continuaram a observar e sancionar a lei mosaica escrita na Torah e podiam esperar que as autoridades romanas reconhecessem seu direito de fazê-lo” (STAMBAUGH; BALCH, 2008, p. 27). Porém, não era uma liberação irrestrita, pois alguns direitos continuavam sendo prerrogativas da autoridade romana no local. Além disso, qualquer cidadão romano tinha autonomia de escolher ser julgado pelas leis do direito local ou pelas leis do império.

Para se estabelecer um tribunal de júri, para ouvir julgamento, somente era permitido em categorias especìficas de crime: “adultério, falsificação, assassìnio, suborno e traição. Esses costumavam serem crimes dos ricos e poderosos” (STAMBAUGH; BALCH, 2008, p. 26). Essa estrutura de julgamento com júri acontecia no centro do Império. Nas demais províncias, o julgamento ficava a cargo do governador que era o magistrado.

2 Equivalente de „romano‟. Havia uma hierarquia entre os diferentes direitos de cidadania e grande

Os magistrados, ao “instauradas investigações judiciais não olhavam para o que era justo nem para a constatação real dos fatos, mas apenas se podia ganhar uma grande fortuna” (WENGST, 1991, p. 60). Assim, a aplicação da lei romana faz prevalecer a vontade de quem pagava mais ou era mais forte, em todos as instancias da sociedade Imperial.

Dentro do fazer romano das leis, existia uma distinção entre os delitos e as penas aplicada nos marginalizados e nos ricos. A lei aplicada segundo a classe evidencia-se a desvantagem das condenações. Como exemplo, Wengst conta que “Apuleu narra um processo no qual é provado que uma mulher abastada cometera assassínio e é condenada ao exílio por toda a vida; um escravo, porém, que ela utilizara como instrumento de sua ação é condenado à cruz” (WENGST, 1991, p. 61). Com isso, vê-se a disparidade da aplicação da lei, ser cidadão romano, garantia até suavidade nas penas na conclusão do julgamento.

Como foi narrado, uma pena comum de ser aplicada aos cidadãos romanos delituosos era o exílio voluntário fora da Itália, ou então o pagamento de alguma multa. A “prisão não era por si punição, mas meramente detenção, antes do julgamento da sentença” (STAMBAUGH; BALCH, 2008, p. 29). Por isso, o exìlio era uma opção para as pessoas abastadas.

Quando o réu era de origem baixa e estava convicto de seu crime, ele “podia ser privado da liberdade, vendido como escravo, ou condenado a trabalho forçado nas minas pelo resta da vida, ou mandando à arena dos gladiadores” (STAMBAUGH; BALCH, 2008, p. 29). Porém, antes de ser despachado o condenado sofria uma surra com chicotes feitos de couro, osso e metal.

Além disso, o fazer romano das leis previa algumas penas de mortes especificas, para alguns delitos:

um parricida era costurado num saco e lançado a um rio, uma virgem vestal que violava seu voto de castidade era enterrada vida, e os réus convictos de alguns outros crimes eram lançados da rocha Tarpéi. Romanos célebres e prisioneiros de guerra eram estrangulados na prisão ou simplesmente recebiam do imperador a ordem de cometer suicídio. Ou o prisioneiro condenado era atado nu numa estaca e coitado com varas, depois vendando, e, ajoelhado, era decapitado com o machado (durante a república) ou com uma espada (durante o principado). Também se usavam execuções mais brutais e sádicas. A crucificação em geral era reservada para escravos e prisioneiros perigosos (STAMBAUGH; BALCH, 2008, p. 29).

A desigualdade jurídica e social era latente nessa sociedade. As pessoas detentoras de poder tinham também privilégios e prestígios consolidados pelo direito

romano. Assim, como foi evidenciado pelos outros fazeres do Império Romano apresentado nos outros tópicos, percebe-se que a injustiça e desigualdade nas ações, protegendo e amparando os mais fortes, são características recorrentes do fazer no Império Romano.

Aqueles que estão na prisão esperam pelo julgamento ou cumpre uma pena temporária até a realização da pena definitiva, como foi exposto acima. Um fazer cobrado no julgamento, no texto do evangelho de Mateus, é o de visitar quem está nesta prisão. Quem foi sentenciado, pelo fazer romano das leis, não pode ser esquecido pela comunidade, por isso, no julgamento, o filho do homem lembra aqueles que fizeram ou não fizeram visitas a quem estava condenado. Essa é uma atitude de cuidado ao marginalizado que se encontra na prisão, que mesmo condenado não perde a sua humanidade.

Com este último tópico, realiza-se o objetivo de evidenciar caraterísticas do fazer romano em seu contexto histórico e ao mesmo sinalizar como a comunidade de Mateus busca resistir a essa dominação. Na sequência dos trabalhos, a pesquisa dá uma pausa nessa análise e reflexão, das atitudes contrastantes do fazer romano para o fazer da comunidade de Mateus. Para desenvolver um rastreamento exegético da perícope de Mateus 25, 31-46, com intuito de apresentar caracterìsticas presentes no texto que evidenciam a peculiaridade do fazer (ποιέω), tanto para o Evangelho como um todo, como para a o julgamento.

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